Por Pr Silas Figueira
Texto base: Lucas 14.7-14
INTRODUÇÃO
O episódio da cura do
homem hidrópico aconteceu imediatamente depois da chegada dos convidados, antes
que tivessem ocupado os seus lugares à mesa. Assim que o homem curado deixou a
casa e o Mestre silenciou os seus críticos, os convidados escolheram os seus
lugares. O egoísmo deles imediatamente mostrou como cada um – como crianças
indisciplinadas – tentava conseguir os lugares de maior honra. [1] Diante dessa
cena, o Senhor começou a observar a atitude desses fariseus, ou seja, assim
como os fariseus examinavam e observavam o Senhor detidamente ao entrar na
casa, para ver se ele diria ou faria algo que não era lícito no sábado, Jesus
dirigiu seu olhar aos convidados, vendo como escolhiam os primeiros lugares.
Esse comportamento dos convivas então motivou Jesus a ilustrar uma verdade
superior e mais importante mediante uma figura. Suas palavras de forma alguma
contêm mero bom senso. A ilustração utilizada aqui não é extraída de um
banquete, mas do convite para uma festa nupcial, porque essa solenidade traz
consigo uma classificação da importância dos convidados. [2]
As mesas naquela época
eram, geralmente, arrumadas nessas ocasiões em forma de U ou um arranjo de
mesas separadas no meio da sala. Na cabeceira ficava o anfitrião, em cada lado
dele, os dois convidados mais honrados, e abaixo dos lados os restantes dos
convidados. Quando os convidados entraram para esta refeição, houve uma
precipitação para escolher os lugares de honra à mesa, os mais próximos ao
hospedeiro. Foi diante desse quadro que o Senhor Jesus então proferiu está
parábola.
Diante desse quadro, podemos
tirar algumas lições.
1 – UMA LIÇÃO À HUMILDADE
(Lc 14.7-11).
Jesus conta uma parábola
para ensinar o princípio demonstrado no versículo 11: “Porquanto qualquer
que a si mesmo se exaltar será humilhado, e aquele que a si mesmo se humilhar
será exaltado”. O que estava sendo ensinado aqui era uma lição sobre a humildade,
e não simplesmente regras para serem observadas nesses encontros sociais [3].
Podemos destacar três princípios
aqui:
1º - Em primeiro lugar,
nem todos que pensam que tem honra, são honrados (Lc 14.8,9).
Muitos daqueles homens que estavam naquele banquete pensavam que eram mais
honrados que os outros homens, mas o único que merecia o lugar de honra era o
Senhor Jesus. Somente Ele tinha honra naquele lugar. No entanto, aos olhos dos
fariseus e doutores da Lei, Jesus era o único que não tinha honra alguma.
Hoje não está diferente
daquela época. Muitas pessoas pensam que merecem lugar de honra, no entanto não
tem honra alguma. Algumas pessoas pensam que pôr terem algum “título” são mais
honradas que outras pessoas. Muitos destes podem até ter o título de doutor,
juiz, ministro, pastor..., mas quantos destes desonram o título que tem. São
uma desonra para a sociedade. São uma vergonha para o título que carregam.
Deus não se impressiona
com nosso status na sociedade nem na igreja. Não é influenciado pelo que dizem
ou pensam a nosso respeito, pois vê o que há por trás das motivações de nosso
coração (1Sm 16.7). Deus continua a humilhar os arrogantes e a exaltar os
humildes (Tg 4.6) [4].
2º - Em segundo lugar, devemos
aprender o valor da humildade (Lc 14.10). Jesus, para ilustrar
esse ensinamento, conta a parábola de uma festa de casamento, porque essa
solenidade traz consigo uma classificação da importância dos convidados. No entanto,
em vez de o convidado chegar à festa e imediatamente ocupar os primeiros
lugares, deve procurar os últimos lugares. Pois é um grande constrangimento ser
solicitado para sair de um lugar de honra a fim de dar a vez a outro convidado
mais digno. Porém, é uma grande honra estar assentado nos últimos lugares e ser
convidado pelo dono da festa a ocupar lugar de maior destaque [5]. No
entanto, a intenção de Jesus é muito maior do que dar meros conselhos de bom
comportamento nos banquetes. A vista do significado da parábola da grande ceia,
que vem a seguir, nos vv. 15-24, parece-nos razoável que interpretemos a festa
de casamento como referência velada ao banquete no reino, no final dos tempos
[6].
John C. Ryle diz que a
humildade pode ser chamada de a rainha de todas as virtudes [7].
Observe a expressão “Amigo...”.
Não se trata da mesma palavra grega que figura em Mt 20.13; 22.12; 26.50, mas
aquela usada em João 11.11, acerca de Lázaro, o amigo de Jesus que morreu, e em
João 15.14, acerca dos discípulos de Jesus, aos quais ele começou a chamar de “amigos”
em determinado instante. O vocábulo implica em um afeto de grande amizade. O hospede
humilde como que cruza os olhos com o seu anfitrião e é convidado a uma posição
mais elevada, ao mesmo tempo que a amizade do dono da casa por ele pelo menos
aumenta um pouco mais. E assim o convidado humilde é elevado não apenas a uma
posição mais próxima do dono da casa, mas também na estima dele. Aqui vemos,
igualmente, uma lição concernente a nossa humildade diante de Deus, pois a
promessa que ele faz é que exaltará aos humildes e humilhará aos soberbos. Veja
essa lição ensinada no trecho de 1Pe 5.5,6 [8].
O que Jesus estava
dizendo é quase uma repetição do que há tanto tempo é ensinado em Provérbios
25.6,7 (NVI): “Não se engrandeça na presença do rei e não reivindique lugar
entre os homens importantes; é melhor que o rei lhe diga: Suba para cá!, do que
ter de humilhá-lo diante de uma autoridade” [9].
Como nos diz Paulo em sua
carta aos Filipenses 2.3: “Nada façais por contenda ou por vanglória, mas
por humildade; cada um considere os outros superiores a si mesmo”.
A humildade é a virtude
que tem sido a característica distintiva no caráter dos cristãos mais piedosos
em todas as épocas [10].
3º - Em terceiro lugar,
os que se exaltam serão humilhados (Lc 14.11). Essa parábola
mostra que a humildade é a antessala da honra, mas a soberba é a plataforma da
vergonha. Quem se humilha é exaltado; quem se exalta é humilhado [11]. A
atitude humilde não apenas evita o risco da humilhação, mas é sempre o caminho
da exaltação [12].
Os rabinos contavam uma
parábola semelhante a esta: “Três homens foram convidados para um banquete. Um
sentou-se no lugar mais alto, dizendo, eu sou um príncipe. Outro se sentou a
seu lado dizendo: eu sou um homem sábio. O outro no lugar mais baixo, dizendo, eu
sou um homem humilde. O rei colocou o homem humilde assentado no lugar mais
alto, e colocou o príncipe no lugar mais baixo” [13].
John C. Ryle é enfático
ao dizer que o conhecimento correto é a raiz e a fonte da humildade. O homem
que conhece a si mesmo e ao seu próprio coração, conhece a Deus e sua majestade
e santidade infinitas, conhece a Cristo e o preço que Ele pagou por nossa
redenção – tal homem jamais será orgulhoso. Assim como Jacó, haverá de
considerar-se “indigno de todas as misericórdias” de Deus (Gn 32.10). A semelhança
de Jó, dirá a respeito de si mesmo: “Sou indigno” (Jó 40.4). Clamará, assim
como o apóstolo Paulo: “Eu sou o principal dos pecadores” (1Tm 1.15). Não
achará nada bom em si mesmo. Em humildade de espírito, julgará os outros
melhores do que ele mesmo (Fp 2.3). Ignorância, nada menos do que ignorância –
ignorância acerca de si mesmo, de Deus e de Cristo — é o verdadeiro segredo do orgulho
[14].
2 – A NECESSIDADE DA
MOTIVAÇÃO CERTA (Lc 14.12-14).
Assim como faz parte da
natureza humana buscar posições de honra, assim também é de a tendência humana
fazer coisas boas para os amigos (ou para as pessoas que, assim o esperamos,
venham a tornar-se nossos amigos), pois antecipamos que nos retribuam nossos
favores. Jesus adverte ao que o tinha convidado: a bondade demonstrada aos que
vão retribuir com bondade não impressiona a Deus [15].
Com isso em mente,
podemos destacar algumas lições.
1º - Em primeiro lugar,
Jesus
não está criticando o anfitrião por convidar os seus amigos para um banquete,
mas a motivação desse convite (Lc 14.12). Jesus sabia que o
anfitrião havia convidado os presentes por dois motivos: (1) para retribuir
convites anteriores; e (2) para que ficassem em dívida com ele e continuassem a
convidá-lo para outros banquetes. Esse tipo de hospitalidade não é uma
expressão de amor e graça, mas sim uma demonstração de orgulho e de egoísmo.
Estava “comprando” o reconhecimento dos convidados [16].
Há muitos que expressam a
sua vaidade num banquete, em vez de demonstrar sua generosidade. Ressaltam sua
grandeza, em vez de demonstrar sua compaixão. Fazem propaganda de sua riqueza,
em vez de revelar sua bondade. Convidam pessoas ricas para receber em troca
redobrada recompensa, em vez de expressarem amor aos que não têm com o que
retribuir [17].
Vou lhe dar um exemplo. Uma
vez eu fui a um congresso de um determinado pastor. Esse congresso durava certa
de três dias. Ficamos hospedados no hotel em que seria o congresso. Vários pastores
convidados, além dos cantores e bandas. Mas o que eu descobri nesse congresso, era
que cada pregador ali convidado tinha que convidar o líder do congresso posteriomente,
dando oferta, acomodações e despesa paga na mesma proporção que cada um recebia.
Mas quem pagava a conta era a igreja. Fizeram daquele congresso, e de outros
congressos, um comércio que beneficiava grandemente o pastor convidado.
2º - Em segundo lugar, a
bem-aventurança em convidar quem não pode retribuir (Lc 14.13,14).
Primeiramente devemos destacar que Jesus não está ensinando que a salvação é
mediante as obras de caridade. Longe disso. Jesus nunca ensinou tal coisa. Somos
salvos mediante a graça e não mediante obras. Outro detalhe que precisamos
destacar, é que o bem que fazemos, seremos recompensados por Deus, e não necessariamente
por quem fizemos o bem. Como lemos em Atos 10.1-4: “E havia em Cesareia um
homem por nome Cornélio, centurião da coorte chamada italiana, piedoso e
temente a Deus, com toda a sua casa, o qual fazia muitas esmolas ao povo, e de
contínuo orava a Deus. Este, quase à hora nona do dia, viu claramente numa
visão um anjo de Deus, que se dirigia para ele e dizia: Cornélio. O qual,
fixando os olhos nele, e muito atemorizado, disse: Que é, Senhor? E disse-lhe: As
tuas orações e as tuas esmolas têm subido para memória diante de Deus”.
Um indivíduo é
bem-aventurado quando age motivado por pura graça, sem qualquer pensamento e
nem possibilidade de ser recompensado por isso, porquanto, ao assim agir, está no
processo de tornar-se mais parecido com Deus Pai e com Deus Filho [18].
Os israelitas eram obrigados,
pela lei de Moisés, a incluir os pobres, os estrangeiros, os órfãos, e as
viúvas em suas festas (Dt 14.28-29; 16.11; 26.11-13). A menção que Jesus faz
aqui em relação aos mandamentos de Deus a Moisés relembra a ênfase dada aos
deficientes físicos – os aleijados, os mancos, os cegos. Visto que o motivo
desta prática de ajudar sem egoísmo é o amor, e que não há chance de recompensa
terrena, recompensado serás na ressurreição dos justos [19].
Como disse Paulo: “Mais
bem-aventurada coisa é dar do que receber” (At 20.35).
3º - Em terceiro lugar, a
importância de pensar sobre a ressurreição dos mortos (Lc 14.14).
Haverá uma ressurreição após a morte. Isto jamais deve ser esquecido. A vida
que temos neste corpo não é tudo. O mundo visível que nos cerca não é o único
com o qual temos de lidar. Tudo não está acabado quando o último suspiro é dado
e homens e mulheres são levados à sua residência no sepulcro. Um dia a trombeta
soará, e os mortos ressurgirão incorruptíveis. Todos os que se encontram no
sepulcro ouvirão a voz de Cristo e sairão: aqueles que tiverem feito o bem
ressurgirão para a ressurreição da vida, e os que tiverem feito o mal, para a
ressurreição da condenação. Essa é uma das grandes verdades fundamentais do cristianismo.
Apeguemo-nos com firmeza a essa verdade e dela jamais nos afastemos [20].
CONCLUSÃO
Esse conselho teria
ressoado com muita estranheza aos ouvidos de muitos dos contemporâneos de
Jesus. Segundo o modo errado de aquelas pessoas pensarem, os pobres, os
aleijados, os mancos e os cegos são pessoas a quem Deus negou suas bênçãos. Com
toda a probabilidade, julgava-se que suas aflições eram resultantes do pecado.
Tais pessoas, ao lado dos gentios, seriam as últimas a ter entrada no reino de
Deus. Por que então alguém haveria de convidar essa gente para uma festa? Comer
ao lado de tais pessoas resultaria em o judeu tornar-se cerimonialmente imundo.
Portanto, o israelita piedoso procuraria naturalmente manter companhia com
pessoas de mesma piedade. No entanto, Jesus não compartilha esse ponto de vista
estreito, corroído de auto retidão. Sua proclamação das Boas-Novas declara que
até mesmo os humildes e os desprezados devem ser incluídos no reino de Deus. Em
nenhuma outra passagem essa ideia é vista com maior intensidade do que na
parábola que se segue [21].
Ao olharmos para esta
parábola observamos as prioridades do Reino de Deus, que é totalmente contrária
as nossas prioridades. Se dissermos que não nos identificamos com o anfitrião e
com os fariseus dessa história mentimos. Com certeza, a nossa identificação com
os ensinamentos de Jesus é uma lição incômoda para todos nós. Mas é um alerta
para sermos menos egoístas e sermos mais altruístas. Não para sermos vistos pelos
homens, mas para sermos vistos e recompensados por Deus.
Pense nisso!
Bibliografia
2 – Rienecker, Fritz. O
Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba,
PA, 2005. p. 306.
3 – Champlin, R. N. O Novo
Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos,
São Paulo, SP, 2005, p. 144.
4 – Wiersbe, Warren W.
Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo
André, SP, 2007, p. 298.
5 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito,
Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 442.
6 – Evans, Craig A. O
Novo Comentário Bíblico Contemporâneo, Lucas, Ed. Vida, São Paulo, SP, 1996, p.
252.
7 – Ryle, J. C. Meditações
no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 251.
8 – Champlin, R. N. O
Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed.
Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 144.
9 – Hendriksen, William.
Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 258.
10 – Ryle, J. C.
Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p.
251.
11 – Lopes, Hernandes
Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p.
442.
12 – Childers, Charles L.
Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006,
p. 446.
13 – Henry, Matthew.
Comentário Bíblico Novo Testamento Mateus a João, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ,
2008, p. 642.
14 – Ryle,
J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP,
2002, p. 251.
15 – Evans, Craig A. O
Novo Comentário Bíblico Contemporâneo, Lucas, Ed. Vida, São Paulo, SP, 1996, p.
252.
16 – Wiersbe, Warren W.
Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo
André, SP, 2007, p. 299.
17 – Lopes, Hernandes
Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p.
443.
18 – Champlin, R. N. O
Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed.
Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 145.
19 – Childers, Charles L.
Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006,
p. 447.
20 – Ryle, J. C.
Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p.
252.
21 – Evans, Craig A. O Novo
Comentário Bíblico Contemporâneo, Lucas, Ed. Vida, São Paulo, SP, 1996, p. 253.
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