Por Pr. Silas Figueira
Texto base: Lucas 6.31-36
INTRODUÇÃO
Jesus em Lucas 6.27-30
nos mostrou que devemos amar os nossos inimigos. Isso é algo que a nossa
natureza caída não aceita e reluta em praticar. No entanto, nós, como pessoas
regeneradas devemos agir não como o mundo age, mas devemos agir como nosso Pai
celestial age em relação ao mundo (Lc 6.36). Nos versículos 31-36 Jesus nos
mostra porque devemos agir de forma contrária ao que o mundo ensina e pratica,
Ele mostra que o amor cristão transcende a lógica do mundo. Que esse amor nos
faz agir na dimensão do amor de Deus e que as nossas ações revelam que somos
filhos de Deus.
Quais as lições que
podemos tirar desse texto?
1
– A REGRA ÁUREA DA ÉTICA CRISTÃ É POSITIVA EM SUA AÇÃO (Lc 6.31).
Jesus resume os princípios
e práticas precedentes na conhecida Regra de Ouro ou Regra Áurea com as
seguintes palavras: “E como vós quereis
que os homens vos façam, da mesma maneira lhes fazei vós, também” (Lc
6.31). Este mesmo ensinamento nós encontramos em Mateus 7.12: “Portanto, tudo o que vós quereis que os
homens vos façam, fazei-lho também vós, porque
esta é a lei e os profetas”. Em Mateus é registrado que esta é a lei e os profetas, ou seja, a Lei e os
Profetas se resumem nessa prática. Jesus mostra com isso que Ele não estava
trazendo algo novo, mas mostrando o que a Lei e os profetas já ensinavam.
Com isso em mente
podemos destacar três coisas:
1º - O cristão não é
guiado pelo padrão do mundo. O padrão moral do mundo é: “Faça aos outros o que eles lhe fazem”. Sansão,
um dos mais celebrados juízes de Israel viveu segundo esse padrão [1]. Em
Juízes lemos:
“Então
três mil homens de Judá desceram até a fenda da rocha de Etã, e disseram a
Sansão: Não sabias tu que os filisteus dominam sobre nós? Por que, pois, nos fizeste
isto? E ele lhes disse: Assim como eles
me fizeram a mim, eu lhes fiz a eles” (Jz 15.11).
Os seguidores de Jesus
não podem aplicar esse padrão em suas vidas. Se formos guiados pelo padrão do
mundo, só iremos demonstrar que não passamos de pessoas religiosas vivendo um
falso evangelho. Aplicaremos em nossas vidas o “toma lá dá cá”, ou como dizia a
Lei: “Olho por olho e dente por dente”.
2º - O mundo tem suas
versões desse ensinamento. Versões desta chamada
Regra de Ouro, existia nos escritos rabínicos, na filosofia grega, no hinduísmo
e até no budismo. Essas formulações, no entanto, lançam a regra em um sentido negativo; eles não defendem que
devemos fazer aos outros aquilo que você não gostaria que fizessem a você. O
filósofo grego Isócrates escreveu: “Não faça aos outros o que o irrita quando
eles fazem isso para você”. Confúcio
aconselhou: “Nunca impor aos outros o que
você não iria escolher para si mesmo”. O livro apócrifo de Tobias ordena: “Não faças aos outros o que não queres que
eles te façam a ti” (Tb 4.15). O famoso rabino Hillel resumindo a Torá
disse: “Não faças ao teu companheiro
aquilo que para ti é odioso: nisto se resume toda a Lei; o resto é um seu
comentário”.
3º -
A
Regra Áurea de Jesus é positiva no agir (Lc 6.31). Não é suficiente
para Cristo que seus seguidores se refreiem de atos que não gostariam que
fossem praticados contra eles. Eles devem também ser ativos na prática do bem
[2]. A ordem positiva de para amar, em vez de simplesmente se abster de fazer o
mal faz com que os cristãos se examinem profundamente e procurem meios de fazer
isso. Esse exame altera mais que o comportamento; altera o próprio caráter [3].
O cristianismo não é
apenas uma coletânea de proibições negativas, mas, sobretudo, um reservatório
de princípios positivos a serem seguidos. Não basta aos filhos do reino não
fazerem o mal a seu próximo; eles são instados a fazer o bem. Não é suficiente
deixarem de odiar seus inimigos; eles precisam amá-los, servi-los e orar por
eles. O ensino de Jesus é claro: “E como
vós quereis que os homens vos façam, da mesma maneira lhes fazei vós, também”
(Lc 6.31) [4]. Não é não fazer o mal, é praticar o bem.
2
–
A REGRA ÁUREA DA ÉTICA CRISTÃ É MEDIDA
POR UM PADRÃO SUPERIOR (Lc 6.32-34).
Jesus passa a ressaltar
que os seus discípulos têm a necessidade de possuírem um padrão de conduta para
com seu próximo mais elevado do que o dos filhos do mundo. Observe que os
cristãos não têm de amar apenas quem os ama (32); e não têm de fazer o bem só
para quem lhes faz o bem (33); não têm de emprestar só para quem lhe pagar de
volta (34). Esse padrão que o Senhor espera de cada um de nós revela que somos
filhos do Altíssimo.
1º - Jesus disse que quem
pratica somente a lei da reciprocidade são os “pecadores”.
Nesse parágrafo, formado por apenas três versículos, a palavra pecadores é
usada três vezes, uma vez em cada versículo. O que Jesus está dizendo é que os
ouvintes que só amam a quem lhes faz bem, e que fazem exclusivamente
empréstimos “seguros” (daqueles que têm certeza de que serão reembolsados, e provavelmente
com juros), não são melhores que os próprios pecadores a quem estavam sempre
olhando com desdém, porque mesmo os que estão no fundo da escala social
e religiosa amam os seus, fazem o bem a eles e lhes emprestam, com a esperança
segura de que, num futuro não distante, eles, os doadores, os que emprestaram,
serão os recebedores [5].
A natureza caída do
homem faz isso muito bem. Não é nenhuma novidade entre eles esse pensamento. Os
pecadores, geralmente, são recíprocos entre si no que se diz a praticar o bem.
2º - O cristão não pode
ser guiado pela lei da reciprocidade. Os cristãos devem ser
melhores do que os pecadores. Até mesmo homens que não reconhecem qualquer
lealdade a Deus praticam algumas virtudes. Amam aos que os amam. Retribuem o
bem que é feito a eles. Emprestam àqueles que precisam de dinheiro se podem ter
certeza de recebê-lo de volta, ou talvez confiam em receber empréstimos por sua
vez quando eles mesmos tiverem necessidade (o verbo para emprestar, aliás,
provavelmente quer dizer “emprestar com juros”) – Se os cristãos fizerem estas
coisas, não estão fazendo mais do que o mundo faz. É fácil para o cristão
congratular-se por alguma virtude que imagina que detecta em si mesmo. Mas
antes de poder alegar que está obedecendo ao mandamento de Cristo, deve
perguntar se está fazendo alguma coisa a mais do que os pecadores fazem em
circunstâncias semelhantes [6].
3º - Usar a régua do
próximo para medir nossa ética é insuficiente para os filhos do reino.
Precisamos nos comparar não com nossos vizinhos, mas com o Pai celestial, que é
benigno até para com os ingratos e maus [7]. A moralidade convencional faz o
bem de acordo com a probabilidade de receber de volta algum bem proporcional;
Jesus ordena aos discípulos focarem exclusivamente o ato bom, independentemente
do retorno proporcional [8]. A régua do mundo não é a régua que nos mede.
Apenas a amar como os
pecadores fazem não há testemunho do evangelho; esse tipo de amor não vai
convencer ninguém de que a pessoa pertence o reino de Deus. Ele não dá nenhuma
evidência de uma vida transformada regenerada. Mas o amor sobrenatural de Deus
demonstrado na vida dos crentes é uma poderosa apologética para a verdade do
evangelho [9].
Nós cristãos devemos
viver uma contracultura e não sermos guiados pela natureza caída. Os princípios
estabelecidos por Jesus no Evangelho deve ser a nossa prioridade de vida.
3
– A REGRA ÁUREA DA ÉTICA CRISTÃ É MEDIDA POR UMA MOTIVAÇÃO SANTA (Lc 6.35,36).
O fator motivacional
para agirmos assim é o próprio Deus que em nós habita. Isso não é uma motivação
natural. É algo transcendente. Não parte da natureza caída do homem, mas parte
de Deus que nos dá forças para praticar esse amor. Será o nome no Senhor que
será glorificado ao agirmos assim. Como lemos em Mateus 5.16: “Assim resplandeça a vossa luz diante dos
homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está
nos céus”.
Qual é a razão para
esta conduta cristã? A razão é que nos faz ser parecidos com Deus, dado que
essa é a forma em que Ele atua. Deus envia sua chuva sobre justos e injustos. É
amável com o homem que lhe dá gozo e com aquele que entristece seu coração. O
amor de Deus abraça tanto o santo como o pecador. Esse amor é o que devemos
copiar; se também nós procurarmos só o bem de nossos inimigos, seremos em
realidade filhos de Deus.
O
amor exigido por Jesus é absolutamente desinteressado.
É o amor ágape, o amor que não espera nada em troca. Um exemplo especial desse
desprendimento é o empréstimo do qual não se recebe a restituição nem dos juros
nem do capital (Mt 5.41). Equivocadamente, intérpretes antigos viam aqui uma
proibição de cobrar juros (cf. Êx 22.25). O amor natural busca uma retribuição
adequada, o que no fundo não passa de egoísmo.
4
– A REGRA ÁUREA DA ÉTICA CRISTÃ NOS OFERECE UMA GRANDE RECOMPENSA (Lc 6.35,36).
Jesus ordenou aos seus
discípulos para amar seus inimigos, não apenas aqueles que os amam, fazer o bem
a todos, não só aqueles que fazem o bem para eles, e emprestar, sem esperar
nada em troca. Tal amor não é natural, nem normal pelos padrões humanos.
Aos que obedecem a este
mandamento Jesus oferece uma grande recompensa:
1º - “E será grande o vosso galardão”. Naturalmente que a
referência de Jesus é ao galardão da graça, não a algum pagamento ganho por
méritos humanos. O galardão está em proporção ao sacrifício, porém é sempre
muito maior que ele (Rm 8.18; 2Co 4.17, 18).
“Porque
para mim tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para
comparar com a glória que em nós há de ser revelada”
(Rm 8.18)
“Porque
a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós um peso eterno de glória
mui excelente; Não atentando nós nas coisas que se veem, mas nas que se não
veem; porque as que se veem são temporais, e as que se não veem são eternas”
(2Co 4.17,18)
Nesta presente vida,
ele está formado por coisas como a satisfação interior de haver podido ajudar
outros, ou alegrar-se com sua alegria (Rm 12.15); a paz de Deus e o “Deus da
paz” no coração (Fp 4.7, 9). Depois desta vida, ele é a soma total de todas as
bênçãos da salvação ao longo de toda a eternidade (Mt 16.27; 25.46). Mesmo
agora os filhos de Deus recebem uma alegria antecipada. Em particular, há o
reconhecimento público feito por Jesus pessoalmente em sua gloriosa vinda (Mt
25.34s.) [10].
2º - E sereis filhos do
Altíssimo. Em todo mundo da Antiguidade os filhos
– sobretudo os primogênitos – eram, conforme concordância unânime, os
principais herdeiros e tinham posição privilegiada. A ética do ágape conduz os
cristãos à comunhão com Deus como filhos, e os filhos participam da natureza de
seu Pai (2Pe 1.3) [11].
3º - Seremos
misericordiosos como o Pai é misericordioso.
Ser misericordioso significa ser compassivo, isto é, cheio daquele tipo de
comiseração que se expressa em palavras e atos. É a preocupação que o Pai
revelou quando enviou – deu, não poupou – seu Filho unigênito para nos salvar
(Jo 3.16; Rm 5.8; 8.32).
Deus é benigno até para
com os ingratos e maus. É misericordioso. Suas boas dádivas, tais como o sol e
a chuva, a sementeira e a colheita, são enviadas a todos os homens, ao santo e
ao pecador sem distinção. E “tal Pai, tal
filho”. As qualidades que são vistas no Pai são as qualidades que os filhos
devem adotar como alvo deles [12].
CONCLUSÃO
A Regra Áurea da ética
cristã não é natural. Faz parte da vida dos filhos de Deus, dos que
compartilham da Sua natureza. Agimos segundo os princípios da Evangelho e não
segundo o padrão do mundo caído.
O cristianismo como
religião não altera nada no mundo. O cristianismo como estilo de vida do salvo
por Cristo transforma o mundo. É uma contracultura. É algo que o mundo não
espera, mas nós, os salvos por Cristo praticamos porque o Espírito Santo habita
em nós.
Este é o Evangelho de
Cristo. Esta é maneira que devemos viver em palavras e em ações. O homem
natural não alcança tal padrão moral, mas nós devemos busca-lo e vivê-lo pois
somos filhos do Altíssimo.
Pense nisso!
Bibliografia
1 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed.
Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 270.
2 – Morris, L. Leon. Lucas, Introdução e Comentário,
Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 124.
3 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed.
Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 270.
4 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem
perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 188.
5 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 1, São Paulo,
SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 476.
6 – Morris, L. Leon. Lucas, Introdução e Comentário,
Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 124.
7 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem
perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 189.
8 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed.
Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 271.
9 – MacArthur, John. Comentário do Novo Testamento – Lucas, p.
2372.
10 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 1, São Paulo,
SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 477.
11 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed.
Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 272.
12 – Morris, L. Leon. Lucas, Introdução e
Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 125.