sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

A re-humanização da humanidade


Por Joe Holland 

Em dezembro de 2013, presenciamos dois eventos de enorme impacto – o primeiro foi o aniversário do tiroteio de Sandy Hook e o segundo, a morte de Nelson Mandela. Ambos eventos, posicionados em um contexto de morte, são opostos um ao outro. Um foi uma triste memória de um mundo quebrado pela doença mental e violência. O outro foi o reconhecimento de uma vida em prol da dignidade humana. E é nessa tensão entre a dignidade e a fragilidade que todo humano nesse planeta vive, tentando encontrar um sentido em tudo isso.

Que é o Homem?

O salmo 8 representa uma ilha de esperança no Velho Testamento e atesta essa tensão tão real. É uma canção de Davi em que o autor reflete acerca da dignidade humana em face da fragilidade da humanidade. Os versos 4 a 8 dizem:

“Que é o homem, que dele te lembres e o filho do homem, que o visites? Fizeste-o, no entanto, por um pouco, menor do que Deus e de glória e de honra o coroaste. Deste-lhe domínio sobre as obras da tua mão e sob seus pés tudo lhe puseste: ovelhas e bois, todos, e também os animais do campo; as aves do céu, e os peixes do mar, e tudo o que percorre as sendas dos mares”.

Note algumas coisas que esse Salmo ensina:

Apesar da fragilidade do homem e seu tamanho minúsculo se comparado aos pores do sol e extensões das montanhas, Deus o deu dignidade. Deus está atento ao homem.

Sobre todas as criaturas, Deus escolheu o homem para carregar a imago dei, a imagem de Deus. O Senhor coroou o homem com glória e com honra.

O homem foi designado por Deus para administrar a criação. O propósito de Deus para a criação foi de que todas as coisas estariam submetidas à humanidade.

Essas são três promessas maravilhosas sobre a capacidade e o plano para a humanidade. Mas, ao olharmos para o mundo e para a história humana, encontramos essas três coisas se concretizando?

Um investigação CSI: Mundo

Ao consideramos a humanidade no laboratório forense de nossos corações e mentes, encontramos uma história bem diferente acontecendo. Apesar das promessas de dignidade, a fragilidade parece constantemente ganhar o dia. Tentações abundam. O pecado flui excessivamente. As notícias nos apontam repetitivamente para assassinatos e corrupção, enquanto nossas vidas diárias produzem montanhas de descontentamento, desapontamento e descrença. Por favor, note que eu não estou pretendendo ser macabro. Estou, entretanto, procurando o realismo que apenas o Cristianismo pode dar. O autor de Hebreus segue essa linha de pensamento em Hebreus 2.8, em que considera o salmo 8 e diz:

“Todas as coisas sujeitaste debaixo dos seus pés. Ora, desde que lhe sujeitou todas as coisas, nada deixou fora do seu domínio. Agora, porém, ainda não vemos todas as coisas a ele sujeitas”

O autor de Hebreus obviamente tinha uma propensão para o eufemismo. Nós ainda não vimos nenhum homem como um mordomo totalmente livre dominando sobre a criação como um representante da imago de Deus. Na verdade, vemos o oposto. Pecamos, e o pecado facilmente nos envolve (Hb 12.1). O que queremos fazer além da nossa capacidade e as coisas que odiamos por muitas vezes aparecem como nossa experiência habitual (Rm 7). Nos encontramos ansiando sem resposta por uma dignidade definitiva e pela liberdade da fragilidade. Mas a intenção de Deus nunca foi para que o homem caído retirasse a si mesmo de sua própria corrupção. Dignidade e fragilidade encontrariam reconciliação de outra forma bem mais radical e custosa.

Nós vemos Jesus

O autor de Hebreus leva seu processo de pensamento teológico a uma conclusão ao nos dizer que, como não vemos a mudança que procuramos em nossas próprias vidas, vemos sim a Ele:

“Vemos, todavia, aquele que, por um pouco, tendo sido feito menor que os anjos, Jesus, por causa do sofrimento da morte, foi coroado de glória e de honra, para que, pela graça de Deus, provasse a morte por todo homem” (Hb 2.9).

Deus soluciona a tensão do salmo 8 de uma forma totalmente inesperada. O Deus da criação reconcilia a dignidade e fragilidade humanas na encarnação de seu filho, Jesus Cristo. Na edição do “Comentário do uso do Novo Testamento no Velho Testamento” de DA Carson e GK Beale, lemos:

“Cristo, então, em sua solidariedade para com os seres humanos, foi capaz de trazer a realização completa da intenção do salmo… Ao adicionar humanidade à sua deidade através da encarnação, Cristo se juntou a nós em nossa fragilidade, nossa pequenez frente ao escopo da vasta criação. Ele se moveu de sua atmosfera pré-encarnada de poder e autoridade que empunha ao criar o mundo e assumiu um lugar menor na ordem criada. A fragilidade consequente desse movimento foi finalizada na morte do Filho por todos (Hb 2:8-9). Ainda assim, por causa do sofrimento e da morte, ele foi “coroado em glória e honra”, nas palavras do salmo. A dignidade dos humanos, garantida a Adão em seu lugar no mundo, vem ao completo cumprimento e expressão no Filho enquanto ele é feito Senhor de todas as coisas, todas as coisas sendo colocadas debaixo de seus pés”.

Jesus, como verdadeiramente Deus e homem, é também verdadeiramente digno e frágil. Ele é tanto Deus quando a imago de Deus. Ao provar a morte por aqueles que colocariam a sua fé nele, ele traça um caminho para que pecadores façam parte da intenção original de Deus para a humanidade, conforme expressa no salmo 8. Se a queda de Adão é o grande evento desumanizador na história humana, então, a encarnação do segundo Adão e sua subsequente morte e ressurreição é o re-humanizador daqueles que encontram salvação nele.

O que fazer

1. Admita a fragilidade da experiência humana. Discussões próximas ao Natal são um bom momento para se conectar com as vidas machucadas e quebradas a nossa volta. Apesar da sua aparência comemorativa, feriados festivos são algumas das épocas mais penosas para um grande segmento da nossa sociedade. A maioria das pessoas está procurando desesperadamente por alguém com quem passa ser transparente acerca de suas dificuldades. O cristianismo nos permite dizer francamente: “as coisas (ainda) não estão da maneira como deveriam ser”.

2. Admita o que você vê quando você se olha. Como o autor de Hebreus diz, se estivéssemos trabalhando com evidências forenses, ao olharmos para nós mesmos, não veríamos a dignidade que desejamos. Não vemos a mudança pela qual oramos. Certamente, pela providência e ao longo do tempo, nós experimentamos a santificação da graça de Deus. Mas, quando olhamos para nós mesmo, sempre percebemos uma falta.

3. Olhe para Jesus. Esse é o maior ponto do autor de Hebreus. Pare de olhar para si mesmo para completar o que diz o salmo 8. Deus queria que Jesus fizesse isso. Apenas ele, em sua encarnação, abarca os requisitos necessários para se alcançar a salvação. Apenas ele, em sua fragilidade, pôde testar a morte e apenas ele foi digno de conquistá-la.

4. Viva dessa verdade. Se nós podemos, pela graça de Deus, começar a olhar menos para nós mesmos e mais para Jesus, então começaremos a mudar. Começamos a viver uma vida conforme o evangelho (Gálatas 2.14) ao sermos transformados na imagem daquele homem coroado com glória e honra, ainda Jesus (2 Co 3.18).

Fonte: Reforma 21

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