quarta-feira, 12 de maio de 2010

O CADÁVER QUE A CHUVA MOLHA







Por Jorge Fernandes

Muitos se perguntam se o Inferno existe. E dou-lhes certeza, existe! Por que a Bíblia diz. Não vou nem me ater a relacionar versículos. Eles estão em tão grande profusão por toda a Escritura que é desnecessário. Se alguém lhe falar que isso é “lenda”, “mentira”, “coação psicológica” ou “radicalismo teológico”, afaste-se dele, pois o objetivo é unicamente o de destruí-lo definitivamente, assim como ele mesmo se acha devastado.

Nos piores momentos de impiedade da minha vida, quando estava escravizado pelo pecado, eu acreditava tanto num tipo equivocado de amor divino, um amor engodado e subjugado, que não O considerava capaz de me condenar. Em minha loucura, achava que o Deus bondoso não poderia criar um lugar tão terrível como o descrito na Escritura, onde os pecadores fossem lançados e atormentados eternamente, "para o fogo que nunca se apaga, onde o seu bicho não morre, e o fogo nunca se apaga" [Mc 9.43-44]. O meu coração estava tão corrompido pela autocompaixão, que o Seu amor era uma espécie de escudo protetor a me desobrigar de cumprir a Sua palavra, garantindo-me descumpri-la, e manter-me enredado no caminho pervertido. O objetivo era de que a minha iniqüidade prevalecesse sobre o amor de Deus; era como o calço que equilibraria a mesa defeituosa e manca; uma muleta capaz de fazer o coxo se arrastar sem que seja curado do seu mal. Era preciso que eu anulasse a Sua justiça e, por conseguinte, o sacrifício de Cristo na cruz do Calvário, com a idéia perversa de um amor contemplativo e inútil, suficiente para me manter num coma irreversível.

É interessante como tudo se processa:

1) O conhecimento de Deus e de Sua Lei Moral, inatos em minha alma, revelavam-me os pecados, ainda que não os assumissem como tal.

2) Para justificá-los, apelava para o amor complacente, tolerante e conveniente, o qual julgava divino, quando não passava de uma tentativa desesperada de ser aprovado por Ele, sem a necessidade de arredar o pé da antiga vida de pecados.

3) Então suprimia o Inferno e qualquer tipo de condenação; acreditando que mesmo o diabo seria absolvido em nome desse suposto amor divino. No fundo, não passava de uma tentativa frustrada de demovê-lO da sua convicção, de considerá-lO volúvel e maleável, facilmente moldado por todo o meu coração perverso e estúpido.

4) Por fim, como a Escritura é categórica em relação ao julgamento de Satanás [e também do réprobo], optei pela sua não existência; e as citações escriturísticas não passavam de apelos morais à minha consciência, no sentido de o mal ser condenado e combatido na sociedade, sem que o pecador o seja. Desta forma, as criaturas tornavam-se mais importantes do que o Criador, e o projeto de santidade de Deus era uma mera obsessão ortodoxa, um delírio teológico legalista [1].

5) A expiação do Senhor, o tema central e corrente de toda a Escritura, passou a ter também um apelo meramente moral, no sentido de se buscar, seja na bondade, no serviço, na consciência, na integração social, o bem que há em nós e que sempre vencerá o mal. Somente desse modo a humanidade evoluirá por seus próprios meios, à sua maneira, até finalmente alcançar a perfeição [2].

Assim, progressivamente, vai-se afastando da revelação especial, em detrimento de uma “revelação pessoal”, na qual o ímpio conforta-se com a idéia de que tudo será perdoado, ainda que não seja necessário arrependimento, ainda que seja preservada a sua velha natureza, e a dissolução servisse de prêmio à desobediência, à leviandade, ao ignóbil pensamento de que se é possível “passar a perna em Deus”.

O novo-nascimento operado pelo Espírito Santo, primeiramente, nos revela a nossa condição imoral e iníqua. Sem a constatação do que somos, o reconhecimento de que estamos verdadeiramente perdidos e mortos para Deus, não há arrependimento nem salvação. Duvido do crente que diz que sempre foi crente. Por menor que seja o processo de regeneração, por mais tênue que seja a diferença entre a sua vida pregressa e a nova vida, há de se arrepender. Mesmo crentes nascidos em berços cristãos, cujos pais, avós e bisavós eram crentes, terão de se deparar mais cedo ou mais tarde com os seus pecados, sendo confrontados pela Palavra e o mover do Espírito em suas vidas. Ainda que se tenha lido a Bíblia muitas vezes, ouvido dezenas de pregações, e até se concluiu o seminário, o Evangelho não passará de construções gramaticais aos seus olhos e ouvidos, nada além de palavras e frases sucedendo-se sem sentido, ou quando muito, confundindo-o.

Porém, quando Deus o confronta com o texto bíblico e o Espírito Santo lhe revela a sua condição de rebelde, mostrando o seu estado miserável diante da santidade e glória divinas, não há como resistir: somos inapelavelmente abatidos em nossa soberba, nossos olhos são abertos, nossa mente é conformada à mente de Cristo, os joelhos se dobram, a cerviz se curva, e a escravidão do pecado é-nos arrancada, reconhecemos Cristo como Senhor, e somos eternamente salvos pelo Seu perfeito amor.

Então, qualquer tentativa de se minimizar o novo-nascimento como a transposição radical do reino das trevas para o Reino da luz, deve ser combatida. Nada é mais diabólico do que rejeitar o novo-nascimento, porque sem ele, o homem apenas será mantido no estado de impiedade, sustentando a inimizade contra Deus, a sua condição de caído em Adão, e a perpetuar a sua natureza carnal, conservando-se morto.

Sem a regeneração, não há salvação. Não adianta saber todos os versículos de cor, nem ter uma vida de aparente piedade, nem estar a serviço da igreja, nem dizimar e ofertar, nem participar da ceia, nem mesmo pregar a palavra. Deus pode usá-lo de várias maneiras [e o usará quer você queira ou não] e você pode até mesmo estar convencido de sua salvação, mas a sua fé não é por Cristo, mas em seus méritos próprios. E ninguém será justificado por obras de justiça própria; porque a sua fé não está nEle, mas em si mesmo, em seu esforço, e no grande cristão que você aparenta ser; nada disso surtirá algum efeito, a não ser condená-lo; ainda que se considere bom o suficiente para receber a misericórdia divina, quando, se não for lavado no sangue do Cordeiro, não poderá chegar diante do Seu trono alegando qualquer outra justificativa. A única que satisfaz o Todo-Poderoso é ser expiado por Cristo, e ser absolvido dos pecados pelo Seu sacrifício remidor.

Você não passa de um tolo! Não é salvo. Nunca foi. E continua sob a ira de Deus.

Se não houver aquele dia, em que numa ínfima fração de tempo você se viu como realmente é, e foi movido irresistivelmente pelo Espírito Santo a ser como Cristo, você ainda está morto em seus delitos e pecados. De nada adiantará espernear, alegar inocência, porque a obra de salvação é completamente de Deus, e o homem não pode auxiliá-lO em nada. Tudo é dEle para o eleito, o qual foi destinado para a vida eterna apenas pela Sua vontade. Sabendo isto, que o nosso homem velho foi com ele crucificado, para que o corpo do pecado seja desfeito, para que não sirvamos mais ao pecado” [Rm 6.6].

O réprobo somente faz produzir provas contra si, infringindo a Lei Moral tantas vezes quanto a sua mente caída é capaz de se deleitar na malignalidade.

Por isso, muitos se recusam a crer no Inferno e na condenação; por que não foram regenerados, e se não foram, como acomodar os seus pecados à Palavra? Não tem jeito. É impossível. Então usarão de artifícios para desqualificá-la, distorcê-la ou recriá-la. Ao idealizarem o paraíso, contentam-se em permanecer atolados no pântano como se fosse possível fazer dele um jardim sem remover toda a lama. Querem que brote flores no terreno estéril. Querem exalar o doce perfume de Cristo, quando estão apodrecendo. Querem-se vivos, quando estão mortos. Querem respirar, quando estão asfixiados. É como o cérebro sem oxigênio.

Assim é o ímpio.

O cadáver que a chuva molha.

Nota: [1] Interessante que os liberais nos acusam de todo o tipo de distorção. Dizem que traçamos absolutos quando eles não existem. Dizem que levamos a Bíblia a uma literalidade doentia. Dizem que o propósito de Deus não é o de condenar ninguém. Dizem que a revelação especial foi construída por homens, e, portanto, está sujeita a falhas. Dizem que Deus deu apenas uma idéia geral do Seu plano, e que os homens acrescentaram e distorceram essa mensagem inicial. Dizem que a Bíblia não é divina, mas humana; e tem apenas bons exemplos morais, mas nada que leve a criatura à salvação ou condenação.

Eles proclamam uma cartilha de motivos para a sua impiedade, para manterem-se em conluio com o pecado, sem que haja qualquer prova concreta do que afirmam; nada além da mais simplória e débil especulação. Contrariamente, podemos afirmar que eles não passam de incrédulos, de crentes em uma fé distorcida e talhada à imagem dos seus deuses: eles mesmos e o diabo. E isso não é mera especulação. É o próprio Deus falando através da Bíblia, a revelação especial.

[2] A qual nada mais é do que a integração de todos os povos, raças e credos numa simbiose capaz de fazer com que a humanidade se unisse no projeto de construção do homem ideal. Isso significaria a união da luz com as trevas, do bem com o mal, do absoluto com o relativo, do fundamental com o dispensável, de Cristo com Belial, do santo com o profano, do incorruptível com o corrompido. Seria o mesmo que fundir água e óleo; e sabemos que eles não se confundem.

Fonte: KÁLAMOS

Nenhum comentário:

Postar um comentário