Por Yago Martins
Nos últimos tempos, a espiritualidade está em alta; a religião, não. [...] a religião organizada é vista como opressora, irrelevante e desperdício de tempo. [...] Existe um movimento crescente [...] para que se obtenha espiritualidade sem religião, se encontre um relacionamento sem regras e se tenha Deus sem a igreja. Mais e mais pessoas estão procurando um cristianismo descorporalizado.[1]
Em consonância com o que colocou Kevin DeYoung, em seu excelente livro Por que amamos a igreja, podemos perceber, sem muito esforço, que se tornou moda falar que nós não precisamos nos reunir como igreja, uma vez que somos
igreja, como se a igreja de Cristo fosse composta de fantasmas que não
ocupam espaço na terra. Não há outra opção para a igreja invisível a não
ser tornar-se um corpo visível. Ou é assim, ou não será corpo de forma
alguma[2]. Neste mesmo feeling, há a declaração de que Cristo
veio nos resgatar da religião. Ainda que não estejam se dando conta
disto, os que dizem que querem mais Jesus e menos religião só estão
dizendo, na verdade, que amam a Deus, mas odeiam a igreja. Mesmo que não
reconheçam que seja isso que querem dizer, as implicações deste tipo de
pensamento só nos leva a esta conclusão. Um estimado amigo me disse,
certa vez, que não se importa muito se alguém está ou não frequentando
uma igreja, desde que a vida pessoal dele com Deus esteja firme. Porém,
declarar tal coisa é tão absurdo quanto dizer que, desde que a vida
pessoal de alguém com Deus esteja firme, não importa se ele ora, lê a
Bíblia, luta contra o pecado, tem fé em Jesus, ama ao Senhor, honra os
pais, oferta aos pobres, prega o evangelho e se mantém longe do tráfico
de mulheres.
Quando lemos a Escritura, percebemos a
igreja sendo descrita como o corpo vivo de Cristo (Ef 1:22,23; 1Co
12.12-27), a assembleia dos primogênitos do Deus vivo (Hb 12:22,23), a
família de Deus (Ef 3.14 e 4.19-22) e os ramos de uma vinha (Jo 15.5),
descrições que trazem a ideia de comunidade. A igreja somos “nós”, e não
“eu”. A Escritura diz: “Não deixemos de congregar-nos, como é costume
de alguns” (Hb 10:25). Se somos “concidadãos dos santos” e membros da
“família da fé” (Ef 2.19), precisamos estar sempre juntos de nossos
irmãos, fugindo do individualismo do “eu” como expressão de uma oposição
ao “nós”. A comunidade Cristã é expressa na linguagem de “dois ou três
reunidos” (Mt 18:20), e não sozinhos. Como bem asseverou Chuck Colson:
Vivemos numa era de individualismo crescente. Assim, numa cultura bastante individualista, essa ideia de fazer parte de uma comunidade é contracultural. E ela corrige perfeitamente a atitude narcisista “o que ganho com isso” tão predominante na cultura…[3]
A igreja não é opcional, como algum tipo
de clube de apoio, mas faz parte do propósito redentivo de Cristo. Como
diz Stott, “a igreja está no centro do propósito eterno de Deus”[4].
Não é plano de Deus apenas salvar indivíduos isolados, mas salvar uma
comunidade. A promessa de que Ele nos faria Seu povo (Ex 6:7, Ap 21:3) é
cumprida na manifestação do evangelho: “em outro tempo não éreis povo,
mas agora sois povo de Deus” (1Pe 2:10). Como Sinclair Ferguson colocou,
“Paulo enfatiza que Cristo quer criar ‘um povo’, e não meramente
indivíduos isolados, que creiam nele”[5]. Usando a linguagem de forte de
Cipriano, precisamos entender que quem se separa da igreja, une-se a
uma adúltera e se torna um estranho, um profano e um inimigo. “Você não
pode ter Deus como Pai a menos que tenha a igreja como mãe”[6], como
comentado por Calvino:
Não há outra maneira de entrarmos na vida, se esta [a igreja] não nos conceber em seu ventre, não nos der à luz, não nos nutrir em seu seio e, por último, se ela não nos mantiver sob o seu cuidado e orientação até que, despojando-nos da carne mortal, nos tornemos como os anjos.[7]
Paulo chega a ser assustador quando diz:
“Assim nós, que somos muitos, somos um só corpo em Cristo, mas
individualmente somos membros uns dos outros” (Rm 12:5). Estar em Cristo
significa estar em Cristo junto com os outros que estão em Cristo. Eu
pertenço a Deus, mas eu também pertenço à comunidade. Segundo um ditado
xhosa, “pessoas são pessoas através de outras pessoas”[8]. Podemos dizer
que cristãos só são cristãos através de outros cristãos. Claro que
existe um aspecto em que temos um relacionamento pessoal com Deus, mas isto não é o mesmo que um relacionamento individual
com Deus. John Stott, que sempre foi marcado por sua linguagem branda,
humilde e equilibrada, chega a chamar o “cristão sem igreja” de
“anomalia grotesca”[9]. Ao observar o evangelismo no livro de Atos,
Stott conclui que Deus “não os adicionava à igreja sem salvá-los, e ele
não salvava sem adicioná-los à igreja. Salvação e filiação à igreja
andavam juntas e ainda caminham assim”[10]. Acontecia o que ilustra
Colson: “Assim como o marido e a mulher no altar se tornam uma só carne,
você se encontra com Cristo na cruz e sai um com sua igreja”[11].
A verdade é simples, mas muito ignorada: é impossível aceitar Jesus e rejeitar a igreja.
[1] DEYOUNG, Kevin; KLUCK, Ted. Por que amamos a igreja. São Paulo: Mundo Cristão, 2010, p. 11,12.
[2] BONHOEFFER, Dietrich. The Cost of Discipleship, ed. rev., reimpr. 1937 New York: Macmillian, 1959, p. 277.
[3] Por que amamos a igreja, p. 152.
[4] STOTT, Jonh. The Living Church: Convictions of a Lifelong Pastor. Downers Grove, III.: InterVarsity, 2007, p. 19.
[5] FERGUSON, Sinclair B. Grow in Grace. Banner of Truth, 1989, p. 67.
[6] De catholicae ecclesiae unitate, 6.
[7] CALVINO, João. Institutas, livro IV, 4.1.4.
[8] Apud CHESTER, Tim; STEVE, Timmis. Igreja Total: Repensando radicalmente nossa apresentação do evangelho na comunidade. Niterói, RJ: Tempo de Colheita, 2011, p. 39,40.
[9] The Living Church, p. 19
[10] Ibidem, p. 32.
A Paz do Senhor,
ResponderExcluirConcordo plenamente com o artigo-o congregar é bíblico. Assim, como não concordo com pessoas que ficam pulando de igreja em igreja.Porém, existe algo que deve ser refletido: Já tive de mudar de igreja por conta do pr.ser o dono da igreja.Foi me dito:"Quero que você saia da minha igreja.Você não tem o perfil ideal". Era uma igreja de oba,oba. Também tive problemas por pregar com esboço e, quem prega com "papel" é crente carnal.E mais recente me desliguei, porque o "presidente" se desligou da CONAMAD, e estava desviando dinheiro...Tive que me posicionar contra os absurdos.Enquanto muitos se "venderam".
Deus continue o abençoando
Um abraço,
Pr Rubcler
Graça e paz Pr. Rubcler.
ExcluirFico triste por saber que o irmão passou por momentos como estes em algumas igrejas, mas certamente Deus tem uma igreja melhor para o irmão congregar. Eu já passei por isso e sei o quanto é difícil.
Quanto ao pregar com esboço é o que eu mais faço. O esboço é o mapa do sermão. Através do esboço eu ponho os meus pensamentos em ordem e não me perco em devaneios.
Pastor, toda vez que nós mantivemos um posicionamento correto e bíblico diante das pessoas nós iremos descobrir que muitas vezes nós estamos sozinhos, ou somos a minoria. Mas continue assim, não se venda.
Fique na Paz!
Pr. Silas Figueira