"E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará" Jo 8:32
Por Clóvis Gonçalves
Arminianos são pródigos em produzir frases cheias de efeito e vazias de significado bíblico.
- "Dever implica poder!"
- "Responsabilidade requer liberdade!"
- "Não somos robôs!".
E por aí vai. São lemas libertários que ressoam em livros, púlpitos e blogs arminianos. A última, mas nem por isso menos cheia de vácuo é "Sem liberdade, a verdade não aparece!", produzida pelo Pr. Zwinglio Rodrigues, editor do blog Dókimos. A frase é o que ele acredita ser a conclusão de Lc 7:30 e 13:34, num salto duplo exegético.
Já que todo mundo está criando frases, também criei uma, a que encabeça este post. Tem menos efeito, não é assim tão original, mas apresenta uma vantagem, é bíblica: "conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará" Jo 8:32. Já as dos arminianos não podem ser amparadas por passagens bíblicas, sobrevivem à custa de uma licença poética que não deveria ter lugar na interpretação da Bíblia.
Olhemos o primeiro versículo utilizado pelo pastor Zwinglio e, querendo Deus, antes que o mundo acabe em 2012 daremos atenção ao outro verso. A passagem diz:
"E todo o povo que o ouviu e os publicanos, tendo sido batizados com o batismo de João, justificaram a Deus. Mas os fariseus e os doutores da lei rejeitaram o conselho de Deus contra si mesmos, não tendo sido batizados por ele." Lc 7:29-30
Baseado nessa passagem o pastor sugere que o homem pode "rejeitar, e assim impedir, um propósito de Deus em sua vida" e que "o arminianismo está correto quando afirma que no homem restou algum bem suficientemente capaz de habilitá-lo a desejar receber ou não o Evangelho da salvação". E conclui com a poética, sonora e vazia frase "sem liberdade a verdade não aparece!".
O pastor Zwinglio cometeu alguns deslizes na sua análise, o que costuma acontecer quando alguém se deixa controlar por pressupostos arminianos não provados. Um deslize foi desconsiderar o ensino geral das Escrituras sobre a soberania da vontade divina e a escravidão da vontade humana. Uma passagem isolada não basta para negar o que é ensinado de Gênesis a Apocalipse, sobre a domínio de Deus e sobre a incapacidade do homem caído de produzir qualquer bem espiritual, antes da graça divina.
Afirmações como "o meu conselho será firme, e farei toda a minha vontade" (Is 46:10), "o conselho do SENHOR permanece para sempre" (Sl 33:11), "Muitos propósitos há no coração do homem, porém o conselho do SENHOR permanecerá" (Pv 19:21), "o nosso Deus está nos céus; fez tudo o que lhe agradou" (Sl 115:3), "se ele resolveu alguma coisa, quem então o desviará? O que a sua alma quiser, isso fará" (Jó 23:13), "conforme o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade" (Ef 1:11) entre outras tantas não podem simplesmente ser postas de lado por um texto isolado e interpretado a partir de suposições humanistas.
Outro é tomar uma proposição num sentido para provar exatamente o contrário. A texto diz que os fariseus e doutores rejeitaram e a partir disso ele conclui que o homem é capaz de aceitar o evangelho. A lógica assume que o contrário de motorista bêbado é pedestre sóbrio. Não devia, mas chego a achar engraçado quando vejo arminianos tomar promessas de segurança como ameaças de queda e más escolhas feitas como prova de que boas escolhas poderiam ter sido feitas.
O ponto que o pastor quer provar com o texto é que a vontade do homem é capaz de "impedir um propósito de Deus em sua vida". Em outras palavras, o que ele está afirmando é que o homem tem poder de veto sobre os decretos de Deus e que o agir de Deus pode ser impedido ou frustrado pelo homem. Após determinar alguma coisa, Deus deve ficaria na torcida de que o homem não estrague seus planos, escolhendo ou fazendo outra coisa,contrária ao que Ele pretendia para alcançar seu propósito. Este pensamento beira a blasfêmia, por fazer a vontade iníqua do homem prevalecer sobre a vontade santa de Deus.
O que então pode ser extraído da passagem em questão?
Pensemos, primeiro, a que se refere o propósito de Deus do verso 30. Fica claro que o propósito determinado de Deus era o arrependimento seguido pelo batismo de João. A expressão "reconheceram a justiça de Deus" (Lc 7:29) é paralela a "nos convém cumprir toda a justiça" (Mt 3:15), justificativa de Jesus para deixar-se batizar por João. A rejeição dos fariseus e doutores da lei consistia em "não tendo sido batizados por ele" (Lc 7:30). O conselho Deus, aqui referido, era que todo o povo, publicanos, fariseus e doutores da lei se arrependessem e fossem batizados por João, como uma preparação espiritual para chegada do Messias.
E a quem dizia respeito este conselho? O pastor Zwinglio diz que o propósito de Deus dizia respeito especificamente aos publicanos e doutores da lei. Porém, o propósito de Deus não dizia respeito àqueles especialistas da religião especificamente, mas "todo o povo". A versão utilizada pelo pastor diz "rejeitaram o propósito de Deus para eles". Porém, esta não é a melhor tradução de "ηθετησαν εις εαυτους". A ACF, traduz "rejeitaram o conselho de Deus contra si mesmos", a ARA "rejeitaram, quanto a si mesmos, o desígnio de Deus", a ARC "rejeitaram o conselho de Deus contra si mesmos", a LTT "rejeitaram o conselho de Deus contra si mesmos", a RV "desecharon el consejo de Dios contra sí mismos", a KJV "rejected the counsel of God against themselves", etc.
A passagem em questão tem o sentido de que o propósito de Deus para aquele momento era que as pessoas ouvissem a pregação do Batista, se arrependessem de seus pecados e fossem batizados. Ao se recusarem a arrepender-se (pois alguns até entraram na fila para serem batizados, mas impenitentes) eles o fizeram contra si mesmos, escolhendo ficar à margem do propósito de Deus. Só haveria real veto ao decreto de Deus se o Senhor houvesse decretado especificamente que eles seriam batizados por João e eles impedissem esse propósito. Não é o caso.
Não configurando a ação desses religiosos um veto ao conselho de Deus, demonstra esta passagem "que no homem restou algum bem suficientemente capaz de habilitá-lo a desejar receber ou não o Evangelho da salvação"? Se o texto prova alguma coisa, é que o homem pode rejeitar a oferta divina do evangelho. Que o homem é livre para e capaz de pecar é o ensino bíblico que nenhum calvinista jamais negou. O ponto é: esta passagem ensina que o homem tem habilidade para desejar e aceitar, por si mesmo, a salvação? A resposta só pode ser não. Ler "eles rejeitaram" e afirmar "viu? eles podiam aceitar" é ir além de onde o texto parou.
Mesmo assim, podemos perguntar por que o povo e os publicanos se arrependeram, mas os fariseus e doutores da lei rejeitaram a pregação do Batista? Uma resposta pode estar em Mateus, onde Jesus ora: "Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e instruídos e as revelaste aos pequeninos" (Mt 11:25). Os fariseus e doutores de Lucas são um bom exemplo de "sábios e instruídos". Deus ocultou deles o conhecimento necessário à salvação. Mas por que Deus ocultou deles e revelou ao povo e publicanos? A resposta de Jesus é "Sim, ó Pai, porque assim foi do teu agrado" (Lc 11:26). Sem uma ação reveladora de Deus ninguém chega ao conhecimento da salvação. É o que o Senhor diz em seguida "ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar" (Mt 11:27). Esta passagem explica o que acontece em Lucas 7:29-30.
O fato é que não chegamos à verdade pela liberdade, mas à liberdade através da verdade. Portanto, a expressão zwingliana vai na contra-mão da Bíblia.
- "Dever implica poder!"
- "Responsabilidade requer liberdade!"
- "Não somos robôs!".
E por aí vai. São lemas libertários que ressoam em livros, púlpitos e blogs arminianos. A última, mas nem por isso menos cheia de vácuo é "Sem liberdade, a verdade não aparece!", produzida pelo Pr. Zwinglio Rodrigues, editor do blog Dókimos. A frase é o que ele acredita ser a conclusão de Lc 7:30 e 13:34, num salto duplo exegético.
Já que todo mundo está criando frases, também criei uma, a que encabeça este post. Tem menos efeito, não é assim tão original, mas apresenta uma vantagem, é bíblica: "conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará" Jo 8:32. Já as dos arminianos não podem ser amparadas por passagens bíblicas, sobrevivem à custa de uma licença poética que não deveria ter lugar na interpretação da Bíblia.
Olhemos o primeiro versículo utilizado pelo pastor Zwinglio e, querendo Deus, antes que o mundo acabe em 2012 daremos atenção ao outro verso. A passagem diz:
"E todo o povo que o ouviu e os publicanos, tendo sido batizados com o batismo de João, justificaram a Deus. Mas os fariseus e os doutores da lei rejeitaram o conselho de Deus contra si mesmos, não tendo sido batizados por ele." Lc 7:29-30
Baseado nessa passagem o pastor sugere que o homem pode "rejeitar, e assim impedir, um propósito de Deus em sua vida" e que "o arminianismo está correto quando afirma que no homem restou algum bem suficientemente capaz de habilitá-lo a desejar receber ou não o Evangelho da salvação". E conclui com a poética, sonora e vazia frase "sem liberdade a verdade não aparece!".
O pastor Zwinglio cometeu alguns deslizes na sua análise, o que costuma acontecer quando alguém se deixa controlar por pressupostos arminianos não provados. Um deslize foi desconsiderar o ensino geral das Escrituras sobre a soberania da vontade divina e a escravidão da vontade humana. Uma passagem isolada não basta para negar o que é ensinado de Gênesis a Apocalipse, sobre a domínio de Deus e sobre a incapacidade do homem caído de produzir qualquer bem espiritual, antes da graça divina.
Afirmações como "o meu conselho será firme, e farei toda a minha vontade" (Is 46:10), "o conselho do SENHOR permanece para sempre" (Sl 33:11), "Muitos propósitos há no coração do homem, porém o conselho do SENHOR permanecerá" (Pv 19:21), "o nosso Deus está nos céus; fez tudo o que lhe agradou" (Sl 115:3), "se ele resolveu alguma coisa, quem então o desviará? O que a sua alma quiser, isso fará" (Jó 23:13), "conforme o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade" (Ef 1:11) entre outras tantas não podem simplesmente ser postas de lado por um texto isolado e interpretado a partir de suposições humanistas.
Outro é tomar uma proposição num sentido para provar exatamente o contrário. A texto diz que os fariseus e doutores rejeitaram e a partir disso ele conclui que o homem é capaz de aceitar o evangelho. A lógica assume que o contrário de motorista bêbado é pedestre sóbrio. Não devia, mas chego a achar engraçado quando vejo arminianos tomar promessas de segurança como ameaças de queda e más escolhas feitas como prova de que boas escolhas poderiam ter sido feitas.
O ponto que o pastor quer provar com o texto é que a vontade do homem é capaz de "impedir um propósito de Deus em sua vida". Em outras palavras, o que ele está afirmando é que o homem tem poder de veto sobre os decretos de Deus e que o agir de Deus pode ser impedido ou frustrado pelo homem. Após determinar alguma coisa, Deus deve ficaria na torcida de que o homem não estrague seus planos, escolhendo ou fazendo outra coisa,contrária ao que Ele pretendia para alcançar seu propósito. Este pensamento beira a blasfêmia, por fazer a vontade iníqua do homem prevalecer sobre a vontade santa de Deus.
O que então pode ser extraído da passagem em questão?
Pensemos, primeiro, a que se refere o propósito de Deus do verso 30. Fica claro que o propósito determinado de Deus era o arrependimento seguido pelo batismo de João. A expressão "reconheceram a justiça de Deus" (Lc 7:29) é paralela a "nos convém cumprir toda a justiça" (Mt 3:15), justificativa de Jesus para deixar-se batizar por João. A rejeição dos fariseus e doutores da lei consistia em "não tendo sido batizados por ele" (Lc 7:30). O conselho Deus, aqui referido, era que todo o povo, publicanos, fariseus e doutores da lei se arrependessem e fossem batizados por João, como uma preparação espiritual para chegada do Messias.
E a quem dizia respeito este conselho? O pastor Zwinglio diz que o propósito de Deus dizia respeito especificamente aos publicanos e doutores da lei. Porém, o propósito de Deus não dizia respeito àqueles especialistas da religião especificamente, mas "todo o povo". A versão utilizada pelo pastor diz "rejeitaram o propósito de Deus para eles". Porém, esta não é a melhor tradução de "ηθετησαν εις εαυτους". A ACF, traduz "rejeitaram o conselho de Deus contra si mesmos", a ARA "rejeitaram, quanto a si mesmos, o desígnio de Deus", a ARC "rejeitaram o conselho de Deus contra si mesmos", a LTT "rejeitaram o conselho de Deus contra si mesmos", a RV "desecharon el consejo de Dios contra sí mismos", a KJV "rejected the counsel of God against themselves", etc.
A passagem em questão tem o sentido de que o propósito de Deus para aquele momento era que as pessoas ouvissem a pregação do Batista, se arrependessem de seus pecados e fossem batizados. Ao se recusarem a arrepender-se (pois alguns até entraram na fila para serem batizados, mas impenitentes) eles o fizeram contra si mesmos, escolhendo ficar à margem do propósito de Deus. Só haveria real veto ao decreto de Deus se o Senhor houvesse decretado especificamente que eles seriam batizados por João e eles impedissem esse propósito. Não é o caso.
Não configurando a ação desses religiosos um veto ao conselho de Deus, demonstra esta passagem "que no homem restou algum bem suficientemente capaz de habilitá-lo a desejar receber ou não o Evangelho da salvação"? Se o texto prova alguma coisa, é que o homem pode rejeitar a oferta divina do evangelho. Que o homem é livre para e capaz de pecar é o ensino bíblico que nenhum calvinista jamais negou. O ponto é: esta passagem ensina que o homem tem habilidade para desejar e aceitar, por si mesmo, a salvação? A resposta só pode ser não. Ler "eles rejeitaram" e afirmar "viu? eles podiam aceitar" é ir além de onde o texto parou.
Mesmo assim, podemos perguntar por que o povo e os publicanos se arrependeram, mas os fariseus e doutores da lei rejeitaram a pregação do Batista? Uma resposta pode estar em Mateus, onde Jesus ora: "Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e instruídos e as revelaste aos pequeninos" (Mt 11:25). Os fariseus e doutores de Lucas são um bom exemplo de "sábios e instruídos". Deus ocultou deles o conhecimento necessário à salvação. Mas por que Deus ocultou deles e revelou ao povo e publicanos? A resposta de Jesus é "Sim, ó Pai, porque assim foi do teu agrado" (Lc 11:26). Sem uma ação reveladora de Deus ninguém chega ao conhecimento da salvação. É o que o Senhor diz em seguida "ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar" (Mt 11:27). Esta passagem explica o que acontece em Lucas 7:29-30.
O fato é que não chegamos à verdade pela liberdade, mas à liberdade através da verdade. Portanto, a expressão zwingliana vai na contra-mão da Bíblia.
Caro Pastor Silas,
ResponderExcluirMuito bom esse texto do Clóvis, já o li no 5 Solas.
Aproveito para convidá-lo a ir ao meu blog e comentar sobre o post que gerou muita polêmica (último) e já está com 70 comentários.
Informando também que recebi o Pr. Ciro por lá, e aparamos as "arestas", pela graça de Deus.
Grande abraço,
Em Cristo,
Ricardo