Por A. A. Hodge (1823-1886)
Como Criador e Governador
infinitamente inteligente e providente, Deus certamente teve um propósito
definido com referência à existência e destino de tudo quanto criou,
compreendendo em um só sistema todo-perfeito seu fim principal nesse particular
e todos os fins e meios subordinados em referência a esse fim principal. E já
que ele é um Ser eterno e imutável, seu plano certamente existiu em todos os
seus elementos, perfeito e imutável, desde a eternidade. Visto ser Deus uma
Pessoa infinita, eterna, imutável e absolutamente sábia, poderosa e soberana,
certamente que seu propósito participa dos atributos essenciais de seu próprio
ser. E visto que a inteligência de Deus é absolutamente perfeita e seu plano
eterno; visto que seu fim último é revelado como que almejando unicamente sua
própria glória, e toda a obra da criação e da providência é observada como a
formar um sistema único, segue-se que seu plano é também único — uma intenção
todo-compreensiva, provida de todos os meios e condições, bem como dos fins
predestinados.
O plano de Deus compreende e
determina todas as coisas e eventos de todo gênero que venham suceder.
Isso se faz infalível à luz do
fato de que todas as obras de Deus, da criação e da providência, se constituem
num sistema.
Nenhum evento é isolado, quer
no mundo físico quer no mundo moral, quer no céu quer na terra. Todas as
revelações super-naturais de Deus, e cada avanço da ciência humana, corroboram
para tornar esta verdade conspicuamente luminosa. Daí a intenção original que
determina um evento deve também determinar todos os outros eventos relacionados
a ela, como causa, condição, ou conseqüente, direto e indireto, imediato ou
remoto. Por isso, o plano que determina os fins gerais deve também determinar
até mesmo o elemento mais minúsculo compreendido no sistema do qual esses fins
são partes. As ações livres de agentes livres constituem um elemento
eminentemente importante e efetivo no sistema de coisas. Se o plano de Deus não
determinou eventos dessa classe, ele não poderia ter feito nada certo, e seu
governo do mundo seria feito contingente e dependente, e todos os seus
propósitos, falíveis e mutáveis.
As Escrituras expressamente
declaram essa verdade:
a. De todo o sistema em geral. Ele
"opera todas as coisas segundo o conselho de sua própria vontade". Ef
1.11.
b. Dos eventos fortuitos. Pv 16.33; Mt
10.29,30.
c. Das livres ações dos homens. "Como
ribeiros de águas assim é o coração do rei na mão do Senhor, que o inclina a
todo o seu querer." Pv 21.1. "Porque somos feitura sua, criados em
Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que
andássemos nelas." Ef 2.10. "Porque Deus é quem opera em vós tanto o
querer como o efetuar, segundo sua boa vontade." Fp 2.13.
d. Das ações pecaminosas dos homens. "A
este que foi entregue pelo determinado conselho e presciência de Deus,
prendestes, crucificastes e matastes pelas mãos de injustos." At 2.23.
"Porque verdadeiramente contra o teu Santo Filho Jesus, que tu ungiste, se
juntaram, não só Herodes, mas Pôncio Pilatos, com os gentios e os povos de
Israel; para fazerem tudo o que tua mão e teu conselho tinham anteriormente
determinado que se havia de fazer." At 4.27-28. Compare-se Gn 37.28 com Gn
45.7-8; Is 10.5.
Deve lembrar-se, contudo, que o
propósito de Deus com respeito aos atos pecaminosos dos homens e anjos
réprobos, em nenhum aspecto causa o mal nem o aprova, mas apenas permite que o
agente mau o realize, e então o administra para seus próprios sapientíssimos e
santíssimos fins. O mesmo decreto infinitamente perfeito e autoconsistente
ordena a lei moral que proíbe e condena todo o pecado, e ao mesmo tempo permite
sua ocorrência, limitando e determinando o canal preciso ao qual ele se
confinará, o fim preciso ao qual se dirigirá e governando suas conseqüências
para o bem. "Vós bem intentastes mal contra mim; porém Deus o intentou
para o bem, para fazer como se vê neste dia, para conservar muita gente com
vida." Gn 50.20.
Esse propósito
todo-compreensivo não é condicional, nem no todo nem em qualquer de seus
elementos constituintes. Em nenhum aspecto sua presciência depende de eventos
não compreendidos em e determinados por seu propósito. Ele é absolutamente
soberano, dependendo somente do "sábio e santo conselho de sua própria
vontade".
Uma distinção bastante óbvia
deve sempre ser mantida em mente entre um evento ser condicionado a outros
eventos, e o decreto de Deus, com referência a esse evento, ser condicionado.
Os calvinistas crêem, como todos os homens deveriam, que todos os eventos no
sistema de coisas dependem de suas causas e são pendentes de condições. Isto é,
se um homem não semeou, também não colherá; se semeou, e todas as influências
climáticas favoráveis agem, ele colherá. Se um homem crê, ele será salvo; se
não crê, também não será salvo. Mas o propósito todo-compreensivo de Deus
abarca e determina a causa e as condições, tanto quanto o evento interrompido
nelas. O decreto, em vez de alterar, determina a natureza dos eventos e suas
relações mútuas. Ele faz as ações livres, livres em relação aos seus agentes; e
os eventos contingentes, contingentes em relação às suas condições. Enquanto
que, ao mesmo tempo, ele faz todo o sistema de eventos, e muitos elementos
envolvidos nele, infalivelmente futuros. Decreto absoluto é aquele que,
enquanto pode determinar muitos eventos condicio-nais, determinando suas
condições, ele mesmo não é interrompido em nenhuma condição. Decreto
condicional é aquele que determina que certo evento acontecerá sob a condição
que algum outro evento não decretado aconteça, a que evento não decretado o
próprio decreto, tanto quanto o evento decretado, se acha pendente.
Os decretos de Deus são
incondicionais.
Todos quantos crêem num governo
divino concordam com os calvinistas em que os decretos de Deus relativos aos
eventos produzidos por causas necessárias são incondicionais. O único debate se
relaciona aos decretos que são concernentes às livres ações dos homens e dos
anjos. Os socinianos e racionalistas mantêm que Deus não pode infalivelmente
prever as livres ações, porque à luz de sua própria natureza elas são incertas
até que sejam realizadas. Os arminianos admitem que ele infalivelmente as
prevê, mas negam que ele as determine. Os calvinistas afirmam que ele as prevê
como infalivelmente futuras, porque ele determinou que elas assim o fossem.
A veracidade do ponto de vista
calvinista prova-se:
À luz do fato de que, como
demonstrado supra, os decretos de Deus determinam todas as classes de eventos.
Se cada evento que vem a lume é preordenado, é evidente que não há nada
indeterminado sobre o qual o decreto pudesse ser condicionado.
Porque os decretos de Deus são
soberanos. Isso é evidente — (a) Porque Deus é o eterno e absoluto Criador de
todas as coisas. Todas as criaturas existem, e são o que são, e possuem as
propriedades peculiares a elas, e agem sob as próprias condições em que agem,
em obediência ao plano divino, (b) É diretamente afirmado na Escritura. Dn
4.35; Is 40.13-14; Rm 9.15-18; Ef 1.5.
O decreto de Deus inclui e
determina os meios e condições dos quais os eventos dependem, tanto quanto dos
eventos propriamente ditos: "Como também nos elegeu nele antes da fundação
do mundo, para que fôssemos santos e irrepreensíveis." Ef 1.4.
"Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isso não vem de vós, é o
dom de Deus." Ef 2.8. "Deus desde o princípio vos elegeu para a
salvação, pela santificação do Espírito e fé da verdade." 2 Ts 2.13. No
caso do naufrágio de Paulo, Deus primeiramente prometeu a Paulo que
absolutamente nenhuma vida se perderia. At 27.24. Paulo, porém, disse, no
versículo 31: "Se estes não ficarem no navio, não podereis
salvar-vos."
As Escrituras declaram que a
salvação de indivíduos está condicionada ao ato pessoal de fé, e ao mesmo tempo
que o decreto de Deus com respeito à salvação dos indivíduos repousa tão-só em
"o conselho de sua própria vontade", "seu próprio
beneplácito". "Porque, não tendo eles ainda nascido, nem tendo feito
bem ou mal (para que o propósito de Deus, segundo a eleição, ficasse firme, não
por causa das obras, mas por aquele que chama)." Rm 9.11. "Sendo
predestinados segundo o propósito daquele que opera todas as coisas segundo o
conselho de sua própria vontade." Ef 1.11; 1.5; Mt 11.25-26.
Fonte: O Calvinista
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