sexta-feira, 19 de março de 2010

Um eufemismo para Deus


Por Leonardo Bruno Galdino

Eufemismo é uma figura de linguagem que usamos quando queremos amenizar as coisas. Por exemplo, quando se quer dizer que fulano de tal morreu, diz-se que ele “passou desta para melhor” (mesmo que o fulano não tenha crido em Cristo para a remissão dos seus pecados). Quando um jogador de futebol é afastado do grupo por andar mal das pernas, geralmente o técnico justifica sua decisão com a “insuficiência técnica” do atleta (o que, traduzindo, quer dizer: “ou melhora ou vai ficar aí esquentando banco”). Quando o patrão quer dizer ao funcionário que este errou feio, para não endossar mais ainda aquela imagem de que todo patrão é carrasco, ele diz que o funcionário “deixou muito a desejar” (essa tática já tá tão desgastada que os empregados já encaram isso como um eufemismo para o temido aviso prévio). Um caso curioso é o da minha mãe. Ela não gosta de pronunciar a palavra “câncer”, pois, segundo ela, uma doença tão ruim como esta não é bom que a pronunciemos. Em vez disso, ela diz simplesmente que a pessoa está com aquela “doença ruim”, que às vezes ela acaba abreviando para “CA” (morro de rir com a minha mãe!).

A moda da linguagem eufêmica pegou entre as pessoas que costumam conversar sobre Deus (que não são necessariamente teólogos, clérigos, filósofos e afins), inclusive entre muitos cristãos professos, que adoram fazer uso desse artifício nos debates mais acalorados. Quando isso acontece, eles geralmente fogem para bem longe do Deus revelado nas Escrituras, e procuram uma outra forma de descrevê-lO e encará-lO, o que geralmente fazem diminuindo-O (quando não esvaziando-O) de seus atributos. Isso equivale a dizer, sem eufemismos, que um outro deus totalmente diferente do Deus de Abraão, Isaque e Jacó é apresentado; “um deus menor que Deus”, como diria meu amigo Roberto Vargas Jr.

Uma das situações mais propícias para se eufemizar a Deus é quando algo de muito ruim acontece. Por exemplo, diante das tragédias que tem devastado vários países ao redor do mundo, muitos cristãos logo se apressam em isentar Deus da culpa, procurando de todas as formas uma linguagem que torne Deus mais palatável ao homem pós-moderno. Essa seria uma atitude bastante louvável se tivesse como referencial o próprio Deus, mas, como tem se tornado evidente, não é isso que acontece. Parece que muitos que dizem crer nas Escrituras como sendo a Palavra infalível de um Deus infalível se envergonham diante da possibilidade de alguém atribuir crueldade a um Deus que sempre foi tido como sendo o Todo-Amoroso. Para os tais, seria trágico demais furtar das pessoas toda aquela noção que elas herdaram de Deus como um pai sempre disposto a perdoar, de braços abertos. Isso naturalmente estimula os pseudo-apologistas (ainda que sinceros, não passam de falsos) a fazerem as suas pseudo-apologias da fé (fé?) cristã (cristã?), utilizando-se do recurso leve e agradável da linguagem branda, aquela que não repele nem assusta, e que visa a trazer Deus para mais perto, bem para perto, quase que mortalizando-O (esse “quase” foi eufêmico demais).

O que é pior nisso tudo, e o que as pessoas mais custam a aceitar, é que a eufemização de Deus acaba por negá-lO. Na realidade, ela acaba se transformando no próprio capuz da descrença, uma forma disfarçada de dizer que o Deus dos antigos não é mais bem-vindo. Certas designações bíblicas para Deus, como Todo-Poderoso, Soberano, Altíssimo e etc., não se encaixam mais nos parâmetros de degustabilidade adotados pela cristandade light contemporânea. Negando o Deus “tradicional” dos pobres e antiquados ortodoxos, os neo-teístas se tornam os novos herois da nova “fé”, exatamente porque enchem de riso a boca daqueles que esperam pelas “novas boas-novas” (aquele outro evangelho ao qual Paulo se referiu em Gálatas 1.9).

Um grupo que bem representa o perfil que acabo de descrever é o pessoal que propaga o Teísmo Aberto. Em minha opinião, eles são os maiores especialistas na arte de se esconder debaixo da carapuça eufêmica da incredulidade (tipo A Cabana, sabe?). Ao atribuirem as catástrofes à mera casualidade, por exemplo, eles estão simplesmente negando a Deus como o Supremo Criador, Provedor e Senhor Absoluto de todas as coisas. Em outras palavras, eles estão negando o Deus que as Escrituras apresentam. Sua influência tem sido tão forte no linguajar gospel contemporâneo que dificilmente as pessoas conseguem pensar em Deus de outra forma, ou seja, da forma bíblica. Infelizmente, muitos são aqueles que estão dando as boas-vindas a esse tipo de ensino, considerando-o como digno de ser tolerado dentro dos limites da diversidade cristã. Até mesmo alguns cristãos conservadores tem procurado evitar o assunto, relegando-o à esfera das “questões indiferentes”, justamente para não serem tachados de fundamentalistas no meio do arraial.

Sem eufemismos agora (mas com algumas ironias aqui e acolá), gostaria de dizer que o evangelho não precisa ser eufemizado para se tornar mais eficaz, e nem Deus precisa ter seus atributos mais abrandados para que afirmemos o seu amor incondicional por nós, pecadores. Não é uma linguagem melíflua que tornará Deus mais bonzinho. Os atributos de Deus continuam intocáveis, mesmo com todo o malabarismo teológico empreendido por certas pessoas. A pena que estas sofrerão, e disso tenho certeza, não será nada eufêmica. Mas se eu fosse dar um eufemismo para Deus, bem… Prefiro deixar como está.

Soli Deo Gloria!!!

Nenhum comentário:

Postar um comentário