domingo, 22 de dezembro de 2019

UMA ANUNCIAÇÃO ESPLENDOROSA



Por Pr. Silas Figueira

Texto base: Lucas 2.8-12

INTRODUÇÃO

A Bíblia nos fala que o primeiro Adão havia sido criado conforme a imagem de Deus, e o Senhor disse que essa criação era “muito boa”, no entanto, esse Adão era da terra, foi colocado em um jardim quando foi criado, no entanto, a Bíblia nos fala de outro Adão, porém este que é o Senhor do céu (1Co 15.47) – para este havia somente uma estrebaria e uma manjedoura. Enquanto o primeiro Adão teve um jardim, o segundo Adão que é Jesus, quando nasceu, não teve lugar para Ele na hospedaria.

A Escritura também nos diz que em sua encarnação o Senhor da glória (1Co 2.8) “se esvaziou, assumindo a forma de servo, e [foi] feito à semelhança de homens” (Fl 2.7). Jesus nasceu da descendência de Abraão e foi vestido no corpo de um infante. Todos os adjetivos e exclamações em nossa língua nunca poderiam dizer o suficiente sobre essa realidade. O nascimento mais notável da história aconteceu sob as mais obscuras e indescritíveis circunstâncias humildes que se possa imaginar, Jesus nasceu no local onde os animais daqueles que ficam em um abrigo público foram mantidos. Ninguém naquela sonolenta aldeia de Belém percebeu o significado do que tinha acontecido, a não ser, até certo ponto, os pais da criança. Quando um menino nascia os músicos da região se reuniam para celebrar esse nascimento, no entanto, quando Jesus nasceu em um estábulo em Belém essa cerimônia não teve lugar. Mas isso estava prestes a mudar; O silêncio sobre o nascimento do Salvador seria quebrado em uma forma mais sobrenaturalmente dramática. Se não houve música aqui da terra é bom pensar que os coros celestiais substituíram os músicos terrestres, que os anjos cantaram para Jesus canções que teria sido impossível entoar por bocas humanas.

Os céus desceram à terra para anunciar o nascimento do Salvador, no entanto, essa anunciação não foi dada aos religiosos de sua época, mas a pobres pastores que guardavam o seu rebanho durante a noite.

Por que a notícia do nascimento de Jesus foi aos pastores e não aos religiosos da época?

1 – DESDE O SEU NASCIMENTO JESUS SE IDENTIFICOU COM OS HUMILDES DESTE MUNDO (Lc 2.8-11).

Se o anúncio do nascimento de Jesus tivesse sido parte de uma campanha de relações-públicas humanamente planejado, ele teria sido tratado de forma muito diferente. O anúncio teria como alvo os poderosos e influentes em Israel: o Sumo Sacerdote, os membros do Sinédrio, os sacerdotes, os levitas, escribas, saduceus e fariseus. Em vez disso, Deus escolheu revelar essa gloriosa verdade em primeiro lugar, aos pastores que cuidavam do seu rebanho na calada da noite.

É desses pastores, que cuidavam do rebanho nas cercanias de Belém, que a história do Natal fala agora. Sobre os mesmos campos em que no passado Davi pastoreava os rebanhos do pai, e sob o mesmo céu estrelado, sob o qual Davi se edificava (Sl 8), os pastores talvez entoassem os salmos de Davi, fortalecendo assim o seu anseio pelo Filho de Davi. Deve ser plausível a suposição de que aqui em Belém aquela expectativa estava particularmente viva, pelo menos entre aqueles que esperavam pela redenção.

Diante disso, podemos destacar algumas considerações importantes:

1o – Os pastores eram uma classe desprezada. Todos os dias no templo, pela manhã e à tarde, oferecia-se um cordeiro sem mancha como sacrifício a Deus. Para assegurar-se de que não houvesse a falta destes cordeiros perfeitos, as autoridades do templo tinham seus próprios rebanhos, e sabemos que estes pastavam perto de Belém. Provavelmente estes pastores eram funcionários do templo. No entanto, os pastores eram desprezados pelos bons ortodoxos de seus dias. Virtualmente não podiam cumprir com todos os detalhes da Lei cerimonial; não podiam observar todas as meticulosas lavagens de mãos, as normas e as regulamentações. O cuidado de seus rebanhos os absorvia e os ortodoxos os consideravam como pessoas inferiores. Não desfrutavam de boa reputação naqueles dias. Não eram considerados fidedignos e não lhes era permitido dar testemunho nos tribunais. Eles eram considerados plebe que desconhece a lei. Eram, inclusive, privados da honra dos direitos civis.

No entanto, eles eram úteis para sua religião, mas inúteis para servi-la no templo. Eram usados pelos religiosos, mas negligenciados pelos mesmos. Eram úteis para os religiosos mas inúteis e não podiam estar no templo. Essa é a incoerência da religião formal; dos observadores de preceitos, dos teólogos nominais, dos que desconhecem o Deus que se revela nas Escrituras.

Isso aponta para uma grande incoerência que ainda se vê nas igrejas de forma geral. Exigem-se certas práticas e compromissos que acabam sendo impraticáveis por vários tipos de pessoas. Não necessariamente por estes serem relaxados religiosamente, mas pelas próprias exigências de suas vidas, trabalhos e contexto em geral. Quando a religião torna-se complicada demais, excluem-se automaticamente muitas pessoas; embora ainda precisando delas. Leia Colossenses 2.16-23. Nesse texto Paulo deixa claro o que estamos falando aqui.

2o – As Boas Novas a respeito do Cordeiro de Deus é dada aos pastores. Apesar dos religiosos os desprezarem, Deus não os desprezou, pelo contrário, foram eles que receberam a mais bela visita angelical anunciando o nascimento do Cordeiro de Deus.

É belo pensar que os pastores que cuidavam dos cordeiros do templo foram os primeiros a ver o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo (Jo 1.29). Já vimos que quando nascia um menino os músicos da região se congregavam para saudá-lo com música singela, agora a música para Este Menino não é entoada pelos homens, mas é entoada pelos anjos, pois este que nascera era o Cordeiro de Deus. O Salvador do mundo. É algo maravilhoso que a história nos conte que o primeiro anúncio de Deus foi aos pastores considerados inúteis para os religiosos, mas honrados por Deus para receberem tais notícias.

O Senhor não se revela aos poderosos, mas aos humildes. Ele não se revela aos que são religiosos, mas aos que temem a Deus. Deus pode até falar pela boca de um líder sem compromisso com Ele, como lemos em Mateus 7.22,23:

Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não fizemos muitas maravilhas? E então lhes direi abertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade”.

O mesmo vemos em João 11.49-51:

Depois os principais dos sacerdotes e os fariseus formaram conselho, e diziam: Que faremos? Porquanto este homem faz muitos sinais. Se o deixamos assim, todos crerão nele, e virão os romanos, e tirar-nos-ão o nosso lugar e a nação. E Caifás, um deles que era sumo sacerdote naquele ano, lhes disse: Vós nada sabeis, nem considerais que nos convém que um homem morra pelo povo, e que não pereça toda a nação. Ora ele não disse isto de si mesmo, mas, sendo o sumo sacerdote naquele ano, profetizou que Jesus devia morrer pela nação”.

Assim como falou pela boca de uma jumenta com Balaão (Nm 22.27-30), assim como usou a própria boca de Balaão, mas Deus não tem compromisso com esse tipo de pessoa. É melhor sermos irracionais como a jumenta de Balaão do que ser profeta cego que não contempla a glória de Deus. É melhor sermos pastores que cuidam com diligência do rebanho do Senhor do que ser um líder religioso preconceituoso que anda longe das ovelhas do Senhor.

A escolha de Deus de pastores para receber o anúncio do nascimento de seu Filho está de acordo com a profecia do Antigo Testamento sobre o ministério do Messias. Isaías 61.1 profeticamente se cumpriu pela boca do próprio Messias:

O Espírito do Senhor está sobre mim, porque o Senhor me ungiu para anunciar a boa nova aos pobres; enviou-me a curar os quebrantados do coração, a proclamar liberdade aos cativos e a liberdade aos prisioneiros”.

Depois de ler essa passagem na sinagoga de Nazaré, Jesus declarou: “Hoje se cumpriu esta Escritura em vossos ouvidos (Lc 4.21). O ministério do Messias não seria o farisaico (Lc 5.32) - especialmente os líderes religiosos (Jo 7.48), ou o autossuficiente rico (Lc 18.24). Em vez disso, Ele buscaria os pobres, os humildes, os aflitos, os excluídos da sociedade (cf. Lucas 1.52; 1Co 1.26). Ao longo de seu ministério Jesus atraiu essas pessoas que foram quebradas pelos seus pecados e se humilharam em arrependimento (cf. Lc 7.37,38;18.13,14,19.8-10).

3o – Jesus nasceu em um mundo em trevas (Lc 2.8,9). Observe algo interessante, não foi sobre o Jesus menino e nem mesmo diante de Maria e José que resplandeceu a luz celestial. A estrebaria continuou escura e em sua constituição normal. Contudo lá fora, no campo, na direção do deserto, onde os pastores de ovelhas estavam acampados junto aos rebanhos, um dos mensageiros angelicais cumpriu um alto mandato de arauto. O céu está repleto daquilo que a terra deixa de lhe oferecer! A terra se cala. Como nos fala João: “Ele veio para os seus, mas os seus não o receberam” (Jo 1.11). Todos dormem na noite profunda. O céu, porém, celebra um grandioso e eterno dia!

A luz raia e rasga a noite! O anúncio da vinda do Cordeiro de Deus não foi de dia, mas a noite. Não foi enquanto todos andavam de um lado para outro, mas enquanto todos dormiam. A luz só é necessária nas trevas, em densa escuridão, no sono do descaso, foi isso que vimos aqui nesse texto.

A luz brilhou para os desprezados dos religiosos. A luz brilhou para os que guardavam as ovelhas do Senhor – eram ovelhas para o sacrifício diário. A luz brilhou para aqueles que estavam proibidos de estarem no templo. O sumo sacerdote não viu, os sacerdotes não perceberam, os levitas não se deram conta do ocorrido, os fariseus e os doutores da lei ficaram em densas trevas. Mas a luz brilhou para os que estavam cuidando do rebanho do Senhor.

4o – O Supremo Pastor veio cuidar das Suas ovelhas (Jo 10.11-14; 1Pe 5.4). Apesar de os pastores estarem perto do fundo da escada social; serem considerados ignorantes e não qualificados, cada vez mais visto como pessoas não confiáveis, personagens desagradáveis e desonestas, tanto que eles não foram autorizados a testemunhar em tribunal; apesar de tudo isso, Jesus se identifica como Pastor de nossas almas. É interessante observar que os dois personagens mais importantes para os judeus, Moisés e Davi, foram pastores em algum momento de suas vidas ((Êx 3.1; 1Sm 16.11, 17.34,35). Além disso, o Antigo Testamento refere-se metaforicamente a Deus como o “pastor de Israel” (Sl 80.1 cf. 23.1; Is 40.11), Enquanto Jesus descreveu-se como o “Bom Pastor” (João 10.11, 14; cf. Hb 13.20; 1Pe 2.25; 5.4).

Um dos salmos mais lidos e conhecidos da Bíblia, creio que seja o Salmo 23. Este Salmo nos mostra o relato de uma ovelha a respeito do cuidado do Bom Pastor para com ela. Quando identificamos essas características em Deus é que podemos compreender o que o apóstolo Paulo quis dizer em 1Co 1.27-31:

Mas Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias; e Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes; e Deus escolheu as coisas vis deste mundo, e as desprezíveis, e as que não são, para aniquilar as que são; para que nenhuma carne se glorie perante ele. Mas vós sois dele, em Jesus Cristo, o qual para nós foi feito por Deus sabedoria, e justiça, e santificação, e redenção; para que, como está escrito: Aquele que se gloria glorie-se no Senhor”.

2 – O CONTEÚDO DA MENSAGEM DOS ANJOS (Lc 2.10-12).

O resplendor da glória de Deus através do anjo foi algo que trouxe grande temor aos pastores. O anjo se apresenta de forma completamente diferente da que se apresentou a Zacarias no templo e a Maria em Nazaré, mesmo assim eles ficaram temerosos, imagine os pastores que nem no templo podiam entrar? O esplendor do Senhor, a doxa = glória, que envolvia esse anjo iluminou também os pastores. A glória do Senhor resplandeceu sobre esses homens simples e rejeitados. O medo que eles sentiram era a resposta normal sempre que alguém na Escritura que encontrou um anjo (cf. Dn 8.15-18; 10.7-9,16,17; Mt 28.2-4; Lc 1.12, 26-30) ou viu a glória de Deus manifestado (Is 6.1-5; Ez 1.28; 3.23; Mt 17.5,6; Mc 4.41; 5.33; At 9.4; Ap 1.17). Creio que não seria diferente com nenhum de nós.

Vamos analisar o teor da mensagem do anjo.

1o – O anjo acalma o coração dos pastores (Lc 2.9,10). O medo tomou seus corações, mas imediatamente o anjo lhes acalma. O anjo diz que lhes trazia boa notícia. A boa notícia (Evangelho) que o anjo proclamou é para todas as pessoas. Laos (pessoas no grego) refere-se primeiro a Israel (1.68; 7.16; 19.47; 21.23; 22.66; 23.5, 14), pois “a salvação vem dos judeus” (Jo 4.22; cf. Rm 1.16). Mas a promessa da salvação não é somente para eles. Depois de louvar a Deus ao ver o menino Jesus no templo, Simeão disse: “Porque os meus olhos viram a tua salvação, que preparaste na presença de todos os povos: luz para revelação aos gentios, e para glória do teu povo Israel” (Lc 2.30-32). Significativamente, laos no versículo 31 é plural, ao mesmo tempo que é singular no versículo 32. As palavras de Simeão refletir a verdade expressa na profecia de Isaías: (Is 60.1-3; cf. Is 9.2; 42.6; 49.6-9; 51.4).

2o – Nasceu o Salvador que é Cristo o Senhor (Lc 2.11). Como disse João: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1.14). Estava se cumprindo naquela noite o que o profeta Isaías havia profetizado cerca de setecentos anos antes: “Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu, e o principado está sobre os seus ombros, e se chamará o seu nome: Maravilhoso, Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz” (Is 9.6).

1) Ele nasceu. O nascimento é sempre a primeira realidade de um ser humano. Esse Redentor “nasceu”. Ele nasceu, Ele não apareceu como esse anjo que o anuncia com as vestimentas de luz da glória de Deus. Não, esse Salvador tornou-se nosso irmão de sangue, osso dos nossos ossos, carne de nossa carne, para que soubesse como nos sentimos neste pobre corpo carnal, e viesse a ser nosso misericordioso sumo sacerdote, para expiar nosso pecado e nos atrair para o alto como membros de seu corpo, de sua carne e seus ossos (Ef 5.30).

2) Para vós, diz o anjo. Essa é a mais gloriosa palavra em toda a primeira pregação de Natal. “Para vós”, diz o anjo, “para vós”, para os humanos, não foi para os anjos que Ele nasceu, o Supremo Senhor se tornou ser humano. Como disse Lutero: “Os anjos não precisam do Redentor, e os demônios não o querem. Ele veio por nossa causa, nós é que precisamos dele”.

3) Hoje! O Redentor, que é de eternidade a eternidade, entrou no tempo. A palavra “hoje” define seu nascimento como fato histórico. A encarnação do Filho de Deus não é um pensamento, uma ideia, um produto da fantasia que se construiu em personalidades ansiosas e esperançosas, mas um fato histórico que provocou um efeito imenso.

Desde aquele “hoje” passaram-se séculos, mas será que a palavra do anjo não continua sempre ressoando em nosso coração, como se fosse hoje? A história de nosso Redentor, por mais verdadeira e real que tenha sido no tempo, não é como a história de outras pessoas, pertencente apenas ao tempo. Aqui o passado se torna presente, porque essa história pertence à eternidade e se renova incessantemente, prolongando-se todas as vezes que seu poder animador é experimentado por um coração humano.

A tríplice descrição desse menino dada pelo anjo:

1) Ele é o Salvador – O anjo prefaciou sua descrição tríplice do Menino recém-nascido dizendo aos pastores que Aquele de quem ele falava tinha nascido para eles. Jesus é o Salvador de os judeus e gentios; individualmente, Ele é o Salvador de todos os que creem nEle (João 3.16). O anjo não deu nome terreno da Criança; Salvador, Cristo e Senhor são todos os títulos. Mas desde que o nome “Jesus” significa “o Senhor é salvação”, seu significado é abarcado pelo termo Salvador.

2) Ele é o Cristo – é um título exaltado para um bebê nascido em tais circunstâncias humildes. Ele é o Cristo, i. é, o Ungido, em hebraico o “Messias” (Dn 9.25,26), também significa “ungido”; uma pessoa colocada em um alto cargo e digno de exaltação e honra. Jesus foi ungido pela primeira vez no sentido de que Ele é o Rei designado por Deus, o “Rei dos reis” (Ap 17.14; 19.16), que vai sentar-se no trono de Davi e reinará para sempre, como Gabriel disse à Maria (Lc 1.32,33). Ele também foi ungido para ser o grande Sumo Sacerdote (Hb 3.1) para o seu povo; o mediador entre eles e Deus (1Tm. 2.5), que intercede por eles (Hb 7.25.). Finalmente, Jesus foi ungido como um profeta, porta-voz do final dos tempos (Hb1.1,2).

3) Ele é o Senhor – no sentido humano é um termo de respeito e estima, dado a alguém em uma posição de liderança e autoridade. Este título era dado aos proprietários de escravos; kurios (Senhor) e doulos (escravos) foram conectados. Mas, neste contexto, Senhor não é uma mera designação humana elevada; é um título divino. Dizer que esta criança é o Senhor quer dizer que Ele é Deus. Quando usado em referência a Jesus Cristo, kurios (Senhor) transmite tudo o que está implícito no tetragrama YHWH (Yahweh que a Septuaginta traduz kurios) - o nome de Deus (cf. Ex. 3.14,15). A confissão mais fundamental e básico do cristianismo é, “Jesus é o Senhor” (1Co 12.3). Ninguém que não afirma plena divindade de Cristo e sua igualdade com Deus, o Pai pode ser salvo, pois, como Ele advertiu os judeus, porque se não crerdes que eu sou, morrereis em vossos pecados (Jo 8.24).

3o – Um sinal de humildade (Lc 2.12). Os pastores recebem a notícia de que nascera o Salvador do mundo, isso por si só já era algo esplêndido, mas que esse Salvador estava em uma manjedoura? Isso sim era surpreendente. Uma admirável troca: o servo (no caso, o anjo do Senhor) vem na “glória de seu Senhor”, a saber, em esplendor de luz sobrenatural, a ponto de as pessoas se atemorizarem (v. 9), mas o Senhor em si vem como um bebê de fraldas na manjedoura. De fato, se o anjo do Senhor não o tivesse dito pessoalmente – como os pobres pastores poderiam ter crido e acolhido essa mensagem?!

O Salvador do mundo não está em um palácio, mas em uma manjedoura. O herdeiro do trono de Davi possuía uma estrebaria como salão real, uma manjedoura como trono, feno e palha como lugar de repouso e duas pessoas desabrigadas como séquito.

CONCLUSÃO

É preciso ler a narrativa de Natal sem o brilho poético e aconchegante, a fim de captar o realismo rude, terreno, com que aqui se apresenta a narrativa. O evangelista não fala do doce menino de cabelo cacheado, da estrebaria limpinha e dos probos pastores, mas de um casal exausto, da miséria de uma jovem mãe que tem de dar à luz seu filho em lugar estranho e precário sem qualquer ajuda, de uma criança que enxerga a luz do mundo em uma estrebaria suja, e de cuja chegada inicialmente ninguém, exceto alguns pastores proletários, tomou conhecimento. Isso sim é o verdadeiro sentido do Natal!

Pense nisso!

Bibliografia:

1 – Barclay, William. Comentário do Novo Testamento, Lucas.

2 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, volume 2, Lucas e João. Editora Candeia, São Paulo, SP, 1995.

3 – Davidson, F. O Novo Comentário da Bíblia, volume 2. Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1987.

4 – Hale, Broadus David. Introdução ao Estudo do Novo Testamento, Editora Juerp, Rio de Janeiro, RJ, 1986.

5 – Keener, Craig S. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia, Novo Testamento. Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 2017.

6 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus, o homem perfeito. Comentário Expositivo Hagnos. Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017.

7 – MacArthur, John. Comentário do Novo Testamento, Lucas.

8 – Manual Bíblico SBB. Barueri, SP, 3a edição, 2018.

9 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário. Edições Vida Nova e Mundo Cristão, São Paulo, SP, 1986.

10 – Rienecker, Fritz. Evangelho de Lucas, Comentário Esperança. Editora Esperança, Curitiba, PR, 2005.


sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

DEUS SE FEZ HOMEM E HABITOU ENTRE NÓS (O PRIMEIRO NATAL)























Por Pr. Silas Figueira


Texto base: Luas 2.1-7

INTRODUÇÃO

Este capítulo, que fornece o olhar mais detalhado sobre os acontecimentos do primeiro Natal, é talvez o capítulo mais conhecido na Bíblia. Sua história conhecida tem música inspirada, cartões, livros e concursos ao longo dos séculos. Mas o mundo celebra o nascimento de Jesus Cristo, por razões erradas. Natal tornou-se uma desculpa para a autoindulgência (Tendência para desculpar os próprios erros e defeitos), o materialismo e as festas; ele se degenerou em um evento social secularizado que perde totalmente o seu verdadeiro significado.

Durante os primeiros séculos de sua existência, a igreja não celebrava o nascimento de Cristo. Alguns dos primeiros pais da igreja, em especial, Orígenes, chegou a argumentar contra a comemoração dos aniversários dos santos e mártires (incluindo Jesus). Os pais da igreja argumentavam que essas pessoas deveriam ser honradas no dia do seu martírio e não no dia do seu nascimento. Observando que os únicos aniversários mencionados na Bíblia são os de Faraó (Gn 40.20) e Herodes (Mt 14.6.). Eles viam as comemorações de aniversário como um costume pagão. Até o século II, a data real do nascimento de Cristo havia sido esquecido. Os primeiros indícios da igreja comemorando o Natal em 25 de dezembro vem do manuscrito do século IV conhecido como o Chronography ou Calendário de 354 d.C. De acordo com esse documento o Natal era comemorado em 25 de dezembro pela igreja de Roma por volta do ano 336 d.C. Essa data foi gradualmente adotada pela igreja como um todo ao longo dos próximos séculos.

Por que a igreja finalmente decidiu celebrar o nascimento de Jesus em 25 de dezembro também não se sabe ao certo. Alguns acreditam que ele era para oferecer uma alternativa cristã ao popular feriado pagão conhecido como dies natalis Solis Invicti (“o nascimento do sol invicto”), que era comemorado em 25 de dezembro. Esse festival tinha como propósito honrar a vários deuses do sol, a principal dessas divindades foi Mithras, cujo culto (mitraísmo) representou uma séria ameaça para a igreja cristã. Outros sustentam que a data foi escolhida porque é de nove meses após o 25 de Março, o dia em que algumas pessoas acreditavam (sem garantia bíblica) ser a data da concepção de Jesus.

Curiosidades à parte, vamos analisar esse texto e ver o que ele tem a nos ensinar.

1 – DEUS PREPAROU O MUNDO PARA O NASCIMENTO DE JESUS (Lc 2.1,2).

O apóstolo Paulo escrevendo aos Gálatas disse: “Mas, vindo a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei” (Gálatas 4.4). A vinda de Cristo a terra foi planejada desde a eternidade. O Senhor preparou o mundo para que isso ocorresse. Nada foi obra do acaso. O Senhor trabalhou na história para que o Salvador viesse a terra em tempo oportuno.

1o – Resumidamente ocorreram estes eventos históricos durante a história de Israel:

Período Babilônico (605 a.C. - 538 a.C.) - sob a liderança de Nabucodonosor, a Babilônia conquista Judá. Nesse período de cativeiro que durou cerca de 70 anos, Israel deixou de ser uma comunidade agrícola para se tornar uma comunidade comercial. Nesse período também surgem as sinagogas. Os judeus abandonam a idolatria. Preservam a língua e a Lei de Moisés.

Período Medo-Persa – (538 a.C. - 331 a.C.) - Reconstrução do templo em Jerusalém e a reconstrução dos seus muros. O povo pôde voltar para sua terra.

Período Grego (331 a.C. - 167 a.C.) - Através do reinado dos gregos o Senhor estabelece uma língua universal – o grego koinê. Inclusive, o Novo Testamento foi escrito em grego koinê – língua comum.


Período Macabeu (167 a.C. - 63 a.C.) - Antíoco Epifânio tentou implantar a cultura helenística aos judeus e profanou o templo, com isso houve uma revolta liderada pelos macabeus. Com isso a nação judaica esteve independente de 142 a.C. a 63 a.C. 

Período Romano (63 a.C. -167 d.C.) - Havia liberdade religiosa, estradas seguras, leis justas e muito duras, e a implantação da crucificação para criminosos perigosos.

Deus prepara o mundo para a vinda de Jesus. Por isso que Paulo fala com muita propriedade que o Senhor nasceu na plenitude dos tempos. O Senhor preparou o mundo nesses 600 anos para que Seu Filho viesse ao mundo. O evangelista Lucas começa descrevendo exatamente esse tempo histórico que Paulo chama de “plenitude dos tempos”. Jesus não nasceu nem antes e nem depois, mas no tempo determinado por Deus.

No entanto, a preparação do mundo para a vinda do Salvador começou desde a fundação do mundo como está escrito no Apocalipse: “E adoraram-na todos os que habitam sobre a terra, esses cujos nomes não estão escritos no livro da vida do Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo” (Apocalipse 13.8; conf. Lc 3.23-38).

A plenitude dos tempos que Paulo nos fala em Gálatas 4.4 quer dizer que o tempo estava cumprido sob o aspecto político, linguístico, de comunicações e religioso. Um reino (o Império Romano), uma língua (o idioma grego), uma rede de comunicação (estradas e conexões de navegação) unia o império mundial no mar Mediterrâneo. Religioso (a religião judaica bem firmada), apesar do sacerdócio corrupto, havia muitas pessoas tementes a Deus.

2o – O Rei dos reis nasce quando César Augusto era o imperador (Lc 2.1). Seu verdadeiro nome era Caio Otávio. Ele foi imperador no período de 27 a.C. a 14 d.C. Era sobrinho neto do grande imperador Júlio César. Seu tio-avô tinha grande estima por ele e concedeu-lhe muitas honras. Quando Júlio César foi assassinado em 44 a.C., Otávio descobriu que, no testamento deixado pelo imperador, ele havia sido constituído como seu filho e herdeiro. Então, imediatamente mudou seu nome para Caio Júlio César. No ano 27 a.C., o senado romano conferiu a Otávio, agora Caio Júlio César, o título de Augusto (venerável). Dali para frente, ele passou a ser conhecido como César Augusto ou Augusto César. Ele tinha grande habilidade administrativa, promovendo as artes, incentivando a literatura e propiciando ao império um longo período de prosperidade e paz.

César Augusto era o imperador, mas quem estava no controle do mundo era o Senhor nosso Deus, pois usou de um édito do imperador para levar José e Maria a percorrer cerca de 120 quilômetros que separavam Nazaré de Belém para que se cumprisse a Sua Palavra. Os governantes pensam que estão no controle do mundo, mas só estão por vontade permissiva de Deus. Como lemos em João 19.10,11 quando Jesus está perante Pilatos: “Disse-lhe, pois, Pilatos: Não me falas a mim? Não sabes tu que tenho poder para te crucificar e tenho poder para te soltar? Respondeu Jesus: Nenhum poder terias contra mim, se de cima não te fosse dado.

Spurgeon disse “que para mostrar um espírito independente, um tirano menor, Herodes, ofende o tirano maior, César Augusto. Por causa disso, Augusto lhe informa que não o tratará mais como amigo, mas como servo. E para mostrar o seu desgosto, ordena que se faça um censo de todo o povo judeu como preparação a um planejado regime tributário (Lc 2.1-5). Desta forma o Senhor faz com que Sua Palavra se cumprisse. Assim como o Senhor nosso Deus tem um freio para o cavalo de guerra mais selvagem e um gancho para o mais terrível leviatã, da mesma forma os governantes do mundo são como marionetes movidas por fios invisíveis nas mãos do Supremo Senhor da terra e céus”.

A inserção do nascimento de Jesus no contexto histórico do governo do imperador Augusto tem meramente a finalidade de mostrar que em última análise os mais poderosos desta terra não passam de instrumentos para a concretização da vontade de Deus! Na obediência do judeu José ao gentio Augusto, se explicita que unicamente a mão de Deus governa.

3o – Os cumprimentos proféticos acerca de Jesus se concretizaram. Jesus nasceu em Belém Efrata como cumprimento profético (Mq 5.2 e Mt 2.6). Cerca de 700 a.C., Miqueias já havia profetizado que o Messias nasceria na pequena Belém. Aliás, o AT tem mais de 100 profecias a cerca de Jesus. Veja apenas alguns exemplos:

1 – Que Ele nasceria de uma virgem (Is 7.14; Mt 1.18-25).
2 – Que Ele viria da tribo de Judá (Gn 49.9,10; Hb 7.12-17).
3 – Que Ele seria da linhagem de Davi (2Sm 7.12-16; Mt 1.1).
4 – Que por ocasião do seu nascimento haveria um infanticídio (Jr 31.15; Mt 2.16-18).
5 – Que seus pais teriam que fugir para o Egito (Os 11.1; Mt 2.13-15).
6 – Que Ele nasceria em Belém Efrata (Mq 5.2; Mt 2.4-6).

O Senhor que falou através dos seus profetas fez com que se cumprisse a Sua Palavra. Ele é o Senhor da história; pois para Deus nada é impossível e Ele vela por cumprir a sua Palavra. O Seu nascimento não foi como o de qualquer outra criança, Ele era diferente de qualquer outra criança que já nasceu, seja antes ou depois. Pois este menino era o Filho de Deus, o Senhor Jesus Cristo, divindade em carne humana, tão esperado Messias de Israel, o Salvador do mundo. Em seu nascimento Deus entrou sociedade humana como uma criança; o criador do universo se tornou um homem; o eterno “Verbo se fez carne, e habitou entre nós” (João 1.14).

2 – UMA VIAGEM NECESSÁRIA (Lc 2.3-7).

No Império Romano se realizavam censos periódicos. A cada quatorze anos, o governo romano realizava um censo com duplo objetivo: para impor as contribuições e para descobrir aqueles que podiam cumprir o serviço militar obrigatório. Os judeus estavam isentos do serviço militar, e, portanto, o censo na Palestina tinha um propósito predominantemente impositivo, e todos os homens judeus tinham que voltar à cidade de seus antepassados para registrar seu nome, ocupação, propriedades e família.

O texto original de Lucas diz: Aconteceu… que saiu um decreto (um dogma) de César Augusto. O resultado do recenseamento de César Augusto foi de 60 milhões de pessoas. Isso significava: um imenso reino, uma enorme potência. O resultado da contagem divina significa: “Um pobre gênero humano, um mundo perdido!”. Devido a isso, Jesus veio ao mundo.

Com isso em mente podemos destacar duas coisas:

1o – O Evangelho tem uma ligação com a realidade do mundo (Lc 2.3-5). Quem pensa que o Evangelho é um acontecimento à parte da história secular hoje, está enganado. Como já falamos a história está nas mãos do Senhor e Ele a move segundo os seus propósitos. Hoje os acontecimentos históricos continuam sendo controlados pelo Senhor. Isso não ocorreu somente para que o Senhor Jesus nascesse. Nos dias atuais a história se move para que o Senhor retorne a esta terra para buscar o Seu povo, mas antes disto é necessário que aconteça o que nos falou o apóstolo Paulo:

Ninguém de maneira alguma vos engane; porque não será assim sem que antes venha a apostasia, e se manifeste o homem do pecado, o filho da perdição, o qual se opõe, e se levanta contra tudo o que se chama Deus, ou se adora; de sorte que se assentará, como Deus, no templo de Deus, querendo parecer Deus” (2 Ts 2.3,4).
Sabe, porém, isto: que nos últimos dias sobrevirão tempos trabalhosos. Porque haverá homens amantes de si mesmos, avarentos, presunçosos, soberbos, blasfemos, desobedientes a pais e mães, ingratos, profanos, sem afeto natural, irreconciliáveis, caluniadores, incontinentes, cruéis, sem amor para com os bons, traidores, obstinados, orgulhosos, mais amigos dos deleites do que amigos de Deus, tendo aparência de piedade, mas negando a eficácia dela. Destes afasta-te” (2 Tm 3.1-5).

Já que o Evangelho está ligado diretamente aos fatos históricos atuais, é bom lembrarmos que estaremos sujeitos a aborrecimentos por parte do mundo secular. Deus não tornará o mundo melhor para nós que o servimos. José e Maria passaram por momentos difíceis em suas vidas. Vejam aqui a viagem que tiveram que fazer de Nazaré até Belém. Eles poderiam ter algum privilégio já que Maria estava carregando em seu ventre o Filho de Deus, ou quem sabe serem isentos dessas obrigações, mas não foi isso que ocorreu. Isso é uma lição para nós que pensamos que as adversidades não deveriam acontecer com os crentes em Jesus. Que, por sermos seus servos, nossa vida deveria ser um mar de rosas. Mas essa mensagem é falsa e não retrata o verdadeiro Evangelho. Jesus disse que no mundo passaríamos por aflição (Jo 14.33).

Mas a verdade é que Jesus nasceu nesse mundo real, com todas as suas aflições, obrigações e dificuldades. E, sim, apesar delas, e até através delas, os propósitos divinos foram realizados.

Lucas cuidadosamente diz que Jesus era filho primogênito (prototokos) de Maria, não seu único (monogenes) filho (cf. seu uso de monogenes para se referir a uma única criança em Lc 7.12; 8.42; 9.38). Em Mateus 1.25 nos diz que José “não a conheceu até que deu à luz seu filho, o primogênito; e pôs-lhe o nome Jesus”. E em Marcos 6.3 diz: “Não é este o carpinteiro, filho de Maria, e irmão de Tiago, e de José, e de Judas e de Simão? E não estão aqui conosco suas irmãs?”

2o – Não havia lugar para eles na hospedaria (Lc 2.6,7). A longa viagem não deve ter sido solitária, pois todos os familiares também deveriam recensear-se. A cidade de Belém estava abarrotada de peregrinos. Não havia sequer uma pensão ou abrigo para acolher o casal nazareno. A cidade estava indisponível para Jesus nascer. Quando Jesus nasceu ele ficou em um estábulo. Muitos estudiosos acreditam que Jesus nasceu em uma caverna que costumava ser usada como abrigo de animais, não numa cabana de madeira, como as que vemos nos presépios modernos.

A manjedoura que Jesus foi colocado ao nascer, é bem provável que fosse bem diferente das que vemos nos presépios hoje. O que se usava muito naquela época eram cochos feitos de pedras e não de madeira como se veem hoje.

Jesus nasceu num estábulo e foi posto em uma manjedoura por que o Senhor queria nos ensinar algumas lições com isso. Charles Spurgeon pregando sobre esse texto nos diz porque Jesus foi colocado em uma manjedoura:

1 – Foi uma lição de humildade. A Bíblia não nos deixa nenhuma dúvida em relação a isto. Conforme a profecia de Isaías: “Porque foi subindo como renovo perante ele, e como raiz de uma terra seca; não tinha beleza nem formosura e, olhando nós para ele, não havia boa aparência nele, para que o desejássemos. Era desprezado, e o mais rejeitado entre os homens, homem de dores, e experimentado nos trabalhos; e, como um de quem os homens escondiam o rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum”.

Além do mais, ao ser posto em uma manjedoura, por dizer assim, Jesus estendia um convite aos mais humildes para que viessem até Ele. Nós poderíamos tremer se nos aproximássemos diante de um trono, mas não temeríamos se nos aproximamos diante de uma manjedoura. Se tivéssemos visto na entrada o Mestre, cavalgando ao longo das ruas de Jerusalém com muita pompa, sobre mantos estendidos no caminho e folhas de palmeira espalhadas, e o povo clamando: “Hosana!”, poderíamos ter pensado que era inacessível, ainda que esse simples pensamento fosse errado. Mas vemos ali o Senhor cavalgando sobre um jumentinho, Ele era tão manso e humilde que as crianças se agrupavam ao seu redor com seus infantis gritos de “Hosana!” Não poderia alguém ser mais acessível que Cristo.

Observe que ao longo da vida de Jesus Ele andou com pescadores; os de humilde condição haveriam de ser seus discípulos. Como Ele mesmo falou: “as raposas têm covis, e as aves do céu ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde recostar a cabeça” (Mt 8.18-20); nada, portanto, poderia ser mais apropriado que, em Sua etapa de humilhação, - quando deixou de lado toda Sua glória e tomou a forma de servo e se rebaixou ao estado mais humilde – ser colocado em uma manjedoura. E Ele mesmo disse que deveríamos aprender com Ele a sermos mansos e humildes de coração (Mt 11.29).

2 – O Senhor Jesus Cristo nasceu no estábulo da hospedaria para mostrar quão gratuito Ele era para todos os que se aproximassem Dele. As hospedarias eram pagas, no entanto, o Senhor nasceu num lugar de livre acesso, um lugar onde todos podiam ficar. Isso mostra que o Evangelho deve ser pregado a toda criatura e não excluir ninguém. Tanto que o convite de Jesus é para todos os cansados e sobrecarregados e todos os sedentos: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei” (Mt 11.28). “E no último dia, o grande dia da festa, Jesus pôs-se em pé, e clamou, dizendo: Se alguém tem sede, venha a mim, e beba” (Jo 7.37).

3 – Nosso Senhor foi colocado na manjedoura onde se alimentavam os animais para mostrar que inclusive os homens que se assemelham às feras podem vir a Ele e viver. Nenhuma criatura pode ser tão degradada que Cristo não possa levantá-la. Poderia cair e poderia parecer que cairá invariavelmente no inferno, mas o braço longo e forte de Cristo pode alcançá-la ainda em sua mais desesperada degradação e pode levantá-la de uma aparente ruína irremediável. Como disse o apóstolo Paulo: “Onde abundou o pecado, superabundou a graça” (Rm 5.20).

Mas se Cristo foi posto onde se alimentavam os animais, lembrem-se que depois que Ele se foi os animais se alimentaram ali outra vez. Era apenas a Sua presença que podia glorificar a manjedoura, e aqui aprendemos que se Cristo fosse retirado, o mundo voltaria a sua anterior escuridão pagã. Se Cristo fosse retirado do coração humano, os mais santos se tornariam vis outra vez, e aqueles que, na sua conduta, se parecem com os anjos logo demonstrariam que estão relacionados aos demônios. A manjedoura seria ainda uma manjedoura para os animais, se o Senhor da Glória fosse retirado, e nós regressaríamos aos nossos pecados e à nossa lascívia, se Cristo uma vez retirasse Sua graça e nos abandonasse por nós mesmo. Penso que Cristo foi posto em uma manjedoura pelas razões mencionadas.

3 – AINDA HOJE NÃO HÁ LUGAR PARA JESUS EM MUITOS LUGARES (Lc 2.6,7).

O Rei dos reis e Senhor dos senhores nasceu em uma manjedoura por que não havia lugar para eles na hospedaria. Jesus deveria nascer em um palácio, tanto que os magos foram procurar o Rei dos judeus no palácio de Herodes (Mt 2.1,2). Mas Jesus não estava lá.

Ainda hoje não há lugar para Jesus em muitos lugares. Onde Jesus não tem lugar?

1o – No coração dos arrogantes (Mt 11.25,26). Raramente há lugar para Cristo nos palácios! Como disse Charles Spurgeon: “como poderiam os reis da Terra receber o Senhor? Ele é o Príncipe da Paz e eles se deleitam na guerra!” Jesus não é recebido ainda hoje onde a arrogância impera. Onde o “eu” fala mais alto do que o “tu”. Onde predomina o aqui e agora.

A soberba precede a ruína, o espírito arrogante vem antes da queda” (Pv 16.18).

2o – A sociedade atual não quer Jesus em seus corações. Veja como vivem as pessoas, por melhor que elas sejam ou aparentam ser, estão querendo manter distância do Senhor. Há lugar para as vãs sutilezas da etiqueta; há lugar para a conversa frívola; há lugar para a adoração do corpo; há lugar para a ascensão disto ou daquilo como o ídolo do momento, mas há pouquíssimo lugar para Cristo, e está longe de ficar na moda seguir plenamente o Senhor.

3o – Não há lugar para Jesus em muitas igrejas hoje. Não houve lugar para Jesus entre os seus e muito menos entre os religiosos em Sua época. Não houve lugar para Ele no templo ou nas sinagogas. Ele não encontrou refúgio nesses lugares; antes, foi ali onde Ele encontrou os mais ferozes inimigos de toda a Sua vida. Não foi a multidão comum, e sim os sacerdotes que foram os instigadores de Sua morte; os sacerdotes incitaram o povo para que dissessem: “Não a este, mas sim a Barrabás”. Em muitas igrejas hoje Jesus também não seria aceito. Em muitas dessas igrejas onde o Evangelho tem sido maculado é um retrato da igreja de Laodiceia onde o Senhor está do lado de fora da igreja batendo em Sua porta (Ap 3.20).

Os líderes dessas igrejas são inimigos da cruz. Os inimigos da cruz são mercenários, não são pastores de Cristo que amam Suas ovelhas (Jo 10.12). Estes têm sido os mais ferozes inimigos de nosso Deus e do Seu povo. Prestem atenção: Igrejas onde a Palavra de Deus é substituída por autoajuda e não de ajuda do Alto é uma igreja que está maculando a mensagem da cruz. Igrejas onde o que predomina nos púlpitos é psicologia barata e não a Palavra de Deus, estão maculando a mensagem da cruz. Igrejas onde a Teologia do Coaching tem sido ensinada, tem maculado a mensagem da cruz. Igrejas onde os líderes estão preocupados com os bens das ovelhas e não com bem delas esse lugar não é igreja, mas sinagoga de Satanás.

As mensagens pregadas nesses lugares alisam o ego, mas não traz transformação para os seus ouvintes. Preste atenção no que você ouve e no que você lê. Lugares assim não têm lugar para Jesus!

CONCLUSÃO

Quero concluir lhe perguntando: “HÁ LUGAR PARA JESUS EM SEU CORAÇÃO?” Se você tem lugar para Cristo, então, a partir deste dia, saibam de uma coisa O MUNDO NÃO TEM LUGAR PARA VOCÊS, pois o texto não só diz que não havia lugar para Jesus, mas, também diz: “Não havia lugar para eles”, não havia lugar para José nem para Maria, como tampouco havia para o bebê. A partir deste dia não haverá lugar para você na boa opinião do mundo. A partir deste momento se você tem lugar para Cristo, o mundo dificilmente encontrará um lugar de tolerância para você. Apesar de o mundo pregar contra a intolerância, o mundo não aceita opinião contrária a dele e quem segue a Cristo anda na contramão do mundo. Ser cristão hoje, compromissado com a Verdade do Evangelho é ser inimigo do mundo. Então se prepare, pois se não há lugar para Cristo, também não haverá para os que o temem e andam em Seus caminhos. Saiba que no mundo não há lugar para o homem que tem lugar para Cristo. Essa é a dura realidade do Evangelho que nos é revelado nesse texto do nascimento de Jesus. NÃO HAVIA LUGAR PARA ELES NA HOSPEDARIA.

Por isso eu lhe pergunto mais uma vez: “Há lugar para Jesus em seu coração?”

Pense nisso!

Bibliografia:

1 – Barclay, William. Comentário do Novo Testamento, Lucas.

2 – Champlin, R. N. O Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo, volume 2, Lucas e João. Editora Candeia, São Paulo, SP, 1995.

3 – Davidson, F. O Novo Comentário da Bíblia, volume 2. Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 1987.

4 – Hale, Broadus David. Introdução ao Estudo do Novo Testamento, Editora Juerp, Rio de Janeiro, RJ, 1986.

5 – Keener, Craig S. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia, Novo Testamento. Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 2017.

6 – Lopes, Hernandes Dias. Lucas, Jesus, o homem perfeito. Comentário Expositivo Hagnos. Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2017.

7 – MacArthur, John. Comentário do Novo Testamento, Lucas.

8 – Manual Bíblico SBB. Barueri, SP, 3a edição, 2018.

9 – Morris, Leon L. Lucas, Introdução e Comentário. Edições Vida Nova e Mundo Cristão, São Paulo, SP, 1986.

10 – Rienecker, Fritz. Evangelho de Lucas, Comentário Esperança. Editora Esperança, Curitiba, PR, 2005.

11 – Spurgeon, Charles H. Não Havia Lugar Para Eles na Hospedaria. http://www.projetospurgeon.com.br/2013/12/nao-havia-lugar-para-cristo-na-hospedaria/, acessado em 13/12/19.

terça-feira, 10 de dezembro de 2019

A Bíblia: inspiração verbal ou inerrância?


Por Héber Campos

O trecho abaixo foi extraído com permissão do Livro Eu Sou Volume 1, de Héber Campos, Editora Fiel.

Michaels prefere dizer que “inspiração verbal é um termo mais adequado para expressar uma doutrina viável da Escritura do que o termo inerrância”. Há muitos evangélicos que rejeitam a expressão inspiração verbal porque temem ser colocados entre aqueles que creem numa teoria mecânica do ditado.

De fato, é inapropriado dizer que as palavras que os autores bíblicos usaram vieram diretamente de Deus, mas os que creem numa inspiração verbal aceitam o fato de que, embora as palavras tenham sido usadas por homens, foram usadas pelo simples fato de que Deus quis que estivessem lá. Roger Nicole assinala:

Se Deus não guiou os escritores sagrados na escolha do material que decidiram incorporar ao seu próprio texto, então seria para sempre impossível distinguir entre o que é verdadeiramente Palavra de Deus e aquilo que pode ser simplesmente o registro acurado de uma fonte falível. No mesmo nível que material aparece endossado pelo escritor sagrado, deve ser visto como endossado por Deus também.

Os autores bíblicos agiram sob a “inspiração do Espírito Santo”, que fez com que registrassem exatamente o que Deus queria que eles registrassem. E as palavras usadas pelos escritores não é matéria de indiferença. Embora seja correto dizer da Palavra de Deus em palavras de seres humanos, essas palavras humanas são as palavras que Deus escolheu. Precisamente desse modo, e não de outro, Deus disse o que quis dizer. E, em qualquer caso, seria incorreto chamar a Bíblia de “livro de ideias inspiradas”. Ela é um livro de palavras, e não apenas de conceitos ou ideias… Falar de ideias inspiradas implica tornar a Bíblia alguma coisa diferente do que é e menos do que realmente é. Inspiração deve ser inspiração verbal.

Se Deus escolheu as palavras que os escritores usaram, podemos dizer, junto com os defensores da inerrância, que é desprovida de erros, porque Deus não erra naquilo que faz. Portanto, não há vantagem em usar o termo inerrância (que apresenta certas inconveniências), já que a inspiração verbal recobre todo o sentido atribuído pelos defensores da inerrância.

Inerrância, portanto, significa simplesmente que a Bíblia é a Palavra, ou as palavras de Deus. O que a Bíblia diz é o que Deus diz. Nesse sentido, inerrância realmente não acrescenta nada ao conceito de inspiração verbal. Chamar a Bíblia “Palavra de Deus” e chamá-la “inerrante” não são duas assertivas, mas uma só. Portanto, visto por esse prisma, não há necessidade de se dizer que se crê na inspiração verbal e na inerrância.

Não há, contudo, nenhuma objeção ao termo inerrância, contanto que seja usado simplesmente como sinônimo para inspiração verbal. No entanto, quando ele se torna (como acontece com muitos evangélicos modernos) uma espécie de segunda “mais alta” caracterização, ou uma caracterização mais ortodoxa da Bíblia, seu valor se torna questionável”. Imagine alguém dizer:

Primeiro, a Bíblia é a revelação de Deus verbalmente inspirada e, segundo, é de fato exata e sem erro — como se Deus fosse agradecido por ter nosso selo de aprovação de sua obra! Quando fizemos a primeira afirmação, dissemos tudo o que tinha de ser dito. A segunda assertiva, porém, não é somente anticlimática, como é algo que está além de nosso poder determinar com absoluta certeza, devido às limitadas ferramentas de que dispomos.

Não há justificativa, portanto, para o uso dos dois termos dentro de uma ortodoxia evangélica. Seria redundância. Se a Escritura é a Palavra de Deus, ou seja, se cremos em sua inspiração verbal, então deve ser inerrante. Se não é inerrante, então não poderemos considerá-la inspirada ou com plena de autoridade. “A vantagem do termo inspiração verbal é que ele aponta para Deus, afirmando que, em sua totalidade e em todas as suas partes, a Bíblia vem de Deus e expressa, palavra por palavra, o que Deus tenciona dizer.”