domingo, 25 de abril de 2021

OS DOIS DEVEDORES – SIMÃO FARISEU E A MULHER PECADORA

Por Pr. Silas Figueira

Texto base: Lucas 7.36-50

INTRODUÇÃO

O Evangelista Lucas começa a nos escrever essa história com um convite realizado por um fariseu por nome Simão ao qual rogou (pedir com insistência) para que Jesus fosse em um banquete na sua casa. A versão ARA diz “jantar”. É interessante observarmos que o primeiro banquete retratado por Lucas tem um pecador (publicano) como anfitrião e um fariseu como intruso (Lc 5.29-32); nesse seu segundo banquete, um fariseu é o anfitrião; e uma pecadora, a intrusa [1].

Jesus não apenas aceitava a hospitalidade de publicanos e pecadores, mas também aceitava convites de fariseus. Ele comia com pecadores e também com fariseus, pois todos igualmente precisavam da palavra de Deus [2]. Alguém muito sabiamente falou: “Se Jesus não se sentasse à mesa com pecadores, Ele iria estar sempre sozinho!”.

Os fariseus diziam de Jesus: “Eis aí um glutão e bebedor de vinho, amigo de publicanos e pecadores!” – Os fariseus condenavam a si mesmos com essas palavras que haviam dito sobre Jesus. Era também conviva deles, aceitava também convites deles para a ceia, embora na verdade fossem seus inimigos pessoais (já haviam considerado a ideia de matá-lo, Lc 6.11) e não se igualassem aos publicanos ávidos de salvação. Apesar da hostilidade deles, o Senhor não tem medo, mas mostra a eles e também a nós o que significa amor ao inimigo [3].

Estando lá, uma pecadora começou a ungir os pés de Jesus. Este incidente não deve ser confundida com a unção de Maria, irmã de Marta e Lázaro fez (Mt 26.6-13; Mc 14.3-9; Jo 12.1-8). A história registrada nesta passagem ocorreu na Galileia, não em Betânia; a mulher que nos é apresentada aqui é uma pecadora (provavelmente uma prostituta); esta unção aconteceu muito mais cedo no ministério do Senhor, e não durante a semana da Paixão; este fato ocorreu na casa de Simão o fariseu, não na casa de Simão o leproso. A única semelhança superficial é que os proprietários de ambas as casas tinham o nome de Simão. No entanto, Simão era um nome muito comum em Israel. O Novo Testamento apresenta vários outros homens com esse nome, incluindo dois dos apóstolos, Simão Pedro e Simão, o Zelote, (Lc 6.14-15; Mt 13.55), um dos irmãos de Jesus tinha esse nome (Mc 6.3), um homem de Cirene que foi forçado pelos romanos a carregar a cruz de Jesus (Mc 15.21), o pai de Judas Iscariotes (Jo 6.71), o falso profeta Simão, o mágico (At 8.9-24), e Simão, o curtidor, em cujas casa em Jope Pedro ficou (At 9.43).

Somente em Lucas, Jesus entra na casa de um fariseu para comer. Ele faz isso três vezes (7.36; 11.37; 14.1). Nesse jantar na casa de Simão, acontece um fato que se torna o centro do registro bíblico, e que nos traz grandes lições.

1 – ENTENDENDO O CONTEXTO HISTÓRICO.

Alguns dos detalhes característicos do Oriente Médio presumidos pelo texto são descritos minuciosamente por Tristam, um astuto viajante do Século XIX: “...receber hóspedes é um negócio público. O portão do jardim, e a porta... estão abertos... Uma mesa longa e baixa, ou mais frequentemente os grandes pratos de madeira, são colocados ao longo do centro da sala, e divãs baixos de ambos os lados, nos quais os hóspedes, colocados segundo a ordem da sua posição, reclinam-se, apoiando-se no cotovelo esquerdo, com os pés afastados da mesa. Ao chegar, todos tiram as sandálias ou chinelos, e os deixam à porta. Os servos ficam de pé por detrás dos divãs, e colocando uma bacia rasa e larga no chão, derramavam água sobre os pés dos hóspedes. Omitir essa cortesia seria dar a entender que o visitante era de posição social muito inferior... Por detrás dos servos os desocupados da aldeia se aglomeram, e não são considerados intrusos por assim agirem (Tristam, 36-38) [4].    

As casas dos judeus ricos tinham colunatas para o lado do pátio interior. Conforme o costume oriental, também estranhos podiam observar o lauto e solene banquete a partir do pátio. Vemos dispostas sobre as mesas as comidas e frutas. Diante das mesas estão colocadas almofadas altas e macias, sobre as quais repousarão os convivas. O senhor da casa vai ao encontro de cada um deles, cumprimentando-o com a saudação: “Paz seja contigo”, e beijando-o com o ósculo da paz. Esse beijo sobre a face afiança-lhes que são bem-vindos e que gozam de amor e amizade. Depois de lavados os pés, o anfitrião ainda oferecia óleo aromático (perfume) para arrumar os cabelos e para ungir a cabeça e as mãos (que os hóspedes igualmente haviam lavado) [5].

Bailey diz que além disso, os pés são sempre colocados por detrás das pessoas que está reclinada, por causa da natureza ofensiva e impura dos pés na sociedade oriental, desde os tempos imemoriais até o presente. No Antigo Testamento o mais supremo triunfo para o vencedor e insulto para o vencido era “fazer do inimigo escabelos dos pés” (Sl 110.1). A Edom, que é odiado violentamente, se diz: “Sobre Edom atirarei a minha sandália” (Sl 60.8, Sl 108.9). Moisés é obrigado a tirar as suas sandálias impuras diante da sarça ardente, por causa da santidade do solo (Êx 3.5, conf. Js 5.15). João Batista usa a ilustração de desatar o cadarço dos sapatos para expressar a sua total indignidade na presença de Jesus (Lc 3.16) [6].   

As boas maneiras ordenavam que se cumprissem estas coisas, e neste caso não aconteceu nada disto com Jesus na casa do fariseu Simão.

2 – UMA PECADORA ARREPENDIDA (Lc 7.37,38).

Diferentemente de Simão fariseu, esta mulher prestou honras a Jesus, coisa que Simão se negou a fazer. A presença dessa mulher e a forma como ela reagiu em relação a Jesus deixou Simão e, provavelmente, os outros convidados constrangidos.

Os rabinos judeus não conversavam nem comiam com mulheres em público. Essa mulher não tem nome, mas tem fama, fama de pecadora. Ela não foi convidada para o jantar na casa do fariseu; é uma penetra, uma intrusa. No conceito de Simão, essa mulher era um caso perdido, uma pessoa irrecuperável, indigna de receber atenção [7].

O que a atitude dessa mulher tem a nos ensinar?

1º - A atitude desta mulher nos mostra humildade e gratidão (Lc 7.37,38). Essa mulher havia ouvido Jesus proclamar o amor de Deus, oferecendo gratuitamente aos pecadores. Estas boas novas do amor de Deus pelos pecadores, mesmo iguais a ela, a haviam emocionado, e iniciado nela um profundo desejo de manifestar uma reação de gratidão. [Ela ungiu os pés de Jesus com unguento]. Um frasco com esse perfume era usado pelas mulheres dependurado no peito, de um cordão ao redor do pescoço. Esse perfume era usado tanto para perfumar o hálito como a pessoa. Não é necessário muita imaginação para entender como esse frasco devia ser importante para uma prostituta. A sua intenção é derramá-lo nos pés de Jesus mostrava que ela não precisava mais dele [8]. Sua vida havia sido transformada por Jesus e ela estava dizendo que ela estava abandonando a vida de pecado e sendo uma nova criatura em Cristo. O fruto de seu pecado ela estava derramando aos pés de Jesus como prova de sua nova vida.

J. C. Ryle diz que a fim de percebermos a beleza da história, devemos fazer sua leitura juntamente com o capítulo 11 de Mateus. Descobriremos o notável fato de que a mulher cuja conduta foi descrita nesta passagem provavelmente teve sua conversão como resposta às famosas palavras de Jesus: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei” (Mt 11.28). Este maravilhoso convite, dentre todas as possibilidades humanas, foi a salvação para sua alma e lhe trouxe paz, pela qual nós a vemos expressar imensa gratidão. Uma completa oferta de perdão é sempre o instrumento escolhido por Deus para trazer o pior dos pecadores ao arrependimento [9].

Wiersbe nesta mesma linha de pensamento diz que a mulher admitiu que era uma pecadora e demonstrou ser uma pecadora arrependida. Se observarmos os paralelos entre os Evangelhos, veremos que, pouco antes desse acontecimento, Jesus havia feito o convite amável: “Vinde a mim [...] e eu vos aliviarei” (Mt 11.28-30). Talvez tenha sido nessa ocasião que a mulher arrependeu-se de seus pecados e creu no Salvador. Suas lágrimas, sua atitude humilde e seu presente indicavam transformação interior [10].  

2º - A atitude desta mulher mostra extravagância (Lc 7.38). Tendo conhecimento de que Jesus estava reclinado à mesa em casa do fariseu, e sabendo que as portas poderia ser deixada em aberto, a mulher foi para lá com um plano específico em mente. Ela evidentemente, não foi imediatamente reconhecida pelas outras pessoas lá; caso contrário o fariseu teria mandado ela se retirar de sua casa. Pode ser que o banquete teve lugar de noite, e à luz fraca das velas e lâmpadas tenham mascarado sua identidade.

Ela trouxe com ela um vaso de alabastro com perfume. O vaso em que o perfume foi armazenado foi feita a partir de alabastro, uma espécie de mármore caro extraído no Egito, indica que o perfume era valioso. A mulher destina-se a ungir a cabeça de Jesus com o perfume, em vez do azeite mais comum e menos caro normalmente utilizados para esses fins (cf. v. 46). Esperando uma oportunidade, ela assumiu uma posição de pé atrás de Jesus aos Seus pés.

Na sua profissão vergonhosa ela estava acostumada a comprar perfumes, e alguns pensam ser possível que este fosse originalmente destinado para propósitos relacionados ao pecado. Mas agora o seu coração estava afastado do pecado e da vergonha e voltado para o Salvador. Assim como o seu corpo e a sua alma, este unguento estava dedicado a Cristo [11].

Ela estava tão grata pelo perdão alcançado que ela não se importou em agir para honrar o Seu Senhor, já que Simão deixou de fazê-lo. Ela provavelmente queria ungir Jesus, mas ela foi tomada de tanta emoção que começou a chorar. Por estar de pé próxima a Jesus, começou a molhar os Seus pés com as suas lágrimas. Brechó (molhado) significa, literalmente, “a chuva” (Mt 5.45; Lc 17.29; Tg 5.17; Ap 11.6). A barragem emocional tinha estourado, e as lágrimas inundaram para baixo sobre os pés de Jesus em uma chuva suave.

Como disse Hendriksen: ela se sente vencida pela emoção. Um pesar esmagador pelo pecado pregresso se mescla com profunda gratidão pelo presente senso de perdão. Seu coração transborda de amor e reverência por aquele que lhe abriu os olhos e produziu uma transformação tão radical em sua vida. Resultado: ela explode em lágrimas [12].

Inclinada aos pés de Jesus enquanto ela chorava, a mulher notou que o anfitrião não tinha lavado os pés de Jesus (v. 44). Então ela manteve enxugando-os das suas lágrimas com os seus cabelos. Naquela cultura, lavar os pés de outra pessoa era considerado degradante, algo feito apenas pelos escravos mais humildes. Mas o que teria chocado os espectadores, ainda mais do que lavar os pés, foi que ela enxugou os pés de Jesus com os seus cabelos. Para uma mulher judia fazê-lo em público era considerado algo indecente, mesmo imoral. Mas dominada pela emoção, ela não estava preocupado com a vergonha que ela poderia enfrentar.

Isso era algo tão sério que o Talmude indica que marido pode pedir divórcio pelo fato de a mulher desatar o cabelo na presença de outro homem. Em regiões conservadoras do mundo islâmico contemporâneo cabeleireiros do sexo masculino são proibidos de pentear mulheres pelas mesmas razões [13].

Depois de terminar de lavá-los, a mulher começou a beijar os pés de Jesus. Kataphileō (beijar) é uma palavra intensa. Em Lucas 15.20 descreve o beijo do filho pródigo em seu retorno para casa do pai. Lucas usou em Atos 20.37 para descrever como os anciãos da igreja de Éfeso beijou Paulo quando ele se despediu deles. Os beijos nos pés de Jesus pôr esta mulher era uma expressão marcante de afeto. Então, ela passa a ungiu os pés do Senhor com o perfume. Esta foi uma exibição impressionante de honra prestada a Jesus no meio daqueles que buscavam apenas para desonrá-Lo.

O que parecia ser algo extravagante era na verdade uma forma de gratidão. Muitas pessoas não demonstram nenhuma gratidão pela salvação alcançada. Aliás, desonram a Deus com suas atitudes diante da igreja e no mundo.

2 – SIMÃO, UM ANFITRIÃO QUE NÃO HONROU JESUS (Lc 7.39-43).

A tripla referência à situação da mulher junto aos “pés” de Jesus no versículo 38 acentua a humildade dela – ou melhor, sua humilhação. Contudo, ela não é passiva. Os versículos 37 e 38 contêm oito asserções verbais sobre a conduta da mulher: soube onde Jesus estava, trouxe um jarro de unguento, se colocou atrás dos pés de Jesus, chorou, molhou seus pés com lágrimas, os enxugou com seus cabelos, beijou-os e os ungiu com o perfume. Esses verbos atestam sua notável determinação e devoção. A conduta do fariseu, em contrapartida, é relatada em uma superficial de correção social: ele o havia convidado (Lc 7.39). O versículos 44 e 45 descrevem quão pouco ele fez de Jesus [14].

O fariseu não tem coragem de criticar Jesus a viva voz, mas o censura nas recâmaras secretas do seu coração. Ele não apenas reprova Jesus, mas também despreza a mulher pecadora. Jesus mostra a frieza exterior do coração de Simão e sua vida julgadora interior [15].

Como disse Wiersbe: o verdadeiro problema de Simão era a cegueira, não conseguia enxergar a si mesmo, a mulher, nem o Senhor Jesus. Assim, foi fácil declarar: “ela é pecadora”, mas foi impossível dizer: “eu sou pecador” (ver Lc 18.9-14). Jesus provou que, de fato, era um profeta ao ler os pensamentos de Simão e revelar suas necessidades [16].

A parábola relatada por Jesus fornece uma bela demonstração do dom profético de Jesus. As palavras de Jesus assinalam o que acontecia no coração da pecadora e também o que representam os pensamentos e as perguntas de Simão [17].

Ela corrige Simão de duas formas:

1º - Jesus revela a cegueira do coração de Simão (Lc 7.39,40). Simão estava julgando Jesus pelo fato dEle não ter discriminado a mulher, pois afinal se Ele fosse profeta Ele saberia quem era aquela mulher e não permitiria tal atitude dela. Para Simão isso confirmava que Jesus era um falso profeta. Um embusteiro. No entanto, Simão está enganado em relação a Jesus e a mulher. Jesus era mais que um profeta e a mulher era uma pecadora arrependida.

2º - Jesus revela que tanto a mulher quanto Simão eram pecadores (Lc 7.40-43). A parábola não trata da quantidade de pecados na vida de uma pessoa, mas da consciência desses pecados no coração. Quantos pecados uma pessoa precisa cometer para ser considerada pecadora? Tanto Simão quanto a mulher eram pecadores. Simão era culpado de pecados do espírito, especialmente orgulho, enquanto a mulher era culpada de pecados da carne (ver 2Co 7.1). Seus pecados eram conhecidos, enquanto os de Simão encontravam-se ocultos de todos, exceto de Deus. Os dois estavam falidos e não tinham condição de pagar sua dívida com Deus. Simão estava tão espiritualmente falido quanto aquela mulher e não tinha consciência disso [18].

O fariseu não expressava amor por Jesus porque se sentia justo, mas a mulher derramada aos seus pés lhe demonstrava acendrado amor porque se sentia pecadora, carente da graça de Jesus. Jesus veio salvar os pecadores. O médico veio curar os enfermos. Só aqueles que reconhecem seus pecados e sentem tristeza por suas mazelas são perdoados por Jesus! [19].

3 – JESUS FAZ A APLICAÇÃO DA PARÁBOLA (Lc 7.44-50).

A mulher era culpada de pecados de comissão, mas Simão era culpado de pecados de omissão. Como anfitrião, não havia recebido Jesus com a devida cortesia (contrastar com Abraão em Gn 18.1-8). Aquela mulher atentou para tudo o que Simão havia negligenciado – e o fez com mais esmero! [20].

Jesus, então, aplica o princípio ilustrado na parábola para a mulher e Simão. Dirigindo-se a ela o Senhor contrastou seu amor óbvio para Ele com sua fria indiferença.

E, voltando-se para a mulher, disse a Simão: Vês tu esta mulher? Entrei em tua casa, e não me deste água para os pés; mas esta regou-me os pés com lágrimas, e os enxugou com os cabelos de sua cabeça.  Não me deste ósculo, mas esta, desde que entrou, não tem cessado de me beijar os pés. Não me ungiste a cabeça com óleo, mas esta ungiu-me os pés com unguento”.

Com isso em mente podemos destacar algumas lições importantes:

1º - Sua demonstração de amor por Jesus deu provas claras de sua vida transformada. Ela muito amou, porque ela foi muito perdoada. Em contraste, Simão havia insultado Jesus ao não oferecer a cortesia normal de fornecimento de água para os seus pés (cf. Gn 18.4; 19.2; 24.32; 43.24; Jz 19.21; Jo 13.4-5), ou cumprimentá-lo com o habitual beijo (cf. Gn 29.13; 45.15; Êx 4.27; 18.7; Rm 16.16). E enquanto ele não tinha ungido o Senhor com azeite barato, ela tinha ungido Seus pés com dispendioso perfume.

Foi um amor demonstrado e não um amor velado. Ela reconhecia o quanto havia sido perdoada e estava grata por isso, e ela não mediu esforços para demonstrar isso ao seu Salvador. Aos olhos de todos ali e, principalmente de Simão, o que ela estava fazendo demonstrava uma total falta de pudor, mas para o Senhor era uma grande demonstração de amor.

2º - Ela demonstrou um grande arrependimento (Lc 7.44-46). Enquanto Simão negou a Jesus todas as cortesias, esta mulher o demonstrou de forma clara e se desfazendo de um unguento que lhe era útil para a vida que levava. Ela se desfez daquele perfume como demonstração do seu arrependimento.

3º - Ela agiu assim por ter alcançado um grande perdão (Lc 7.47-49). O que a mulher já sabia em princípio agora é reafirmado. Em vista de sua vida pregressa de pecado, ela provavelmente sentia a necessidade dessa confirmação, de modo que aquilo que ela sentia que já ocorrera – daí seu transbordamento de amor – poderia ficar mais solidamente estabelecido em seu coração, a saber, que de uma vez para sempre e de uma forma plenária seus pecados estão então apagados. E tal perdão nunca fica sozinho. E sempre perdão e mais. Deus, em Cristo, abraça essa mulher penitente com seus braços de amor protetor, amor adotivo [21].

Quem é este, que até perdoa pecados? (Lc 7.49). Para alguns daqueles que faziam esta pergunta, o fato de Jesus perdoar pecados era possivelmente uma demonstração da sua natureza divina, e para outros era, sem dúvida, um obstáculo. Mas Jesus nunca permitiu que o perigo de ser mal interpretado o impedisse de demonstrar misericórdia ou de expressar o seu amor [22].

4º - Ela alcançou uma grande salvação (Lc 7.50). Jesus oferece à mulher a salvação mediante a fé e concede a ela a sua paz. Ela entrou cheia de culpa e saiu justificada pelo Filho de Deus. Ela é salva da prisão da culpa de seu passado pecaminoso. Seu passado foi apagado. Seu presente foi transformado. Seu futuro glorioso está garantido.

“Vá em paz”, disse Jesus, ao despedi-la. Aqui não pode significar menos que o que está implícito na palavra hebraica Shalom, prosperidade para a alma e o corpo. Essa paz é o sorriso de Deus refletido no coração do pecador redimido, um refúgio na tempestade, um esconderijo na Rocha eterna, um abrigo sob suas asas. É o arco-íris ao redor do trono de onde saem relâmpagos, trovões e vozes (Ap 4.3,5) [23].  

CONCLUSÃO

Aquele jantar na casa de Simão foi um “tapa na cara com luva de pelica” de Simão que se via justo demais até para honrar Jesus. No entanto, uma mulher com uma vida duvidosa honrou ao Senhor sem medir esforços e sem se importar com o que os outros pensariam dela. Tudo isso, porque ela reconhecia que era pecadora, mas que havia alcançado o perdão através de Jesus. Simão no entanto, não se via como pecador e não se deu conta de que também tinha uma dívida impagável com Deus.

A mulher perdoada saiu honrada por Jesus, enquanto Simão foi humilhado pelo Senhor pela sua cegueira espiritual e por não honrá-lo.

Que sejamos como esta mulher, reconhecendo os nossos pecados e honrando ao nosso Senhor com tudo que temos. Ela abriu mão do fruto do seu pecado para viver na dependência e nos cuidados de Deus. Isso é um grande exemplo para todos nós.

Pense nisso!   

Bibliografia

1 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 300.

2 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 219.

3 – Rienecker Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 118.

4 – Bailey, Kenneth. A Poesia e o Camponês – As Parábolas e Lucas, Ed. Vida Nova, São Paulo, SP, 1985, p. 40-41.

5 – Rienecker Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 118.

6 – Bailey, Kenneth. A Poesia e o Camponês – As Parábolas e Lucas, Ed. Vida Nova, São Paulo, SP, 1985, p. 41.

7 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 220.

8 – Bailey, Kenneth. A Poesia e o Camponês – As Parábolas e Lucas, Ed. Vida Nova, São Paulo, SP, 1985, p. 45.

9 – Ryle, J. C. Meditação no Evangelho de Lucas, Ed. Fiel, São José dos Campos, SP, 2002, p. 114.

10 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 256.

11 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, vol. 6, Lucas, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 400.

12 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 1, São Paulo, SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 545.

13 – Bailey, Kenneth. A Poesia e o Camponês – As Parábolas e Lucas, Ed. Vida Nova, São Paulo, SP, 1985, p. 46.

14 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 303.   

15 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 221.

16 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 256.

17 – Rienecker Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 119.

18 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 256.

19 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 222.

20 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 256.

21 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 1, São Paulo, SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 547.

22 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, vol. 6, Lucas, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 401.

23 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 1, São Paulo, SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 550.

domingo, 18 de abril de 2021

JESUS TESTIFICA DE JOÃO BATISTA

Por Pr. Silas Figueira

Texto base: Lucas 7.24--35

INTRODUÇÃO

Aquilo que pensamos a respeito de nós mesmos ou que os outros pensam de nós não é tão importante quanto aquilo que Deus pensa. Jesus esperou até que os mensageiros [de João] tivessem partido e, então, elogiou João publicamente por seu ministério, revelando, ao mesmo tempo, o coração pecaminoso daqueles que rejeitavam o ministério de João [1].

João Batista, com frequência, testemunhou de Jesus; agora, Jesus testemunha de João [2]. Como disse J. C. Ryle, Jesus pleiteou a causa de seu amigo ausente utilizando um linguagem forte e ardente. Ordenou seus ouvintes a tirarem de sua mente as dúvidas a respeito desse homem piedoso [3].

Quando lemos as Escrituras, nós encontramos o Senhor testemunhando de algumas pessoas: Gideão o Senhor o chamou de “homem valoroso” (Jz 6.12); Daniel foi chamado de “homem muito amado” (Dn 10.11); João Batista “o maior profeta” (Lc 7.28); Herodes Jesus o chamou de “raposa” (Lc 13.32). Por isso mais uma vez repito: “Aquilo que pensamos a respeito de nós mesmos ou que os outros pensam de nós não é tão importante quanto aquilo que Deus pensa. De que maneira Jesus definiria você?

Sobre esse testemunho de Jesus a respeito de João que eu quero pensar com você.

1 – JOÃO UM HOMEM APROVADO POR JESUS (Lc 7.24-30).

Podemos destacar cinco características de João que o texto nos mostra.

1º - João Batista não era um homem que se curvava diante das adversidades (Lc 7.24). A cana a que Jesus se referia era comum nas margens dos rios do Oriente Próximo, incluindo as do Jordão, onde João batizou. Eles eram leves e flexíveis, acenando para trás e para frente com cada brisa. “Um caniço agitado pelo vento” sugere uma pessoa instável, levada em seu julgamento pelos ventos da opinião pública ou da desdita pessoal [4].

João Batista não era um caniço agitado pelo vento, que se curva diante das adversidades. Era um homem incomum e inabalável. Ele preferiu ir para a prisão com a consciência livre a ficar livre com a consciência prisioneira. Ele preferiu a morte à conivência com o pecado do rei Herodes. O martírio é preferível à apostasia! [5]. João Batista não era um homem de disposição instável, de conduta fraca e covarde.

Sua prisão por reprovar o rei Herodes mostrou que ele não tinha medo dos homens; e quanto à sua constância, apesar de parecer um pouco abalada pela mensagem que ele enviou, não foi prejudicada por ela. Pois sua fé em Cristo não podia deixar de permanecer inviolável, pois havia sido fundada em uma revelação específica e na descida visível do Espírito Santo, acompanhada por uma voz do céu, declarando que ele era o Filho de Deus.

Como nos fala Paulo em sua carta ao Efésios: “Para que não sejamos mais meninos inconstantes, levados em roda por todo o vento de doutrina, pelo engano dos homens que com astúcia enganam fraudulosamente” (Ef 4.14).

João Batista não era um caniço balançado pelo jogo do vento, mas sim um cedro sacudido pela tempestade [6]. Se alguma vez houve um homem com convicções inabaláveis, foi João Batista.

2º - João Batista não se deixou seduzir pelo poder e nem pelo luxo (Lc 7.25). João Batista não era um homem dos palácios, mas do deserto. Ele não se importava com os trajes finos dos palacianos. Todos sabiam que João usava uma roupa extremamente rústica - uma veste de pelos de camelo e um cinto de couro (Mt 3.4). Tanto que   a expressão “vestes delicadas” (malakos em grego), só usado em outras duas passagens do Novo Testamento em Mt 11.8 e em 1Co 6.9, conota “suavidade” ou até mesmo “efeminação” e pode ser um termo irônico. Contrasta a roupa áspera que o profeta realmente vestia. A expressão que se refere aos que estão “nos palácios reais” é uma alfinetada maliciosa no homem que matinha João Batista na prisão [7].

João Batista também não era uma celebridade que desfrutava a amizade de gente importante e os prazeres da riqueza [8]. João teve muitas oportunidades para jogar com a multidão e ganhar a aprovação das autoridades. Ele era uma figura tão poderosa e dominante que muitas pessoas pensavam que ele próprio poderia ser o Messias (Lc 3.15), no entanto, ele nunca se utilizou dessa popularidade para se promover e ser aceito por todos.

Diferentemente de alguns pastores que gostam dos holofotes e adoram andar com pessoas influentes. Andam com políticos de má índole, gente que tem o nome sujo por escândalos e desvio de verbas públicas. Esses pastores fazem questão de saírem em fotos com esse tipo de gente só para dizer que também são influentes. Gente assim envergonha o nome de João Batista que preferiu a prisão e a morte a apoiar o pecado de Herodes.     

Como falou o Reverendo Hernandes Dias Lopes: “João Batista era um homem insubornável. Ele não viveu bajulando os poderosos, tecendo-lhes elogios a despeito de seus pecados. Ao contrário, confrontou-os com firmeza granítica e robustez hercúlea. Ele não vendeu sua consciência para alcançar o favor do rei. Não buscou as glórias deste mundo para angariar favores efémeros, mas cumpriu cabal e fielmente o seu ministério” [9].

3º - João Batista, profeta e precursor do Messias (Lc 26,27). O povo reuniu-se no deserto para ver um profeta, uma vez que todos concordavam que havia séculos que um profeta verdadeiro não aparecia. Não é de admirar tamanha agitação. Jesus confirma o julgamento da multidão e o ultrapassa – João não era apenas um profeta, era mais que um profeta. Em que sentido? Neste: não só ele era como outros profetas do Antigo Testamento, um porta-voz direto de Deus para chamar a nação ao arrependimento, mas ele mesmo também foi o sujeito da profecia – aquele que, de acordo com a Escritura, anunciaria o Dia do Senhor (Lc 7.27) [10].

João Batista não era apenas um profeta, mas sim um profeta cujo ministério havia sido profetizado (Is 40.3 e Ml 3.1)! João Batista foi o último profeta do Antigo Testamento e, como mensageiro de Deus, teve o privilégio de apresentar o Messias a Israel [11].

A vida e o ministério de João Batista é a prova do que está escrito em Isaías 55.10,11: “Porque, assim como desce a chuva e a neve dos céus, e para lá não tornam, mas regam a terra, e a fazem produzir, e brotar, e dar semente ao semeador, e pão ao que come, assim será a minha palavra, que sair da minha boca; ela não voltará para mim vazia, antes fará o que me apraz, e prosperará naquilo para que a enviei”.

4º - João Batista era uma pessoa ímpar no Reino de Deus (Lc 7.28). João Batista se destaca como primeiro entre todos os profetas por sua posição única no reino de Deus. Ele encerrou a antiga aliança e iniciou a nova. João merece ser chamado o maior entre todos os profetas, porque ele foi o enviado de quem falou Malaquias [12]. A partir de uma perspectiva terrena, o caráter e o chamado de João fez dele o maior homem nascido entre os homens. Em qualidades superiores como um ser humano, João era inigualável.

Mas fica uma pergunta: de que maneira o menor no reino de Deus é maior do que João? Em termos de posição, não de caráter nem de ministério. João foi arauto do Rei, anunciando o reino. Os cristãos de hoje são filhos do reino e amigos do Rei (Jo 15.15). O ministério de João constituiu um divisor de águas, tanto na história nacional de Israel quanto no plano redentor de Deus (Lc 16.16) [13].

Leon L. Morris diz que o menor no reino é maior, não por causa de quaisquer qualidades que venha a possuir, mas, sim, porque pertence ao tempo do cumprimento. Jesus não está subestimando a importância de João. Está colocando a membrezia do reino na sua perspectiva apropriada [14].

Essa declaração deve ser explicada à luz de Lc 10.23, 24: “Felizes sãos os olhos que veem o que vocês veem, pois eu lhes digo que muitos profetas e reis desejaram ver o que vocês estão vendo, mas não viram; e ouvir o que vocês estão ouvindo, mas não ouviram”. (NVI) O menor no reino era maior que João no sentido de ser mais altamente privilegiado, porque o João encarcerado não estava em contato tão estreito com Jesus como estava o menor dentre eles [15].

5º - João Batista pregou com ousadia a vinda do Reino de Deus (Lc 7.29,30, Mt 3.1,2). Muitos do povo em geral ouviram a mensagem de João, aceitaram-na e foram batizados por ele como prova de seu arrependimento. Assim, “reconheceram a justiça de Deus”, ou seja, concordaram com aquilo que Deus havia dito sobre eles (SI 51.4). Os líderes religiosos, porém, se justificaram a si mesmos (Lc 16.15) sem reconhecer a justiça de Deus e rejeitaram João e sua mensagem [16].

O que ocorreu no tempo de João Batista continua ocorrendo nos dias de hoje. O homem continua o mesmo, pois somos feitos do mesmo barro de Adão. Muitos por orgulho, por se verem independentes e autossuficientes rejeitam a Deus. Mas os humildes que olham para dentro de si e se veem dependentes de Deus, a estes o Senhor se revela. Como escreveu Paulo: “Mas Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias; e Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes; e Deus escolheu as coisas vis deste mundo, e as desprezíveis, e as que não são, para aniquilar as que são; para que nenhuma carne se glorie perante ele” (1Co 1.27-29).

2 – UMA DURA CRÍTICA AOS QUE REJEITAM OS MENSAGEIROS DE DEUS (Lc 7.31-35).

A parábola das crianças teimosas com certeza consideram de maneira especial os fariseus e escribas. Sua posição diante de João e Jesus assemelha-se à de crianças inconstantes ao brincar. Tocam a flauta, mas ninguém dança. Entoam um lamento fúnebre, porém ninguém golpeia o peito (Mt 11.17; Lc 7.32). Por meio dessa comparação Jesus afirma: seus contemporâneos são como as crianças mal-humoradas que criticam maldosamente tudo o que Deus realizou através de João e dele mesmo. No entanto, Deus enviou a essa geração João Batista e “o Filho do Homem”, como últimos emissários antes da catástrofe final. Por causa de seu modo de vida ascético, disseram de João Batista que ele teria um demônio. Jesus, que tinha uma conduta não-ascética, foi chamado glutão e beberrão, um amigo de coletores de impostos e pecadores (Lc 5.27-32; 15.1). A pregação de arrependimento de João não lhes servia, e a pregação do evangelho de Jesus tampouco lhes era simpática. Os contemporâneos daquela época eram tão inconstantes e travessos que reclamavam de tudo o que Deus fazia por eles [17].

Com isso em mente podemos destacar duas coisas:

1º - A infantilidade religiosa continua hoje. Muitas pessoas hoje estão agindo como os fariseus e escribas da Lei da época de Jesus; nunca estão satisfeitos com o agir de Deus em suas vidas e na História. Por mais que o Senhor faça e se revele, para tais pessoas nunca é o suficiente. Por isso Jesus comparou aquela geração com pessoas imaturas (crianças), que não se contentavam com coisa alguma. A infantilidade religiosa perdura até hoje. A sociedade se modernizou, mas o ser humano é o mesmo. E diante da pandemia que temos enfrentado nós temos visto isso de forma ainda mais clara.

Observe que quando as crianças brincam, elas frequentemente imitam o comportamento dos adultos. Aparentemente, as crianças nos dias de Jesus, muitas vezes brincavam de duas coisas que refletiam os acontecimentos mais significativos na vida social judaica: casamentos e funerais. Assim era João Batista e Jesus. João simbolizava o funeral, a antiga Lei e Jesus a festa de casamento, representando a graça.

João pregava uma mensagem severa de julgamento, e eles diziam: “Tem demônio!”. Jesus misturava-se com o povo e pregava uma mensagem de salvação repleta de graça, e eles diziam: “Eis aí um glutão e bebedor de vinho, amigo de publicanos e pecadores!”; ou seja, não queriam nem o funeral nem o casamento, pois nada lhes agradava [18].

Vivemos hoje dias tão difíceis que até para Jesus operar um milagre é algo complicado. Antigamente Jesus multiplicava pão e peixe, hoje vivemos uma geração (dentro da igreja e na sociedade), que, ou não comem uma coisa ou não comem a outra, ou nenhuma as duas coisas; mas reclamam porque não existem mais milagres hoje!

2º - Os sábios, porém, não se deixam desanimar. A sabedoria é justificada por todos os seus filhos. O verbo justificada quer dizer “declarada justa” ou “demonstrada como sendo justa” ou “aceita como justa”. Aqueles que são realmente sábios (os filhos da sabedoria), pronunciarão justo o caminho justo, seja ele ascético ou social. Verão a sabedoria de Deus tanto em João quanto em Jesus. Não andarão nos caminhos críticos dos homens que nunca se deixam contentar [19].

Quem quer evitar encarar a verdade sobre si mesmo sempre encontra algum defeito no pastor. Essa é uma forma de “justificar-se”. Mas a sabedoria de Deus não é frustrada por argumentos de “sábios e prudentes”. Antes, é demonstrada na vida transformada dos que creem. Somente assim a verdadeira sabedoria é “justificada” [20].

João e Jesus tinham cada um uma missão distinta a cumprir. Cada um tinha sua tarefa. Jesus, que pessoalmente era e é a “sabedoria de Deus” (1Co 1.30), levou a bom termo sua tarefa de forma perfeita; João a cumpriu em grande medida de forma excelente. Então, os filhos da sabedoria são todos os que foram suficientemente sábios a ponto de levar a sério e sinceramente a mensagem de João e a de Jesus [21].

CONCLUSÃO

O maior testemunho que uma pessoa pode ter não é a que vem do si mesmos e nem dos outros, mas de Deus. João Batista foi esse homem que recebeu de Jesus o maior dos elogios. Mas aí fica a pergunta: como o Senhor tem visto você? O que Ele pode falar a seu respeito? Você alguma vez já pensou a esse respeito?

Pense nisso!  

Bibliografia

1 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 255.

2 – Carson, D. A. O Comentário de Mateus, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2011, p. 313.

3 – Ryle, J. C. Meditação no Evangelho de Lucas, Ed. Fiel, São José dos Campos, SP, 2002, p. 109.

4 – Carson, D. A. O Comentário de Mateus, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2011, p. 313.

5 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 215.

6 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Mateus, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 125.

7 – Carson, D. A. O Comentário de Mateus, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2011, p. 313, 314.

8 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 255.

9 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 216.

10 – Carson, D. A. O Comentário de Mateus, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2011, p. 314.

11 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 255.

12 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Mateus, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 126.

13 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 255.

14 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 136.

15 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 1, São Paulo, SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 533.

16 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 255.

17 – Rienecker Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 116.

18 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 255.

19 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 138.

20 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 255.

21 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 1, São Paulo, SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 537.

domingo, 11 de abril de 2021

QUANDO DEUS NÃO ATENDE AS NOSSAS EXPECTATIVAS

Por Pr. Silas Figueira

Texto base: Lucas 7.18-23

INTRODUÇÃO

No momento em que Jesus começou a ministrar na Galileia, João Batista havia sido preso por Herodes por denunciar casamento adúltero do rei com a mulher do seu irmão (Mt 14.3-4). João já havia anunciado que Jesus era o Messias, se dirigiu a Ele como o Cordeiro de Deus (Jo 1.29), o batizou no rio Jordão, e declarou com humildade que “Convém que ele cresça e que eu diminua” (Jo 3.30). Ele já tinha reconhecido Jesus como o Cristo e confiara nele como seu próprio Senhor e Salvador (Jo 3.36). Mas agora João Batista está preso. O ministério de Jesus cresce, enquanto João Batista é esquecido na prisão. Os milagres de Jesus são notórios, enquanto o seu precursor vive na escuridão lôbrega do cárcere. As multidões fluem a Jesus e recebem seus milagres, enquanto João amarga o ostracismo de uma prisão imunda [1]. João parece estar perplexo diante do que tem ouvido a respeito de Jesus e então ele manda dois de seus discípulos perguntar-lhe: “És tu aquele que havia de vir, ou esperamos outro?”.

Esse é um daqueles textos que têm algumas interpretações.

Há os que defendem que João Batista teve um momento em seu ministério que duvidou de que Jesus era o Messias. João está preso já acerca de um ano na prisão de Maquerós, a leste do mar Morto, e aquele que ele apresentara como o Noivo e o Messias do Senhor, nada fazia para libertá-lo do cárcere. Nem uma visita havia lhe feito nesse período de encarceramento. Os defensores desse ponto-de-vista argumentam que João passou por uma grande crise pois João esperava que o Messias estivesse agindo com rigorosa justiça no seu ministério contra os gentios, e no entanto, ele havia curado o servo de um centurião romano. Por isso que a resposta que o Senhor manda dar a João era para renovar a sua fé.

Outros argumentam que a atitude de João fora pedagógica. João não alimentava dúvidas nem decepção alguma em relação a Jesus, não que João não pudesse cair em dúvidas, mas não era essa a questão aqui. Quem defende essa opinião diz que João sabia que seu ministério estava por terminar, então João envia dois de seus discípulos para lhes fortalecer a fé no Messias Jesus. Tanto que a resposta de Jesus aos discípulos de João são citações diretas do livro do profeta Isaías (Is 29.18; 35.5,6; 42.18; 26.19; 61.1).

O argumento que defendo é que João não duvidou que Jesus era o Messias prometido. Creio que tal pensamento não lhe ocorreu. Quando lemos os Evangelhos e principalmente o Evangelho de João 1.19-34 isso não nos deixa dúvida. Creio que o que estava por trás da pergunta de João era decepção e não dúvida. Creio que as suas expectativas em relação a Jesus foram frustradas na forma como o Senhor estava agindo. Mas ao mesmo tempo João foi pedagógico com seus discípulos, para não permitir que essa mesma decepção os atingisse também. Por isso João envia dois de seus discípulos a Jesus. A resposta de Jesus foi um renovo para João e um fortalecimento na fé dos seus discípulos. João sabia que seu ministério estava por terminar, mas ele não queria deixar os seus discípulos órfãos. Tanto que ele falou em João 3.30,36: “É necessário que ele cresça e que eu diminua. Aquele que crê no Filho tem a vida eterna; mas aquele que não crê no Filho não verá a vida, mas a ira de Deus sobre ele permanece”.   

Eu quero pensar com você a partir dessa perspectiva da decepção de João Batista e como podemos lidar quando essas decepções também nos atingem.

1 – JOÃO ERA HOMEM SEMELHANTE A NÓS (Lc 7.18,19).

João estava na prisão havia alguns meses (Lc 3.19,20), mas seus discípulos o mantinham informado do que Jesus estava fazendo. Deve ter sido difícil a um homem acostumado à vida no deserto ficar confinado à prisão. A pressão física e emocional certamente era enorme, e os longos dias de espera não facilitavam as coisas. Os líderes judeus não tomaram atitude alguma a fim de interceder por João, e, ao que parecia, nem mesmo Jesus se preocupava com ele. Se Cristo veio mesmo para libertar os cativos (Lc 4.18), João Batista era um candidato! [2].

João, embora figura única na história bíblica, não era um super-homem. Estava sujeito, como todos os seres humanos, à depressão e à decepção [3]. Não é incomum grandes líderes espirituais terem seus dias de dúvida e de incredulidade. Moisés quase desistiu certa ocasião (Nm 11.10-15), assim como também Elias (1 Rs 19) e Jeremias (Jr 20.7-9, 14-18); até Paulo sabia o que era sentir desespero (2Co 1.8,9) [4].

Com isso em mente, podemos destacar três coisas:

1º - Ninguém está livre de passar por crises de depressão e decepção em relação a Deus. Quando um crente mantêm-se fiel ao Senhor e procura servi-lo com empenho ao longo dos anos e, de repente, experimenta a tragédia em sua vida, talvez até mesmo uma série de tragédias, é difícil não se perguntar sobre o amor e a justiça de Deus.

No Salmo 73 nós encontramos Asafe passando por essa crise. Veja o que ele fala nos versos 13,14: “Na verdade que em vão tenho purificado o meu coração; e lavei as minhas mãos na inocência. Pois todo o dia tenho sido afligido, e castigado cada manhã”.

Asafe não era apenas um levita, mas era também profeta (2Cr 29.30), no entanto, ele passou por tamanha crise que deixou registrado nas Escrituras em forma de canção.

Quando lemos a carta aos Hebreus, vemos que o autor lembra aos seus leitores das lutas que eles passaram a enfrentar quando foram iluminados pelo Senhor:

“Lembrai-vos, porém, dos dias passados, em que, depois de serdes iluminados, suportastes grande combate de aflições. Em parte fostes feitos espetáculo com vitupérios e tribulações, e em parte fostes participantes com os que assim foram tratados. Porque também vos compadecestes das minhas prisões, e com alegria permitistes o roubo dos vossos bens, sabendo que em vós mesmos tendes nos céus uma possessão melhor e permanente” (Hb 10.32-34).

A questão não é passar por esse tipo de crise, a questão é enfrentá-la sem perder a esperança e a fé. Como disse Wiersbe: Há uma diferença entre dúvida e incredulidade. A dúvida diz respeito à mente: não conseguimos entender o que Deus está fazendo nem seus motivos para fazê-lo. A incredulidade diz respeito à vontade: nós nos recusamos a crer na Palavra de Deus e a obedecer ao que nos ordena” [5]. Nisso devemos vigiar.

2º - Passar por esses questionamentos não é pecado. A pergunta de João não era resultado de incredulidade, mas de dúvida alimentada por pressão física e emocional. Questionar o agir de Deus em relação a certas situações que enfrentamos não é pecado. Pecado é negar a fé por estar enfrentado alguma crise.

Jó passou por uma grande crise, no entanto ele não pecou (Jó 1,2). Leia o Salmo 88, nele nós encontramos um homem enfrentando uma grande crise por estar doente e abandonado pelos amigos. Mas este homem está orando: “SENHOR Deus da minha salvação, diante de ti tenho clamado de dia e de noite” (Sl 88.1). Ele não perdeu a fé, apesar da crise que está enfrentando.

Podemos passar por muitas crises e questionarmos a Deus o porquê delas. O que muitas vezes ocorre é que muitas pessoas blasfemam diante da crise. Negam o nome do Senhor. Falam as coisas mais absurdas a Seu respeito. Nisso devemos vigiar.

3º - O Senhor nos ajuda em nossas crises (Lc 7.21-23). O Senhor não deixou João sem uma resposta à sua pergunta. Talvez a resposta não seja a que João gostaria de ter recebido, mas nem por isso Jesus deixou de responde-lo.

Observe que na resposta de Jesus trouxe à tona as obras que estava realizando, obras essas claramente ligadas a ação do Messias no mundo, profetizadas no Antigo Testamento (Por exemplo, em Isaías 35.5-6). O que Jesus quis mostrar a João Batista é que a agenda de Deus estava sendo cumprida. Apesar de não estar sendo feita como João desejava ou esperava, Deus estava agindo conforme Sua vontade soberana. João deveria estar atento a isso!

A resposta de Jesus não tirou João da prisão física, mas com certeza, o libertou da prisão da decepção. Foi isso que ocorreu também com o apóstolo Paulo.

O apóstolo Paulo orou três vezes para ser liberto de um espinho na carne. No entanto, o apóstolo não teve da parte do Senhor o livramento que esperava, mas mesmo assim, ele teve a resposta que precisava ter. Veja o que ele nos fala a esse respeito:

“E, para que não me exaltasse pela excelência das revelações, foi-me dado um espinho na carne, a saber, um mensageiro de Satanás para me esbofetear, a fim de não me exaltar. Acerca do qual três vezes orei ao Senhor para que se desviasse de mim. E disse-me: A minha graça te basta, porque o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza. De boa vontade, pois, me gloriarei nas minhas fraquezas, para que em mim habite o poder de Cristo. Por isso sinto prazer nas fraquezas, nas injúrias, nas necessidades, nas perseguições, nas angústias por amor de Cristo. Porque quando estou fraco então sou forte” (2Co 12.7-10).

Diante da resposta do Senhor o apóstolo se conformou e se alegrou no Senhor, apesar da crise continuar. Creio que com João Batista não tenha sido diferente.  

2 – COMO CONCILIAR A GRAÇA E A MISERICÓRDIA DE JESUS COM O SOFRIMENTO (Lc 7.20-23).

Talvez os pensamentos e perguntas de João naquela solidão fossem os seguintes: Se realmente for verdade o que meus discípulos informam sobre ressurreições e maravilhosas curas de enfermos, isso é algo grandioso. Mas então, por que não brilha uma luz na minha cela escura? Se for verdade que o Mestre disse de si: “Vim para apregoar aos cativos a libertação” (Lc 4.18), se isso realmente for verdade, por que o Senhor não liberta o seu servo, que já está há tanto tempo apodrecendo na prisão? O servo espera, mas nada acontece. O Mestre nem mesmo lhe faz uma visita. Parece que Jesus nem se importa com o seu servo e arauto. Para um coração humano isso evidentemente é incompreensível. Aonde isso vai levar? A quem devo me dirigir na minha angústia? Assim o Batista preso talvez esteja cismando e lutando. Não consegue livrar-se das perguntas e dos anseios de seu coração. Um único pensamento o detém sem cessar: Que há com esse Jesus? Não devia ele tomar a pá e fazer uma limpeza, em especial diante da revoltante injustiça desse Herodes, a quem ele (João) havia dito a verdade de modo tão claro e insofismável? [6].

Jesus cura enfermos e ressuscita mortos, mas onde está Jesus que não vem ao encontro do seu profeta para libertá-lo? Esse é, também, o nosso drama. Como conciliar o poder de Jesus com as angústias que sofremos? Como conciliar o poder de Jesus com a inversão de valores da sociedade: Herodes no trono e João Batista na cadeia? Como conciliar o poder de Jesus numa época em que uma jovem fútil, uma mulher adúltera e um rei bêbado podem atentar contra a vida do maior homem, do maior profeta, sem nenhuma intervenção do céu? [7].

Creio que para essas perguntas temos três respostas.

1º - Muitos dos questionamentos que temos é porque criamos falsas expectativa em relação a Jesus. João não teve dúvidas de que Jesus era o Messias, mas ele provavelmente esperava que o Senhor agisse com mais rigor em seu ministério. De acordo com João, Jesus tinha vindo para peneirar a colheita. Ele recolheria os grãos e queimaria a palha com fogo que não se apagava (Lc 3.16,17). Em vez disso, Jesus estava percorrendo os montes da Galileia, pregando o evangelho e curando os enfermos. O machado tinha sido afiado e o fogo estava aceso (Mt 3.10), mas parece que Jesus não se interessara por eles.

Essa é a crise que muitas vezes enfrentamos também. Esperamos o agir de Deus segundo a nossa vontade e não segundo a vontade dele. Sabemos o que queremos e assim colocamos isso na boca de Deus. Deixamos nossos desejos governar nossas expectativas. Por isso ficamos frustrados.

Foi esse mesmo sentimento que enchia o coração dos discípulos no caminho de Emaús quando falavam a respeito das expectativas que tinham a respeito de Jesus, como lemos em Lucas 24.21: “E nós esperávamos que fosse ele o que remisse Israel; mas agora, sobre tudo isso, é já hoje o terceiro dia desde que essas coisas aconteceram”. Eles esperavam um reino terreno e imediato, mas não foi isso que o Senhor veio realizar. Expectativas erradas traz grandes tristezas ao coração. Mas isso ocorreu por desconhecimento das Escrituras (Lc 24.25-27).

2º - Muitas vezes nossas orações são respondidas segundo a nossa vontade e passamos a crer que será sempre assim. Às vezes os objetivos que determinamos de fato vêm a ser conforme o que Deus pretende fazer. Quando isso acontece, ficamos muito animados, tão entusiasmados que estabelecemos mais objetivos para Deus. Porém, cedo ou tarde – e com muita probabilidade acontecerá mais cedo que mais tarde – o que Deus realiza é tão contrário às nossas expectativas que mal sabemos o que pensar.

- Oramos por cura, e o doente morre.

- O emprego que parece tão perfeito para nós vai para outra pessoa.

- A pessoa que seria a companhia ideal para toda a vida não corresponde aos nossos sentimentos.

Diante disso, ficamos profundamente transtornados não apenas porque Deus não fez o que queríamos que ele fizesse, nem sequer porque não fez o que esperávamos que fizesse. Ficamos assombrados por Deus não ter feito o que sabemos em nosso íntimo que ele devia ter feito [8]. Aí entramos em crise!

3º - Ficamos decepcionados com Jesus porque não vemos o que ele está realmente fazendo (Lc 7.21,22). Observe que a resposta de Jesus aos discípulos de João não consistiu somente em palavras, mas em ação. Ele mostrou várias coisas que Ele estava realizando. Mostrando para os discípulos de João e respondendo ao próprio João que a Palavra de Deus estava se cumprindo, ainda que ele João, não estivesse vendo.

Três verdades devem ser aqui destacadas na resposta de Jesus a João Batista [9]:

1 – Jesus dá provas de que ele é o Messias (7.21). Esses sinais seriam operados pelo Messias que havia de vir (Is 29.18,19; 35.4-6; 42.1-7). Não era, portanto, necessário esperar outro Messias, pois o Jesus histórico é o Messias de Deus!

2 – Jesus prega aos ouvidos e aos olhos (7.22). Jesus fala e faz, prega e demonstra, revela conhecimento e também poder. Jesus prega aos ouvidos e aos olhos. A mensagem de Jesus a João tem três ênfases, como vemos a seguir.

Primeiro, a mensagem de Jesus mostra que o reino de Deus abre as portas para que os rejeitados sejam aceitos. Ninguém era mais discriminado na sociedade do que os cegos, os coxos, os leprosos e os surdos. Eles não tinham valor. Eram feridas cancerosas da sociedade. Eram excesso de bagagem à beira da estrada. Mas a estes que a sociedade chamava de escória, Jesus valorizou, restaurou, reciclou, curou, levantou e devolveu a dignidade da vida. Jesus manda dizer a João que o reino que ele está implantando não tem os mesmos valores dos reinos deste mundo.

Segundo, a mensagem de Jesus mostra que no reino de Deus a sepultura não tem força e a morte não tem a última palavra. O problema do homem não é o tipo de morte que enfrenta agora, mas o tipo de ressurreição que terá no futuro. Se Jesus é o nosso Senhor, então a morte não tem mais poder sobre nós. Seu aguilhão foi arrancado. A morte foi vencida.

Terceiro, a mensagem de Jesus mostra que no reino de Deus há uma oferta gratuita de vida eterna. O reino de Deus é para o pobre, que se considera falido espiritualmente, não importa qual seja sua condição social. Enquanto João está pedindo a solução do temporário, Jesus está cuidando do eterno.  

Muitas vezes só achamos que o Senhor está realizando grandes coisas, quando essas “grandes coisas” acontecem conosco. Sabe porque isso acontece? É que partimos de um pressuposto errado. Jesus veio por nós, mas isso não significa que Ele veio para nos agradar. Jesus não veio para fazer os nossos caprichos. Embora essa tem sido a mensagem pregada em muitos púlpitos por aí.

Jesus veio por nossa causa, mas Ele não responde a nós. Jesus veio por nós, mas Ele não se sujeita aos nossos planos, por melhor que eles sejam. Pelo contrário, Jesus exige que nos sujeitemos aos planos dele.

Eu sou barro e Ele o oleiro. O problema é que o barro quer debater com o Oleiro o que Ele está fazendo.

Veja o que a Bíblia nos fala a respeito disso:

“Mas, ó homem, quem és tu, que a Deus replicas? Porventura a coisa formada dirá ao que a formou: Por que me fizeste assim? Ou não tem o oleiro poder sobre o barro, para da mesma massa fazer um vaso para honra e outro para desonra?” (Rm 9.20,21).

“A palavra do SENHOR, que veio a Jeremias, dizendo: Levanta-te, e desce à casa do oleiro, e lá te farei ouvir as minhas palavras. E desci à casa do oleiro, e eis que ele estava fazendo a sua obra sobre as rodas, Como o vaso, que ele fazia de barro, quebrou-se na mão do oleiro, tornou a fazer dele outro vaso, conforme o que pareceu bem aos olhos do oleiro fazer. Então veio a mim a palavra do Senhor, dizendo: Não poderei eu fazer de vós como fez este oleiro, ó casa de Israel? diz o Senhor. Eis que, como o barro na mão do oleiro, assim sois vós na minha mão, ó casa de Israel” (Jr 18.1-6).

Lembrem-se: somos barro e o Oleiro Jesus sabe o que faz!

3 – O SENHOR RECRIMINA JOÃO POR SUA DÚVIDA E DECEPÇÃO (Lc 7.23).

Jesus mostra aqui que João estava caindo em uma armadilha. O termo σκανδαλίζω (escândalo) é a isca numa armadilha ou laço. É o espeque que arma a armadilha; daí, laço, tentação para o pecado, sedução (Mt 18.7; Lc 17.1); também, objeto de repulsa, o escândalo da cruz (1Co 1.23; Gl 5.11). Semelhantemente, o verbo basicamente significa cair no laço, induzir ao pecado, desviar-se (Mt 5.29; 18.6; etc.). No passivo, pode significar ser repelido por (Mt 11.6; Me 6.3; e aqui em Lc 7.23) [10].

O verbo escandalizar se referia originalmente ao graveto usado como pinguela em armadilhas. Por causa de sua preocupação com aquilo que Jesus não estava fazendo, João corria o risco de cair numa armadilha. Estava tropeçando sobre seu Senhor e o ministério dele. Jesus lhe disse gentilmente para ter fé, pois seu Senhor sabia o que estava fazendo.

Hoje em dia, muita gente critica a Igreja por não “mudar o mundo” e resolver os problemas econômicos, políticos e sociais. No entanto, os críticos esquecem que Deus muda seu mundo ao transformar indivíduos. A história mostra que muitas das grandes iniciativas humanitárias partiram da Igreja, mas sua tarefa principal é outra: levar os pecadores ao Salvador. Todo o resto é resultado desse objetivo central. Proclamar o evangelho deve ser sempre a maior prioridade da Igreja [11].

CONCLUSÃO

Assim como João Batista, muitas vezes nós ficamos frustrados com o agir de Deus. Ficamos assim porque esperamos que Ele aja de acordo com a nossa vontade, segundo a nossa interpretação das coisas. Tudo isso ocorre porque olhamos para o efêmero e não para a eternidade. Muitas vezes somos tão egoístas que queremos o agir de Deus em nossas vidas e não nos importamos com os outros. Achamos que por sermos servos do Senhor, Ele irá agir sempre a nosso favor segundo a nossa vontade.

Mas não isso não será sempre assim. Jesus deixou claro aos seus discípulos quando disse: “Se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro do que a vós, me odiou a mim. Se vós fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu, mas porque não sois do mundo, antes eu vos escolhi do mundo, por isso é que o mundo vos odeia. Lembrai-vos da palavra que vos disse: Não é o servo maior do que o seu senhor. Se a mim me perseguiram, também vos perseguirão a vós; se guardaram a minha palavra, também guardarão a vossa” (Jo 15.18-20).

O que podemos esperar então neste mundo? Quantos irmãos nossos estão sofrendo perseguições, torturas e mortes. Isso ocorreu no início da Igreja, isso ocorreu durante a história e isso tem ocorrido hoje. Então viva a para Cristo firmado em Suas promessas, mas não se iluda que a vida cristã é uma colônia de férias. Nem todos sofrerão torturas e mortes, mas todo aquele que quiser viver piedosamente em Cristo Jesus sofrerá perseguição. Lembre-se disso. E que Deus o abençoe!

Pense nisso!

Bibliografia:

1 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 210.

2 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 254. 

3 –Tasker, R. V. G. Mateus, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, 1985, p. 90,91.

4 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 254.

5 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 254.

6 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Mateus, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 123.

7 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 212.

8 – Koessler, John. A Surpreendente Graça nas Decepções, Ed. Vida Nova, São Paulo, SP, 2019, p. 56.

9 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 214, 215.

10 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 1, São Paulo, SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 540.

11 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 254, 255.