quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

RÓTULO


Por Jorge Fernandes Isah

O rótulo é algo inevitável para o homem que precisa se identificar e identificar aos outros, sendo muito mais uma definição estética que moral. E entre os evangélicos há tantos dísticos que ficamos perdidos; muitos deles apenas estéticos, e alguns nem tão morais. Por exemplo, a questão da salvação é algo moralmente distorcida em nossos dias. Prega-se que o homem pode "aceitar" a Cristo, e o mesmo que O aceitou pode "rejeita"-lO, como se fosse o escolher brócolis no almoço e filé no jantar. Não se pode tratar Deus como um tubérculo ou leguminosa acomodados no freezer, o qual retira-se e coloca-se quando e onde quiser. Jesus disse: “Não me escolhestes vós a mim, mas eu vos escolhi a vós” [Jo 15.16].

A causa de muitas profissões de fé falsas é a idéia errada de que posso aceitar e depois rejeitar a Cristo, e mais à frente aceita-lO novamente, e caso não queira mais, desprezá-lO quantas vezes quiser até que venha a “recebe”-lO, se houver tempo. Não é algo definitivo, nem mesmo é uma hipótese de definição, é efêmero e vacilante, podendo suceder-se por inúmeras vezes. Esse tipo de salvação é moralmente bíblico? Ele pertence à categoria do nascer de novo ao qual o Senhor Jesus afirmou ser necessário para se ver o reino de Deus? [Jo 3.3].

Ao depender de mim, da minha vontade e, especialmente, dos "métodos" para se "convencer" alguém de que uma vida com Cristo é o melhor, a minha salvação seria moral? Como pode um homem caído, separado de Deus em seus pecados ser moralmente apto para se reconciliar com o Senhor santo e justo? “Ora, o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente” [1Co 2.14].

Ao aceitá-lO, sou o agente moral, e, portanto, habilitado a estabelecer a comunhão com o Todo-Poderoso, o qual é passivo, dependente da minha vontade? E ao aceitá-lO e rejeitá-lO diversas vezes sou moral ou amoral? Responda-me: é realmente melhor ser um cristão? Já imaginou os sacrifícios, os obstáculos, as renúncias que temos de fazer num mundo que odeia a Deus e que apela tão baixamente para o que de pior existe em nós? Se é tão bom ser crente, porque não o fomos antes? Porque somente agora e não um ano atrás? O que mudou em minhas convicções e natureza que me motivaram a aceitar Cristo e servi-lO? Porque “decidi-me” pelo Deus bíblico, ao invés de permanecer com o deus genérico, popularizado, mistificado e comercializado por tantas religiões e sistemas filosóficos?

O Deus bíblico, verdadeiro e único não pode ser passivo. Ele não fica de braços cruzados esperando as coisas acontecerem, alheias à Sua vontade, sem intervir direta e propositadamente, visto ser o Agente, o Autor de toda a criação, Aquele que atua na história, que determina todos os atos no universo [Ex 33.19; Is 14.24;27; Rm 9.15], os quais foram estabelecidos soberanamente antes da fundação do mundo. Portanto, o Deus bíblico não pode ser rejeitado impunemente. Não pode ser desprezado sem que aquele que o desprezou sofra as conseqüências do seu ato. O Deus bíblico não reconhece o homem como seu filho se ele permanecer "amoldado" à sua natureza pecaminosa. Para isso, é necessário que o nosso ser seja transformado, que esse homem renasça em Cristo, e pela ação do Espírito Santo, o caráter do Senhor seja implantado, pouco a pouco. Assim, regenerados, somos então capacitados a reconciliar-nos com Deus, ou a “aceitá-lO”; não sendo mais passivos no pecado, mas ativos em santidade. Sem isso, somos criaturas rebeldes, incomunicáveis com o Altíssimo, destinados à Sua ira, a perecer eternamente, sem jamais ser filhos e templo do Espírito Santo. Então, não é uma questão de escolha, mas de QUEM escolhe, e Deus escolhe, “Para que nenhuma carne se glorie perante ele” [1Co 1.29].

Se sou eleito de Deus, Ele jamais permitirá que eu me perca novamente, que eu volte ao reino de trevas, ao mundo caído de Satanás. Esta é a Sua promessa aos Seus escolhidos, porque “Todo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora”, disse Jesus [Jo 6.37].

O arminianismo, e o seu pai, o pelagianismo, são a razão do vai-e-vem sem fim nas cadeiras das igrejas, onde os crentes de hoje serão incrédulos amanhã, podendo novamente ser crentes, e por fim, apostatarem tempos depois; visto que a salvação é como uma partida de pingue-pongue; e não consigo imaginar-me disputando um jogo em pé de igualdade com o Todo-Poderoso, Criador, Salvador e Senhor, e ainda por cima, derrotá-lO. A salvação passa a ser uma pilhéria, e o Senhor motivo de escárnio, tais as possibilidades de variações quanto ao estado de salvo e perdido, quanto a uma insegurança que denota a fragilidade de um deus criado na mente corrupta e insana do homem... que nada tem a ver com o Deus Tri-uno, poderoso e Senhor de todo o universo.

É possível que esse homem que crê deter o poder de "eleger" a Deus tenha a certeza da salvação? Visto que não há nada que a assegure, apenas e tão somente a vontade do próprio homem? O qual é fraco, volúvel, obstinado em sua pecaminosidade, bastando apenas o mudar para se perder outra vez? Ele pode afirmar-se salvo, se ele mesmo não o sabe nem tem certeza se o será?

O homem deu um tiro no pé! Ao supor-se detentor de um poder que não possui. É ilusório, terrível, maligno. Pois nos dá uma sensação de liberdade irreal, impossível de nos levar a decidir por Deus, na medida em que ela é incapaz e inadequada de nos levar a escolhê-lO; pois o livre-arbítrio pressupõe o homem tanto bom como mau, contrapondo-se ao ensinamento bíblico, o qual assevera ser o homem essencialmente mau; “porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” [Rm 3.23]; não há justo, nem um sequer” [Mq 7.2; Rm 3.10]; e “Porventura pode o etíope mudar a sua pele, ou o leopardo as suas manchas? Então podereis vós fazer o bem, sendo ensinados a fazer o mal” [Jr 13.23]... Logo, o homem encontra-se completamente incapacitado de vencer o seu pecado.

A presunção é de que, se fazemos coisas boas e ruins, escolhas boas e ruins, elas indicam que sou capaz de eleger a Deus (pois rejeita-lO já o faço naturalmente, de manhã à noite); e de que esta escolha é não influenciada por alguma força, seja ela exterior ou interior; de que é isenta de causalidade, neutra, o que é utópico, pois somos sempre tomados por algum poder... a liberdade morreu no Éden com Adão e Eva, e estaremos sob o domínio de satanás até que o poder máximo do Senhor restaure-nos, e a liberdade seja finalmente ressuscitada.

Ainda que não possamos "ganhar" ninguém para Cristo, pois esse papel cabe ao Espírito Santo, o qual dá o convencimento ao homem do pecado, da necessidade de arrependimento, e a compreensão da obra salvadora do Filho de Deus, não podemos nos escusar de levar o Evangelho aos perdidos [Mt 28.19-20]. É uma ordem expressa do Senhor, não sendo condicional, mas imperativa. Como instrumentos, Deus nos usará para alcançá-los, não nos cabendo questionar os Seus sábios métodos, mas certificar-nos de obedecê-lO prontamente.

E, para que não reste dúvidas quanto à minha posição, creio na doutrina da Eleição do homem por Deus, e de que Deus escolhe quem salvará; é uma obra completa d’Ele, na qual somos como barro nas mãos do oleiro [Rm 9.21], em vista de sermos incapazes de “escolher” salvar-nos; pois jamais o homem escolheria a salvação se Deus não o movesse a ela... É uma discussão que se arrasta há séculos, mas a Bíblia é clara quanto ao assunto: a eleição é de Deus, e não do homem! Como acertadamente disse o profeta: “Do Senhor vem a salvação” [Jn 2.9], pois a glória é somente e completamente d’Ele.

Ah... ia me esquecendo... quanto ao rótulo, podem chamar-me calvinista.

8 comentários:

  1. Paz...

    Com todo respeito à beleza gramatical e a organização lógica das idéias, faltou bastante fundamento teológico na matéria. Não é tão fácil fazer conclusões relacionadas à eleição e predestinação, nem tampouco esquecer-se do maior e mais precioso tesouro dado ao homem por Deus: sua liberdade de escolha, ao que chamamos de livre-arbítrio.

    Evidente que o debate se estenderia muito. Respeito sua posição, até porque milhares pensam como pensa e revela neste texto. Respeito-o como pessoa e acredito em sua forma de apresentar a convicção que apregoa. Porém não posso concluir a obra da salvação com superficialidade teológica.

    Um abraço fraterno.

    No mais... Paz!

    Pr. Jesiel Freitas

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  2. Graça e paz Pr. Jesiel.
    Jorge, o autor do artigo, não fez uma defesa teológica a respeito da predestinação, ou eleição, mas expôs a sua idéia mais como uma reflexão. No entanto, temos outros artigos onde há profundos argumentos teológicos para tal pensamento.
    Apesar de ser calvinista, eu não tenho nenhuma dificuldade em conviver pacificamente e até comprar livros de teólogos arminianos, aliás, tenho vários livros.
    Mas numa coisa tanto calvinistas como arminianos tem em comum: Sem Jesus ninguém chegará ao Céu.
    Fique na Paz!
    Pr. Silas

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  3. Pr. Silas,

    ótima resposta. Nem preciso treplicar (rsrs)...

    Forte abraço, meu irmão!
    Cristo o abençoe!

    Pr. Jesiel,

    Sugiro que leia "A Soberania Banida", R.K. McGregor Wright, Ed.Cultura Cristã; um livro nada superficial sobre a soberania de Deus x livre-arbítrio.
    Se ainda assim achar as quase 300 pg. do livro superficiais, sugiro que leia Rm 9. Porém, alerto-o para não basear a verdade e a objetividade divinas na leitura de uma reflexão superficial como a minha.

    Cristo o abençoe!

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  4. Graça e paz Jorge.
    Se o Pr. Jesiel irá comprar o livro eu não sei, mas eu pretendo adquiri-lo muito em breve (rs).
    O Pr. Jesiel é uma pessoa muito zelosa pelas coisas de Deus, e quando ele falou sobre a questão de mais profundidade na argumentação teológica não foi com o intuito de ofender ou criar polêmica, mas de compreender melhor o seu raciocínio.
    Não é fácil deixar de ser arminiano e ser calvinista, ou pelo menos entender o pensamento calvinista, assim como eu não consigo entender o pensamento arminiano.
    Fique na Paz!
    Pr. Silas

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  5. Pr. Silas,

    A intenção em indicar o livro do McGregor não foi provocativa, apenas quis afirmar que se o pr. Jesiel ou qualquer um outro irmão quiser realmente argumentos bíblicos, sólidos e lógicos sobre a questão soberania de Deus x livre-arbítrio ou calvinismo x arminianismo, não há em português livro melhor sobre o assunto (ao menos, não conheço outro).

    São 300 pg que farão qualquer arminiano "tremer" em suas falsas bases. O problema é que a maioria deles não está interessada em leituras sérias e profundas, talvez, por isso, prefiram ler textos superficiais como o meu (rsrs).

    Nem tenho pretensão de convencer ninguém, porque sei que o convencimento é dado pelo Espírito Santo, assim como Ele me convenceu um dia do engano em que me encontrava.

    Também não estou provocando nem em busca de animosidade, sou um homem de paz, graças ao bom Deus, e somente por Ele. Sem fugir de vez em quando de uma bringuinha (rsrs)...

    Também não me senti ofendido pelo pr. Josiel, apenas acho, como o irmão tão bem colocou, que o meu texto é muito menos do que um ensaio teológico (na verdade, nada, se comparado). Portanto fica a sugestão.

    Quanto ao irmão, aconselho-o a comprar o livro do McGregor imediatamente. Garanto que o pr. não se arrependerá. Ele vale cada real gasto.

    Grande abraço no Senhor!

    Cristo o abençoe e ao seu ministério!

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  6. Graça e paz Jorge.
    Em momento algum o irmão foi provocativo, pelo contrário, o irmão foi muito cuidadoso até quando indicou o livro do McGregor.
    Assim como o irmão, eu também fui arminiano, até o dia em que fui para o seminário, que era arminiano, mas Deus colocou no meu caminho um professor calvinista, e todas as dúvidas que eu tinha, ele, com muita calma, respondeu. A partir daquele dia eu comecei a ler e entender o que era essa teologia que na minha época de seminário era uma grande "heresia". A medida que os anos foram se passando eu fui percebendo uma coisa, eu vi muitos arminianos se tornarem calvinistas, mas eu nunca vi nem um calvinista se tornar arminiano. Você conhece algum? (rs).
    Fique na Paz meu amado Jorge.
    Pr. Silas
    PS: Eu estudei um ano e meio aí em BH, no antigo STEB, lá em Venda Nova, depois vim para o Rio estudar no Seminário do Sul. Mas foi no STEB que me tornei calvinista.

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  7. Pr Silas,

    desculpe-me a demora em responder. É a correria do dia a dia...

    É, também não conheço nenhum calvinista que se tornou arminiano. Mas acredito que exista, especialmente entre os falsos calvinistas, aqueles que aceitam a doutrina ou parte dela mas não tiveram seus corações regenerados e transformados pelo Senhor. Pois creio que há calvinistas não convertidos, apesar de considerar esta hipótese bem remota, remotíssima.

    Que bom que o irmão morou em BH. Pena que não mora mais. Mas como Deus tem me agraciado com a possibilidade de conhecer alguns irmãos virtuais pessoalmente, através de suas visitas a BH (sou meio avesso a viagens), quem sabe, um dia não nos encontramos pessoalmente, e poderei dar um forte abraço no irmão? Se não for nesta vida, tenho certeza de que será na eternidade.

    Que o bom Deus o abençoe em tudo, é a minha oração.

    Forte abraço no Senhor!

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  8. Graça e paz Jorge.
    Considere-se virtualmente abraçado.
    Próxima vez que eu a BH eu lhe aviso para tomarmos um café e comermos pão de queijo (rs).
    Fique na Paz!
    Pr. Silas

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