quinta-feira, 18 de março de 2010

A VERDADEIRA FELICIDADE PARA O NOVO CALVINISMO



Por Leandro Lima


O mais famoso e consistente defensor do novo calvinismo em minha opinião é o veterano John Piper. Embora eu pessoalmente não goste muito do termo “hedonismo cristão” que Piper utiliza, tenho que concordar que seu ensino a respeito da felicidade é bastante bíblico. Piper sempre precisa explicar a diferença entre o “seu hedonismo” e o “hedonismo filosófico”, até porque o termo “hedonismo” assusta, pois geralmente é associado com a ideia de que o prazer deve ser alcançado sem medir as consequências (ideia que os hedonistas filosóficos não concordariam, pois entendem que entre obter o prazer e evitar a dor, o segundo caso é preferível). Como já dissemos num post anterior, Piper faz questão de explicar que uma coisa não tem nada a ver com a outra, ou seja, seu hedonismo cristão é totalmente distinto do hedonismo filosófico. Por hedonismo cristão, Piper pretende defender a ideia de que os cristãos devem buscar o prazer em Deus e não nas coisas, e que essa busca do prazer em Deus é a grande vocação do cristão e é o que mais glorifica a Deus. Piper faz questão de esclarecer desde início:


O prazer cristão, no sentido com que eu uso o termo, não quer dizer que Deus se torna um meio de ajudar-nos a conseguir prazeres mundanos. O prazer que o cristão busca é o que está no próprio Deus. Ele é o fim da nossa busca, não o meio para algum outro fim. Nossa grande alegria é ele, o Senhor – não as ruas de ouro, ou a reunião com parentes ou qualquer outra bênção do céu. O prazer cristão não reduz Deus a uma chave que abre um baú cheio de prata e ouro. Antes, ele busca transformar o coração de tal modo que “o Todo-poderoso será o teu ouro e a tua prata escolhida” (Jó 22.25). (2001, p. 14).


Piper fundamenta sua tese no fato de que o Deus da Bíblia é um Deus feliz e que busca a felicidade. Mas Piper não ignora os sofrimentos e as tragédias da vida. Ele não postula um calvinismo triunfalista, mas um calvinismo equilibrado em relação à soberania de Deus. Em sua absoluta soberania, Deus decidiu e decretou tudo o que deve acontecer, inclusive as tragédias do mundo, e tudo isso faz parte de um plano tão perfeito, que Deus ao olhar para ele só pode se alegrar plenamente. Piper diz:


As pessoas erguem a mão para rebelar-se contra o Altíssimo, apenas para descobrir que sua rebeldia está, contra a sua vontade, a serviço dos maravilhosos desígnios de Deus. Nem mesmo o pecado pode frustrar os propósitos do Todo-poderoso. Ele não comete pecado, mas decretou que houvesse atos que são pecado. (2001, p. 25).


Piper não ignora a dificuldade com essa doutrina, pois apesar de declarar que “no fim, temos de reconhecer que, se há um Deus no céu, não existem meras coincidências, nem mesmo nos menores detalhes da vida” (2001, p. 26), reconhece que “muitos de nós já passaram por um período de grande luta com a doutrina da soberania de Deus” (2001, p. 27). Ele está se referindo a dificuldade que é aceitar a paradoxal asseveração de que, ao mesmo tempo em que Deus decreta tudo o que acontece, o ser humano é plenamente responsável por suas obras. Piper diz: “se levarmos nossas doutrinas para dentro do coração, onde é o lugar delas, elas podem causar agitação, emoção e noites insones” (2001, p. 27). Então ele alfineta o academicismo: “Isso é muito melhor do que brincar com ideias acadêmicas que nunca tocam a vida real. Pelo menos existe a possibilidade de que a agitação desemboque em um novo período de calma e confiança” (2001, p. 27).


O que se percebe é que Piper está realmente querendo aplicar o conceito reformado da soberania de Deus na prática, sem, contudo, ignorar suas dificuldades. Ele questiona:

Como podemos afirmar a felicidade de Deus com base em sua soberania quando muito do que Deus permite no mundo é contrário aos seus próprios mandamentos na Bíblia? Como podemos dizer que Deus é feliz quando há tanto pecado e desgraça no mundo? (2001, p. 28).


Sua resposta é que por um lado as atitudes más dos homens entristecem a Deus, mas só quando Deus olha para o evento em si mesmo, pois quando Deus olha para o evento através de um ângulo aberto, ele vê a tragédia ou o pecado em relação a tudo o que a causou e a tudo o que deriva dela. Ele a vê em relação a todas as ligações e efeitos que formam um padrão ou mosaico que se estende até a eternidade. Esse mosaico com todas as suas partes – boas e más – lhe apraz. (2001, p. 28).


Assim, Piper conclui que sua teologia do hedonismo cristão está fortemente estabelecida sobre a ideia reformada da soberania de Deus:


Por essa razão, quando digo que a soberania de Deus é a base da sua felicidade, não estou desprezando nem minimizando a ira e a tristeza que Deus pode expressar com o mal. Todavia, também não estou inferindo dessa ira e tristeza que Deus é um Deus frustrado que não consegue manter sua criação sob controle. Ele planejou desde a eternidade um mosaico magnífico da história da redenção e está moldando cada evento de forma infalível. A contemplação desse mosaico (com suas pedras claras e escuras) enche seu coração de alegria. (2001, p. 29).


Essa ideia, segundo Piper, revoluciona o modo de se pensar na pessoa de Deus. Ele não é o Deus irado e fechado de parte do puritanismo. Pelo contrário, pois se o coração do nosso Pai está cheio de felicidade profunda e inabalável, nós podemos ter certeza de que, quando buscamos nossa felicidade nele, não o encontraremos ‘de mau humor’. Não encontraremos um Pai frustrado, sombrio, irritadiço que quer ser deixado em paz, mas um Pai cujo coração está tão cheio de alegria que transborda para todos os que estão sedentos (e buscam o prazer cristão). (2001, p. 29).


A ideia de que o prazer de Deus deve ser experimentado no prazer em Deus leva-o a estender esse conceito e aplicá-lo a conversão, a adoração, a prática do amor, ao estudo da Bíblia, a oração, a administração do dinheiro, ao casamento, ao trabalho missionário e até ao próprio sofrimento. Há realmente um esforço por fazer da teologia calvinista algo aplicável aos mais variados aspectos da vida através da ideia da alegria em Deus. Piper descreve sua busca com as seguintes palavras: “Quase tudo o que prego, escrevo e faço é influenciado por esta verdade: a demonstração da glória de Deus e a alegria mais profunda da alma humana são uma coisa só”. (2008, p. 25).


A própria doutrina da eleição é apresentada por Piper como algo em que Deus se delicia e que os cristãos também deveriam aprender a se deliciar:


O ensino da Escritura sobre eleição tem sido controverso. Mas eu creio com todo o meu coração que ele é precioso além do que se pode dizer e um grande nutrimento para o crescimento na fé cristã. Se eu entendo o ensino da Bíblia, Deus tem prazer na eleição. Saber que isso é verdade e, saber porque é, é ver a outra face da glória de Deus. E este sinal é o poder para fazer-nos santos e felizes. (1991, p. 123).


O ensino e pregação de Piper, talvez, em algum ponto esteja sendo um apelo para a mentalidade do jovem moderno criado pelos meios de comunicação para buscar o prazer acima de qualquer coisa. Mas é um fato que Piper não está defendendo a busca do prazer a qualquer custo, muito pelo contrário. O fato de haver alguma identificação, como já dissemos, talvez explique em parte o novo vigor do calvinismo nos Estados Unidos. Nunca é demais lembrar que muitos teólogos apenas reproduzem a teologia antiga sem qualquer ponto de contato com a cultura atual. Piper não pode ser acusado disso, pois tem buscado desenvolver e aplicar a teologia em resposta aos maiores anseios das pessoas de hoje.


PIPER, John. Teologia da alegria: A plenitude da satisfação em Deus. São Paulo: Shedd Publicações, 2001.

PIPER, John. The pleasures of God: Meditations on God’s delight in being God. Portland: Multnomah, 1991.

PIPER, John. A paixão de Deus por sua glória: vivendo a visão de Jonathan Edwards. São Paulo: Cultura Cristã, 2008.



2 comentários:

  1. Olá pr. Silas.

    Gostei muito deste texto. De fato, a verdadeira felicidade do homem está em conhecer e buscar o verdadeiro propósito da sua existência: glorificar e gozar a Deus, o seu Criador.

    A verdadeira felicidade depende do nosso objetivo consciente de servirmos ao propósito para o qual fomos criados. Sem esse objetivo em mente, não há felicidade.

    Um grande abraço.

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  2. Graça e paz Heitor.
    John Piper aborda o hedonismo de uma forma pouco conhecida e buscada que é adorar a Deus e buscar a sua presença constante em nossas vidas. O resto é resto.
    Fique na Paz!
    Pr. Silas

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