sábado, 16 de novembro de 2024

JESUS E AS CRIANÇAS - Lucas 18.15-17

Por Pr Silas Figueira

Texto base: Lucas 18.15-17

INTRODUÇÃO

Jesus, após a sua ressurreição, disse para Pedro quando o confrontou no mar de Tiberíades: “Apascenta os meus cordeiros” (Jo 21.15). Os cordeiros são os mais novos do rebanho. Os cordeiros aqui não são somente crianças, mas os novos na fé. Por isso, devemos cuidar de modo especial daqueles que são novos na graça. Podem ser velhos em anos, mas ainda assim serem bebês na graça quanto à idade de sua vida espiritual, e por isso precisarem da tutela de um bom pastor.

No entanto, o texto que lemos não está falando de pessoas novas na fé, mas de crianças. Crianças (brephos), uma palavra antiga que significa “bebês”. Em Marcos 10.13 e Mateus 19.13 trazem (paida, podem ter entre 8 dias e 12 anos) “criancinhas”. [1] Só compreenderemos a beleza desta passagem ao observar quando esse fato aconteceu. Jesus estava indo para Jerusalém. Ele marchava para a cruz. Foi nessa caminhada dramática, dolorosa, que ele encontrou tempo em sua agenda e espaço em seu coração para acolher as crianças, orar por elas e abençoá-las. [2]

James R. Edwards destaca que no judaísmo, as mulheres e as crianças derivavam sua posição na sociedade principalmente em relação aos adultos do sexo masculino. Os filhos, é claro, eram considerados uma bênção de Deus, mas em grande parte porque eles garantiam a continuidade da família por mais uma geração. A “infância”, em geral, era um intervalo inevitável e não uma celebração até o jovem amadurecer o bastante para ter filhos e contribuir com a força de trabalho. É vã a busca na literatura da Antiguidade por simpatia pelos jovens comparável com a demonstrada por Jesus. [3]

Com isso em mente, podemos destacar algumas lições sobre este assunto.

 1 – OS PAIS DEVEM SE PREOCUPAR EM LEVAR SEUS FILHOS À CRISTO (Lc 18.15).

Era costume os pais levarem os filhos para serem abençoados pelos rabinos, de modo que não causa surpresa terem levado os pequeninos até Jesus. Algumas dessas crianças ainda eram de colo (Lc 18.15), outras já sabiam andar; Jesus recebeu todas de braços abertos. [4] Lucas chama essas criancinhas, que lhe eram trazidas, de “lactentes”. [5]

Mas esse versículo destaca dois grupos.

Em primeiro lugar, vemos os que os que levam as crianças a Jesus (Lc 18.15a). William Hendriksen destaca que presumivelmente, essas crianças eram levadas por seus pais ou outros parentes íntimos, talvez até mesmo crianças maiores. O propósito era que Jesus “tocasse” os pequeninos, isto é, que impusesse suas mãos sobre eles enquanto rogava ao Pai que os abençoasse. [6]

Todos os pais cristãos têm a responsabilidade dada por Deus de “criar seus filhos na doutrina e admoestação do Senhor” (Ef 6.4). Sua maior preocupação deve ser o destino eterno de seus filhos; seu maior desejo para eles é que passem a eternidade no céu, e não no inferno. Para isso, os pais cristãos devem orar pela salvação de seus filhos, e trabalhar em direção a esse objetivo, ensinando-lhes o evangelho em uma atitude de amor e disciplina, evitando irritá-los e desencorajá-los (Cl 3.21), e viver de forma que seus filhos conheçam o amor de Deus mediante o testemunho em suas vidas.

Na cultura grega e judaica as crianças não recebiam o valor devido, mas no reino de Deus elas não apenas são acolhidas, mas também tratadas como modelo para os demais que ali querem entrar. [7]

Em segundo lugar, os que impedem as crianças de irem a Cristo (Lc 18.15). Por que os discípulos repreenderam essas pessoas e tentaram impedir que as crianças fossem até o Mestre? Provavelmente, pensaram estar lhe fazendo um favor, ajudando-o a não desperdiçar seu tempo e a guardar suas energias. Em outras palavras, não deram importância às crianças! [8]

Champlin destaca que as mulheres buscavam a influência do poder espiritual de Jesus sobre seus filhos. Para elas isso não era algo trivial. Elas e Jesus sabiam disso. Mas os discípulos de Jesus presumiram que o ato era uma trivialidade, e tentaram “proteger” a Jesus dos pais e seus filhos. [9]  

As almas das crianças são preciosas aos olhos de Deus, diz John C. Ryle. Tanto nesta passagem quanto em outras das Escrituras, existem provas claras de que Cristo se interessa por elas, na mesma intensidade com que se interessa pelos adultos. [10]

Ainda hoje muitos líderes não se importam com as crianças. Fazem muitos cultos “para os jovens” – não para Deus. Com a intenção de mantê-los na igreja. Só que tais líderes desconhecem que se aduba a planta enquanto ela é bem pequena (semente), e não depois que está desenvolvida. Se queremos ver “frutos” nos jovens, devemos “regá-los e adubá-los” na tenra idade.

Creio também que a causa desse descaso seja o preconceito para com as crianças. Charles Spurgeon conta que uma pessoa que quis, supunha ele, fazer com que sentisse sua própria insignificância, lhe escreveu para dizer que havia se encontrado com alguns negros que tinham lido seus sermões com grande prazer; e essa pessoa acreditava que eram muito adequados para eles. Sim, minha pregação era justamente o tipo de coisa para esses homens, disse Spurgeon. O remetente nem sonhava que me dava um prazer muito sincero; pois se sou compreendido por pessoas pobres, por empregadas, por crianças, estou certo de que posso ser entendido por outros. [10]

Os discípulos repreendiam aqueles que levavam as crianças por acharem que Jesus não devia ser incomodado com questões irrelevantes. O verbo grego usado pelos discípulos indica que eles continuaram repreendendo enquanto as pessoas levavam seus filhos. Eles agiam com preconceito. Ainda hoje podemos impedir as pessoas de levarem as crianças a Cristo por comodismo, por negligência ou por uma falsa compreensão espiritual. [11]

2 – JESUS REPREENDE OS DISCÍPULOS POR TAL ATITUDE (Lc 18.16).

Naquele tempo, como já falamos, os adultos normalmente ignoravam as crianças. Jesus, no entanto, fica indignado, porque ele valoriza as crianças. “Deixai vir a mim os pequeninos, não os embaraceis”. Jesus, então, os toma nos braços e os abençoa: aquele que tem tempo para as crianças enquanto está a caminho do Calvário ainda ama as crianças e as abençoa. Esse é o sentido literal das ações de Jesus aqui. [12]

Alguns princípios precisam ser observados aqui.

Em primeiro lugar, Jesus repreende os discípulos com veemência por essa atitude (Mc 10.14). O texto em Marcos 10.14 nos diz: “Jesus, porém, vendo isto, indignou-se”. Essa é a única passagem nos evangelhos que se diz que Jesus ficou indignado. A palavra para “indignado” (gr. aganaktein) significa “ficar com raiva”, ou seja, demonstrar com veemência o desprazer de forma expressa, em vez de apenas reclamar sobre a situação. [13]

Em segundo lugar, Jesus chama as crianças para si (Lc 18.16). Jesus tem afeição por elas. O apelo de Jesus para que as crianças tenham permissão de vir até Ele é um apelo que muitos pais precisam ouvir. E uma tragédia pensar nos pais “proibindo” seus filhos ou em pregadores fazendo a mesma coisa, ou que ambos sejam obstáculos para as crianças. [14]

Eu conheço uma pessoa que disse que preferia ver sua filha no mundo a frequentar uma igreja. E fazia de tudo para impedi-la de frequentar a igreja. Pois bem, a menina cresceu afastada da igreja. Hoje ela não só não frequenta nenhuma igreja como está envolvida no lesbianismo. Agora, depois de anos passados, a mãe reclama da situação que se encontra a sua filha.

Charles H. Spurgeon diz que Jesus não batizava as crianças, mas as abençoava. O toque de suas mãos significava mais do que uma caneta pode descrever. Foram bem-aventuradas as crianças que compartilharam aquela imposição de mãos [15]

Adolf Pohl diz que não devemos deixar as crianças esperando; não hesite em trazê-las para as mãos de Jesus, não conte com “mais tarde”: mais tarde, quando você for maior, quando entender mais da Bíblia, quando for batizado etc. As crianças podem ser trazidas com muita confiança no poder salvador de Jesus. O reinado de Deus rompe a barreira da idade assim como a barreira sexual (o evangelho para as mulheres), da profissão (para cobradores de impostos), do corpo (para doentes), da vontade pessoal (para endemoninhados) e da nacionalidade (para gentios). Portanto, também as crianças podem ser trazidas dos seus cantos para que Jesus as abençoe. [16] Nenhuma igreja pode ser considerada saudável se não acolhe bem as crianças. Jesus, o Senhor da igreja, encontrou tempo para dedicar-se às crianças. Ele demonstrou que o cuidado com as crianças é um ministério de grande valor. [17]

3 – JESUS FAZ UMA REVELAÇÃO (Lc 18.16).

A razão impressionante que o Senhor deu, e a Sua preocupação especial para as crianças é “porque dos tais é o reino de Deus”. Mas o que essa palavra de Jesus quer dizer? Qual é o seu real significado? Vejamos.

Primeiro, as crianças são criaturas inocentes. Isso não significa que as crianças não são pecadoras; todas as pessoas são pecadoras e nascidas em pecado, como lemos no Salmo 51.5: “Eis que em iniquidade fui formado, e em pecado me concebeu minha mãe”. No Salmo 58.3, Davi acrescentou: “Alienam-se os ímpios desde a madre; andam errados desde que nasceram, falando mentiras” (cf. Gn 8.21; 1Rs 8.46; Sl 143.2; Jr 17.9). Todo mundo herda a culpa do pecado de Adão e da corrupção de sua natureza (cf. Rm 5.12). A realidade que crianças morrem prova que elas são pecadoras e não moralmente neutras. Mas em uma criança, o pecado ainda não desenvolveu na medida em que produz resistência consciente à lei e à vontade de Deus.

A luz do Novo Testamento, as crianças não são anjinhos (nem viram anjinhos no céu quando morrem). Elas são briguentas (lCo 3.1-3), imaturas (lCo 13.11; Hb 5.13), imprudentes (lCo 14.20), volúveis (Ef 4.14) e dependentes (Gl 4.1,2). [18]

Em segundo lugar, as crianças que morrem são eleitas. Acreditamos que as Escrituras realmente ensinam que todas as pessoas que morrem na infância estão entre os eleitos. Isso não deve ser baseado apenas em nossa esperança de que seja verdade, mas em uma leitura cuidadosa da Bíblia.

Qual é, então, a base para afirmar que todos aqueles que morrem na infância estão entre os eleitos? A Bíblia ensina que devemos ser julgados com base em nossos atos cometidos “no corpo” (2Co 5.10). Ou seja, enfrentaremos o tribunal de Cristo e seremos julgados, não com base no pecado original, mas por nossos pecados cometidos durante nossas próprias vidas.  Cada um responderá “segundo o que fez” e não pelo pecado de Adão. A imputação do pecado e da culpa de Adão explica nossa incapacidade de responder a Deus sem regeneração, mas a Bíblia não ensina que responderemos pelo pecado de Adão. Nós responderemos por nós mesmos.  Mas e os bebês?  Aqueles que morrem na infância cometeram tais pecados no corpo?  Acreditamos que não.

O Reverendo Hernandes Dias Lopes diz que quando uma criança morre antes da idade da razão, ela vai para o céu não por ser criança, mas porque o Espírito Santo aplica nela a obra da redenção. Nenhuma criança entra no céu pelos seus próprios méritos, mas pelos méritos de Cristo. [19]

Em terceiro lugar, Jesus deixa claro com essa palavra que a alma de uma criança é capaz de receber a graça divina. As crianças são nascidas em pecado e sem a graça de Deus não podem ser salvas. Não existe nada, em toda a Bíblia ou na experiência humana, que nos faça pensar que as crianças não podem receber o Espírito Santo e serem justificadas, mesmo na infância. A mente da criança é igual à do adulto para receber ensinos espirituais. [20]

Ralph Earle destaca que a palavra grega também pode significar “aos quais pertence o Reino dos céus”, ou “o Reino dos céus é composto dos tais”. Na verdade, as duas ideias são verdadeiras. “Amor, simplicidade de fé, inocência e, acima de tudo, humildade, são as características ideais das criancinhas, e dos súditos do reino. [21]

4 – JESUS ADVERTE QUE SÓ ENTRA NO REINO QUEM AGIR COMO UMA CRIANÇA (Lc 18.17).

O significado é: a única maneira possível para se entrar no reino é recebendo-o real e confiadamente como uma criança recebe um presente. Uma criança não é tão orgulhosa a ponto de não aceitar um presente! [22]

Podemos tirar algumas lições aqui.

Em primeiro lugar, somos totalmente dependentes da graça de Deus. Assim como uma criança depende do cuidado dos pais ou de um tutor, nós, da mesma maneira, dependemos dos cuidados de Deus. Como disse Adolf Pohl:

Elas estão absolutamente no começo, ainda não têm nada, não sabem fazer nada, ainda não valem nada. Portanto, a exclamação de Jesus significa: Deixem-se passar para trás de tudo que já conquistaram e se tornaram. Voltem para trás em sua sabedoria e comecem de novo diante de Deus, “como crianças recém-nascidas” (1Pe 2.2). Não é estocando o que se tem, mas nascendo de novo que se entra no reino de Deus (Jo 3.3). Esta é a “perfeição” espiritual da “criança”: ter necessidade de Deus em tudo, até o fundo. Ficar firme nisto e receber o “Abba” de presente – isto é o que importa! [23]

Em segundo lugar, desfrutamos do reino de Deus pela fé. Champlin diz que as crianças ilustram seu espírito despretensioso, sua ausência dos efeitos aleijadores do ceticismo e do engano. [24]

Quando algo de ruim acontece com uma criança, ela corre para os braços do pai ou da mãe. Ela busca socorro naqueles que podem socorrê-la. Isso é total dependência e confiança. Esse é um exemplo para o nosso relacionamento com o Pai celestial. Sim, Deus espera que sejamos como crianças! [25]

John C. Ryle destaca que a sua fé simples, sua dependência dos outros, sua indiferença às riquezas do mundo, sua despreocupação para com as coisas do mundo, sua comparativa humildade, seu caráter inofensivo e sua falta de malícia são aspectos que fornecem aos crentes excelentes exemplos. Feliz é aquela pessoa que pode se aproximar de Cristo e das Escrituras com o mesmo espírito de uma criancinha. [26]

CONCLUSÃO

Jesus não deseja que sejamos infantis, mas sim que sejamos como crianças. Uma criança inocente ilustra a humildade, a fé e a dependência. A criança maravilha-se de tai modo com as coisas que torna a vida empolgante. A única maneira de entrar no reino de Deus é tornar-se como uma criança e nascer de novo (Jo 3). Se os fariseus orgulhosos tivessem se tornado como crianças também teriam voltado para casa justificados. [27]

Pense nisso!

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Bibliografia:

1 – Robertson, A. T. Comentário de Lucas, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2013, p. 312.

2 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 517.

3 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Shedd, Sto Amaro, SP, 2019, p. 641.

4 – Wiersbe, Warren W. Marcos, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 187.

5 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 372.

6 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 394.

7 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 518.

8 – Wiersbe, Warren W. Marcos, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 187.

9 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 177.

10 – Spurgeon, C. H. Pescadores de Crianças, Ed. Shedd, Sto Amaro, SP, 2004, p. 4.

11 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 518.

12 – Mulholland, Dewey M. Marcos Introdução e Comentário, Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 2014, p. 158.  

13 – Edwards, James R. O Comentário de Marcos, Ed. Shedd, Sto Amaro, SP, 2018, p. 384.

14 – Robertson, A. T. Comentário de Lucas, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2013, p. 313.

15 – Spurgeon, Charles H. O evangelho Segundo Mateus, Ed. Estação da Fé, Goiânia, GO e Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2018, p. 397.

16 – Pohl, Adolf. O Evangelho de Marcos, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 1998, p. 297.

17 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 519.

18 –Ibidem, p. 521.

19 – Ibidem, p. 522.

20 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 293.

21 – Earle, Ralph. Comentário Bíblico Beacon, Mateus, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 137.

22 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 394.

23 – Pohl, Adolf. O Evangelho de Marcos, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 1998, p. 298.

24 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 177.

24 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 523.

26 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 294.

segunda-feira, 9 de setembro de 2024

A PARÁBOLA DO FARISEU E DO PUBLICANO - Lucas 18.8-14

Por Pr Silas Figueira 

Texto base: Lucas 18.8-14

INTRODUÇÃO

Esta introdução, indubitavelmente, foi acrescentada pelo evangelista ou sua fonte. Como tal, ela é uma interpretação da parábola. O intérprete diz ao leitor que o assunto é justiça e, em particular, justiça própria. [1]

Esta parábola se segue para ensinar o espírito em que as pessoas devem orar. É, além disto, um repúdio enfático de qualquer sugestão de que um homem pode ser salvo por meio de adquirir mérito. Aquilo que o fariseu dizia acerca de si mesmo era verdadeiro. Seu problema não era que não tinha progredido suficientemente ao longo da estrada, era que estava na estrada totalmente errada. [2]

Não temos razão para duvidar de que Jesus dirigiu essa parábola a um grupo de fariseus. Esse é o sentido claro da declaração de Lucas. [3] Para John C. Ryle a parábola da viúva perseverante nos ensina o valor da importunidade na oração. A parábola do publicano e do fariseu nos ensina a atitude que deve permear nossas orações. A primeira nos encoraja a orar e não desfalecer; a segunda nos recorda como e em que disposição devemos orar. Ambas devem ser meditadas por todo verdadeiro crente. [4]

Com isso em mente, podemos destacar algumas lições.

1 – A ORAÇÃO É AUTODEPENDÊNCIA DE DEUS E NÃO AUTOAFIRMAÇÃO (Lc 18.9,10).

O fariseu e o publicano foram ambos ao templo, orar. Note que entre os adoradores de Deus, na igreja invisível, há uma mistura de bons e maus, de alguns que são aceitos por Deus, e de alguns que não são; e assim tem sido desde que Caim e Abel levaram as suas ofertas para o mesmo altar. [5] A cena teria sido algo familiar para os ouvintes de Jesus; era natural orações serem oferecidas no templo, a “casa de oração” (Is 56.7; Mat 21.13).

Jesus dirige essa parábola a quem confiava em si mesmo e pensava que ninguém mais tinha valor. Não há dúvida de que a situação descrita não era um exagero, mas um quadro fiel do equívoco dos fariseus desse tempo. As duas parábolas apresentam dois homens, duas orações, dois resultados. [6]

Em primeiro lugar, Jesus nos apresenta dois homens orando. O primeiro era um fiel fariseu. Uma pessoa bem-quista na sociedade judaica. Uma pessoa que procurava ser exemplo para as pessoas mediante seu testemunho.  O outro, um publicano. Uma pessoa odiada pelos judeus, pois era um integrante da corrupta classe de coletores de impostos para os romanos. E se enriqueciam roubando o povo.

Em segundo lugar, Jesus mostra como oravam. A oração de ambos era completamente diferente. O fariseu se auto vangloriava pelo testemunho que dava diante da sociedade, e se via superior ao publicano. Já o publicano tinha consciência de seus pecados.

Em terceiro lugar, Jesus mostra como ambos saíram da presença de Deus. O fariseu foi para casa cheio de si, o publicano foi para casa justificado. Não surpreende que esses dois tipos de homens, ambos pecadores, estejam na mesma igreja, disse Eugene Peterson. [7]

A grande questão aqui em relação ao exercício espiritual da oração é como chegamos à Deus, e como saímos de Sua presença. Podemos chegar cheios de mazelas e sairmos justificados, ou podemos chegar cheios de si e sairmos do mesmo jeito.  

De forma alguma, porém, queremos sugerir que a religião dos fariseus representa a pior perversão possível da religião, diz John MacArthur. Longe disso. Os fariseus ensinavam muitas coisas verdadeiras, pois suas crenças estavam intimamente vinculadas às Escrituras. O próprio Jesus disse sobre eles: “Obedeçam-lhes e façam tudo o que eles lhes dizem” (Mt 23.3). Diferentemente de tantos cultos e religiões falsas descaradamente não ortodoxos, excessivamente diabólicos ou totalmente indiferentes em relação à Lei de Deus, os fariseus eram tradicionalistas e idealistas famosos por sua atenção obsessiva aos pormenores da lei. [8] Os fariseus, na sua grande maioria, se viam justos demais em comparação ao restante da população judaica. No entanto, a verdadeira justiça é uma questão de confiança em Deus, e não no ego (Is 8.17; 2Co 1.9; Hb 2.13). [9]

2 – A ORAÇÃO DO FARISEU (Lc 18.11,12). 

Aqui estão as palavras do fariseu a Deus (porque não podemos chamar isto de oração): Estando em pé, orava consigo... (vv. 11,12). Em algumas versões, lemos: Colocando-se de pé, orava assim... Aquele homem estava totalmente centrado em si mesmo, não via nada além de si mesmo, de seu próprio louvor, e não enxergava a glória de Deus. [10]

Com isso em mente, podemos destacar algumas lições.

Em primeiro lugar, sua oração foi apenas um discurso exaltando suas próprias virtudes (Lc 18.11,12). O fariseu não orou; ele fez um discurso eloquente para se autopromover. Ele não orou; ele tocou trombetas. Ele não orou; ele aplaudiu a si mesmo. Ele não orou; ele fez cócegas no seu próprio ego. Ele não orou; ele fez um solo do hino “Quão grande és tu” diante do espelho. [11]

Eugene Peterson diz ironicamente      

que as igrejas carregam a má fama de serem negligentes em solicitar verificações para identificar pessoas com antecedentes criminais e em instalar sistemas de segurança para filtrar pessoas que podem usar a igreja como um disfarce para suas maldades. [...] Se a igreja tivesse feito essas verificações de segurança em fariseus e publicanos, nenhum deles teria passado da porta. [12] 

Em segundo lugar, sua oração não demonstrava qualquer senso de pecado ou de necessidade (Lc 18.11). Sua oração não continha nenhuma confissão, súplica, reconhecimento de culpa e insignificância, nenhum pedido de misericórdia e graça. [13] Pelo fato de ter permanecido cerimonialmente puro e dentro da lei e porque jejuou com regularidade (sinal de seriedade religiosa), e entregou seus dízimos com fidelidade (conforme o requer a lei de Moisés), ele presume ser aceitável diante de Deus. Ele presume com grande exagero sua impecável retidão. O fariseu não tem uma percepção real de sua própria pecaminosidade e indignidade diante de Deus, pelo que demonstra uma apreciação inadequada da graça de Deus. [14]

A sua oração revelava a sua verdadeira face, a da hipocrisia. Ele não se via como ele realmente era perante Deus. Eugene Peterson diz que todos os pecados mais comuns são razoavelmente óbvios. Aqueles que o cometem sabem o que estão fazendo, por mais que se enganem quanto às motivações. Mas eu nunca fui pastor de hipócrita que soubesse que era hipócrita, pelo menos nos estágios iniciais. [15]

Em terceiro lugar, ele não orava a Deus, ele fazia um monólogo (Lc 18.11). “O fariseu, posto em pé, orava de si para si mesmo” (ARA). Sua oração não se dirigia precisamente a Deus, mas a si mesmo. Sua oração era voltada para a exaltação de si mesmo e dirigida ao plenário que estava ali concentrado. Deus era apenas uma moldura para realçar os seus feitos notáveis e a perfeição de suas ações. Deus era apenas um trampolim para o fariseu alcançar a notoriedade pública e a admiração do povo. [16] William Hendriksen destaca que exteriormente falando, ele se dirige a Deus, porquanto ele diz: “Ó Deus”. Interiormente, porém, e realmente, o homem está falando de si e a si mesmo. Além do mais, havendo mencionado Deus uma vez, ele não volta mais a citá-lo. [17]

Em quarto lugar, ele não era humilde e desprezava os outros (Lc 18.9,11,12). Concordo com John C. Ryle quando diz

Por natureza, todos somos cheios de justiça pessoal, uma doença hereditária de todos os filhos de Adão. Desde o maior ao menor, pensamos mais elevadamente do que deveríamos pensar a respeito de nós mesmos. Em nosso íntimo, bajulamos a nós mesmos, afirmando que não somos tão maus como algumas pessoas e que temos algo para nos recomendar ao favor de Deus. “Muitos proclamam a sua própria benignidade” (Pv 20.6). Esquecemos o testemunho das Escrituras: “Tropeçamos em muitas coisas” (Tg 3.2); “Não há homem justo sobre a terra que faça o bem e que não peque” (Ec 7.20). “Que é o homem, para que seja puro? E o que nasce de mulher, para ser justo?” (Jó 15.14). [18] 

Sua oração é uma peça de acusação leviana contra todos os homens e mais particularmente contra o humilde publicano. O fariseu olha para o próximo com desdém e desfere contra ele perversas acusações e caluniosas referências. O fariseu nada pediu. Ele tinha tudo e era tudo. Ele pensava ser quem não era. Ele era um megalomaníaco, uma pessoa adoecida pelo sentimento de auto exaltação. [19]

Champlin enfatiza que ter sido preservado de iniquidades grosseiras, sem dúvida alguma era causa justa de ações de graças a Deus; porém, ao invés da atitude devotamente humilde que isso deveria inspirar nele, (sem dúvida) arrogantemente ele se separou do resto da humanidade e do pobre publicano, agradeceu a Deus que estava longe de ser semelhante a ele. [20] 

2 – A ORAÇÃO DO PUBLICANO (Lc 18.13,14). 

Tanto a sua atitude quanto o conteúdo da sua oração eram opostos ao do fariseu. Ele estava profundamente consciente dos seus pecados, e estava também espantado pelo seu próprio senso de indignidade. Ele não tinha nada para dizer a seu próprio favor; sua única súplica era por misericórdia. [21]

Com isso em mente, podemos algumas lições da oração do publicano.

Em primeiro lugar, mediante sua oração o publicano foi justificado (Lc 18.14). A mensagem de Jesus é simples: todos que estiverem determinados a estabelecer uma justiça por conta própria fracassarão e assim condenarão a si mesmos; mas aqueles que se submeterem à justiça     de Deus serão graciosamente justificados por ele (cf. Rm 10.3,4). Ninguém pode se justificar perante Deus; apenas Deus é “justificador daquele que tem fé em Jesus” (Rm 3.26). Esse princípio é a simples linha divisória entre o evangelho de Jesus Cristo e todos os outros sistemas de crença equivocados ou demoníacos. [22]

Anthony Lee Ash destaca que o publicano foi justificado, não pelo seu passado, mas pela sua atitude presente. Ele sabia que sua única reivindicação era a bondade de Deus. [23]

Em segundo lugar, a oração do publicano consiste em cinco aspectos. John C. Ryle destaca esses cinco pontos

 

Primeiro, foi uma petição genuína. Uma oração que só contém ações de graça e afirmações, sem qualquer súplica, é uma oração deficiente. Pode ser conveniente para um anjo, mas não para um pecador.

Segundo, foi uma oração pessoal. O publicano não falou a respeito de seu próximo, e sim a respeito de si mesmo. Incerteza e generalidade são os grandes defeitos do cristianismo de muitas pessoas. Abandonar o “nós”, o “nosso” e o “nos”, passando para o “eu”, o “meu” e o “me” é um grande passo em direção ao céu.

Terceiro, foi uma oração humilde, que colocou o “eu” no seu devido lugar. O publicano confessou claramente que era um pecador. Este é o próprio “abc” do cristianismo que salva. Não começamos a nos tornar bons, enquanto não podemos sentir e confessar que somos maus.

Quarto, foi uma oração em que a misericórdia foi a principal coisa desejada e em que foi demonstrada, embora com fragilidade, a fé na aliança da misericórdia divina. A misericórdia é a primeira coisa que temos de pedir quando começamos a orar. A misericórdia e a graça divina têm de ser o assunto de nossas súplicas diárias junto ao trono da graça, enquanto vivermos.

Quinto, a oração do publicano foi proveniente de seu coração. Ele sentiu-se profundamente comovido, ao pronunciá-la. Batia no peito como alguém que tinha mais sentimentos do que podia expressar. São orações que causam deleite em Deus. Um coração compungido e contrito, Ele não o desprezará (SI 51.17). [24]

James R. Edwards destaca que no texto grego, o publicano não se refere a si mesmo como um pecador, mas como o pecador (to hamatolo), indicando tanto o grau de seu pocado tanto sua consciência dele. [25] Bailey enfatiza que a postura aceita para a oração era as mãos sobre o peito e conservar os olhos baixados. Mas os braços cruzados deste homem não permanecem imóveis. Pelo contrário, ele bate no peito. Este gesto é usado em ocasiões de extrema angústia ou intensa ira. [26]

Esta parábola nos ensina algumas lições a respeito da oração.

1) Nenhum orgulhoso pode orar. A porta do céu é tão baixa que ninguém pode entrar a não ser ajoelhado.

2) Ninguém que menospreze a seus semelhantes pode orar. Na oração não nos elevamos acima de nossos semelhantes. Recordamos que somos um do grande exército da humanidade pecadora, que sofre e está contrita, ajoelhados todos perante o trono da misericórdia de Deus.

3) A verdadeira oração brota da aproximação de nossas vidas a de Deus. Sem dúvida tudo o que o fariseu dizia era verdade. Jejuava; dava meticulosamente, o dízimo; não era como os outros homens; sem dúvida não era como o coletor de impostos. Mas a pergunta não é: “Sou tão bom como meus semelhantes?” A pergunta é: “Sou tão bom como Deus?” [27]

 CONCLUSÃO 

O fariseu cheio de si voltou para casa da mesma forma como chegou ao templo, no entanto, o publicano, o mais pecador dos pecadores, foi para casa justificado. Essa é uma parábola que nos mostra que a graça de Deus, e somente por ela, é que somos justificados. Literalmente é um perdão imerecido para aqueles que verdadeiramente se arrependem de seus pecados.

O fariseu estava cheio de si, o publicano vazio de tudo. O coração do fariseu não tinha espaço para a graça do Senhor, mas o publicano estava com ele pronto para receber do Senhor, Seu perdão e Sua graça.

Como está o seu coração?

Pense nisso! 

Bibliografia:

1 – Bailey, Kenneth. As Parábolas de Lucas, Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1985, p. 326.

2 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 248.

3 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 380.

4 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 289.

5 – Henry, Matthew. Comentário Bíblico Novo Testamento Mateus a João, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2008, p. 681.

6 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 381.

7 – Peterson, Eugene H. A Linguagem de Deus, Ed. Mundo Cristão, São Paulo, SP, 2011, p. 151.

8 – MacArthur, John. As Parábolas de Jesus, Ed. Thomas Nelson, Rio de Janeiro, RJ, p. 131.

9 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Shedd, Sto Amaro, SP, 2019, p. 635.

10 – Henry, Matthew. Comentário Bíblico Novo Testamento Mateus a João, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2008, p. 681.

11 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 511.

12 – Peterson, Eugene H. A Linguagem de Deus, Ed. Mundo Cristão, São Paulo, SP, 2011, p. 151.

13 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 290.

14 – Evans, Craig A. O Novo Comentário Bíblico Contemporâneo, Lucas, Ed. Vida, São Paulo, SP, 1996, p. 305.

15 – Peterson, Eugene H. A Linguagem de Deus, Ed. Mundo Cristão, São Paulo, SP, 2011, p. 154.

16 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 512.

17 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 382.

18 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 290.

19 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 513.

20 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 176.

21 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 468.

22 – MacArthur, John. As Parábolas de Jesus, Ed. Thomas Nelson, Rio de Janeiro, RJ, p. 140.

23 – Ash, Anthony Lee. O Evangelho Segundo Lucas, Ed. Vida Cristã, São Paulo, SP, 1980, p. 263.

24 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 291.

25 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Shedd, Sto Amaro, SP, 2019, p. 639.

26 – Bailey, Kenneth. As Parábolas de Lucas, Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1985, p. 337.

27 – Barclay, William. Comentário do Novo Testamento, Lucas, p. 195,196.

sexta-feira, 2 de agosto de 2024

A PARÁBOLA DA VIÚVA IMPORTUNA - Lucas 18.1-8

Por Pr Silas Figueira

Texto base: Lucas 18.1-8

INTRODUÇÃO

A Bíblia ensina, tanto por preceito como por exemplo, que a oração abrange muitos assuntos diferentes. Mas um elemento muitas vezes esquecido da oração, é a oração para o retorno do Senhor Jesus Cristo. Jesus revela para os seus discípulos que os dias que viriam após sua Ascenção seriam dias difíceis para a Igreja, e os Seus discípulos deveriam ser perseverantes na oração.  

Quando lemos esta parábola, observamos que ela está ligada ao discurso anterior, que fala a respeito do retorno de Cristo. Portanto, vemos que a oração é prescrita como um remédio para que ninguém esmoreça nos difíceis dias vindouros – os dias do cerco de Jerusalém, os dias que precederão a segunda vinda de Jesus e todos os outros dias desesperadores. Quando Jesus fosse levado da terra, a Igreja seria como a viúva na parábola. Mas a oração seria o seu meio de suporte e alívio. [1]

William Hendriksen corroborando com esse argumento diz que Jesus revela aos seus discípulos que, durante o longo e cada vez mais difícil período de tempo que precederá a volta do Filho do homem (veja Lc 17.22,23), seus seguidores na terra, ao longo da História, em vez de esmorecer, devem perseverar em oração. [2]

John MacArthur diz que esta parábola é um encorajamento para cristãos que vivem em tempos ruins, que veem como o mundo fica cada vez mais hostil, que sentem a aproximação do juízo, que se sentem sozinhos e isolados “como foi nos dias de Noé” (Lc 17.26) e “como foi também nos dias de Ló” (v. 28). Em outras palavras, essa história se aplica especificamente a tempos como os nossos. Os dias são ruins. As necessidades são críticas. Nossa oração deveria ser urgente, fervorosa e persistente. Não podemos desanimar. [3]

Com isso em mente, vamos analisar esta parábola.

1 – OS DISCÍPULOS SÃO INCENTIVADOS A SEREM PERSEVERANTES NA ORAÇÃO (Lc 18.1). 

Como disse Matthew Henry: “Esta parábola tem a sua chave pendurada na porta; o sentido e o plano dela são prefixados. Cristo a disse com esta intenção, para nos ensinar que os homens deveriam orar sempre e nunca desfalecer”. [4]

Por que devemos ser perseverantes na oração? Vejamos algumas razões.

Primeiro, a oração renova a nossa fé. Perseverar em oração exige fé, pois quando estamos orando, nós estamos na presença de Deus crendo no Seu agir a nosso favor. Quando deixamos de orar, nós descremos do Seu agir. Os fortes não oram, os fracos se colocam diante de Deus em oração, pois sabem que só Ele pode os socorrer. Por isso devemos orar. Kenneth Bailey enfatiza que os fiéis devem ser persistentes na oração não apenas em relação à intenção de Deus na história, mas devem buscá-lo sempre que Ele parecer distante e a confiança do crente vacilar. A solução para o medo é a oração. [5]  

Como disse John C. Ryle: “A oração é a própria respiração do verdadeiro crente. O cristianismo autêntico começa e floresce na prática da oração; ou decai na falta dela”. [6]

Segundo, a oração nos torna mais humildes. À medida que oramos, nós nos colocamos diante daquele que pode nos socorrer, nos confortar e trazer paz ao coração. Quando oramos, cai por terra nosso orgulho, nosso eu, nossa autoconfiança. A oração é o grito de socorro de uma pessoa que reconhece a sua pequenez; que reconhece a sua total dependência de Deus.

Terceiro, a oração revela a vontade de Deus para nossas vidas (1Jo 5.14). “E esta é a confiança que temos nele, que, se pedirmos alguma coisa, segundo a sua vontade, ele nos ouve”. Eu só posso saber qual é a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus para minha vida (Rm 12.2), mediante a leitura das Escrituras e a oração.

Muitas pessoas ficam frustradas com Deus quando suas orações não são respondidas, mas muitas dessas pessoas não têm o hábito de ler as Escrituras para saber o que Deus quer dos Seus servos mediante a Sua Palavra. Por exemplo, quando Elias desafiou Acabe, dizendo que não iria chover, ele fez não fez isso no calor da sua emoção. Ele o fez segundo o que estava escrito nas Escrituras. Havia uma passagem específica que parece ter chamado a atenção de Elias: “Guardai-vos não suceda que o vosso coração se engane, e vos desvieis, e sirvais a outros deuses, e vos prostreis perante eles; que a ira do SENHOR se acenda contra vós outros, e feche ele os céus, e não haja chuva, e a terra não dê a sua messe (Dt 11.16,17).

Quarto, o Espírito Santo nos auxilia na oração. Veja o que o apóstolo Paulo nos fala em Rm 8.26,27: “Da mesma forma o Espírito nos ajuda em nossa fraqueza, pois não sabemos como orar, mas o próprio Espírito intercede por nós com gemidos inexprimíveis. E aquele que sonda os corações conhece a intenção do Espírito, porque o Espírito intercede pelos santos de acordo com a vontade de Deus”.

Quando estamos em fervente oração, nós estamos sendo assistidos pelo Espírito Santo. A oração do Espírito Santo é intensa, eficaz e agônica. Ele intercede com “gemidos inexprimíveis”. Gemido é uma expressão de dor. Gememos quando não conseguimos expressar em palavras nossos sentimentos intensos. E assim que o Espírito intercede por nós, em nós, ao Deus que está sobre nós. Aquele que conhece todas as línguas, idiomas e dialetos de todos os povos, de todos os tempos, ora por nós com tal agonia que o faz com gemidos inexprimíveis. [7]

Devemos destacar que essa exortação lucana é dirigida a uma comunidade madura da oitava ou nona década do primeiro século. Os desafios da vida como igreja em um mundo hostil é a realidade diária deles. [8] Em pleno século XXI nós continuamos enfrentando perseguições e adversidades. Em alguns países, tortura e morte por causa de Jesus. O mundo não se cristianizou, o mundo continua jaz no maligno. E a tendência é caminharmos para dias piores. Por isso que está parábola é tão atual quanto foi no primeiro século.

Quinto, a oração nos ajuda a lutarmos contra o pecado. Até a volta do Senhor os discípulos vivem combatendo o pecado, motivo pelo qual não devem desistir da luta de oração e súplica antes de atingir o alvo. Essa exortação do Senhor aos discípulos evoca aquelas palavras de Mc 13.33: “Estai de sobreaviso, vigiai e orai!”, que também foram acrescentadas diretamente ao anúncio de sua volta. Ao analisar o mesmo assunto, Lucas ainda traz a aplicação prática: “Vigiai, pois, a todo tempo, orando!” (Lc 21.36). Portanto, a exortação à oração persistente está estreitamente ligada à expectativa da volta do Senhor [9] e uma vida de santidade.

Sexto, Deus adia as respostas às nossas orações a fim de que nossos motivos e alvos sejam purificados. Nada recebemos porque pedimos erradamente, por motivos egoísticos, de forma ignorante ou estúpida.         

2 – JESUS MOSTRA QUE A JUSTIÇA NESSE MUNDO É FALHA (Lc 18.2,3). 

No segundo livro de Crônicas 19.4-6 nos diz que “o rei Jeosafá estabeleceu juízes na terra, em todas as cidades fortificadas, de cidade em cidade. E disse aos juízes: Vede o que fazeis; porque não julgais da parte do homem, senão da parte do Senhor, e ele está convosco quando julgardes”.

Jeosafá agiu de acordo com a Lei que o Senhor estabelecera. Por ser um rei temente a Deus, ele procurou estabelecer a lei e a ordem de acordo com a justiça divina, e lembrou a esses juízes que o Senhor estava vendo como eles estariam julgando.

Não sabemos muita coisa acerca do sistema judicial que vigorava nas aldeias da Palestina, mas esta parábola indica que, em certos casos, as vilas menores podiam ser controladas por um único indivíduo, e que a justiça ou a injustiça poderiam depender das disposições desse único homem. [10]

John MacArthur diz que

Roma havia nomeado magistrados locais e juízes para as aldeias – autoridades municipais que julgavam casos criminais e defendiam os interesses de César. Eram os piores de todos, famosos por sua falta de moral e escrúpulos. Recebiam salários altos pagos pelo tesouro do templo, apesar de serem gentios e incrédulos. Os judeus costumavam tratá-los com o mesmo desdém profundo que demonstravam aos coletores de impostos. Seu título oficial era “Juiz de Proibição”, mas, com a alteração de uma única letra em aramaico, os judeus se referiam a eles como “juízes-ladrões”.

A descrição do juiz feita por Jesus nessa parábola deixa claro que ele era um desses nomeados pelos romanos. Ele “não temia a Deus nem se importava com os homens” (Lucas 18.2). Isso é uma caracterização bem escolhida. [11]

Com isso em mente, podemos destacar algumas lições.

Primeiro, Jesus apresenta um juiz que não temia a Deus e não respeitava o povo (Lc 18.2). Bailey diz que o problema desse juiz não é que ele não “respeita” outras pessoas no sentido de respeitar alguém de outra cultura ou posição elevada. Ao contrário, é um caso de incapacidade de sentir a maldade de suas ações na presença de alguém que possa fazê-lo ficar envergonhado... mesmo que o mundo todo grite: “Que vergonha!”, mas isso não causará nenhuma impressão sobre ele. [12] Esse é um indivíduo totalmente carente de qualquer emoção, de qualquer empatia. Este juiz é um ímpio e sociopata.  

Como falamos acima, este é um juiz provavelmente gentio. Embora, a corte religiosa mais alta em Israel era o Grande Sinédrio, que consistia em 71 juízes (todos eles líderes religiosos considerados especialistas da lei e da tradição oral do Antigo Testamento), no entanto, era uma instituição profundamente injusta e corrupta. Tanto que matou Jesus e perseguiu a Igreja. Era uma instituição vendida à Roma.

Não diferente dos nossos dias em que prevalece a injustiça, porque muitos bandidos estão usando toga e regem as comarcas do nosso país. Por isso, a injustiça prevalece e a justiça tem os olhos vendados de vergonha. A impiedade no lugar do juízo foi um dos males mais cruéis que Salomão viu debaixo do sol, Eclesiastes 3.16. O tempo passa e a malignidade no coração do homem só aumenta.

Segundo, Jesus apresenta uma viúva que pede justiça para si (Lc 18.3). Essa viúva tinha sido tratada de forma injusta. Alguém poderia ter tirado o pouco que ela possuía. Ou, talvez, a tivesse impedido de receber o que lhe correspondia. Por isso ela foi ao juiz, esperando que este confirmasse sua reclamação e lhe desse o que a justiça demandava. Provavelmente isso também implicaria o castigo para o oponente, mas a ênfase é, antes, sobre a urgente petição da viúva injustiçada de receber o que lhe era devido. [13]

No entanto, não seria tão fácil para esta pobre viúva alcançar a justiça esperada. Wiersbe destaca que esta viúva teve que superara alguns obstáculos. Em primeiro lugar, pelo fato de ser mulher, praticamente não existia perante a lei. Na sociedade palestina do tempo de Jesus, as mulheres não pleiteavam suas causas. Em segundo lugar, uma vez que era viúva, não tinha um marido para representá-la no tribunal. Por fim, era pobre e, nem que quisesse, não poderia pagar suborno. Não é de se admirar que as viúvas pobres não recebessem o amparo legal que lhes era devido! [14]

John MacArthur também destaca que naquela cultura, os tribunais pertenciam exclusivamente aos homens. Uma mulher jamais teria apelado a um juiz caso houvesse um homem em sua vida. Seu marido estava morto; evidentemente, ela não tinha irmão, cunhado, filho, primo, sobrinho, um parente homem distante ou algum vizinho próximo que pudesse ter defendido sua causa. Ela representa os pobres, impotentes, desprovidos, humildes, anônimos, não amados ou desesperados. [15]

A injustiça jurídica ainda prevalece em nossos dias. Aqueles que não têm recursos, geralmente, ainda são injustiçados. A corda ainda arrebenta no lado mais fraco. Se nós crermos que o nosso Senhor é o Justo Juiz, e que Ele defende a nossa causa, ainda que não seja nessa vida, mas na vindoura, há muito tempo já teríamos desistido de servi-lo. A injustiça prevalece e continuará prevalecer até a volta do Senhor. A justiça até pode prevalecer, mas é raro isso ocorrer. E eu não estou sendo pessimista, mas realista.

3 – DEUS NÃO É UM JUIZ INÍQUO QUE NÃO ATENDE AOS SEUS ESCOLHIDOS (Lc 18.4-8). 

Deus não é como esse juiz, pois é um Pai amoroso, que atenta para todas as nossas súplicas, sendo generoso em suas dádivas e se preocupando com nossas necessidades, pronto a supri-las quando clamarmos. Deus responde às orações para sua glória e para nosso bem e nunca se aborrece quando o buscamos. [16]

Com isso mente, podemos destacar algumas lições.

Primeiro, a persistência da viúva mudou o injusto juiz (Lc 18.4,5). O historiador Plutarco (46 d.C. – 120 d.C.), fala de uma mulher velha pobre que implorou por justiça a Filipe da Macedônia, pai de Alexandre, o Grande, sem sucesso. Quando Filipe disse à mulher que não tinha tempo para ela, ela declarou: “Então abra mão de ser rei!” Filipe, surpreso, prosseguiu para ouvir o caso dela e também de outros. [17]

Leon Morris diz que a persistência dessa pobre viúva finalmente esgotou o juiz. No fim, fez conforme ela pedia, pois, nenhum motivo mais nobre do que se ver livre dela. Ele não queria que ela viesse a molestá-lo. [18] O termo grego aqui utilizado para “molestar” aqui utilizado é hypopiazein, “bater abaixo dos olhos”. O sentido da expressão é, como em 1Co 9.27, um verdadeiro golpear. O juiz, e não o narrador da parábola, descreve a viúva cinicamente como uma fúria. Teme uma intensificação do assédio dela a ponto de lhe “golpear a face”. [19]

Ele sabia que era um desgraçado. Mas a viúva o estava aborrecendo. Ele podia simplesmente calá-la acatando o seu apelo. Assim, resolveu fazer isso para que ela parasse de vir o tempo todo. A palavra continuamente traduz duas expressões no texto grego: eis telos. Significa literalmente: “até o fim” ou “infinitamente”. É uma expressão comum na Bíblia, que significa “para sempre”. O juiz estava, portanto, pensando: “Ela continuará vindo para sempre, e me cansará”. [20]

Segundo, a oração não é um pedido de um desconhecido a um magistrado injusto (Lc 18.6,7). A viúva não tinha acesso ao juiz; nós temos livre acesso ao trono da graça, por meio de Cristo. A viúva não tinha amigo algum no tribunal; nós temos junto ao Pai, Jesus Cristo, o Advogado, o Justo. Ele é o nosso grande Sumo Sacerdote que nos assiste em nossa fraqueza. Ela não tinha nenhuma garantia ou promessa do juiz em atender à sua causa; nós temos as Escrituras com centenas de promessas do cuidado generoso de Deus. A viúva dirigiu-se a um tribunal, mas nós entramos confiadamente no trono da graça (Hb 4.14-16). [21]

Se um juiz injusto concede o pedido por causa da persistência do requerente, quanto mais o Pai celestial irá responder à persistência de quem o pede? A comparação é particularmente potente. Esse é um contraste não só do humano e do divino, mas do injusto e do santo. Se um homem injusto sabe como fazer o bem, quanto mais saberia o Deus santo? [22]

Terceiro, o Senhor responderá as nossas orações em tempo oportuno (Lc 18.8a). Deus tem um povo eleito, que desfruta de seu cuidado especial. O Senhor Jesus declarou que “fará Deus justiça aos seus escolhidos, que a ele clamam dia e noite”; e continuou: “Digo-vos que, depressa, lhes fará justiça”. Enquanto o juiz iníquo tinha de ser molestado durante um longo tempo antes de, finalmente e de má vontade, agir, Deus não vai demorar, mas agirá depressa. [23]

É possível que surja a pergunta: “A palavra depressa não está em conflito com o fato de que o regresso do Filho do homem para julgar ainda não se concretizou?” A resposta deve ser: “O Senhor não retarda sua promessa segundo alguns a têm por demorada, senão que ele é paciente (ou longânimo) para conosco, não querendo que nenhum pereça, senão que todos cheguem ao arrependimento” (2Pe 3.9).

Quarto, Jesus faz uma pergunta perturbadora (Lc 18.8b). “Quando, porém, vier o Filho do homem, porventura achará fé na terra?” Charles L. Childers destaca que a pergunta de Jesus não era para ser respondida. Ela não poderia ser respondida por ninguém, além de Deus; ela foi feita como um aviso, para que o aparente atraso da volta do Senhor não se tornasse uma ocasião para a dúvida. A última resposta será dada pelos cristãos. A resposta pode ser: “Sim, haverá fé”, se determinarmos resistir às sugestões de dúvida de Satanás. Podemos ficar mais perto do Senhor, de modo que a fé se torne o resultado natural do nosso relacionamento íntimo com Ele. [24]

Wiersbe é enfático em dizer que não haverá grande fé no fim dos tempos. Oito pessoas foram salvas no tempo de Noé e somente quatro em Sodoma (e uma delas pereceu no caminho). Passagens como 1 Timóteo 4 e 2 Timóteo 3 apresentam um retrato sombrio dos últimos dias. [25]

John MacArthur diz que é impossível viver a vida cristã fielmente a não ser que seja à luz da segunda vinda. Conhecer o final da história nos dá confiança e estabilidade. Como diz Paulo: “sempre dedicados à obra do Senhor, pois vocês sabem que, no Senhor, o trabalho de vocês não será inútil” (1Co 15.58). [26] 

CONCLUSÃO 

Jesus conclui esta parábola fazendo uma pergunta, quando Ele voltar, Ele vai encontrar alguém orando fielmente na ânsia para a segunda vinda? Qualquer que amam a sua vinda, certamente gritarão: “Maranata” (“ora vem Senhor Jesus) (1Co 1.22).

Algumas pessoas pensam que a escatologia (a doutrina das últimas coisas), é mera especulação sensacionalista com pouco valor prático. Mas, como o ensinamento do Senhor nesta passagem indica, nada poderia estar mais longe da verdade. Os ensinos de Paulo a igreja de Tessalônica enfatiza ainda mais a importância e valor prático do ensino sobre o fim dos tempos. As duas epístolas do apóstolo Paulo a eles revelam que no breve tempo que passou com eles (cf. Atos 17.1,2), ele ensinou-lhes uma escatologia surpreendentemente abrangente (2Ts. 2.5).

Que a nossa oração seja como o Senhor nos mostrou nesta parábola. Orar para que Seu retorno seja muito em breve. Que possamos entender que não tem como o mundo melhorar, pelo contrário, estamos indo de mal a pior (2Tm 3.13). Como Jesus deixou bem claro para Sua Igreja, que na época de Sua vinda o mundo estará como nos dias de Noé e nos dias de Ló.

Pense nisso!           

Bibliografia:

1 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 466.

2 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 376.

3 – MacArthur, John. As Parábolas de Jesus, Ed. Thomas Nelson, Rio de Janeiro, RJ, 2018, p. 212.

4 – Henry, Matthew. Comentário Bíblico Novo Testamento Mateus a João, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2008, p. 678.

5 – Bailey, Kenneth. As Parábolas de Lucas, Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1985, p. 310.

6 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 287.

7 – Lopes, Hernandes Dias. Romanos, o evangelho segundo Paulo, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2010, p. 308.

8 – Neale, David A. Lucas, 9 – 24, Novo Comentário Beacon, Ed. Central Gospel, Rio de Janeiro, RJ, 2015, p. 206. 

9 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 365.

10 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 173.

11 – MacArthur, John. As Parábolas de Jesus, Ed. Thomas Nelson, Rio de Janeiro, RJ, 2018, p. 214.

12 – Bailey, Kenneth. As Parábolas de Lucas, Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1985, p. 312.

13 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 378.

14 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 321.

15 – MacArthur, John. As Parábolas de Jesus, Ed. Thomas Nelson, Rio de Janeiro, RJ, 2018, p. 215.

16 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 322.

17 – Edwards, James R. O Comentário de Lucas, Ed. Shedd, Sto Amaro, SP, 2019, p. 629.

18 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 247.

19 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 365.

20 – MacArthur, John. As Parábolas de Jesus, Ed. Thomas Nelson, Rio de Janeiro, RJ, 2018, p. 218.

21 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 509.

22 – Neale, David A. Lucas, 9 – 24, Novo Comentário Beacon, Ed. Central Gospel, Rio de Janeiro, RJ, 2015, p. 206.

23 – Evans, Craig A. O Novo Comentário Bíblico Contemporâneo, Lucas, Ed. Vida, São Paulo, SP, 1996, p. 304.

24 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 467.

25 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 323.

26 – MacArthur, John. As Parábolas de Jesus, Ed. Thomas Nelson, Rio de Janeiro, RJ, 2018, p. 223. 

segunda-feira, 6 de maio de 2024

JESUS VOLTARÁ - Lucas 17.20-37

Por Pr Silas Figueira

INTRODUÇÃO

A pergunta dos fariseus alicerçava-se sobre um conceito bem formal do reino divino, que para eles na verdade deve ser equiparado ao “reino messiânico”. [1] Eles acreditavam que este seria um reino literal que reavivaria o poder político judaico, livrando-os do jugo romano e fazendo dos judeus os senhores do mundo. [2]

Essa pergunta dos fariseus dá oportunidade a Jesus de ensinar verdades solenes sobre o reino de Deus e sua segunda vinda.

Vejamos o que Jesus ensinou a respeito do reino de Deus. 

1 – O REINO DE DEUS NÃO É UM REINO POLÍTICO (Lc 17.20,21).

A resposta de Jesus torna claro que o reino é diferente de quaisquer reinos com os quais os fariseus tinham familiaridade. [3]

Com isso em mente, podemos destacar algumas lições.

Em primeiro lugar, uma má interpretação das Escrituras gera expectativas erradas. William Hendriksen destaca que os fariseus e seus muitos seguidores estavam esperando a chegada de um reino exterior, terreno, visível, um reino no qual os judeus ocupariam um lugar muito proeminente. Eles mal podiam esperar sua vinda. [4] Creio que a resposta de Jesus tenha deixado os fariseus, e talvez alguns de seus discípulos, frustrados, pois esta era a expectativa de toda nação. Jesus não veio ao mundo para estabelecer o reino universal; Ele já era Rei sobre esse reino (cf. Mt 28.18; Ef 1.20,21), e isso foi demonstrado mediante Seu poder sobre a morte, as doenças e a criação. Jesus veio para fornecer acesso ao Seu reino espiritual para o seu povo. Mas o povo judeu não entendeu isso, e estavam esperando o Messias para estabelecer um reino temporal, um reino terreno.

Wiersbe destaca que a pergunta dos fariseus foi válida, mas também infeliz, pois Jesus havia ministrado no meio deles por cerca de três anos e ainda se encontravam em trevas espirituais. Não entendiam a natureza de Jesus nem da obra que realizava. Suas ideias acerca do reino eram políticas, não espirituais. [5]

Uma má interpretação das Escrituras leva as pessoas se frustrarem com Deus. Muitos creem de forma errada e depositam sua fé em promessas que Deus não fez. Mas Deus não tem compromisso com que não falou e nem prometeu.

O Brasil, e porque não dizer a “igreja”, viveu na expectativa de um “messias” político. Depositou sua fé em um homem, ou pelo menos, em sua ideologia, e se esqueceu de que o papel da Igreja é entender e viver o Reino de Deus de forma espiritual. Alguns chegaram à beira da idolatria. Por isso que o Senhor frustrou seus sonhos, pois Deus não divide a Sua glória.

Em segundo lugar, o reino de Deus não virá de forma externa (Lc 17.20,21). Não obstante, Jesus indica em sua resposta que eles abrigavam um conceito errôneo a respeito da natureza do reino, como se ele fosse chegar com proclamações estrondosas, corcéis imponentes, exércitos em marcha, música marcial; em suma, “exibição externa!” [6] A única forma externa revelada foi a “coroação” de Jesus na cruz do Calvário. Quando estava estabelecendo o Seu reino derrotando Satanás, levando sobre si os nossos pecados e nos fazendo reis e sacerdotes (Ap 1.6).

Em terceiro lugar, Jesus enfatiza que o reino de Deus se manifesta de forma interna (Lc 17.21). John C. Ryle destaca que a expressão de nosso Senhor descreve com exatidão o início de seu reino espiritual. 

Começou em uma manjedoura, em Belém, sem o conhecimento dos grandes, dos ricos e dos sábios. Apareceu de repente no templo em Jerusalém, e somente Ana e Simeão reconheceram seu Rei. Trinta anos depois, foi recebido somente por um pequeno grupo de pescadores e publicanos, na Galileia. Os principais sacerdotes e fariseus não puderam vê-lo. O Rei veio para o que era seu, mas os seus não O receberam. Durante muito tempo, os judeus confessavam estar aguardando o reino; porém, olhavam na direção errada. Não tinham qualquer garantia para os sinais que estavam aguardando. O reino de Deus estava no meio deles. Apesar disso, não o puderam ver. [7] 

David Neale diz que para Lucas, toda a expectativa do Reino de Deus deve estar fundamentada na mensagem de Moisés e dos profetas. Essas expectativas incluem a compaixão pelos marginalizados. Elas não incluem uma correspondente hegemonia religiosa, nacional ou racial. Lembre-se da resposta dos mensageiros de João Batista: “os cegos veem, os aleijados andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados e as boas novas são pregadas aos pobres” (Lc 7.22). Tudo isso já ocorreu e está ocorrendo no presente Reino de Deus. Para o Jesus de Lucas, é um erro pensar no Reino como uma realidade política. [8]

O reino de Deus é uma realidade espiritual invisível. Está entre nós e dentro de nós. Ou seja, onde uma pessoa se submete ao governo de Deus, onde um indivíduo se rende ao senhorio de Cristo, aí chegou o reino de Deus. [9] 

2 – A SEGUNDA VINDA DE CRISTO É UMA REALIDADE (Lc 17.22-37). 

Tendo respondido à pergunta dos fariseus, Jesus volta-se, então, para seus discípulos, a fim de instruí-los sobre a vinda do reino. O Mestre os adverte a não se tornarem tão obcecados por sua volta a ponto de não fazer outra coisa senão procurar sinais disso. [10]

Várias seitas surgiram exatamente por viverem em função dessa expectativa e marcarem datas para o advento de Cristo. Entre essas seitas estão os Adventistas, as Testemunhas de Jeová. Essas são as mais proeminentes.

A. W. Tozer diz que embora tenhamos a certeza de que Jesus voltará, não sabemos quando isso ocorrerá. Essa é a questão. Somos incapazes de prever esse momento. Desde os dias apostólicos, não existiu alguém suficientemente capaz de ou instruído nas escrituras para saber, exatamente, o dia e a hora da segunda vinda de Jesus. Todas as pessoas que opinaram fracassaram. [11]

No entanto, todos os verdadeiros cristãos que entendem as Escrituras e amam o Senhor Jesus Cristo, e estão preocupados com a Sua glória, desejam o Seu retorno. Embora, estamos vivendo um período em que tal expectativa está cada vez mais escassa. Hoje praticamente não se fala no retorno de Cristo e nem a respeito do arrebatamento da Igreja.

Com isso em mente, podemos destacar alguns pontos importantes.

Em primeiro lugar, Jesus fala a respeito de Sua ausência física entre os discípulos (Lc 17.22). Jesus está alertando aos Seus discípulos a respeito de Sua morte, e que os discípulos ansiarão pelo Seu retorno. Que a saudade do período em que estiveram com Jesus será grande e o quanto eles desejariam que aqueles dias voltassem.

Charles L. Childers enfatiza que o Senhor Jesus está aqui avisando os seus discípulos que dias negros os esperam – dias de perseguição e trabalho – quando suas mentes se voltariam às abençoadas lembranças do tempo em que Ele estava com eles. Eles desejarão a sua presença física novamente, mas esse desejo não será atendido. Estas palavras do Senhor Jesus também eram endereçadas àqueles discípulos que ainda não haviam nascido (incluindo a nossa época e épocas posteriores à nossa) e que só mais tarde tomariam conhecimento destas palavras. Nos dias de sofrimento e frustração, todos desejariam a presença física de Cristo. [12]

Em segundo lugar, a haverá o surgimento de falsos cristos (Lc 17.23). Em Mateus 24.23,24 lemos: “Então, se alguém vos disser: Eis que o Cristo está aqui, ou ali, não lhe deis crédito; porque surgirão falsos cristos e falsos profetas, e farão tão grandes sinais e prodígios que, se possível fora, enganariam até os escolhidos”.

A perplexidade da igreja primitiva, quanto à demora da volta de Cristo, que eles esperavam para breve (ver 1Co 15.51), é refletida na narrativa de Lucas (ver Lc 17.22,23). Muitos desejarão ver os “dias do Filho do homem”, o cumprimento das promessas do reino. Porém, em sua ansiedade, não deverão permitir que os falsos mestres os levem para um “falso reino” e para um “falso cristo”. [13]

Devemos ficar atentos, pois sinais e prodígios não é sinal de que o Senhor se faz presente nesse lugar. O que prova que o Senhor se faz presente em um lugar (de forma espiritual), é a sã doutrina sendo pregada e vivida. Sinais e prodígios podem até acontecer, mas sem negligenciar a sã doutrina. 

Em terceiro lugar, a volta de Jesus será repentina (Lc 17.24). A vinda (parousia) do Filho do Homem ocorrerá repentinamente, sem prévio aviso, como o relâmpago. Mas a linguagem aqui também implica que ela será visível, como o relâmpago, de um lado a outro no horizonte. A imagem implica claramente que haverá conhecimento, em todas as partes do mundo, da segunda vinda de Cristo. [14]

Em quarto lugar, Jesus ensina que antes padeceria muitas coisas e seria rejeitado por aquela geração (Lc 17.25). Seu retorno para buscar a Sua Igreja só aconteceria depois da Sua morte na cruz. William Hendriksen destaca que muito antes de ocorrer a segunda vinda, o Filho do homem deve sofrer. É um dever, porque o decreto de Deus desde a eternidade deve ser executado, a profecia deve ser cumprida, os eleitos desde a eternidade devem ser resgatados. Ele deve sofrer “muitas coisas”. Os detalhes horríveis desse sofrimento são aqui amorosamente ocultos. As palavras “e deve ser rejeitado por esta geração” mostram que Jesus estava apontando para o Calvário. [15]

Em quinto lugar, a segunda vinda de Cristo será num período de descuido espiritual (Lc 17.26-30). Jesus ofereceu dois paralelos históricos para mostrar como será nos dias do Filho do Homem. A época que precederá a vinda de Cristo se assemelhará aos dias de Noé. As pessoas estavam levando vidas normais e seculares, ignorando a Deus. Mas de repente o dilúvio (em grego, kataklysmos, “cataclisma”) os levou a todos. [16]

Os dias de Noé e os dias de Ló foram marcados antes de tudo pela indiferença. As pessoas comiam, bebiam, casavam, eles estavam sendo dadas em casamento... eles estavam comprando, vendendo, plantando, construindo, até o momento em que o julgamento caiu, até o dia em que Noé entrou a arca e no dia em que Ló saiu de Sodoma.

Os dias de Noé e Ló também foram dois dos mais miseráveis, vis e maus períodos da história humana. A maldade era galopante. Nos dias de Noé “a maldade do homem se multiplicara sobre a terra e que toda a imaginação dos pensamentos de seu coração era só má continuamente” (Gn 6.5). Sodoma nos dias de Ló também foi marcada pela perversão sexual, tanto que o nome da cidade passou a se referir ao pecado homossexual. Tão vil eram seus habitantes que tentou estuprar os dois anjos enviados para resgatar Ló e sua família do julgamento iminente de Sodoma (Gn 19.4-11).

Dia após dia, estamos caminhando para esses dias terríveis. As leis estão mudando para apoiar o pecado e não o que a Bíblia ensina. Vivemos dias em que o certo está se tornando errado, e o errado, está se tornando o certo. A igreja está cada vez mais reclusa e proibida de dizer a verdade abertamente. Líderes de muitas igrejas estão se rendendo a esse sistema maligno para não serem rechaçados pela sociedade. O que Jesus falou em Mateus 7.15-23 está se cumprindo em nossos dias. 

O Reverendo Hernandes Dias Lopes diz que 

não há nenhum mal nessas atividades. Todas elas são lícitas. O problema é que essas pessoas só fizeram investimentos na vida terrena e nenhum investimento na vida espiritual. Colocaram as bênçãos de Deus no lugar do Deus das bênçãos. Transformaram as dádivas de Deus na única razão para viver e se esqueceram de Deus. Assim estará o mundo quando Jesus voltar: as pessoas estarão pensando apenas em seus interesses imediatos e terrenos, não fazendo nenhuma provisão para a vida espiritual. O Dia do Senhor as apanhará de surpresa! [17]

Em sexto lugar, Jesus alerta a respeito da destruição de Jerusalém (Lc 17.31-33). Jesus para exemplificar o Seu retorno e o que acontecerá, cita um fato que muito em breve irão ocorrer: o cerco de Jerusalém pelos Romanos no ano 70 d.C. pelo general Tito. Esse cerco era somente um exemplo que na Sua volta será inescapável fugir dele. Nenhuma caverna conseguirá esconder as pessoas daquele que virá com grande poder e glória. Nem mesmo a morte poderá servir de escape naquele dia (Ap 6.12-17).

Leon Morris destaca que as palavras semelhantes em Mateus e Marcos se referem à fuga diante da queda de Jerusalém no ano 70 d.C., e alguns estudiosos sustentam que Lucas tirou o dito do seu contexto e o aplicou a uma situação em que a fuga seria impossível. [18] Quando Jerusalém foi invadida pelo general Tito, a cidade ficou devastada, o templo foi arrasado e incendiado, os muros foram quebrados, e o povo que não foi passado ao fio da espada acabou disperso pelo mundo. Nesse dia, era impossível pensar em resgatar algo de valor dentro de casa. O cerco de Roma tornou-se inescapável. [19]

Ralph Earle citando Eusébio de Cesareia nos diz como foi obedecida a ordem para que os que estavam na Judéia fugissem para os montes (Mt 24.16). Ele escreve: “No entanto, todo o corpo da igreja em Jerusalém tinha recebido uma ordem por uma revelação divina, dada antes da guerra aos homens de comprovada piedade, e saíram da cidade e viveram em uma cidade além do Jordão, chamada Pella”. [20]

Jesus cita como exemplo a mulher de Ló que olhou para trás e virou uma estátua de sal (Gn 19.17,26). O doloroso sobre a esposa de Ló é saber que em sua escala de valores ela pôs a terra antes do céu, as coisas materiais antes das espirituais. [21]

John C. Ryle destaca que devemos observar nestes versículos o aviso solene de nosso Senhor contra uma falsa confissão de segui-Lo.

A mulher de Ló foi deixada como um sinal e uma advertência para todos aqueles que professam ser crentes. Devemos temer que muitos serão encontrados na mesma situação da mulher de Ló, no dia da segunda vinda de Cristo. Existem muitos crentes professos, em nossa época, que avançam bastante em sua religiosidade. Conformam-se aos padrões externos de pais e amigos crentes. Falam a linguagem do povo de Deus; obedecem às ordenanças do cristianismo. Mas durante todo esse tempo suas almas não estão em retidão diante de Deus. O mundo está em seus corações, e estes, no mundo. Mais tarde, no Dia do Juízo, sua falsidade será exposta a todos. O cristianismo dessas pessoas será demonstrado como algo completamente podre. Existem muitos casos semelhantes ao da mulher de Ló. [22]

A mulher de Ló olhou para trás. O seu corpo já estava fora de perigo, conforme pensou; mas o seu coração continuava preso em Sodoma, diz Champlin. Assim sendo, ela se tornou um tipo do indivíduo de mente mundana, carnal, que só busca seus próprios interesses, sem jamais importar-se com a sua própria alma. [23] Ela foi tirada de Sodoma, mas Sodoma não foi tirada de dentro dela. [24]

Jesus faz um alerta solene: “Qualquer que procurar salvar a sua vida, perdê-la-á, e qualquer que a perder, salvá-la-á” (Lc 17.33). Fritz Rienecker diz que o termo psyché (vida em grego) designa a alma com todas as suas pulsões e capacidades naturais.

Salvar a vida psíquica significa querer mantê-la da maneira como ela é, tentando tão-somente desenvolvê-la e satisfazê-la. Esse, porém, é o meio para perdê-la. Para protegê-la do aniquilamento, existe apenas um meio: é preciso consentir em perdê-la livremente, pelo fato de entregá-la ao sopro do Espírito divino, que mata e vivifica simultaneamente, e o qual a preenche com seu poder superior e lhe comunica valor e beleza perenes. Contudo, quando se visa conservar a vida psyché, perde-se não apenas a vida natural em si, mas também a vida superior, eterna, na qual deveria ter-se transformada como a flor que se transforma no fruto. [25]

Em sétimo lugar, na segunda vinda de Cristo haverá apenas dois grupos de pessoas (Lc 17.34-36). Esses dois grupos são formados por aqueles que serão tomados no arrebatamento (lTs 4.17) e aqueles que serão deixados para o juízo (Mt 13.41,42; 2Ts 1.7-9; Ap 14.17-20). Nem intimidade física (dois na mesma cama) nem sociedade de trabalho (duas mulheres juntas moendo, dois homens no campo) pode impedir essa separação. [26]

William Hendriksen destaca que o versículo 34 descreve o que ocorre durante a noite; o versículo 35, o que ocorre durante o dia. Isso é muito lógico, porque o Filho do homem chega nos ares acima de um lugar onde for noite, será dia no outro lugar do globo e vice-versa. O que significa “tomada”? A resposta se encontra em 1 Tessalonicenses 4.17: “seremos arrebatados com eles nas nuvens para o encontro com o Senhor nos ares”. Veja também Apocalipse 14.14-16. [27]

Em oitavo lugar, a volta de Cristo será tão repentina que não haverá tempo para se preparar (Lc 17.37). Os ouvintes de Jesus querem saber onde tudo isto ocorrerá, mas Ele não responde diretamente. Parece que está citando um provérbio que apresenta a verdade de que é o cadáver que atrai os abutres (não águias – a palavra grega significa ambos, mas as águias não comem carniça nem se reúnem em bandos). Onde se acharem os espiritualmente mortos, ali haverá julgamento. [28] Os abutres (não águias) se precipitam sobre um cadáver, também diz William Hendriksen. [29]

Charles L. Childers citando William Barclay trata este parágrafo sob o título: “Os Sinais da Sua Vinda”. Ele observa: 1) Haverá tempos em que o cristão estará ansioso pela vinda de Cristo, mas precisará ser paciente, 22; 2) A vinda de Cristo é certa, mas a sua hora é desconhecida, 23-30; 3) Quando Cristo vier, Deus executará os seus julgamentos, 31-36; 4) Cristo virá quando as condições necessárias forem cumpridas - quando os motivos forem certos. Este é o sentido do provérbio contido no versículo 37. [30]

CONCLUSÃO

Quero concluir com as palavras de Warren W. Wiersbe onde ele diz que hoje em dia, há muitos cristãos professos que considerariam a volta de Cristo uma interrupção dos seus planos (ver 1Ts 5.1-11)!

Jesus retratou a civilização como um corpo em decomposição e que, um dia, estaria pronto a sofrer o julgamento. O cristão com discernimento encontra evidências desse fato por toda parte e sabe que os “dias de Noé” e os “dias de Ló” não tardarão. Nosso Senhor pode voltar a qualquer momento para buscar sua Igreja, de modo que não estamos à procura de sinais; antes, estamos cientes de que “os acontecimentos vindouros são precedidos de sua sombra”. Uma vez que vemos várias dessas coisas ocorrendo (Lc 21.28), sabemos que sua vinda se aproxima.

Estamos esperando sua volta, verdadeiramente ansiosos para que ele venha? [31]

Pense nisso!

Bibliografia:

1 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005, p. 322.

2 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 464.

3 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 243.

4 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 364.

5 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 318.

6 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 364.

7 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 282.

8 – Neale, David A. Lucas, 9 – 24, Novo Comentário Beacon, Ed. Central Gospel, Rio de Janeiro, RJ, 2015, p. 199.

9 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 501.

10 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 318.

11 – Tozer, A. W. Preparando-se Para a Volta de Jesus, Graça Editorial, Rio de Janeiro, RJ, 2018, p. 17.

12 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 465.

13 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 170.

14 – Earle, Ralph. Comentário Bíblico Beacon, Mateus, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 166.

15 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 366.

16 – Earle, Ralph. Comentário Bíblico Beacon, Mateus, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 168.

17 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 502.

18 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 245.

19 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 502.

20 – Earle, Ralph. Comentário Bíblico Beacon, Mateus, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 165.

21 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 369.

22 – Ryle, J. C. Meditações no Evangelho de Lucas, Ed. FIEL, São José dos Campos, SP, 2002, p. 285, 286.

23 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, Lucas, Vol. 2, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005, p. 171.

24 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 465.

25 – Rienecker, Fritz. O Evangelho de Lucas, Comentário Esperança, Ed. Evangélica Esperança, Curitiba, PA, 2005. p. 140.

26 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus o homem perfeito, Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2017, p. 504.

27 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 370.  

28 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1986, p. 246.

29 – Hendriksen, William. Lucas, vol. 2, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, SP, 2003, p. 370.

29 – Childers, Charles L. Comentário Bíblico Beacon, Lucas, vol. 6, Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 2006, p. 465.

31 – Wiersbe, Warren W. Lucas, Novo Testamento 1, Comentário Bíblico Expositivo, Ed. Geográfica, Santo André, SP, 2007, p. 320.