Por Pr. Silas Figueira
Texto base: Lucas 1.39-45
INTRODUÇÃO
Como esta passagem se abre, Maria
tinha acabado de receber do anjo Gabriel a mais surpreendente
inimaginável anúncio, algo incompreensível que qualquer ser humano
jamais ouvira falar. A mensagem que Maria ouviu do anjo era que ela
seria a mãe do Messias; o Filho de Deus encarnado; o Senhor Jesus
Cristo. Maria tinha respondido em humilde, obediência, submissão e
fé (Lc 1.38), confiando que Deus faria o que ele tinha dito.
Embora Maria não tenha pedido um
sinal, Deus, sabendo o quão surpreendente era essa mensagem, deu-lhe
um de sinal. O sinal, comunicado por Gabriel, foi outro milagre da
concepção, desta vez envolvendo sua parenta mais velha Isabel
(Elisabete). O registro do evangelho de Lucas abre com as histórias
desses dois milagres, um envolvendo uma estéril, uma mulher mais
velha passada a idade fértil, e o outro, uma jovem virgem, solteira
no início da adolescência. A criança do primeiro seria o precursor
do Messias, João Batista; o segundo seria o próprio Messias, o
Senhor Jesus Cristo.
Desde então, ela tinha certeza,
pela fé, de que seria mãe. Pela transbordante emoção do coração
ela anseia por outro ser humano ao qual possa contar e comunicar
tudo. Maria anseia por comunhão. A verdadeira vida em Deus busca por
comunhão. Ao ouvir que Isabel também estava grávida, Maria partiu
numa viagem de quatro a cinco dias, saindo de Nazaré e indo ao sul,
até uma cidade que ficava na região montanhosa da Judeia. Maria
percorre cerca de 130 km a pé por um caminho acidentado e perigoso,
e, de acordo com os costumes dos judeus, era impróprio, ou pelo
menos, incomum que uma mulher solteira ou noiva viajasse sozinha. A
Bíblia não nos diz como Maria conseguiu viajar dessa forma. Não
sabemos se ela conseguiu autorização com seus pais ou com José, já
que estava desposada com ele. De uma coisa podemos dizer com toda
certeza, foi a mão de Deus sobre ela que fez com que ela conseguisse
essa autorização e ser guardada dos perigos em todo o seu trajeto.
O tema principal desses textos é
alegria, e há três pessoas alegrando-se no Senhor: Isabel, João e
Maria. Vamos analisar esse texto para entender o que ele tem a nos
ensinar.
1 – A ALEGRIA DA COMUNHÃO É
A BUSCA DO “EU” A UM “TU” CONFIÁVEL (Lc 1.39).
Quanto mais Maria derrama o
coração perante o Senhor, tanto mais repleto de alegria ele fica.
Ela precisa de alguém ao qual consiga conversar sobre tudo que
estava por acontecer. Em casa, no entanto, ela estava sozinha. Ela
não fora acometida de mudez, como Zacarias, mas, na verdade, sua
situação “não era muito melhor”! O delicado sentimento da
virgem percebia a ameaça da perspectiva de imprevisível
incompreensão e vergonha. Nessa situação não é bom estar
sozinha. A solidão poderia até mesmo se tornar um perigo para ela,
tão logo viessem tempos de tribulação. A
comunhão de almas crentes com frequência é o único remédio para
pessoas atribuladas.
Já a solidão muitas vezes é um solo fértil para diversas plantas
venenosas da dúvida e do desânimo.
Com isso em mente, podemos
destacar três coisas:
1o
– Nem tudo que o Senhor nos fala podemos compartilhar com qualquer
pessoa. As pessoas
que estavam em redor de Maria, provavelmente não iriam entendê-la!
Ela não teria nada além de mal-entendidos e equívocos, e talvez
até mesmo escárnio e zombaria. Isso não é diferente de nós hoje
também. Quantas pessoas resolvem se posicionar de forma firme diante
do que a Palavra de Deus fala e, sem sombra de dúvidas, irão se
levantar pessoas para chamá-las de fanáticas, de fariseus, de
retrógradas. Como disse Paulo a Timóteo: “E
na verdade todos os que querem viver piamente em Cristo Jesus
padecerão perseguições”
(2Tm 3.12).
Isso me lembra um episódio que
aconteceu com Billy Graham depois de uma campanha evangelística. Uma
pessoa lhe disse que a forma como ele pregava e dirigia o seu
trabalho estavam atrasados uns cinquenta anos. Ele então respondeu
que estava triste com isso, ele queria estivesse atrasado dois mil
anos, ou seja, ele queria que seu trabalho evangelístico estivesse
como na época de Jesus e dos apóstolos.
2o
– São poucas pessoas que estão dispostas obedecer ao Senhor,
devido as suas consequências.
A maioria das pessoas quer o bônus, mas não quer assumir o ônus.
Em outras palavras, a maioria das pessoas quer somente os benefícios
e não assumir as consequências das suas escolhas. Maria quando
tomou para si essa incumbência dada pelo Senhor, ela assumiu as
consequências. A Bíblia não nos relata a atitude das outras
pessoas, somente a atitude de José, mas podemos imaginar a situação
embaraçosa que Maria se encontrava e a reação da família e da
comunidade em que ela estava inserida.
Infelizmente, as pessoas estão
mais preocupadas com que as outras pessoas vão dizer a seu respeito
do que tomar uma decisão correta pela obra de Deus. As consequências
são reais, em todas elas sofreremos retaliações, acusações,
sejam elas reais ou não. Hoje, por exemplo, se uma pessoa se
converte em um país muçulmano será perseguida e morta, na Coreia
do Norte é a mesma coisa; mas isso não é diferente quando uma
pessoa resolve seguir a Cristo quando está inserido dentro de uma
família que seguem outra religião. Vou além, até dentro de uma
família que segue um cristianismo nominal. Maria assumiu o risco
pela fé e foi vitoriosa.
3o
– A comunhão com pessoas da mesma fé renova as nossas forças.
É bem provável que o anjo Gabriel quando falou de Isabel para Maria
teve a intenção de lhe mostrar duas coisas: a primeira que ela
estava vivenciando um milagre compartilhado e, segundo, ela tinha
alguém que iria lhe compreender diante do que ela estava passando.
Essas duas mulheres estavam ligadas intimamente à história do
Messias.
Entenda uma coisa, Maria era
apenas uma menina que tinha no máximo quatorze anos. Ela era uma
criança ou quando muito, uma adolescente. A ideia que se tem é que
Maria era uma mulher adulta e experiente. Não era. Ela quando foi
ter com Isabel, na verdade, ela precisava de ajuda para tentar
entender tudo o que estava acontecendo. Isabel e Zacarias seriam as
melhores companhias para Maria naquele momento. A experiência de fé
de Isabel e Zacarias, a perseverança deles, fidelidade a Deus e vida
piedosa fortaleceria ainda mais Maria e o que ela enfrentaria
posteriormente.
Quando as lutas forem grandes não
vá para a internet se expôr, procure gente de carne e osso, procure
pessoas da mesma fé, gente adulta e experiente na fé para lhe
aconselhar e lhe acolher. Cuidado com quem você se abre, nem todos
são o que parecem. Mas Deus pela sua infinita misericórdia põe
pessoas para nos ajudar. Pode ser até alguém da internet, mas no
privado e não para todos darem as suas opiniões pessoais.
2 – A ALEGRIA DA COMUNHÃO
VEM NA SAUDAÇÃO E NA RECIPROCIDADE (Lc 1.40-45).
Como eram distintas as duas que
se saúdam: Maria, a jovem virgem, pouco considerada, da desprezada
Nazaré, enquanto Isabel era a idosa esposa do sacerdote! Depois de
chegar lá Maria entrou na casa de Zacarias e saudou Isabel (Lc
1.41,44). Ao contrário do breve, casual, até mesmo os cumprimentos
irreverentes comum hoje em dia, uma saudação no Antigo Oriente
Médio era um evento social ampliado, envolvendo um longo diálogo
(Êx 18.7-9).
Veja o que Jesus falou para os
seus discípulos quando os enviou a evangelizar:
“Portanto, ide! Eis que Eu
vos envio como cordeiros para o meio dos lobos. Não leveis bolsa,
nem mochila de viagem, nem sandálias; e a ninguém saudeis
longamente pelo caminho”
(Lc 10.3,4)
Isabel ao ouvir a saudação de
Maria a bendiz entre as mulheres e o fruto de seu ventre. Isabel não
exalta Maria acima das mulheres, mas a chama de bendita entre as
mulheres. Maria não é exaltada além do que ela é, nem é tratada
aquém do que ela representa.
A alegria de Isabel ao ver Maria
não era só por serem parentes, mas devido as experiências que
ambas estravam tendo. O kairós (tempo) de Deus estava acontecendo na
vida dessas duas servas de Deus. Uma carregava em seu ventre o
precursor do Messias e a outra o Messias. Um apontaria o Caminho e o
outro seria o Caminho, a Verdade e a Vida.
Essa saudação e reciprocidade
causaram três coisas:
1o
– A saudação de Maria enche Isabel e João do Espírito Santo (Lc
1.41,44). Não
havia em Maria nenhum poder ou dom especial, mas em seu ventre estava
o nosso Salvador. Maria era o porta-joias com a joia mais preciosa do
mundo. Maria estava cheia do Espírito Santo e carregava em seu
ventre Aquele que aos trinta e três anos morreria pelos nossos
pecados.
João Batista mesmo antes de seu
nascimento alegra-se em Jesus Cristo e fez o mesmo durante o seu
ministério, como nos diz em Jo 3.29,30:
“Aquele que tem a esposa é
o esposo; mas o amigo do esposo, que lhe assiste e o ouve, alegra-se
muito com a voz do esposo. Assim, pois, já este meu gozo está
cumprido. É necessário que ele cresça e que eu diminua”.
Isso traz uma grande lição para
todos nós. Será que a nossa presença nos lugares em estamos, seja
em nosso lar, na escola, no trabalho ou quem sabe no laser têm feito
diferença nas pessoas? Será que as pessoas ao nosso redor conseguem
ver em nossas vidas o agir do Espírito Santo ou não estamos fazendo
diferença alguma onde estamos? Será que temos sido canal de bênçãos
sobre a vida das outras pessoas?
Qual tem sido o fruto dos nossos
lábios? A Bíblia fala que a boca fala do que está cheio o coração
(Mt 12.34). John Charles Ryle disse certa feita: “A alegria
compartilhada se multiplica. A tristeza se expande ao ser ocultada; a
alegria, ao ser repartida”.
2o
– A saudação de Isabel enfatiza o fruto do ventre de Maria (Lc
1.42b,43). Isabel
reconhece que aquela que estava diante dela tinha em seu ventre o
“Seu Senhor”. Há uma inversão de valores hoje em relação a
Maria. Entre os católicos ela têm sido adorada como uma
corredentora. Como intercessora e até como Rainha do Céu. No
entanto, Isabel reconhece Maria como uma mulher bendita entre as
mulheres, mas dá ênfase ao Filho de seu ventre.
Temos que tomar como exemplo essa
saudação de Isabel. Devemos honrar as pessoas com a honra devida,
mas somente adorar o Senhor Jesus. Uma pessoa pode ser muito
abençoadora e devemos honrá-la, mas devemos tomar muito cuidado
para não acharmos que tal pessoa tem algum poder especial dado por
Deus. No meio secular as pessoas têm o hábito de serem fãs de
certas celebridades e no meio evangélico isso não tem sido muito
diferente. Alguns anos atrás isso ocorreu com Paul Washer. Ele
repreendeu igreja que o aplaudiu!
3o
– Isabel reconhece que Maria é bem-aventurada pela confiança na
Palavra de Deus (Lc 1.45).
Isabel sabe que o fruto de seu corpo também será grande perante o
Senhor, porém ela reconhece com alegria que o fruto do ventre de
Maria precisa ser exaltado acima de todas as pessoas abençoadas. Por
essa razão, ela cumprimenta a mui ditosa mãe, Maria, como a mais
ditosa, isto é, a mais abençoada dentre todos os humanos. Isabel, a
venerável e idosa curva-se humildemente diante de seu Senhor. Não
apenas diante de seu Senhor, mas igualmente diante da mãe dele, essa
serva juvenil e humilde! Depreendemos isso das palavras: “E
de onde me provém que me venha visitar a mãe do meu Senhor?”
Com total ausência de inveja ela que, afinal, também é abençoada
consegue alegrar-se com aquela que foi abençoada com graça maior!
Cheia de bendita submissão, ela concede a honra a Maria, como se a
mãe de um rei tivesse chegado a um de seus mais ínfimos súditos.
“Bem-aventurada a que creu”,
continua Isabel. Essa é a primeira bem-aventurança do NT, raiz e
soma de todas as subsequentes. Ao que parece, Isabel pensa com dor na
incredulidade de seu marido, e como o Senhor o puniu por isso. Com
que diferença Zacarias havia entrado em casa naquela ocasião! Em
contrapartida, que saudação jovial Maria traz ao chegar agora até
ela, como uma criança feliz. Sim, bem-aventurado aquele que crê!
Essa é a norma, a constituição da nova aliança: “Quem crer será
bem-aventurado.”
Que grande lição para nós
temos aqui. Isabel louva a Deus pela bênção na vida de Maria e
glorifica a Deus por isso. Isabel não a inveja, mas exalta ao Senhor
por ver Maria abençoada, e ela mesma sabe que está abençoada
também. No entanto, quantas vezes as pessoas invejam umas as outras
por verem as outras pessoas abençoadas, mas não conseguem ver a
bênção sobre si mesmas. Há muitas pessoas como o salmista Asafe
(Sl 73). Asafe entrou no templo e teve os seus olhos abertos, mas
existem muitas pessoas em nosso meio que permanecem cegas.
Infelizmente.
CONCLUSÃO
Aprendemos nesse texto que
precisamos compartilhar as bênçãos recebidas com outras pessoas da
mesma fé. No momento que o Senhor nos comissiona para Sua obra,
precisamos estar na companhia de pessoas que pensem como nós, que
tenham a mesma alegria e disposição para o trabalho.
Estar com as pessoas erradas só
irão nos entristecer, ou até, quem sabe, nos enfraquecer na fé.
Por isso devemos saber com quem nós nos relacionamos. Com quem
compartilhamos os nossos sonhos e realizações. Nem todos entendem o
agir de Deus, até os que se encontram na comunidade da fé pensam
diferente, imagine fora do nosso arraial. Por isso, busque estar em
boas companhias. Gente que te aconselhe com conselhos de Deus. Gente
que vê a bênção sobre você e lhe incentive e não lhe inveje e
tente te enfraquecer na fé.
Tome cuidado com quem você anda.
Até o diabo se transforma em anjo de luz!
Pense nisso!
Bibliografia:
1 – Barclay, William.
Comentário do Novo Testamento, Lucas.
2 – Champlin, R. N. O Novo
Testamento Interpretado, versículo por versículo, volume 2, Lucas e
João. Editora Candeia, São Paulo, SP, 1995.
3 – Davidson, F. O Novo
Comentário da Bíblia, volume 2. Edições Vida Nova, São Paulo,
SP, 1987.
4 – Keener, Craig S. Comentário
Histórico-Cultural da Bíblia, Novo Testamento. Edições Vida Nova,
São Paulo, SP, 2017.
5 – Lopes, Hernandes Dias.
Lucas, Jesus, o homem perfeito. Comentário Expositivo Hagnos.
Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017.
6 – MacArthur, John. Comentário
do Novo Testamento, Lucas.
7 – Manual Bíblico SBB.
Barueri, SP, 3a edição, 2018.
8 – Morris, Leon L. Lucas,
Introdução e Comentário. Edições Vida Nova e Mundo Cristão, São
Paulo, SP, 1986.
9 – Rienecker, Fritz. Evangelho
de Lucas, Comentário Esperança. Editora Esperança, Curitiba, PR,
2005.
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