domingo, 28 de fevereiro de 2021

A REGRA ÁUREA DA ÉTICA CRISTÃ - Lucas 6.31-36

Por Pr. Silas Figueira

Texto base: Lucas 6.31-36

INTRODUÇÃO

Jesus em Lucas 6.27-30 nos mostrou que devemos amar os nossos inimigos. Isso é algo que a nossa natureza caída não aceita e reluta em praticar. No entanto, nós, como pessoas regeneradas devemos agir não como o mundo age, mas devemos agir como nosso Pai celestial age em relação ao mundo (Lc 6.36). Nos versículos 31-36 Jesus nos mostra porque devemos agir de forma contrária ao que o mundo ensina e pratica, Ele mostra que o amor cristão transcende a lógica do mundo. Que esse amor nos faz agir na dimensão do amor de Deus e que as nossas ações revelam que somos filhos de Deus.

Quais as lições que podemos tirar desse texto?

1 – A REGRA ÁUREA DA ÉTICA CRISTÃ É POSITIVA EM SUA AÇÃO (Lc 6.31).

Jesus resume os princípios e práticas precedentes na conhecida Regra de Ouro ou Regra Áurea com as seguintes palavras: “E como vós quereis que os homens vos façam, da mesma maneira lhes fazei vós, também” (Lc 6.31). Este mesmo ensinamento nós encontramos em Mateus 7.12: “Portanto, tudo o que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós, porque esta é a lei e os profetas. Em Mateus é registrado que esta é a lei e os profetas, ou seja, a Lei e os Profetas se resumem nessa prática. Jesus mostra com isso que Ele não estava trazendo algo novo, mas mostrando o que a Lei e os profetas já ensinavam.

Com isso em mente podemos destacar três coisas:

1º - O cristão não é guiado pelo padrão do mundo. O padrão moral do mundo é: “Faça aos outros o que eles lhe fazem”. Sansão, um dos mais celebrados juízes de Israel viveu segundo esse padrão [1]. Em Juízes lemos:

“Então três mil homens de Judá desceram até a fenda da rocha de Etã, e disseram a Sansão: Não sabias tu que os filisteus dominam sobre nós? Por que, pois, nos fizeste isto? E ele lhes disse: Assim como eles me fizeram a mim, eu lhes fiz a eles(Jz 15.11).

Os seguidores de Jesus não podem aplicar esse padrão em suas vidas. Se formos guiados pelo padrão do mundo, só iremos demonstrar que não passamos de pessoas religiosas vivendo um falso evangelho. Aplicaremos em nossas vidas o “toma lá dá cá”, ou como dizia a Lei: “Olho por olho e dente por dente”.    

2º - O mundo tem suas versões desse ensinamento. Versões desta chamada Regra de Ouro, existia nos escritos rabínicos, na filosofia grega, no hinduísmo e até no budismo. Essas formulações, no entanto, lançam a regra em um sentido negativo; eles não defendem que devemos fazer aos outros aquilo que você não gostaria que fizessem a você. O filósofo grego Isócrates escreveu: “Não faça aos outros o que o irrita quando eles fazem isso para você”. Confúcio aconselhou: “Nunca impor aos outros o que você não iria escolher para si mesmo”. O livro apócrifo de Tobias ordena: “Não faças aos outros o que não queres que eles te façam a ti” (Tb 4.15). O famoso rabino Hillel resumindo a Torá disse: “Não faças ao teu companheiro aquilo que para ti é odioso: nisto se resume toda a Lei; o resto é um seu comentário”.

3º - A Regra Áurea de Jesus é positiva no agir (Lc 6.31). Não é suficiente para Cristo que seus seguidores se refreiem de atos que não gostariam que fossem praticados contra eles. Eles devem também ser ativos na prática do bem [2]. A ordem positiva de para amar, em vez de simplesmente se abster de fazer o mal faz com que os cristãos se examinem profundamente e procurem meios de fazer isso. Esse exame altera mais que o comportamento; altera o próprio caráter [3].

O cristianismo não é apenas uma coletânea de proibições negativas, mas, sobretudo, um reservatório de princípios positivos a serem seguidos. Não basta aos filhos do reino não fazerem o mal a seu próximo; eles são instados a fazer o bem. Não é suficiente deixarem de odiar seus inimigos; eles precisam amá-los, servi-los e orar por eles. O ensino de Jesus é claro: “E como vós quereis que os homens vos façam, da mesma maneira lhes fazei vós, também” (Lc 6.31) [4]. Não é não fazer o mal, é praticar o bem.

2 – A REGRA ÁUREA DA ÉTICA CRISTÃ É MEDIDA POR UM PADRÃO SUPERIOR (Lc 6.32-34).

Jesus passa a ressaltar que os seus discípulos têm a necessidade de possuírem um padrão de conduta para com seu próximo mais elevado do que o dos filhos do mundo. Observe que os cristãos não têm de amar apenas quem os ama (32); e não têm de fazer o bem só para quem lhes faz o bem (33); não têm de emprestar só para quem lhe pagar de volta (34). Esse padrão que o Senhor espera de cada um de nós revela que somos filhos do Altíssimo.

1º - Jesus disse que quem pratica somente a lei da reciprocidade são os “pecadores”. Nesse parágrafo, formado por apenas três versículos, a palavra pecadores é usada três vezes, uma vez em cada versículo. O que Jesus está dizendo é que os ouvintes que só amam a quem lhes faz bem, e que fazem exclusivamente empréstimos “seguros” (daqueles que têm certeza de que serão reembolsados, e provavelmente com juros), não são melhores que os próprios pecadores a quem estavam sempre olhando com desdém, porque mesmo os que estão no fundo da escala social e religiosa amam os seus, fazem o bem a eles e lhes emprestam, com a esperança segura de que, num futuro não distante, eles, os doadores, os que emprestaram, serão os recebedores [5].

A natureza caída do homem faz isso muito bem. Não é nenhuma novidade entre eles esse pensamento. Os pecadores, geralmente, são recíprocos entre si no que se diz a praticar o bem.

2º - O cristão não pode ser guiado pela lei da reciprocidade. Os cristãos devem ser melhores do que os pecadores. Até mesmo homens que não reconhecem qualquer lealdade a Deus praticam algumas virtudes. Amam aos que os amam. Retribuem o bem que é feito a eles. Emprestam àqueles que precisam de dinheiro se podem ter certeza de recebê-lo de volta, ou talvez confiam em receber empréstimos por sua vez quando eles mesmos tiverem necessidade (o verbo para emprestar, aliás, provavelmente quer dizer “emprestar com juros”) – Se os cristãos fizerem estas coisas, não estão fazendo mais do que o mundo faz. É fácil para o cristão congratular-se por alguma virtude que imagina que detecta em si mesmo. Mas antes de poder alegar que está obedecendo ao mandamento de Cristo, deve perguntar se está fazendo alguma coisa a mais do que os pecadores fazem em circunstâncias semelhantes [6].

3º - Usar a régua do próximo para medir nossa ética é insuficiente para os filhos do reino. Precisamos nos comparar não com nossos vizinhos, mas com o Pai celestial, que é benigno até para com os ingratos e maus [7]. A moralidade convencional faz o bem de acordo com a probabilidade de receber de volta algum bem proporcional; Jesus ordena aos discípulos focarem exclusivamente o ato bom, independentemente do retorno proporcional [8]. A régua do mundo não é a régua que nos mede.

Apenas a amar como os pecadores fazem não há testemunho do evangelho; esse tipo de amor não vai convencer ninguém de que a pessoa pertence o reino de Deus. Ele não dá nenhuma evidência de uma vida transformada regenerada. Mas o amor sobrenatural de Deus demonstrado na vida dos crentes é uma poderosa apologética para a verdade do evangelho [9].

Nós cristãos devemos viver uma contracultura e não sermos guiados pela natureza caída. Os princípios estabelecidos por Jesus no Evangelho deve ser a nossa prioridade de vida. 

3 – A REGRA ÁUREA DA ÉTICA CRISTÃ É MEDIDA POR UMA MOTIVAÇÃO SANTA (Lc 6.35,36).

O fator motivacional para agirmos assim é o próprio Deus que em nós habita. Isso não é uma motivação natural. É algo transcendente. Não parte da natureza caída do homem, mas parte de Deus que nos dá forças para praticar esse amor. Será o nome no Senhor que será glorificado ao agirmos assim. Como lemos em Mateus 5.16: “Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus”.

Qual é a razão para esta conduta cristã? A razão é que nos faz ser parecidos com Deus, dado que essa é a forma em que Ele atua. Deus envia sua chuva sobre justos e injustos. É amável com o homem que lhe dá gozo e com aquele que entristece seu coração. O amor de Deus abraça tanto o santo como o pecador. Esse amor é o que devemos copiar; se também nós procurarmos só o bem de nossos inimigos, seremos em realidade filhos de Deus.  

O amor exigido por Jesus é absolutamente desinteressado. É o amor ágape, o amor que não espera nada em troca. Um exemplo especial desse desprendimento é o empréstimo do qual não se recebe a restituição nem dos juros nem do capital (Mt 5.41). Equivocadamente, intérpretes antigos viam aqui uma proibição de cobrar juros (cf. Êx 22.25). O amor natural busca uma retribuição adequada, o que no fundo não passa de egoísmo.

4 – A REGRA ÁUREA DA ÉTICA CRISTÃ NOS OFERECE UMA GRANDE RECOMPENSA (Lc 6.35,36).

Jesus ordenou aos seus discípulos para amar seus inimigos, não apenas aqueles que os amam, fazer o bem a todos, não só aqueles que fazem o bem para eles, e emprestar, sem esperar nada em troca. Tal amor não é natural, nem normal pelos padrões humanos.

Aos que obedecem a este mandamento Jesus oferece uma grande recompensa:

1º - “E será grande o vosso galardão. Naturalmente que a referência de Jesus é ao galardão da graça, não a algum pagamento ganho por méritos humanos. O galardão está em proporção ao sacrifício, porém é sempre muito maior que ele (Rm 8.18; 2Co 4.17, 18).

“Porque para mim tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada” (Rm 8.18)

“Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós um peso eterno de glória mui excelente; Não atentando nós nas coisas que se veem, mas nas que se não veem; porque as que se veem são temporais, e as que se não veem são eternas” (2Co 4.17,18)

Nesta presente vida, ele está formado por coisas como a satisfação interior de haver podido ajudar outros, ou alegrar-se com sua alegria (Rm 12.15); a paz de Deus e o “Deus da paz” no coração (Fp 4.7, 9). Depois desta vida, ele é a soma total de todas as bênçãos da salvação ao longo de toda a eternidade (Mt 16.27; 25.46). Mesmo agora os filhos de Deus recebem uma alegria antecipada. Em particular, há o reconhecimento público feito por Jesus pessoalmente em sua gloriosa vinda (Mt 25.34s.) [10].

2º - E sereis filhos do Altíssimo. Em todo mundo da Antiguidade os filhos – sobretudo os primogênitos – eram, conforme concordância unânime, os principais herdeiros e tinham posição privilegiada. A ética do ágape conduz os cristãos à comunhão com Deus como filhos, e os filhos participam da natureza de seu Pai (2Pe 1.3) [11].  

3º - Seremos misericordiosos como o Pai é misericordioso. Ser misericordioso significa ser compassivo, isto é, cheio daquele tipo de comiseração que se expressa em palavras e atos. É a preocupação que o Pai revelou quando enviou – deu, não poupou – seu Filho unigênito para nos salvar (Jo 3.16; Rm 5.8; 8.32).

Deus é benigno até para com os ingratos e maus. É misericordioso. Suas boas dádivas, tais como o sol e a chuva, a sementeira e a colheita, são enviadas a todos os homens, ao santo e ao pecador sem distinção. E “tal Pai, tal filho”. As qualidades que são vistas no Pai são as qualidades que os filhos devem adotar como alvo deles [12].

CONCLUSÃO

A Regra Áurea da ética cristã não é natural. Faz parte da vida dos filhos de Deus, dos que compartilham da Sua natureza. Agimos segundo os princípios da Evangelho e não segundo o padrão do mundo caído.

O cristianismo como religião não altera nada no mundo. O cristianismo como estilo de vida do salvo por Cristo transforma o mundo. É uma contracultura. É algo que o mundo não espera, mas nós, os salvos por Cristo praticamos porque o Espírito Santo habita em nós.

Este é o Evangelho de Cristo. Esta é maneira que devemos viver em palavras e em ações. O homem natural não alcança tal padrão moral, mas nós devemos busca-lo e vivê-lo pois somos filhos do Altíssimo.

Pense nisso!  

Bibliografia

1 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 270.

2 – Morris, L. Leon. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 124.

3 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 270.

4 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 188.

5 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 1, São Paulo, SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 476.

6 – Morris, L. Leon. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 124.

7 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 189.

8 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 271.

9 – MacArthur, John.  Comentário do Novo Testamento – Lucas, p. 2372.

10 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 1, São Paulo, SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 477.

11 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 272.

12 – Morris, L. Leon. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 125.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

AMAR OS INIMIGOS, A REGRA ÁUREA DO CRISTÃO

Por Pr. Silas Figueira

Texto base: Lucas 6.27-30

INTRODUÇÃO

Jesus acabara de afirmar que os bem-aventurados seriam odiados por causa do Seu nome (Lc 6.22), então agora passa a ensinar o modo como devemos enfrentar esse ódio. Se as bem-aventuranças é um caldo grosso de engolir, amar os inimigos é algo ainda mais difícil. Essas ordens que Jesus nos dá são resultado direto da esperança de que o Reino de Deus chegou. Esse amor é a demonstração de que somos súditos desse Reino, por isso que as nossas atitudes não devem estar condicionadas às atitudes deste mundo. 

O mandamento de Jesus de amar os inimigos tem por fundamento o fato de que o renascido na realidade é um filho do Pai no céu. O amor ao inimigo é uma característica do Pai celestial. O amor de Deus dirige-se a cada uma de suas criaturas.

Clemente de Alexandria afirma, com razão: “O mandamento de que devemos amar os inimigos não significa que devemos amar a maldade, ou a impiedade, ou o adultério, ou o roubo, mas sim amar, apesar de tudo, o ladrão, o ímpio e o adúltero em si, não porque ele é pecador e denigre o nome do ser humano por meio de algumas atitudes, mas porque ele é ser humano e criatura de Deus” [1]. Nada que o Senhor exige de nós Ele deixou de vivenciar em seu ministério terreno. Ser cristão é seguir as pisadas do Mestre.

Quais as lições que podemos tirar desse texto e como devemos aplica-las em nossas vidas?

1 – OS CRISTÃOS SÃO IDENTIFICADOS MEDIANTE O AMOR DEMONSTRADO (Lc 6.27).

Os discípulos de Cristo devem ser identificados de várias maneiras. Dentre muitas delas podemos destacar algumas: o arrependimento (2Co 7.10; 1Jo 1.8-10.), humildade (Tg 4.6,10; 1Pe 5.6), a vida de oração (Lc 18.1; Ef 6.18; Fp 4.6), separação do mundo (Tg 4.4; 1João 2.15-17), crescimento espiritual (Ef 4.11-15; 1Pe 2. 2; 2Pe 3.18), dar fruto espiritual (Mt 13.23; Jo 15.5,8; Gl 5.22), obediência (Mt 7.21; Jo 15.14; 1Pe 1.1-2; 1Jo 2.3-5), a fome pela Palavra de Deus (1Pedro 2.1-2), uma vida transformada (Rm 12.2; 2Co 5.17).

No entanto, o traço fundamental de um verdadeiro crente em Jesus é o amor. O amor é a marca distintiva dos discípulos de Cristo: “Um novo mandamento vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como eu vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos ameis. Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros” (Jo 13.34,35). Este é o maior mandamento e o cumprimento da lei. O amor é o vínculo da perfeição, superior aos mais excelentes dons (1Co 13). O apóstolo Paulo deu essa mesma ênfase em suas epístolas (Rm 12.19-21; lTs 5.15; ICo 6.7). O apóstolo Pedro de igual forma tratou do assunto (IPe 3.9). O apóstolo João chegou a ser enfático na questão (1Jo 3.16) [2].

Observe que a ênfase que Lucas dá aqui nesse texto não é em Jesus, mas nos Seus discípulos. E esta ênfase está na forma como se deve demonstrar o amor.

Primeiro, os cristãos amam a Deus, que Jesus declarou ser o maior e mais importante princípio na Escritura (Mt 22.37,38; Cf. Dt 6.5; Rm 8.28; 1Co 2.9; 1Jo 5.2).

Segundo, o amor por outros crentes marcam os verdadeiros discípulos de Cristo (Jo 13.34,35; cf.  Jo 15.12; 1Ts 4.9; Hb 13.1; 1Pe 1.22; 4.8; 1Jo 3.11).

Terceiro, junto com a amar Deus e aos outros cristãos está também o amar incrédulos amar o próximo (Mt 22.39; Lc 10.25-37). Enquanto os seus discípulos estão proibidos de amar o mal e o sistema mundial satânico (1Jo 2.15-17), os crentes devem, no entanto, amar os pecadores perdidos que estão nesse mundo. Ao fazer isso eles seguem o exemplo do Pai celestial, que “faz com que o seu sol se levante sobre maus e bons, e faz chover sobre os justos e injustos” (Mt 5.45) [3].

O homem por ter uma natureza caída, acha mais fácil odiar do que amar. Ele age por sentimentos e circunstâncias (instinto). Já o cristão age pelo agir do Espírito Santo que nele habita. A lei do amor que o Senhor exige dos seus discípulos é a forma de demonstrar que somos Seus filhos e que temos compromisso com Seu Reino.

2 – DEFINININDO O AMOR QUE JESUS EXIGE DE SEUS DISCÍPULOS.

Nenhum outro mandamento de Jesus causou tanta discussão e debate como o de amar nossos inimigos. Como falamos anteriormente, esse é um caldo grosso de engolir. É algo que mexe com nossas emoções e revira as nossas entranhas.

Mas antes de analisarmos esses versículos, vamos entender as várias formas que a palavra amor aparece no grego e qual o Senhor exige de nós.

1º - Há a palavra eros. É caracteristicamente a palavra para o amor entre os sexos, o amor de um rapaz para uma jovem; sempre há um lado predominantemente físico, e sempre envolve o amor sexual. Esta palavra não aparece no Novo Testamento em lugar algum, não porque o Novo Testamento despreze ou rejeite o amor físico, mas porque, já nos tempos do Novo Testamento, esta palavra passara a ser ligada com a concupiscência mais do que com o amor. Eros, conforme alguém já disse, é o amor ainda sem conversão.

2º - Há a palavra philia. Descreve um relacionamento caloroso, íntimo e tenro do corpo, mente e espírito. Philia descreve o tipo mais nobre do amor humano, mas também é verdade que a luz da philia pode diminuir e seu calor esfriar. Dessa palavra deriva a palavra “filantropia”, “filantropo”.

3º - Há a palavra storge. Esta é a palavra mais limitada na sua esfera, porque no grego secular é a palavra do amor no lar, do amor dos pais para com os filhos e dos filhos para com os pais, para o amor entre irmãos.

4º - Há a palavra ágape. Ágape é uma palavra nova que descreve uma qualidade nova, uma palavra que indica uma atitude nova para os outros, uma atitude nascida dentro da comunidade, e impossível sem a dinâmica cristã.

Ágape significa a benevolência invencível, a boa vontade que nunca é derrotada. Ágape é o espírito no coração que nunca procurará outra coisa senão o sumo bem do seu próximo. Não se importa com o tratamento que recebe do seu próximo, nem com a natureza dele; não se importa com a atitude do próximo para com ele, nunca procurará outra coisa a não ser o sumo bem do próximo, o melhor para ele [4].

O termo para amar os inimigos é ágape. É o amor sacrificial. É o amor de Deus para com a humanidade caída. É o amor que levou Jesus a se dá na cruz por nós. É o amor do Pai que o fez enviar seu Filho para morrer por nós, sendo que nós éramos por natureza filhos da ira (Jo 3.16; Rm 5.10; Ef 2.1-4).   

3 – PRIMEIRA A REGRA ÁUREA, AMAR OS INIMIGOS (Lc 6.27,28).

Jesus deixou claro de que qualquer um que vivesse em função dos valores eternos do Reino teria complicações com o povo deste mundo. Os cristãos são “sal da terra” e “luz do mundo” (Mt 5.1316), e, por vezes, o sal faz arder e a luz expõe o pecado (Jo 3.19). Os pecadores mostram seu ódio nos evitando ou rejeitando (Lc 6.22), nos insultando (Lc 6.28), abusando fisicamente de nós (Lc 6.29) e nos contendendo (Lc 6.30). Devemos esperar esse tipo de reação (Fp 1.29; 2Tm 3.12).

John Wesley estava pregando pelo país, montado em seu cavalo, meditando na palavra de Deus. Ele percebeu que em três dias ninguém o tinha perseguido, ninguém o tinha caçado, ninguém o tinha amaldiçoado, ninguém tinha tentado bater em seu corpo com paus e pedras. Então ele desceu de seu cavalo, e começou a orar e indagar em seu coração. Ele disse: “Deus, eu me tornei um homem carnal? Minha mensagem se tornou tão mundana que ninguém mais me persegue?” Exatamente neste momento de sua oração um fazendeiro que odiava John Wesley, o vê orando, pegou um tijolo, e jogou nele, que passou raspando o seu nariz. Então Wesley louvou ao Senhor, dizendo: “Deus, muito obrigado! Agora sei que o Senhor confirmou seu favor por mim”. Então quando você se levanta e pessoas aplaudem é meio assustador, você espera que seja um reflexo de piedade de ambas as partes, mas você nunca tem certeza. Precisamos entender que o cristianismo nunca será amigo deste mundo. O cristianismo sustenta o único caminho para a salvação deste mundo, eles nunca serão amigos. O cristianismo nunca se mistura as exigências do mundo, mas as exigências deste mundo se misturam a ele.

1º - O cristão não pode ser vingativo (Lc 6.27). Qual é a maneira correta de tratar os inimigos? Devemos amá-los, fazer-lhes o bem e orar por eles. Ódio gera mais ódio, “porque a ira do homem não produz a justiça de Deus” (Tg 1.20). Não se pode agir assim pelas próprias forças, mas tudo isso é possível pelo poder do Espírito Santo (Rm 5.5; Gl 5.22,23) [5]. O amor cristão descreve um amor sobrenatural, que é muito diferente de amor do mundo. A vingança é uma virtude para os incrédulos, não para os crentes em Jesus (Dt 32.35; Rm 12.19; Hb 10.30).

Em vez de procurar vingança, devemos agir como o Senhor nos fala em Sua Palavra: “Se o teu inimigo tiver fome, dá-lhe de comer; e se tiver sede, dá-lhe água para beber” (Pv 25.21; Rm 12.19-21). “Não procurem vingança nem guardem rancor contra alguém do seu povo, mas ame cada um o seu próximo como a si mesmo. Eu sou o Senhor” (Lv 19.18). O termo “próximo” refere-se para quem precisa (Lc 10.29-37), e não apenas para companheiros judeus.

Até o animal de seu inimigo deve ser socorrido: “Se encontrares o boi do teu inimigo, ou o seu jumento, desgarrado, sem falta lho reconduzirás. Se vires o jumento, daquele que te odeia, caído debaixo da sua carga, deixarás pois de ajudá-lo? Certamente o ajudarás a levantá-lo” (Êx 23.4,5)

2º - O Senhor nos dá quatro imperativos: Amar, fazer o bem, abençoar e orar (Lc 6.27,28). Os cristãos, em sua ética, não devem ser determinados pelo comportamento anterior dos outros em relação a eles, mas pelo caráter de Deus. Por essa razão, os cristãos não têm de retribuir na mesma moeda, os inimigos têm de ser amados, os que os odeiam têm de ser tratados com bondade, os que os amaldiçoam têm de ser abençoados, e é necessário orar pelos que os maltratam [6].

Pagar o bem com o mal é crueldade; pagar o mal com o mal é vingança; pagar o mal com o bem é amor transcendental. Pagar o mal com o mal é o padrão de conduta dos incrédulos, mas pagar o mal com o bem é tornar-se semelhante ao nosso Senhor, que não revidou ultraje com ultraje; antes, intercedeu por seus algozes [7].

3º - Amar os vossos inimigos não oferece meio-termo. Conforme Mateus relata no seu dito equivalente, as pessoas têm disposição para amar seu próximo e odiar seu inimigo (Mt 5.43). Jesus, porém, vai além disto. O seguidor dEle não pode ser seletivo no seu amor. Deve amar todos os homens, inclusive seus inimigos, no espírito do seu Mestre. Não basta refrear-se de atos hostis. Deve fazer o bem aos que o odeiam [8].

4 – SEGUNDA REGRA ÁUREA, SER BENEVOLENTE COM TODOS, INDEPENDENTEMENTE DO QUE NOS FAÇAM (Lc 6.29,30).

As leis mais antigas eram a lei da reciprocidade direta. Podemos vê-la em Êxodo 21.23-25: “Mas, se houver dano grave, então, darás vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura, ferimento por ferimento, golpe por golpe”. A mesma lei aparece em Levítico 24.19,20. Ainda essa lei está registrada em Deuteronômio 19.21: “Não o olharás com piedade: vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé”.

No entanto, esse princípio não tinha a intenção de encorajar a vingança, mas, sim, limitá-la, tanto que a retaliação nunca era aplicada pela pessoa ferida ou por seus parentes, mas sempre por um juiz [9]. Era a justiça sendo posta em prática. E mesmo assim, havia naquela época seis cidades de refúgio onde uma pessoa que havia cometido um crime sem intenção poderia se refugiar para não ser morto (Js 20.1-6).

Se qualquer malefício for feito contra nós, o revide faz parte de nosso instinto natural; e não só isso, mas também queremos acrescentar mais do que é justo, nesse revide. Era isso que homens e mulheres faziam naqueles dias, e é o que continuam fazendo até hoje [10]. Gandhi parafraseando Jesus dizia: “Olho por olho e o mundo ficará cego”.

O que Jesus quer nos ensinar aqui?

Jesus passa a apresentar três exemplos práticos para incutir em nós o amor ao inimigo. Seus exemplos vão do pior ao menos pior, mencionando um ataque físico, um roubo da propriedade e uma doação imprevista. Desta forma o mandamento do Senhor de amar o inimigo é inserido na vida prática.

1º - Não revidar uma violência física (Lc 6.29). “Ao que te ferir numa face” é muito branda. O termo grego typtein significa “golpear ou bater”; e a palavra grega para “face” é siagon, significa “maxilar”. A frase é vigorosa: “levar um soco no maxilar” [11]. A reação natural a tal golpe é ferir de volta com força. Jesus dá a injunção aos Seus seguidores no sentido de oferecer o outro lado do queixo. Está falando acerca de uma atitude. Quando recebemos um dano, não devemos buscar vingança, mas, sim, devemos estar prontos se necessário a aceitar outro dano semelhante [12].

É não ser vingativo e nem se igualar ao outro. O outro pode ser violento e perverso, mas nós cristãos não podemos agir assim. A melhor maneira de se vingar não é ficar parecido com o malfeitor (Marco Aurélio). Seu inimigo o derrota quando o deixa como ele mesmo (Pelágio).  

2º - Ir além do que lhe fazem (Lc 6.29). “E ao que te houver tirado a capa, nem a túnica recuses”. Da mesma forma, a instrução para entregar não só a “capa” (gr. himation, a peça de roupa externa), mas também a “túnica” (gr. chiton, a rouba de baixo usada diretamente sobre a pele) não é para se armar em face do mal e da injustiça, mas para ficar nu em face disso. O propósito dessa vulnerabilidade calculada não é convidar a agressão, mas deixar de oferecer motivo para a agressão [13]. Isso não é ser covarde, nem muito menos medroso. Para agir assim é necessário muita coragem. É necessário ter princípios cristãos.

Como Paulo nos ensinou: “Não se deixem vencer pelo mal, mas vençam o mal com o bem” (Rm 12.21). Isso parece impossível, talvez você diga, mas a história secular nos mostra que isso foi possível. O século XX foi alterado de forma poderosa pela observância corajosa desse ensinamento por Gandhi e por Martin Luther King Jr. Eles tiveram uma postura de “ficar nu” diante de seus adversários. Com essa postura de não defesa cara a cara com os seus agressores Gandhi conseguiu a libertação da Índia do governo britânico; e o resultado desse comportamento similar por parte de Martin Luther King, foi ganhos maciços em direitos civis para os negros nos Estados Unidos.    

3º - Ir além do que lhe pedem (Lc 6.30). O ensinamento central desse texto é que “o cristão nunca deve deixar o amor às posses refreá-lo de dar”. O amor deve estar pronto a ser privado de tudo se necessário for. Naturalmente, em determinado caso talvez dar não seja o caminho do amor. Mas é o amor que deve decidir se vamos dar ou reter, e não a estima pelas nossas posses. , aliás, está num tempo contínuo. Jesus está falando da atitude habitual, não do impulso generoso ocasional [14].

Um fato notório é que o Sermão do Monte está saturado de afirmações surpreendentes e às vezes até mesmo chocantes. Quanto mais analisamos os ensinamentos de Jesus, ficamos cada vez mais surpresos e confrontados com tais ensinamentos. Isso porque essas palavras entram em choque com a nossa natureza caída. Por isso que Jesus falou: “Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, dia a dia tome a sua cruz e siga-me” (Lc 9.23).

CONCLUSÃO

Creio que estes ensinamentos sejam por demais importantes e difíceis de serem praticados, por isso, não basta ser um simples observador dos princípios cristãos, só uma pessoa que nasceu de novo, uma pessoa cheia do Espírito Santo, pode praticar esses ensinamentos. Aqui temos a verdadeira prova de que o Evangelho é real em nossas vidas. A prática do amor de forma incondicional para aqueles que, aos olhos do mundo, não os merece. Amar como Cristo amou e nos ensinou a amar.

Jesus nos convida a vivermos uma vida que vai na contramão deste mundo. Ele nos convida a vivermos uma contra cultura. Ele nos convida a sermos iguais a Ele. Por isso devemos nascer de novo para que essas palavras sejam mais que palavras, seja a nossa vida.

Pense nisso!  

Bibliografia

1 – Rienecker Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 102.

2 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 186.

3 – MacArthur, John.  Comentário do Novo Testamento – Lucas, p. 2367.

4 – Barclay, William. As Obras da Carne e o Fruto do Espirito, São Paulo, Edições Vida Nova, 1985, p. 60-62.

5 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, 2012, p. 249.

6 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Shedd, Santo Amaro, SP, 2019, p. 267.

7 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, 2017, p. 186.

8 – Morris, L. Leon. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 121.

9 – Lopes, Hernandes Dias. Mateus, Jesus, o Rei dos reis, Editora Hagnos, São Paulo, 2019, p. 205.

10 – Lloyd-Jones, D. Martyn. Estudos no Sermão do Monte, Ed, Fiel, São Paulo, SP, 1984, p. 243.

11 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Shedd, Santo Amaro, SP, 2019, p. 268.

12 – Morris, L. Leon. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 123.

13 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Shedd, Santo Amaro, SP, 2019, p. 268.

14 – Morris, L. Leon. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 123. 

domingo, 7 de fevereiro de 2021

O SERMÃO DO MONTE - UMA ANÁLISE EM LUCAS (parte 2)

Por Pr. Silas Figueira

Texto base: Lucas 6.20-26

INTRODUÇÃO

Diferentemente de Mateus, Lucas registra somente quatro bem-aventuranças. Lucas as trata de forma mais resumida, mas não de menor importância. É importante destacarmos que o Sermão do Monte não é uma declaração de ética, e quem as aplica-las será salvo. Tentar aplicar os princípios deste sermão à parte da regeneração é fútil e impossível. Somente através da regeneração, com ajuda do Espírito Santo, poderemos viver o que o Senhor nos ordena aqui.

D. Martyn Lloyd-Jones disse que “o mundo atual está aguardando o aparecimento de crentes autênticos, e deles precisa desesperadamente. Nunca me canso de dizer que aquilo de que a Igreja mais necessita não é organizar campanhas de evangelização, a fim de atrair as pessoas que ainda estão do lado de fora, mas começar, ela mesma, a viver a vida cristã. Se a Igreja assim agisse, homens e mulheres haveriam de encher nossos templos” [1].

1 – O QUE SÃO AS BEM-AVENTURAÇAS?

Ao contrário de Mateus, que cita oito bem-aventuranças (Mt 5.3-11), Lucas traz somente quatro bem-aventuranças no início do sermão. A essas quatro bem-aventuranças são acrescentadas, em correspondência exata, quatro ais, que fazem parte do material exclusivo do presente evangelista. Por meio deles assinala-se uma inversão e revalorização de todas as correspondências terrenas no reino de Deus. A interpelação direta de pobres e ricos nas bem-aventuranças e nos ais dirige-se a todos os ouvintes, provavelmente porque havia entre eles representantes de ambas as classes [2].

1º - A finalidade das Bem-aventuranças. Observe aqui em Lucas que o Senhor ministra esse grande sermão depois de ter escolhido os doze apóstolos. A mensagem que seria ministrada ali por Jesus era algo muito diferente e mais profundo do que estavam acostumados a ouvir, seria algo revolucionário a todos.

Arthur W. Pink diz que o “Sermão do Monte” apresenta o Manifesto do Rei. Ele contém a “Constituição” do Seu reino. Ele anuncia as leis que haverão de governar a conduta deles. A autoridade do Rei fica evidenciada pelos Seus “Eu, porém, vos digo”, repetidos não menos do que catorze vezes neste “Sermão” em Mateus. O efeito que Suas palavras tiveram sobre os Seus ouvintes fica evidente nos versículos finais: “Quando Jesus acabou de proferir estas palavras, estavam as multidões maravilhadas da sua doutrina; porque ele as ensinava como quem tem autoridade e não como os escribas” (Mateus 7.28,29) [3].

Nesses textos Ele apresenta como que a “plataforma de Seu Reino”, seu “programa de governo”, e os apóstolos teriam a incumbência de dar continuidade dessa mensagem. Esses valores devem ser observados ainda hoje pela igreja.

Literalmente Jesus toma as ideias pré-estabelecidas pelo mundo secular e as põem ao contrário. Jesus chamava felizes àqueles que o mundo considera desgraçados, e desgraçados aos considerados felizes. Imaginem a alguém que diga: “Felizes os pobres”, e “Ai dos ricos!”. Falar assim é pôr fim a todos os valores do mundo [4].

Por isso que a mensagem do Evangelho é revolucionária e inaceitável para o homem natural (1Co 2.14-16). Na verdade, a Igreja é uma “contra cultura”. Os valores por ela pregada entra em choque com tudo que o mundo ensina e vive. Na verdade, esses valores do Reino entra em choque com o nosso “EU”. Por isso que Jesus disse: “Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome cada dia a sua cruz, e siga-me” (Lc 9.23-26).

Warren W. Wiersbe diz que o Sermão do Monte aplica-se à vida em nosso tempo e descreve o tipo de caráter piedoso que devemos ter como cristãos neste mundo. Fica claro que Cristo descreve uma conjuntura extremamente distinta daquela do reino glorioso, pois inclui fome, lágrimas, perseguição e falsos mestres [5].

2º - Bem-aventurados (beatitudes), é incompatível com a alegria do mundo. O grande problema do homem sempre será a busca da felicidade naquilo que é passageiro, no que é efêmero e fugaz. É o que a filosofia chama de hedonismo.

Hedonismo vem do grego Hedonê — nome uma deusa na mitologia grega que representa o prazer. Filha de Eros e Psique. Hedonê era a representação encarnada de uma vida prazerosa. O hedonismo é uma doutrina, ou filosofia de vida, que defende a busca por prazer como finalidade da vida humana. Buscar prazer é o que move as paixões, os desejos e todo o mecanismo da vida, sendo, portanto, na visão de hedonistas, a primeira e mais completa ponte para a finalidade última da vida: a felicidade.

A felicidade proposta por Jesus foge desse hedonismo que o mundo busca.

A palavra “bem-aventurado” vem do grego “makarios”, um adjetivo que basicamente significa feliz ou aquele que desfruta da felicidade celestial. A palavra vem da raiz makar, que significa ser feliz, mas não no sentido usual de felicidade, baseado em circunstâncias positivas [6]. A palavra makarios vem do hebraico asher que significa abençoado [7]. Uma pessoa bem-aventurada é uma pessoa que desfruta da felicidade celestial, daquilo que o mundo não tem pois anda na contramão da Sua vontade. É uma felicidade que não está baseada nas circunstâncias, mas no próprio Deus (Fl 4.4,10-13).

Como disse John Piper: “Essa é a base bíblica para o hedonismo cristão: Deus é mais glorificado em nós quando estamos mais satisfeitos nele”.

1 – AS QUATRO BEM-AVENTURANÇAS (Lc 6.20-23).

Analisemos as quatro bem-aventuranças:

1º - Bem-aventurados os pobres (Lc 6.20). Os pobres aqui são aquelas pessoas que vivem na total dependência de Deus. Aqui o texto não fala de pobreza material, mas de pobreza espiritual.

No grego existem duas palavras para designar “pobreza”: a primeira delas é penês – esta palavra é usada para descrever o homem que tem de trabalhar para ganhar a vida (autodiákonos). É aquele que não tem nada que lhe sobre. É o homem que não é rico, mas que também não padece necessidades. A segunda palavra é ptokós – descreve a pobreza absoluta e total daquele que está afundado na miséria. É ser pobre como um mendigo [8].

Jesus descreve que é bem-aventurado o homem que, diante de Deus, se vê como um mendigo. Essa pessoa então é uma pessoa feliz. Aqui está se falando do homem interior e não do exterior. É reconhecer que somos dependentes da graça e misericórdia de Deus todos os dias. Que de nós mesmos nada temos.  

E se alguém, na presença de Deus sentir alguma outra coisa qualquer, além da mais penúria de espírito, isso apenas significará, em última análise, que tal pessoa nunca esteve na presença do Senhor. Esse é o significado da primeira bem-aventurança [9].

A promessa aos desamparados espiritualmente é que deles é o reino de Deus. O presente tempo verbal indica que mais do que apenas as futuras bênçãos do reino futuro. Os crentes desfrutam agora as bênçãos do reino de “justiça, paz e alegria no Espírito Santo” (Rm. 14.17). O gozo do céu compensará amplamente as dificuldades da terra, como disse o apóstolo Paulo: “Porque para mim tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada” (Rm 8.18).

“Por isso não desfalecemos; mas, ainda que o nosso homem exterior se corrompa, o interior, contudo, se renova de dia em dia. Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós um peso eterno de glória mui excelente; não atentando nós nas coisas que se veem, mas nas que se não veem; porque as que se veem são temporais, e as que se não veem são eternas” (2Co 4.16-18).

2º - Bem-aventurado o tem fome (Lc 6.21a). O texto aqui nos fala a respeito da fome espiritual. Da fome de justiça. A ideia no grego nos fala de sentir uma fome profunda.

Em Mateus lemos: “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos” (Mt 5.6). John Stott diz que a justiça tem três aspectos: legal, moral e social. A justiça legal trata da nossa justificação, um relacionamento adequado com Deus. A justiça moral trata da conduta que agrada a Deus, a justiça interior, de coração, de mente e de motivações. A justiça social refere-se à busca pela libertação do homem de toda opressão, junto com a promoção dos direitos civis, de justiça nos tribunais, da integridade nos negócios e da honra no lar e nos relacionamentos [10].

Devemos entender que a justiça aqui apresentada não é uma justiça utópica. Uma justiça que muitas vezes encontramos nos discursos comunistas. Estamos falando aqui da justiça vivida por cada cristão compromissado com o Reino de Deus. Por isso nós não podemos esperar essa mesma justiça do homem natural e nem nos tribunais onde impera a corrupção.

Infelizmente esta é uma dura realidade deste mundo: os mortos não têm apetite. O alimento de Deus não desperta nenhum apetite nos espiritualmente mortos. A fome é o primeiro sinal de que uma pessoa está viva. Quando Jesus ressuscitou a filha de Jairo mandou que lhe dessem de comer (Mc 5.43).

O Senhor conclui esta bem-aventurança dizendo que “sereis fartos”. Seremos fartos das promessas de Deus e do Pão da Vida que é Jesus (Jo 6.35). Em uma parábola narrada somente em Lucas, a do fariseu e o Publicano (Lc 18.9-17), Jesus nos deu uma comovente ilustração dessa fome espiritual. Note as palavras: “Mas o coletor, estando em pé, longe, nem mesmo ousava erguer seus olhos ao céu, porém batia em seu peito, dizendo: “Ó Deus, sê propício a mim, pecador” (Lc 18.13). A fome aqui implícita é um anelo por misericórdia e perdão, por paz de mente e coração, pureza e santidade, comunhão com Deus [11].

Temos outro exemplo em outra parábola que Jesus contou, a parábola do filho pródigo (Lc 15.11-32). Quando o filho pródigo teve fome, queria alimentar-se com as bolotas jogadas aos porcos; mas quando estava morrendo de inanição, voltou para o seu pai. Só poderemos ser saciados da fome espiritual do alimento da mesa do Pai. Longe de Deus nós nunca seremos saciados da nossa fome.

3º - Bem-aventurados os que choram (Lc 6.21b). Esse “choro” espiritual é algo que, necessariamente, resulta no fato de ser alguém “pobre de espírito”. É aquela pessoa que está entristecido de seu próprio pecado. A palavra no grego utilizada aqui para chorar é panthoutes, que significa lamentar-se pelos mortos. Uma tristeza profunda.

O cristianismo começa com a consciência do pecado. Quão feliz é o homem que sente profunda dor por seu pecado, o homem que sente que seu coração se rompe ao dar-se conta do que fez com sua vida, contra Deus e Jesus, o homem que fica atônito ante o desastre que o seu pecado pôde ocasionar! [12]

O apóstolo Paulo em sua segunda carta aos Coríntios diz: “Porque a tristeza segundo Deus opera arrependimento para a salvação, da qual ninguém se arrepende; mas a tristeza do mundo opera a morte” (2Co 7.10). É a tristeza pelo pecado que desemboca na felicidade verdadeira.

A recompensa prometida para os que choram o choro do pecado é que serão consolados, ou como disse Lucas: “porque haveis de rir”. Os consolados são os que se arrependem de seus pecados e alcançam o perdão de Deus (Lc 5.20). Um exemplo desse arrependimento e consolo encontramos na vida de Davi. Ele derramou lágrimas de solidão, rejeição, frustação, abatimento, decepção e fracasso. Tanto que escreveu no Salmo 32.1: “Bem-aventurado aquele cuja iniquidade é perdoada”. Veja também o Salmo 51.

4º - Bem-aventurados os perseguidos (Lc 6.22,23). A bem-aventurança final é talvez a mais paradoxal e, do ponto de vista humano, mais incompreensível de todas. Os três primeiros descrevem como o pecador arrependido vê a si mesmo; a quarta descreve como o mundo o vê. O Senhor usou quatro verbos, de ódio, ostracismo, insulto e escárnio para resumir o sarcasmo, hostilidade e animosidade que será derramada sobre seus discípulos pelo mundo incrédulo. Esta quarta bem-aventurança indica que o trabalho dos três primeiros foi realizado.

Ao longo dos séculos, a igreja tem sofrido perseguição. Os crentes foram perseguidos em todos os lugares e em todos os tempos. Paulo disse: “Todo aquele que quiser viver piedosamente em Cristo será perseguido” (2Tm 3.12). Depois de ser apedrejado em Listra, Paulo encorajou os novos crentes, dizendo-lhes: “...através de muitas tribulações, nos importa entrar no Reino de Deus” (At 14.22). Escrevendo aos Filipenses, o apóstolo disse: “Porque vos foi concedida a graça de padecerdes por Cristo e não somente de crerdes nele” (Fl 1.29). Os judeus primitivos foram duramente perseguidos, tanto pelos judeus como pelos gentios [13]. O único crime dos cristãos era colocar a Cristo acima de César; e por esta lealdade suprema os cristãos morreram aos milhares e enfrentaram incríveis torturas.

Como podemos nos alegrar na perseguição?

Podemos nos alegrar nas perseguições, porque mediante elas temos a oportunidade de demonstrar nossa fidelidade a Cristo. Ninguém quer ser perseguido, mas é mediante as perseguições que nossa fé é demonstrada com mais vigor.

Podemos nos alegrar nas perseguições, porque mediante elas temos a oportunidade de deixar um legado de fé para os que vem depois de nós. Nos países que o comunismo e o islamismo governam, muitos dos nossos irmãos têm padecido afrontas, perdas dos bens materiais, a liberdade e a vida. Ainda hoje ecoa a voz do Senhor Jesus dizendo: “Saulo, Saulo porque me persegues?”.

Veja o que Tiago disse para a igreja: “Meus irmãos, tende por motivo de toda a alegria, o passardes por várias provações” (Tg 1.2-4).

Em filipenses 1.29 nos diz: “Porque vos foi concedida a graça de padecerdes por Cristo, e não somente de crerdes nele”.

Vemos isso quando lemos Atos 6.40,41:

“E, chamando os apóstolos, e tendo-os açoitado, mandaram que não falassem no nome de Jesus, e os deixaram ir. Retiraram-se, pois, da presença do conselho, regozijando-se de terem sido julgados dignos de padecer afronta pelo nome de Jesus”.

Isso não é sadismo, isso é gozo espiritual por terem sido dignos de padecer por amor a Cristo. Isso é maturidade espiritual.

“Folgai nesse dia, exultai; porque eis que é grande o vosso galardão no céu, pois assim faziam os seus pais aos profetas” (Lc 6.23) – Jesus consola-os com a referência ao grande galardão no céu, que receberão em troca das injúrias por amor dele. Não se fala aqui de nenhum pensamento meritório. Deus sem dúvida concede a vida eterna, como gratidão ou graça por tribulações sofridas, porém não como mérito. O galardão, que é grande, já se encontra agora no céu, onde Deus o guardou em segurança (cf. Lc 18.22; 1Pe 1.4). [14].

2 – QUATRO AIS – OS QUE FICARÃO FORA DO REINO (Lc 6.24-26).

Esses quatro ais é um material exclusivo do Evangelho de Lucas. Esse ais formam um correlativo natural às bem-aventuranças. Esses ais é uma forma de pesar, de lástima, de lágrimas e compaixão, e não uma ameaça [15]. Observe o contraste: Bem-aventurado os pobres, ai de vós os ricos; bem-aventurado os que tem fome, ai de vós que estais fartos; bem-aventurados os que choram, ai de vós, os que agora rides; bem-aventurado os perseguidos, ais de vós quando todos os homens de vós disserem o bem.

Os quatro “ais” apresentam uma verdade em comum: quem tira o que deseja da vida paga por isso. Se deseja riqueza imediata, saciedade, riso e popularidade, pode conseguir essas coisas, mas há um preço: isso é tudo o que você vai receber. Jesus não disse que essas coisas são erradas. Disse que encontrar nelas toda a satisfação já é seu próprio julgamento [16].

Analisemos esses “ais”:

1º - Ai dos ricos (v. 24) – Esse ai não é dirigido aos discípulos, ele é dirigido aos “ricos” que estavam entre a multidão. Aos religiosos que o acompanhavam para fiscalizar os seus ensinamentos. Provavelmente os fariseus e os saduceus.

O primeiro “ai” não foi um pronunciado aos que são ricos materialmente. Ser rico em si não é pecado; Abraão, Jó, Nicodemos e José de Arimatéia eram ricos, e de acordo com Dt 8.18 Deus concede o poder de obter riqueza: “Antes te lembrarás do Senhor teu Deus, que ele é o que te dá força para adquirires riqueza”. Ser rico nunca foi e nunca será pecado, se essa riqueza foi adquirida de forma honesta, pois Deus dá prosperidade ao seu povo. 

Os ricos aqui são aqueles que se imaginam ser ricos no reino espiritual. São aquelas pessoas que pensam que os seus atos justos são suficientes para obter a salvação. Um bom exemplo é o fariseu na parábola do Fariseu e do publicano, onde “o fariseu, posto em pé, orava de si para si mesmo, desta forma: Ó Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros, nem ainda como este publicano; jejuo duas vezes por semana e dou o dízimo de tudo quanto ganho” (Lucas 18: 11-12).

A maldição pronunciada sobre eles é que eles estão recebendo o seu conforto de forma plena nesta vida. O que os espera na eternidade é o tormento, incessante do inferno (cf. Lc 16.25).

Mas esse texto também fala daquelas pessoas que tem posses, que têm funcionários e os exploram. Da riqueza adquirida de forma injusta e, muitas vezes, desonesta. Esses também irão responder diante do Senhor naquele grande dia. O Senhor condena quem tais coisas praticam (Tg 5.4-6; Jr 22.13,14; Cl 4.1).  

2º - Ai dos fartos (v. 25a). Jesus está falando a respeito dos que vivem na prática da injustiça e se fartam de maldade. Pessoas que estão cheios de justiça própria e não se sentem carentes da graça de Deus.

Aqui está a antítese da bem-aventurança dos que têm fome. Não da fome natural, mas da fome de justiça. Ao contrário daqueles que anseiam por uma justiça, os fartos de injustiça imaginam que eles têm tudo o que precisam, no entanto, eles não têm nada. A maldição pronunciada sobre eles é que eles serão eternamente famintos, experimentando a roer, a fome de uma alma perdida no inferno sem fim. Eles receberão a justiça divina, o justo juízo.

Vemos esta condenação do juízo vindouro em Tiago 5.1-6:

“Atendei, agora, ricos, chorai lamentando, por causa das vossas desventuras, que vos sobrevirão. As vossas riquezas estão corruptas, e as vossas roupagens, comidas de traça; o vosso ouro e a vossa prata foram gastos de ferrugens, e a sua ferrugem há de ser por testemunho contra vós mesmos e há de devorar, como fogo, as vossas carnes. Tesouros acumulastes nos últimos dias. Eis que o salário dos trabalhadores que ceifaram os vossos campos e que por vós foi retido com fraude está clamando; e os clamores dos ceifeiros penetraram até aos ouvidos do Senhor dos Exércitos. Tendes vivido regaladamente sobre a terra; tendes vivido nos prazeres; tendes engordado o vosso coração, em dia de matança; tendes condenado e matado o justo, sem que ele vos faça resistência”.

Muitas vezes nós seremos injustiçados nesta vida, mas o justo Juiz há de julgar a nossa causa, nos dando, talvez não aqui, mas na glória, o gozo e paz que tanto anelamos. Mas os ímpios receberão a condenação eterna pelo mal que tem praticado.

Como disse Paulo aos Gálatas 6.7-10:

“Não erreis: Deus não se deixa escarnecer; porque tudo o que o homem semear, isso também ceifará. Porque o que semeia na sua carne, da carne ceifará a corrupção; mas o que semeia no Espírito, do Espírito ceifará a vida eterna. E não nos cansemos de fazer bem, porque a seu tempo ceifaremos, se não houvermos desfalecido. Então, enquanto temos tempo, façamos bem a todos, mas principalmente aos domésticos da fé”.

3º - Ai dos que dos que riem (v. 25b). A risada de que se fala aqui é a risada maldosa, que odeia a justiça e triunfa sobre o justo. Eles não têm uma santa alegria. A alegria dos justos eles não conhecem. São pessoas que muitas vezes estão entre os religiosos, mas não tem compromisso com Deus.

Mas uma vez citando Tiago que nos diz:

“Adúlteros e adúlteras, não sabeis vós que a amizade do mundo é inimizade contra Deus? Portanto, qualquer que quiser ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus. Ou cuidais vós que em vão diz a Escritura: O Espírito que em nós habita tem ciúmes? Antes, ele dá maior graça. Portanto diz: Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes. Sujeitai-vos, pois, a Deus, resisti ao diabo, e ele fugirá de vós. Chegai-vos a Deus, e ele se chegará a vós. Alimpai as mãos, pecadores; e, vós de duplo ânimo, purificai os corações. Senti as vossas misérias, e lamentai e chorai; converta-se o vosso riso em pranto, e o vosso gozo em tristeza (Tg 4.4-9).

Os presunçosos estão satisfeitos com suas conquistas religiosas e sua moralidade superficial. Por isso que Tiago os chama de adúlteros e adúlteras. Essas pessoas vivem enganando e estão em adultério com o diabo. Elas pensam que alcançarão a eternidade com Deus vivendo dissolutamente em adultério e profanando o sagrado. Não que a salvação seja mediante as obras, mas quem é salvo demonstra sua salvação através do seu testemunho.

Veja o que o Senhor nos fala em Mateus 7.21-23:

“Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não fizemos muitas maravilhas? E então lhes direi abertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade”.

A dura realidade é que enquanto “muitos virão do oriente e do ocidente, e reclinar-se à mesa com Abraão, Isaque e Jacó, no reino dos céus”, muitos que pensam que são “filhos do reino serão lançados nas trevas exteriores” (Mt 8.11-12.). Em nítido contraste com a alegria eterna prometida aos verdadeiros discípulos, “naquele lugar (inferno) haverá choro e ranger de dentes” (Lc 13.28).

4º - Ai dos que são louvados (Lc 6.26; Mt 7.15-20). Quando todos nos louvarem é sinal de que há muito já sacrificamos alguns princípios. Um profeta verdadeiro é por demais incômodo para ser popular [17].

Quais são as principais características de um falso profeta:

a - Um falso profeta busca aplauso e aceitação. Vivemos um tempo em que muitos pregadores fazem de tudo para serem populares e aceitos por todos, nem que para isso deixem de pregar a respeito do pecado, pois, para eles, falar do pecado constrange os ouvintes. Diferentemente de Paulo quando esteve em Éfeso: “Como nada, que útil seja, deixei de vos anunciar, e ensinar publicamente e pelas casas” (At 20.20).   

b - Um falso profeta relativiza as Escrituras. Para um falso profeta, a Bíblia não é a Palavra de Deus. Para este, as Escrituras são falíveis e não devem servir como plena referência para o cristão.

c -  Um falso profeta prega o evangelho da confissão positiva. O falso profeta nega a possibilidade do sofrimento e anunciando um cristianismo desprovido da cruz.

d - Um falso profeta fala de Cristo, entretanto o nega. Prega sobre Cristo, mas não o conhece; fala em nome do Espírito Santo, sem contudo ter sido regenerado por ele.

e - Um falso profeta fala o que o povo quer ouvir. As pessoas terão prazer em ouvi-los porque falarão o que as pessoas gostam de ouvir. Como nos alertou Paulo em 2Tm 4.3-5: “Porque virá tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, tendo comichão nos ouvidos, amontoarão para si doutores conforme as suas próprias concupiscências; e desviarão os ouvidos da verdade, voltando às fábulas. Mas tu, sê sóbrio em tudo, sofre as aflições, faze a obra de um evangelista, cumpre o teu ministério”.

A. W. Tozer em seu livro “A Vida Crucificada” diz que “o que a igreja precisa temer é tornar-se aceita na comunidade. Uma igreja aceita pela comunidade mundana jamais é uma igreja cheia do Espírito Santo. Uma igreja que esteja cheia do Espírito Santo, separada do mundo e andando com Deus, jamais será aceita por uma comunidade mundana” [18].

CONCLUSÃO

As multidões que acompanhavam Jesus viu muitos milagres operado por Ele, muitos corpos foram curados, no entanto, os seus ensinamentos atingiam as almas das pessoas.

Observar os seus ensinamentos e praticá-los é andar na contramão do que o mundo ensina e pratica, é viver uma contracultura, é ser o inverso do que o mundo ensina e pratica. Por isso, quando nós observamos os ensinamentos de Jesus chegamos a uma única conclusão: “sem a ajuda do Espírito Santo nós não conseguiremos atingir tais objetivos”. Só mediante a conversão e uma vida crucificada poderemos praticar o que nos foi dito até aqui.

Nós cristãos vivemos para agradar o nosso Senhor e não fazermos a nossa vontade. Temos que andar em Suas pisadas e praticar os seus ensinamentos para sermos conhecidos no mundo como servos de Deus.

Pense Nisso!

Bibliografia

1 – Lloyd-Jones, D. Martyn. Estudos no Sermão do Monte, Ed, Fiel, São Paulo, SP, 1984, p. 17.

2 – Rienecker Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 100.

3 – Barclay, Willian. Comentário de Lucas, p. 68.

4 – Pink, A. W. Por Que Quatro Evangelhos, Tradução Hélio Kirchheim, p. 24.

5 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, 2012, p. 248.

6 – MacArthur, John. O Caminho da Felicidade, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2001, p. 33.

7 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 260.

8 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance – uma exposição das bem-aventuranças, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008, p. 22,23.

9 – Lloyd-Jones, D. Martyn. Estudos no Sermão do Monte, Ed, Fiel, São Paulo, SP, 1984, p. 40.

10 – Stott, John R. A Mensagem do Sermão do Monte, Ed. ABU, São Paulo, SP, 1986, p. 34,35.

11 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 1, São Paulo, SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 460.

12 – Barclay, Willian. Comentário de Lucas, p. 106.

13 – Lopes, Hernandes Dias. A Felicidade ao Seu Alcance – uma exposição das bem-aventuranças, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2008, p. 122.

14 – Rienecker Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 102.

15 – Morris, L. Leon. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 121.

16 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, 2012, p. 249.

17 – Morris, L. Leon. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 122.

18 – Tozer, A. W. A Vida Crucificada, Ed. Vida, São Paulo, SP, 2013, p. 106.