Por Pr Silas Figueira
Texto base: Lucas 14.1-6
INTRODUÇÃO
A frase “aconteceu num sábado”, indica um tempo indeterminado durante a jornada de Jesus a caminho de Jerusalém (Lc em 9.51-19.27). O local exato onde o incidente ocorreu não é certo, embora Jesus provavelmente estivesse na Perea. Estas festas no dia de sábado eram comuns, e Jesus foi convidado para várias delas. A única restrição feita nestas ocasiões era que a comida deveria ser preparada no dia anterior. [1] Esta refeição foi na casa de um dos chefes dos fariseus, possivelmente, o chefe da sinagoga local ou até mesmo um membro do Sinédrio. A refeição foi ao meio-dia de sábado, que teve lugar após a reunião da manhã na sinagoga. A adoração do sábado e a refeição do sábado são um reflexo uma da outra – momentos de receptividade descontraída, alegria, recebendo o que Deus generosamente dá na criação e na salvação, e agora compartilha dessa fartura uns com os outros na hospitalidade de uma refeição e de uma boa conversa. Somos criaturas necessitadas. Precisamos comer e beber, precisamos de abrigo e roupa. E Deus. Nenhum de nós é autossuficiente. [2]
Fritz Rienecker destaca
que para o banquete na casa do fariseu estavam convidados também outros
fariseus, que faziam parte da categoria dos rabinos. A formulação “os mestres
da lei e fariseus” (Lc 14.3) assinala que as pessoas ali presentes não devem
ser divididas em dois grupos, mas que elas eram ao mesmo tempo mestres da lei e
fariseus. Tal unificação de funções obviamente não ocorria sempre (cf. Lc
11.39,45). Os diálogos subsequentes permitem reconhecer que o grupo era
numeroso e formado por pessoas abastadas. [3]
Essa é a terceira e última
cura de Jesus no sábado (Lc 6.6; 13.10), e o último incidente no sábado em
Lucas (Lc 4.16-30,31-37; 6.1.1-5,6-11; 13.10-17). A intensidade com que os
fariseus se opõem a Jesus no sábado torna um convite para uma refeição no
sábado na casa de um fariseu algo um tanto surpreendente. [4]
Vejamos o que esse texto
tem a nos ensinar.
1 – UM CONVITE COM MÁS
INTENÇÕES (Lc 14.1).
Praticar a hospitalidade
no sábado era parte importante da vida dos judeus, de modo que não há nada de
estranho no convite que Jesus recebeu para uma refeição depois do culto semanal
na sinagoga. Com frequência, porém, esses convites eram um pretexto para que os
inimigos de Jesus o pudessem observar e encontrar alguma coisa nele para
criticar e condenar. Foi o que aconteceu na ocasião descrita em Lucas 14,
quando um dos líderes dos fariseus convidou Jesus para jantar. [5]
Com isso em mente,
podemos destacar algumas lições importantes.
1º - Em primeiro lugar, Jesus
não rejeita o convite do fariseu. O Filho do Homem veio
comendo e bebendo, conversando intimamente com todos os tipos de pessoas; não
rejeitando a companhia de publicanos, embora eles fossem de má fama. O Senhor
também não rejeitava os fariseus, embora eles o tratassem com má vontade, mas
aceitava os convites amistosos tanto de uns como dos outros, para que, se
possível, pudesse fazer o bem a ambos. [6] Por isso Jesus aceitou o
convite, para apresentar mais uma vez o evangelho para aqueles pecadores
religiosos que, desesperadamente, necessitavam de salvação. Homens cegos que
precisavam ver e entender a verdade que liberta. Jesus quando aceitou esse
convite demonstrou duas coisas: coragem e amor. Coragem para estar entre seus
inimigos e amor para com eles, levando sempre lições de vida que demonstra amor
aos seus inimigos, para que, de alguma forma, alcançar alguns (Mt 5.43-48).
Muitas vezes nós também
estaremos entre pessoas que são inimigas do Evangelho. Estaremos entre aqueles
que não desejam verdadeiramente a nossa companhia. No entanto, essa poderá ser
uma grande oportunidade de demonstramos o amor de Deus para com elas.
2º - Em segundo lugar, o
convite a Jesus era para observa-lo (Lc 14.1b).
Eles o estavam observando. Esta é a primeira pista que temos de que seu
anfitrião tinha um motivo secreto para convidá-lo, e explica porque um fariseu
de nível elevado convidaria Jesus para comer em sua companhia em tal ocasião. O
preconceito e o ódio dos membros daquele partido em relação a Jesus tinham
chegado a um ponto tão crítico, que procuravam a sua destruição. Esta é uma das
muitas ocasiões em que os fariseus agiam como hipócritas – sempre fingindo ser
amigos de Jesus para alcançar os seus objetivos malignos. Eles até mesmo
colaboraram com inimigos tradicionais durante as suas campanhas contra o
Senhor. [7]
“Observando...”
traduz a forma do verbo grego paratēreō, o que significa “observar
cuidadosamente”, “para estar à procura”, ou “prestar atenção a”. Mas nos
evangelhos a palavra assume um tom sinistro, e poderia ser traduzida, “espreitar”,
“espiar”, “prestar atenção para uma oportunidade com intenção maliciosa” (cf.
Lc 14.1; 20.20; Mc 3.2). Jesus foi convidado na esperança de apanhá-lo na quebra
da lei rabínica, principalmente porque eram rigorosas quanto o sábado.
Nós também temos sido
observados. Principalmente agora com o “novo normal”. As leis que estão sendo estabelecidas,
estão cada vez mais longe da Bíblia e seus princípios. Veja por exemplo a ideia
de que uma pessoa é o que pensa que é. Se um homem se vê como mulher ele é
mulher. Não está mais em discussão a genética, a ciência e outras coisas lógicas
da natureza humana. E dizem, que nós cristãos, temos que aceitar esse tipo de
coisa. O pior de tudo é que tem líderes (pastores) que aceitam tal loucura. Eu conheço
pessoas que se dizem cristãs que apoiam, sem nenhum pudor, o aborto. Acham que
é uma questão de saúde da mulher.
Por isso que estamos
sendo observados, criticados e hostilizados em muitos lugares. Estamos caminhando
para o fim dos tempos.
2 – JESUS CURA UM ENFERMO
NA CASA DO FARISEU (Lc 14.2-4).
Não sabemos se esse homem
hidrópico, estava diante de Jesus fortuitamente ou se havia sido “plantado” ali
pelos escribas e fariseus, como uma armadilha, para acusar Jesus. [8]
Charles L. Childers, no
entanto, é enfático ao dizer que este homem foi obviamente trazido pelo
anfitrião e seus comparsas como uma cilada para o Senhor. Sem qualquer
preparação ou apresentação, ele apareceu perante o Mestre. O fato de a presença
deste homem ser parte de uma trama contra Jesus está fortemente implícito na
“observação” por parte dos fariseus (2). Isto também é evidenciado pela
imediata defesa de Jesus da sua prática de curar no sábado (3-6). [9]
A palavra “hidrópico” só
aparece aqui no Novo Testamento. A hidropisia era caracterizada pelo excesso de
água nas cavidades e tecidos do corpo, sendo sintoma de alguma doença mais
grave, não indicada no texto. [10] Este é um termo médico, derivado do vocábulo
grego hidro que representa água. [11] Esse acúmulo anormal de
líquido não só é por si mesmo algo grave, é um sinal de uma enfermidade dos
rins, do fígado, do sangue e/ou do coração. Além disso, os rabinos tinham a
opinião de que a pessoa assim afetada havia cometido algum pecado muito grave.
[12]
Com isso em emente,
podemos destacar algumas lições.
1º - Em primeiro lugar, Jesus
faz uma pergunta embaraçosa (Lc 14.3). Jesus, conhecendo as
intenções maliciosas dos líderes religiosos postados à mesa, armados até os
dentes para acusá-lo no caso de alguma cura ao enfermo ali postado, antecipa o
problema e sai da posição de acuado para o ataque, perguntando aos seus
críticos: “É ou não é lícito curar no sábado?” Em outras palavras, é ou não é
lícito fazer o bem no sábado? Diante da pergunta contundente de Jesus,
guardaram silêncio e nada disseram. Eles, que pensaram em pegar Jesus na rede
de sua astúcia, foram apanhados pela armadilha de seu legalismo medonho. [13]
Embora,
de modo geral defendia-se que no sábado não era permitido curar caso não
existisse um real risco de vida. Os convidados presentes defendiam essa visão,
mas se negavam a afirmá-la abertamente. A pergunta do Senhor, formulada com
singela simplicidade, veracidade e amor, fez calar todos os adversários. O
silêncio dos hóspedes denota constrangimento ou falsidade odiosa e rancorosa (cf.
Mc 3.5). [14]
Como destaca James R. Edwards,
a regra geral que governava as atividades no sábado pertencia à necessidade:
se algo não pudesse ser adiado, então era permitido fazer no sábado; mas se
pudesse ser adiado até o fim do sábado, era proibido ser feito no sábado. Presumindo
que o inchaço do homem não colocava sua vida em risco, esse caso pertencia à
última categoria e, por isso, a cura no sábado seria proibida. [15]
Aqueles homens não tinham
nenhuma capacidade para diagnosticar a doença do hidrópico para dizer se era
grave ou não, se podia esperar mais algumas horas ou não. A insensibilidade deles
revelava a dureza dos seus corações. No entanto,
a perfeição do comportamento de nosso Senhor se manifestou nessa ocasião, assim
como em todas as outras. Ele sempre dizia a coisa certa, na ocasião oportuna e
da maneira correta. Nunca esquecia, por um momento sequer, quem Ele era e onde
se encontrava. [16]
2º - Em segundo lugar, Jesus
cura o enfermo (Lc 14.4). Diante do silêncio de seus
críticos, sabendo que já estavam derrotados pelo seu silêncio covarde, Jesus
cura o homem hidrópico e demonstra ao mesmo tempo seu poder e sua compaixão. O
sábado foi criado por Deus para o bem do homem, para fazer o bem e não o mal,
para trazer alívio e não fardo. Foi criado para que as obras de Deus sejam
realizadas na terra, e não para que o legalismo mortífero seja colocado como
jugo pesado sobre os homens. [17]
O homem hidrópico não era
um partidário daquela trama, mas um inocente sofredor que estava sendo usado
por aquele ardiloso anfitrião. O Mestre, sábio e bondoso como sempre, o curou e
o despediu. [18] A malignidade do coração daquela turba era tanta que foram
capazes de usar da desgraça de uma pessoa para terem do que acusar Jesus.
3 – JESUS FAZ UMA
PERGUNTA CONSTRANGEDORA (Lc 14.5,6).
Jesus fez duas perguntas
que deixaram seus adversários calados: “É lícito curar no sábado?
Eles,
porém, calaram-se” e “Qual será de vós o que, caindo-lhe
num poço, em dia de sábado, o jumento ou o boi, o não tire logo? E nada lhe podiam
replicar sobre isto”.
Jesus revelou a falsa
piedade dos escribas. Diziam defender as leis divinas do sábado, quando, na
verdade, abusavam do povo e acusavam o Salvador. Há grande diferença entre
guardar a verdade de Deus e promover a tradição dos homens. [19]
Com isso em mente podemos
destacar duas lições aqui.
1º - Em primeiro lugar, a
cura desse homem revelou a hipocrisia dos fariseus (Lc 14.5).
Jesus passou a justificar Sua ação por meio de apelar ao próprio procedimento
deles. [20] Na versão ARA traz “filho” ao invés de “jumento”. Já a versão ACF
traz “jumento” ao invés de “filho”.
O filho ou o jumento?
Encontram-se diferentes textos como variantes desse versículo, na tradição dos
manuscritos. Alguns deles dizem: “jumento e boi” (ou “boi e jumento”) ou
“ovelha e boi”. Tais variantes provavelmente se devem a Lc 13.15 (“boi e
jumento”) e à estranheza de ligar a palavra “filho” à palavra “boi”. Houvesse
Jesus dito “jumento ou boi” seu argumento implícito seria o seguinte: se vocês
estão muito preocupados em resgatar um animal mudo no dia de sábado, certamente
deveriam mostrar a mesma preocupação para com um ser humano, seu próximo.
Entretanto,
ao referir-se a um “filho” (que muito provavelmente é a palavra do original), o
argumento é ligeiramente diferente, expresso mais ou menos como segue: se você
está preocupado em salvar seu próprio filho (e até mesmo um boi) em dia de
sábado, é certo que nada há de errado em salvar uma pessoa. [21]
Fritz Rienecker destaca que
na expressão “filho” Jesus expressa sua profunda compaixão pelo enfermo,
ao contrário da impiedade dos fariseus. Por meio do primeiro exemplo Jesus
pergunta se um ato de amor para com um ser humano no sábado não seria tão
lícito quanto celebrar um banquete no sábado e ser convidado para ele como
hóspede. No entanto, os adversários consideravam justificado trabalhar no
sábado por motivação egoísta, a fim de salvar um dos animais domésticos mais
úteis. [22]
A incoerência deles era
gritante. Eles nem sequer permitiam que seus animais ficassem sem água no
sábado (Lc 13.15), por que, então, eles deveriam se opor a Jesus de chegar no
sábado para salvar um homem se afogando em seus próprios fluidos?
2º - Em segundo lugar, os
acusadores ficaram calados (Lc 14.6). Novamente silenciaram
diante da pergunta do Senhor, não porque se negassem a dar uma resposta, mas
porque não tinham como responder. O feito milagroso de Jesus e sua pergunta
tirada de um exemplo cotidiano deixaram embaraçados os inimigos. [23] Ora,
se a lei permitia socorrer um boi que caiu num buraco, por que a lei proibiria
socorrer um homem, criado à imagem e semelhança de Deus, caído no fosso da
enfermidade? Não valem os homens mais do que os animais? A isto nada puderam
responder (14.6). [24]
Cristo será sempre
justificado quando falar. E toda boca deve se calar diante dele. [25]
CONCLUSÃO
A cura desse homem nos
mostra o quanto o Senhor se preocupa com cada um de nós e sempre está pronto a
nos abençoar. Mesmo sabendo que aquele almoço era uma armadilha, o Senhor não
deixou de ir, para que o que ali foi ocorrido chegasse até nós hoje. Para que pudéssemos
desfrutar do Seu amor e de quanto Ele valoriza a cada um de nós.
Jesus mostra mais uma vez
que tem compromisso e coerência com as Escrituras e não com as tradições dos
homens. Que possamos olhar para esse texto e agir da mesma forma, ver o que é
prioridade no Reino e o que é secundário.
Pense nisso!
Bibliografia:
1 – Childers, Charles L.
Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006,
p. 445.
2 – Peterson, Eugene H. A
Linguagem de Deus, Ed. Mundo Cristão, São Paulo, SP, 2011, p. 91.
3 – Rienecker, Fritz. O
Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba,
PA, 2005. p. 304.
4 – Edwards, James R. O
Comentário de Lucas, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 528.
5 – Wiersbe, Warren W.
Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo
André, SP, 2007, p. 297.
7 – Childers, Charles L.
Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006,
p. 445.
8 – Neale, David A.
Lucas, 9 – 24, Novo Comentário Beacon, Ed. Central Gospel, Rio de Janeiro, RJ,
2015, p.151.
9 – Childers, Charles L.
Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006,
p. 445.
10 – Ash, Anthony Lee. O
Evangelho Segundo Lucas, Ed. Vida Cristã, São Paulo, SP, 1980, p. 229.
11 – Champlin, R. N. O
Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed.
Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 143.
12 – Hendriksen, William.
Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 254.
13 – Lopes, Hernandes
Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 441.
15 – Edwards, James R. O
Comentário de Lucas, Ed. Sheed, Santo Amaro, SP, 2019, p. 530.
16 – Ryle, J. C.
Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p.
248.
17 – Lopes, Hernandes
Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p.
441.
18 – Childers, Charles L.
Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006,
p. 445.
19 – Wiersbe, Warren W.
Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo
André, SP, 2007, p. 298.
20 – Morris, Leon L.
Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São
Paulo, SP, 1986, p. 217.
21 – Evans, Craig A. Novo
Comentário Bíblico Contemporâneo, Lucas, Ed. Vida, São Paulo, SP, 1996, p. 248.
22 – Rienecker, Fritz. O
Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba,
PA, 2005. p. 305.
23 – Ibidem, p. 305.
24 – Lopes, Hernandes
Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 442.
25 – Henry, Matthew.
Comentário Bíblico Novo Testamento Mateus a João, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ,
2008, p. 642.
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