Pr Silas Figuiera
Texto básico: Lucas 11.5-13
INTRODUÇÃO
Jesus mostrou a seus discípulos o “Pai Nosso” como modelo de oração, que traz todas as coisas essenciais que devem ser pedidas a Deus. Depois desse ensinamento ele assegura o atendimento da oração. Essa confiança é fundamentada pelo Senhor: 1) através de um exemplo do dia-a-dia (v. 5-8); 2) com vistas à experiência diária (v. 9-10); 3) sobretudo considerando a misericórdia do Pai no céu (v. 11-13) [1].
A oração do “Pai Nosso”
é um modelo de oração, não uma reza a ser recitada. Longe disso. Através da
oração que Jesus deixou como modelo podemos ver que nela consiste a maturidade
de como devemos orar. Nela lemos que o que prevalece na oração é a vontade do
Pai: “Seja feita a tua vontade, assim na
terra como no céu” (v. 2). Entendendo que a vontade do Pai é pura, perfeita
e agradável (Rm 12.2), que Sua vontade soberana sempre irá prevalecer e nós nos
sujeitamos à ela.
Entender que Sua
vontade irá prevalecer é entender que Ele é eterno, onipotente, santo e imutável,
onisciente, onipresente, que levará a efeito o plano perfeito que Ele ordenou
desde o início. Isso mostra maturidade espiritual. Como disse Jó: “Bem sei eu que tudo podes, e que nenhum dos
teus propósitos pode ser impedido” (Jó 42.2). Assim, entendemos que a oração
não muda os planos de Deus, a oração confirma em nosso coração a Sua vontade,
que como já sabemos é pura, perfeita e agradável.
Mas se a oração não
muda a mente ou os planos de Deus, que proposito ela serve? Talvez você pergunte!
A oração é um meio que Deus ordenou para cumprir Seus propósitos: “A oração feita por um justo pode muito em
seus efeitos” (Tg 5.16), ou seja, Deus move o coração do crente a orar. Deus
muda as circunstâncias pela oração. A oração remove o sofrimento, mas também
nos dá poder para enfrentar os problemas e usá-los para cumprir os propósitos
de Deus.
É o próprio Deus que
nos leva a buscar a Sua face em meio as diversas ocasiões e crises que
enfrentamos. Vemos isso na história de Israel. Veja por exemplo Jr 29.11-13,
onde o Senhor diz para seu povo que estava no cativeiro babilônico que eles deveriam
crescer nessa cidade e depois de setenta anos eles iram orar, e o Senhor iria
lhes ouvir a oração e lhes libertar do cativeiro e leva-los de volta para
Jerusalém. O mesmo vemos em Dn 9 quando Daniel lê o profeta Jeremias e descobre
que o fim do cativeiro estava chegando. Devido a isso, ele ora confessando o
pecado do povo. Vemos o mesmo em Neemias capítulo primeiro, quando ele soube da
situação de miséria que se encontrava os judeus em Jerusalém, ele busca a face
do Senhor em oração e confissão de pecados e se propõe a ir a Jerusalém para
restaurar os seus muros. Esses são alguns exemplos de como o Senhor move o
coração do Seu povo a orar, interceder e agir.
No texto que lemos
vemos o Senhor Jesus ensinando os seus discípulos a serem perseverantes na
oração. Essa confiança está fundamentada em três pilares:
1
– ESSA CONFIANÇA ESTÁ FUNDAMENTADA NA INTEGRIDADE DE DEUS (Lc 11.5-8).
Para ilustrar sobre a
importância da perseverança na oração, Jesus lhes conta uma parábola. Mas para
entendermos essa parábola, devemos entender o contexto histórico da época.
O contexto histórico
– Viajar à noite na Palestina era comum por causa do intenso calor do dia, e
assim a chegada deste amigo à meia-noite não é de forma alguma algo incomum
[2]. Kenneth Bailey diz que o elemento essencial desta parte da parábola é que
o hospedeiro é hospedeiro da comunidade e não apenas do indivíduo. Este fato se
reflete até como que se cumprimentavam o hóspede. É-lhe dito: “você honrou a
nossa aldeia”, e nunca: “você me honrou”. Dessa forma a comunidade é
responsável por hospedá-lo. O hóspede deve sair da aldeia sentindo-se bem com a
hospedagem da mesma como comunidade [3]. Devido a isso, o hospedeiro poderia ir
de casa em casa pedindo emprestado, caso não tenha, a melhor toalha, jarro,
talheres, alimentos. E todos cederiam de bom grado. Se algum vizinho não
socorresse o amigo, ele ficaria mal visto da aldeia. Por isso que, mesmo
contragosto, este homem se levanta para socorrer o vizinho importuno. E não só
lhe dá três pães, mas muito mais do que necessitava (v. 8).
Com isso em mente,
podemos destacar três coisas importantes:
1º - O Pai não dorme.
O Pai não é um homem que se casa e procura dormir cedo. O salmista diz que “não tosquenejará nem dormirá o guarda de
Israel” (Sl 121.4). Por isso que a qualquer hora da noite ou do dia o
Senhor está pronto a nos atender.
2º - O Pai não é um
vizinho incomodado. O Senhor não se sente incomodado
com as nossos pedidos. Muito pelo contrário, Ele nos ensina que devemos ser
perseverantes na oração. Em Lucas 18.1 nos diz: “E contou-lhes também uma parábola sobre o dever de orar sempre, e
nunca desfalecer”.
3º - O Pai nos atende
de bom grado. Leon Morris diz não devemos brincar de
orar, mas, sim, devemos mostrar persistência se não recebemos a resposta
imediatamente. Não é que Deus não deseje atender e precisa ser pressionado para
dar uma resposta. O contexto inteiro deixa claro que está ansioso por dar. Mas
se não quisermos aquilo que estamos pedindo, suficientemente para sermos
persistentes, então não fazemos muita questão dele [4].
Wiersbe diz que a
persistência na oração não é uma tentativa de fazer Deus mudar de ideia (“Seja
feita a tua vontade”), mas sim de nos colocar numa posição em que ele nos
confie a resposta [5]. A oração nos prepara para recebermos a resposta de Deus.
Esta parábola nos
revela a natureza de Deus. Se um vizinho que põe tantos obstáculos para
socorrer o seu vizinho inoportuno, mas por ser um homem íntegro, lhe socorrerá,
muito mais o Pai que você busca em oração, por sua mais alta integridade e por
lhe amar, lhe responderá a qualquer hora. Este é o ensinamento desta parábola.
Deus é um Deus de honra, e por isso, seus filhos podem ter certeza absoluta de
que suas orações serão atendidas em tempo oportuno.
2
– ESSA CONFIANÇA ESTÁ FUNDAMENTADA NA PRONTIDÃO DE DEUS EM NOS OUVIR (Lc
11.9,10).
Jesus faz agora a
aplicação da parábola. Ele mostra que para recebermos algo da parte de Deus
devemos orar. Devemos agir como o homem
da parábola, que, mesmo sabendo que estava incomodando e recebendo um não à
princípio do seu vizinho, não deixou de insistir na busca do que necessitava.
Com isso, ele recebeu até mais do que buscava (v. 8, conf. Ef 3.20).
Podemos destacar algumas
lições importantes em relação a oração.
1º - Em primeiro lugar,
a ordem de Jesus para orarmos (Lc 11.9). Há uma
tríplice ordem aqui: pedi, buscai e batei. A oração tem a ver com humildade,
perseverança e ousadia. Os imperativos presentes “continue a pedir”, “continue
a buscar” e “continue a bater” indicam que a oração não é um ritual semipassivo
em que de vez em quando partilhamos nossos interesses com Deus. A oração exige
vigor e persistência [6].
John Stott diz que na
oração há muita coisa por detrás dela. Primeiro, oração pressupõe conhecimento.
Considerando que Deus só concede dádivas de acordo com a sua vontade, temos de
esmerar-nos em descobri-la – pela meditação nas Escrituras e pelo exercício da
mente cristã disciplinada nessa meditação. Segundo, oração pressupõe fé. Uma
coisa é conhecer a vontade de Deus; outra é nos humilharmos diante dele e
expressarmos a nossa confiança em que ele é capaz de executar a sua vontade. Terceiro,
oração pressupõe desejo. Podemos conhecer a vontade de Deus e crer que ele
pode executá-la, e ainda assim não desejá-la. A oração é o principal meio
ordenado por Deus para a expressão de nossos mais profundos desejos. Assim,
antes de pedir, precisamos saber o que pedir e se está de acordo com a vontade
de Deus; temos de crer que Deus pode concedê-lo; e precisamos genuinamente
desejar recebê-lo. Então, as graciosas promessas de Jesus se realizarão [7].
2º - Em segundo lugar,
a promessa a quem ora (Lc 11.9,10). Os tempos verbais desta
passagem são importantes: “Pedi (continuem pedindo), buscai (continuem
buscando), batei (continuem batendo)”. Em outras palavras, não procurem Deus só
quando surgem emergências no meio da noite, mantenham-se constantemente em
comunhão com o seu Pai [8]. Entendendo que não receberemos tudo o que pedirmos,
mas receberemos o que precisamos, e o que iremos receber é o melhor para nossas
vidas.
3
– ESSA CONFIANÇA ESTÁ FUNDAMENTADA NA MISERICÓRDIA DO PAI NO CÉU (Lc 11.11-13).
Jesus conclui esse
assunto mostrando o quanto o Pai é misericordioso. Ele faz uma comparação com o
pai humano, que é falho e mal, mas que entretanto, procura dar o melhor para os
filhos. Por isso devemos confiar que o Pai do céu nos dará sempre o melhor para
nós.
Observe que esta
parábola eleva o nível da discussão de amizade à paternidade; se uma pessoa
iria responder a um pedido ousado de um amigo, quanto mais seria um pai
responder aos seus filhos?
D. M. Lloyd-Jones diz
que em nossa insensatez, inclinamo-nos por pensar que Deus está contra nós,
quando algo de desagradável nos acontece. Entretanto, Deus é o nosso Pai; e, na
qualidade de nosso Pai, Ele jamais nos dará qualquer coisa que nos seja
prejudicial. Nunca; isso é simplesmente impossível [9].
Com isso em mente,
podemos destacar algumas lições importantes.
1º - Deus nunca erra
(Lc 11.11,12). Qual o pai que se um filho lhe pedir
um pão lhe dará uma pedra? E se lhe pedir um peixe lhe dará uma serpente? Ou se
lhe pedir um ovo lhe dará um escorpião? Isso é totalmente ilógico. Ora, se
mesmo um pai terreno, ainda que mau por natureza (SI 51.1-5; 130.3; Is 1.6; Jr
17.9; Jo 3.3, 5; Rm 3.10; Ef 2.1), providencia para seus filhos somente coisas boas,
e não coisas que venham a causar-lhes dano, quanto mais razão tem o Pai
celestial – literalmente, o Pai do céu –, que é isento de toda maldade e é, de
fato, a fonte de toda bondade, de dar ... o quê? [10]. Se aqui na terra o
pedido dos filhos já exerce grande poder sobre os pais, a oração dos filhos de
Deus move o coração do Pai no céu com muito mais intensidade [11].
Mas pode ser que por
uma distração o pai dê algo ao filho algo que lhe prejudique. Quantas vezes já
ouvimos de pais que esqueceram os filhos pequenos dentro do carro e foram
trabalhar? Vi um vídeo de uma mãe que foi levar o filho para a aula de violão e
esqueceu o filho em casa. Isso prova que somos falhos. Outras vezes procuramos
fazer o melhor para os nossos filhos e no entanto estamos lhes prejudicando...
somos falhos.
No entanto, Deus nunca
erra. Deus conhece a diferença que entre o bem e o mal, com uma profundidade
desconhecida por qualquer outro ser. O Pai jamais incorre em equívocos. Ele
jamais nos dará alguma coisa que possa a vir a prejudicar-nos [12].
2º - Deus sempre tem o
melhor para nós (Lc 11.13). Se, porém, os homens
maus não fazem danos aos seus filhos, mas, pelo contrário, lhes fazem bem,
quanto mais Deus fará bem aos Seus filhos? O bem que Deus fará não é deixado em
termos gerais: Dará o Espírito Santo. Lucas está interessado na obra do Espírito
Santo, e aqui vê o dom do Espírito como o sumo bem para o homem [13].
Esse é o único caso no
Evangelho de Lucas no qual a presença do Espírito Santo é descrita como comum
para a vida espiritual dos cristãos. A referência no contexto da história do
amigo importuno é uma exortação para a persistência na busca de uma vida cheia
do Espírito. E uma passagem na qual a busca pela santificação encontra uma
particular garantia das Escrituras. Somente aqui, nas tradições do Evangelho,
somos encorajados a buscar persistentemente o legado do Espírito Santo [14].
Para aqueles que pedem
um presente, Ele dá o doador; para aqueles que procuram a verdade Ele dá o
Espírito da verdade (Jo 16.13); para aqueles que procuram “amor, alegria, paz,
longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio” (Gl
5.22-23) Ele dá o produtor de todas essas coisas. Somos a habitação do Espírito
Santo (Rm 8.9,11; 1Cor 6.19; 2Tm 1.14), Ele é a fonte de todo o bem na vida do
cristão (Ef 3.20).
CONCLUSÃO
Ousemos entrar
confiantemente na presença do Senhor, pois teremos bons resultados em nossa oração.
O Senhor tem prazer em ter comunhão com Seus filhos. Ele é o bom Pai que nos dá
boas dádivas. Em Sua presença desfrutaremos as ricas bênçãos de Sua bondade e
experimentaremos a realidade de que Ele “é capaz de fazer muito mais
abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder que opera
em nós” (Ef. 3.20).
Ele não é um vizinho
insensível as nossas necessidades, mas um Pai amoroso pronto a nos socorrer em
tempo oportuno!
Pense nisso!
Bibliografia:
1 – Rienecker, Fritz. O
Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba,
PA, 2005. p. 164.
2 – Childers Charles L.
Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p.
417.
3 – Bailey, Kenneth E.
As Parábolas de Lucas, Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1985, p. 106.
4 – Morris, Leon L.
Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São
Paulo, SP, 1986, p. 185.
5 – Wiersbe, Warren W.
Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo
André, SP, 2007, p. 279.
6 – Lopes, Hernandes
Dias. Mateus, Jesus, o Rei dos reis, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2019, p. 239.
7 – Stott, John R. W.
Contracultura Cristã, A mensagem do Sermão do Monte, Ed. ABU, São Paulo, SP,
1981, p. 88.
8 – Wiersbe, Warren W.
Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo
André, SP, 2007, p. 280.
9 – Lloyd-Jones, D. M.
Estudo no Sermão do Monte, Ed. Fiel, São Paulo, SP, 1984, p. 481.
10 – Hendriksen,
William. Lucas, vol. 2, São Paulo, SP, Ed. Cultura Cristã, 2003, p. 116.
11 – Rienecker, Fritz.
O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba,
PA, 2005. p. 166.
12 – Lloyd-Jones, D. M.
Estudo no Sermão do Monte, Ed. Fiel, São Paulo, SP, 1984, p. 481.
13 – Morris, Leon L.
Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São
Paulo, SP, 1986, p. 185.
14 – Neale, David A.
Lucas, 9 – 24, Novo Comentário Beacon, Ed. Central Gospel, Rio de Janeiro, RJ,
2015, p. 100.
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