domingo, 2 de abril de 2023

A AMEAÇA DE HERODES E O LAMENTO SOBRE JERUSALÉM - Lucas 13.31-35

Por Pr Silas Figueira

Texto base: Lucas 13.31-35

INTRODUÇÃO

Os atentados contra a vida de Jesus começaram muito antes do início do seu ministério público. Quando ele ainda era um bebê, Herodes, o Grande, patriarca da dinastia herodiana, governador da Judéia intentou matar Jesus quando Ele ainda era criança. Herodes era um sociopata cuja paranoia atingiu um clímax horrível quando, no final de seu reinado, chegaram do oriente uns magos declarando que o rei dos judeus havia nascido e que eles estavam procurando por Ele (Mt 2.1-12). Temendo um rival para o seu trono, Herodes informado, a partir dos líderes religiosos judeus que o Messias havia de nascer em Belém (Mq 5.2), mandou matar todos os meninos de dois anos para baixo de Belém (Mt 2.16-18). Agora, O filho de Herodes, o Grande, Herodes Antipas, que havia mandado matar João Batista, está intentando matar Jesus também. Este era o tetrarca que tinha sob sua jurisdição Galileia e Pereia, a mesma região por onde Jesus passara e continuava viajando. [1]

O que lemos nos mostra que o evangelista Lucas diz que naquela mesma hora, alguns fariseus vieram dizer a Jesus para sair da jurisdição do governo de Herodes, porque este queria matá-lo. Não sabemos se os fariseus estavam precisamente informando a intenção de Herodes ou se estavam inventando a história para forçar Jesus a sair daquela localidade. Duas coisas parecem estar claras na visão do que se sabe sobre Herodes e os fariseus. Em primeiro lugar, os fariseus eram hostis o bastante para se utilizar tanto da verdade como da falsidade contra Jesus, e de forma alguma iriam colaborar com um inimigo. Em segundo lugar, Herodes mostrou, ao assassinar João Batista, que era capaz de matar um líder religioso. Também era evidente que Herodes e os fariseus podiam estar esperando se beneficiar com o resultado de tal informação. [2]

Com isso em mente, podemos tirar algumas lições importantes para nós.

1 – ALIANÇAS FORAM FEITAS CONTRA JESUS (Lc 13.31).

Alguns acreditam que os fariseus estavam tentando alertar Jesus do perigo que corria, pois, assim como João fora morto por Herodes, Jesus corria risco de morrer também. Mas essa ideia não se sustenta devido ao ódio que os fariseus tinham de Jesus. Certamente, os fariseus não tinham nenhum apreço por Herodes. Entretanto, com o propósito de se oporem a Jesus, os fariseus se uniram a ele e seus seguidores (Mc 3.6). [3]

Há um ditado que diz: “Se não pode com ele, junte-se a ele”. Aqui, no entanto, esse ditado é ao inverso, se não se pode calar Jesus, junte-se aos seus inimigos para calá-lo. Ainda que esses inimigos sejam também seus inimigos. Como dizem: “inimigo do meu inimigo é meu amigo”.

Os fariseus tentaram calar Jesus de duas formas:

1º - Em primeiro lugar, tentaram intimidar Jesus. Uma vez que os fariseus não foram motivados pela preocupação com a segurança de Jesus, este aviso sugere que a sua intenção final era para matar Jesus, no entanto, o seu objetivo imediato era intimidá-lo e calar o Seu ensino.

Assim como tentaram calar Jesus muitas vezes, tentaram calar a Igreja no decorrer dos séculos, e estão tentando calar a igreja hoje. Alguns, para não serem perseguidos, estão maculando a mensagem da cruz para que ela fique mais palatável ao gosto dos ouvintes. São os falsos profetas que Jesus falou que viriam em seu nome (Mt 24,23,24).

2º - Em segundo lugar, estavam tentando levar Jesus para Jerusalém para mata-lo. O desejo de Herodes de que Jesus saísse de seu território e acelerasse a viagem para Jerusalém também correspondia ao interesse dos fariseus. Em Jerusalém eles podiam ter a esperança de que, com auxílio do Sinédrio, seria dado fim à atuação de Jesus. [4]

Tentaram calar a Igreja no decorrer dos séculos, mas como não conseguiram, com isso, começaram perseguir e a matar os cristãos (At 8.1-3, 9.1,2). Hoje, muitos dos nossos irmãos têm sido perseguidos e mortos em países comunistas como em países muçulmanos. A liberdade de expressão está cada vez mais restrita até mesmo em países livres. Expor as Escrituras está virando crime. Ainda podemos falar dentro de nossas igrejas, mas até quando isso vai durar?

2 – AS AUTORIDADES DESTA TERRA NÃO PODEM MUDAR A AGENDA DE JESUS (Lc 13.32,33).

Herodes é a única pessoa da qual há registro a quem Jesus tratou com desprezo. Jesus deixa claro que nem Herodes nem os fariseus mudariam sua agenda. Ele não estava fazendo sua obra na dependência dos poderosos deste mundo, mas cumprindo uma agenda eterna do Pai do céu. [5] David Neale diz que Herodes era uma figura patética e sem poder, que pensava que podia subverter o propósito divino da marcha de Jesus para Jerusalém. [6]

Podemos destacar algumas lições importante aqui.

1º - Em primeiro lugar, Jesus despreza as autoridades ímpias desta terra (Lc 13.32). Jesus responde à instrução dos fariseus “Retira-te daqui” com as palavras “Ide” e “Dizei a essa raposa!”. A raposa é emblema de ardil e de esperteza. [7] Charles L. Childers diz que Herodes era cruel e ousado, e seria mais esperado que fosse representado como um leão do que como uma raposa. Mas ele também era astuto e vil, e era este aspecto de sua personalidade que Jesus tinha em mente. Se, como sugerido acima, Herodes estivesse propositalmente enviando os fariseus até Jesus, com um aviso contra Ele, o motivo para a designação raposa estaria evidenciado. [8] Champlin destaca também que a raposa era uma metáfora comum entre os judeus e os gregos para indicar um homem astucioso; mas com frequência, na literatura rabínica, simplesmente significava um indivíduo destituído de importância, sendo usado como termo de menosprezo. [9]

O apóstolo Paulo escrevendo aos Romanos no capítulo 13.1-7 nos diz que devemos nos sujeitar as autoridades superiores. Com isso, devemos entender que o Senhor instituiu o governo, e não a anarquia. E este governo foi levantado para governar com justiça. Em outras palavras, é a autoridade de Deus que se exerce, quando a autoridade exerce sua autoridade a serviço do bem. Mas quando essa autoridade faz leis que burlam a Palavra de Deus, esta autoridade está a serviço de Satanás e não do Senhor.

Nós, como cristãos, não podemos nos sujeitar a nenhuma autoridade que apoia o aborto, o uso das drogas, o casamento homo afetivo, ou qualquer outra coisa que fere os princípios bíblicos. Nenhuma autoridade tem poder para alterar a agenda de Deus, que é a Sua Palavra. Jesus nos deixou o exemplo e os apóstolos o seguiram (At 5.29).

2º - Em segundo lugar, Jesus tinha uma agenda imutável (Lc 13.33). A resposta que Jesus manda transmitir a Herodes por meio dos fariseus atesta que ele realizará exorcismos e curas enquanto lhe aprouver e pelo tempo que Deus lhe determinar. Ele não se retiraria hoje, como eles pretendem, mas prosseguirá sua atividade pelo tempo necessário até que sua incumbência tenha sido concluída. Jesus cita apenas a atividade de cura, pois o governante não seria capaz de imaginar nada específico acerca da pregação. Herodes também deveria admitir por si mesmo que uma atuação tão benéfica não merece a morte ou o banimento. [10] Nem os fariseus nem Herodes determinam o destino de Jesus, mas este, em obediência à providência divina, determina o seu destino, seu objetivo. O verbo grego para “alcançar um objetivo”, teleioun, do qual deriva a palavra “teologia”, significa “cumprir ou completar um propósito pretendido”. [11]

Charles J. Ryle destaca que não havia chegado ainda o tempo para Jesus deixar o mundo. Sua obra ainda não estava concluída. Até que chegasse o momento específico, Herodes não teria poder para fazer-lhe qualquer mal. Até que a obra estivesse terminada, nenhuma arma forjada contra Ele prosperaria. [12] Jesus não vai alterar seus planos, nem se deixará intimidar. É preciso que prossiga seu caminho (é o sentido de hoje e amanhã), para que não suceda que morra um profeta – alguém que traz a mensagem de Deus para o seu povo – fora de Jerusalém. [13]

Assim é a Igreja. Os homens ímpios só tocam na Igreja se o Senhor permitir, fora isso, nenhuma arma forjada contra ela prosperará. Quando lemos o livro de Atos, vemos que, por permissão de Deus, Tiago foi decapitado, no entanto, Pedro foi solto milagrosamente da prisão (At 12.1-10; Ap 13.7).

3 – O LAMENTO SOBRE JERUSALÉM (Lc 13.34,35).

Aqui Jesus derrama a amarga agonia do amor rejeitado. A amargura da sua tristeza mostra que embora seu amor não tenha sido requisitado e sua oferta de ajuda não tenha sido aceita, o seu amor não mudou. Jerusalém está sem esperança não porque Cristo tenha ido embora, mas porque eles literalmente não desejaram, não tiveram vontade, não quiseram o que Ele oferecia. Deus não forçará ninguém a aceitar as suas bênçãos. [14]

Podemos destacar algumas verdades aqui.

1º - Em primeiro lugar, Jerusalém era uma cidade assassina (Lc 13.34a). De acordo com a santa ironia acerca de Jerusalém, que se tornou covil de assassinos de profetas, irrompe em Jesus o tom de lamentação de profunda dor. Sua consternação interior já fica clara pela duplicação do nome “Jerusalém”. [15] A Jerusalém que eles chamavam de santa, Jesus chama de assassina de profetas. A Jerusalém que eles exaltavam, Jesus diz que apedrejava os que a ela foram enviados. A Jerusalém que Jesus quis, tantas vezes, acolher sob suas asas, como uma galinha ajunta os seus pintinhos, essa o expulsou para fora de seus muros e o crucificou no topo do Calvário. [16]

Jesus sempre fará o diagnóstico correto do coração humano. Jesus não se deixa levar pelas aparências. Ele não vê como vê o homem. Ele esquadrinha os corações e seu julgamento e justo (Jr 17.9,10, Ap 3.17,18).

2º - Em segundo lugar, Jesus trata Jerusalém com ternura (Lc 13.34b). Há ternura na linguagem figurada da galinha e seus pintinhos. A responsabilidade dos judeus pela sorte deles é atribuída diretamente a eles mesmos com a expressão final, vós não o quisestes! [17] O lamento perturbador de Jesus a respeito de Jerusalém é o resultado de sua compaixão (“eu quis reunir os seus filhos”) sendo oposta por uma contracorrente obstinada de rejeição humana (“mas vocês não quiseram”). Muitas vezes Deus é tratado no Antigo Testamento como ave mãe protetora (Sl 17.8, 91.4; Is 31.5). [18]

O motivo pelo qual os pecadores não são protegidos e sustentados pelo Senhor Jesus – como os pintinhos o são pela galinha – é que eles não querem: Eu quis, eu quis frequentemente, e não quiseste. A boa vontade e a disposição de Cristo agravam a má vontade dos pecadores, deixando o seu sangue sobre as suas próprias cabeças. [19]

3º - Em terceiro lugar, uma profecia dramática (Lc 13.35). A partícula idou (eis) indica que o que se segue é surpreendente e chocante. Casa simboliza não só o templo, mas também Jerusalém e a nação como um todo. A rejeição do reino da graça implica a exclusão do reino da glória. Os judeus, tão arrogantes e soberbos ao rejeitarem a Cristo, o Messias, veriam sua casa ficar deserta. [20]

No entanto, Israel ainda tem um futuro. Virá o tempo em que o Messias voltará, será reconhecido e recebido pelo povo, que dirá: “Bendito o que vem em nome do Senhor” (Lc 13.35; ver também SI 118.26). Algumas pessoas usaram essas palavras na “entrada triunfal” de Jesus (Lc 19.38), mas elas só se cumprirão quando ele voltar em glória (ver Zc 12.10; 14:4ss; Mt 24.30,31). [21]

CONCLUSÃO

A agenda de Jesus não foi alterada mediante as ameaças de Herodes e nem dos líderes religiosos de Israel, e não será alterada hoje também devido a incredulidade do mundo ímpio e suas ameaças à Igreja. Assim como tentaram calar Jesus e o levaram a morte de cruz, o mundo ímpio tem tentado calar a Igreja através da perseguição e morte, mas o Coliseu não calou a Igreja, as perseguições no decorrer dos séculos não calaram a Igreja. Não conseguiram, porque a Igreja é a agência de Deus na terra. Nós não fazemos e falamos o que queremos, mas somos guiados pelo Espírito Santo. Somos guiados pela Palavra de Deus e caminharemos até o fim. Até a volta do Senhor em Glória!

Pense nisso!

Bibliografia

1 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 241.

2 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 443.

3 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 434.

4 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 301.

5 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 435.

6 – Neale, David A. Lucas, 9 – 24, Novo Comentário Beacon, Ed. Central Gospel, Rio de Janeiro, RJ, 2015, p. 147.

7 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 301.

8 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 443.

9 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 140.

10 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 301.

11 – Edwards, James A. O Comentário de Lucas, Ed. Shedd, Sto Amaro, SP, 2019, p. 518.

12 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 245.

13 – Evans, Craig A. Novo Comentário Bíblico Contemporâneo, Lucas, Ed. Vida, São Paulo, SP, 1996, p. 244.

14 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 444.

15 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 302.

16 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 436.

17 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 215.

18 – Edwards, James A. O Comentário de Lucas, Ed. Shedd, Sto Amaro, SP, 2019, p. 519.

19 – Henry, Matthew. Comentário Bíblico Novo Testamento Mateus a João, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2008, p. 640.

20 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 436.

21 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 296.

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