Por Maurício Zágari
Quem
olha de fora, lê slogans como “Pare de sofrer” e “Uma igreja que faz
vencedores” deve achar que a vida do cristão é muito fácil. Afinal, em
nosso triunfalismo, parece que servir Cristo é um grande carnaval, uma
festa eterna, uma chuva de bênçãos. Prosperidade é o tom do momento.
Alegria todo dia. Viver feliz da vida. E é o que a Bíblia diz, não é?
Em Marcos 8.34, por exemplo, lemos as palavras de Jesus: “Então,
convocando a multidão e juntamente os seus discípulos, disse-lhes: Se
alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e
siga-me”. Opa. Espere um pouco. Tem algo estranho aí. Negar a si
mesmo? Tomar sua cruz? Isso soa como algo sacrificante. Parece ter a ver
com abrir mão de coisas que nos são importantes. Negar-se significa
dizer “não” para si mesmo. Então, se quisermos viver com Jesus Ele deixa
claro que vamos ter de dizer “não” para o espelho. Mas… como assim? Em
quê? O que afinal é esse “negar-se”, apontado por Jesus como o centro do
alvo?
Em primeiro lugar, é dizer não para os prazeres do mundo. “Sabe,
porém, isto: nos últimos dias, sobrevirão tempos difíceis, pois os
homens serão egoístas, avarentos, jactanciosos, arrogantes,
blasfemadores, desobedientes aos pais, ingratos, irreverentes,
desafeiçoados, implacáveis, caluniadores, sem domínio de si, cruéis,
inimigos do bem, traidores, atrevidos, enfatuados, mais amigos dos
prazeres que amigos de Deus” (2 Tm 3.1-4).
“Pedis e não recebeis, porque pedis mal, para esbanjardes em vossos prazeres” (Tg 4.3).
“De onde procedem guerras e contendas que há entre vós? De onde, senão dos prazeres que militam na vossa carne?” (Tg 4.1).
Essas e outras passagens deixam claro que os prazeres deste mundo não
coadunam com o gozo eterno. Que dificuldade! Admitamos, como é difícil
abrir mão das nossas vaidades e nossos benefícios em prol de uma
esperança que não vemos! Nós, humanos, buscamos instintivamente o que
nos dá prazer. Comemos doces e coisas gordurosas sabendo que nos fazem
mal. Mas é tão gostoso! Só que é tão nocivo… Portanto, a Bíblia é clara:
para andar no Caminho estreito que leva à Porta estreita é preciso
caminhar na contramão de nós mesmos e de nossas concupiscências.
Dizer “não” para si mesmo também significa soltar as rédeas de nossa
vida e confiar que Deus a está levando para o lugar certo. É abrir mão
de planos pessoais, conformar-se com os rumos indesejados que o Senhor
dá a nosso futuro, é lançar-se no vazio tendo a certeza de que o Criador
está no controle. “Entrega o teu caminho
ao SENHOR, confia nele, e o mais ele fará. Fará sobressair a tua justiça
como a luz e o teu direito, como o sol ao meio-dia. Descansa no SENHOR e
espera nele, não te irrites por causa do homem que prospera em seu
caminho, por causa do que leva a cabo os seus maus desígnios”
(Salmos 37.5-7). Entregar nosso caminho ao Senhor… que coisa difícil
para seres tão independentes como nós. Mas é preciso, pois a promessa é
que, se o fizermos, confiando, o mais o Todo-Poderoso fará.
Negar-se a si mesmo também implica em dizer não para antigas
prioridades e atitudes. É deixar de lado uma carreira bem remunerada no
meio secular para devotar seu tempo às coisas de Deus. É abrir mão de
um relacionamento afetivo com um não cristão por saber que o jugo
desigual desagrada Cristo. É perder o emprego por recusar-se a fazer
algo antiético que lhe é exigido. Negar-se é, em outras palavras,
priorizar Cristo em tudo: “Quem ama seu pai
ou sua mãe mais do que a mim não é digno de mim; quem ama seu filho ou
sua filha mais do que a mim não é digno de mim; e quem não toma a sua
cruz e não me segue, não é digno de mim. Quem acha a sua vida a
perderá, e quem perde a sua vida por minha causa a encontrará” (Mateus 10.37-40).
Negar-se a si mesmo é também engolir o orgulho e reconhecer o erro. É saber dizer não
para o amor-próprio e admitir que pecou. E então ter a humildade de
abaixar a cabeça, ralar os joelhos e deixar seu pedido de perdão sair
pelos olhos e por urros de contrição. Quando o amor-próprio é maior do
que a capacidade de reconhecer o pecado diante de Deus, confessá-lo e
abandoná-lo é sinal que estamos a anos-luz de distância de negar-nos a
nós mesmos. “Quem esconde os seus pecados não prospera, mas quem os confessa e os abandona encontra misericórdia” (Provérbios 28.13).
Negar-se
a si mesmo é também pôr o outro acima de si. É preferir o outro em
honra, mesmo sabendo que ele é menos capaz, correto, digno ou santo do
que você. É dar a outra face para quem não merece. É abençoar os que te
perseguem, alegrar-se com os que se alegram, chorar com os que choram,
não tornar a ninguém mal por mal; não se vingar a si mesmo. E, se o teu
inimigo tiver fome, dar-lhe de comer; se tiver sede, dar-lhe de beber; é
não se deixar vencer do mal, mas vencer o mal com o bem; é amar os
inimigos, fazer o bem aos que nos odeiam; bendizer os que nos maldizem,
orar pelos que nos caluniam; ao que te bater numa face, oferecer-lhe
também a outra; e, ao que tirar a capa, deixá-lo levar também a túnica.
Isso tudo é difícil até a medula. Mas se não vivo mais eu, mas Cristo vive em mim… temos que viver conforme a natureza dele.
Você nunca vai me ouvir dizer que ser cristão é fácil. Não é. Quem
prega isso está mentindo. Pois quem em sã consciência diria que tomar
uma cruz é fácil? Arrastar um tronco de mais de 90 quilos por
quilômetros é tarefa para leão. Não, negar-se a si mesmo, tomar sua cruz
e seguir nos passos do Mestre é doloroso, sacrificante, mortificante.
Muitos, ao lerem isso, poderiam então se perguntar: mas se a vida do
cristão significa tanta abnegação e sofrimento, por que seguir Cristo?
Eu respondo: porque o que importa não é a vida do cristão, é a morte.
Pois, depois que tivermos de nos dizer “não” tantas vezes, nos
depararemos com a realidade de que “Nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano o que Deus tem preparado para aqueles que o amam” (1 Co 2.9).
Vale a pena dizer “não” a si mesmo nesta vida e o fazemos com prazer,
se conseguimos enxergar essa suprema verdade do Evangelho: que a vida
eterna é o grande “sim” de Deus para cada um de seus eleitos.
Paz a todos vocês que estão em Cristo,
Maurício
Maurício
Fonte: Apenas
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