terça-feira, 14 de maio de 2013

O Casamento Pastoral Líquido


 
Por Pastor Lamarque

Uma reflexão sobre a vulgarização do casamento pastoral batista 

O sociólogo polonês Zygmunt Bauman é um dos intelectuais mais respeitados e produtivos da atualidade. Ele já escreveu mais de 50 livros, esmiuçando em alguns deles os aspectos diversos da “modernidade líquida”, que é o seu conceito fundamental. É assim que ele se refere ao momento da História em que vivemos. Bauman acentua que os tempos são “líquidos” porque tudo muda rapidamente. Nada é feito para durar, para ser “sólido”. Dessa visão resulta, entre outras coisas, a obsessão pelo corpo ideal, o culto às celebridades, o endividamento familiar e até a instabilidade dos relacionamentos amorosos. O casamento torna-se mais “flexível”, é uma incerteza, pois nos tempos líquidos, nada é para durar.

O casamento líquido é um relacionamento que vai somente “até o segundo aviso”. É uma relação a partir do padrão dos bens de consumo: mantenho enquanto ele me trouxer satisfação e o substituo por outros que me prometam ainda maior felicidade. É o amor descartável, com um aspecto de eliminação imediata e que anda sempre em busca de uma outra relação amorosa.

Parece-me que esta é uma filosofia de vida atraente para alguns pastores batistas. É estarrecedor como no solo batista o casamento pastoral tem sido tratado com enorme vulgaridade. Pastores estão colocando os seus casamentos em liquidação. Divorciam-se, tornam a casar-se e se não sentirem-se felizes, descartam a segunda esposa e entram para um novo relacionamento, sem qualquer constrangimento. E o agravante é que mesmo vivendo esta liquidação conjugal, querem continuar no ministério pastoral batista, dirigir uma igreja, ensinar a Palavra de Deus a um rebanho pouco esclarecido, ocupar cargos de liderança denominacional e ainda manterem-se filiados a Ordem dos Pastores Batistas. Para estes homens, o ministério pastoral tornou-se o lugar mais seguro para cometerem seus pecados, sem serem penalizados, pois sempre encontram outros, que apadrinham as suas barbáries.

O divórcio é uma experiência inconveniente ao exercício do ministério pastoral. Não é impossível, mas, inconveniente, pois o casamento nas Escrituras é monogâmico, por toda vida, só podendo ser desfeito pela morte ou pela infidelidade conjugal. O divórcio não é o ideal de Deus para a experiência humana, muito menos para o casamento de um pastor. Ele é uma contingência da condição pecadora do homem (Mateus 19.18). Por sua própria natureza, o divórcio já é constrangedor, doloroso, penoso e pastores divorciados precisam dar um tempo para reconsiderar suas fraquezas, a vocação e o ministério. Devem em humildade, sujeitar-se a uma mentoria bíblica, conduzida por homens tementes a Deus, cheios da Graça Divina, que não espezinhem sobre o pecado alheio.

Não sou fundamentalista ou intransigente quanto ao retorno de pastores divorciados para o ministério. Penso que podemos analisar caso a caso à Luz das Escrituras. É exaustivo, polêmico, mas, viável, quando ocorrer mentoriamento e acompanhamento. Nosso problema é que quando o pastor enfrento do divórcio, ele se isola ou é isolado. É uma espécie de “lepra”, com toda a sua complexidade. Ele caminha narrando a sua versão da queda, sem confrontação. Há falta de humildade diante do seu próprio pecado. E nestas condições, sem confissão e arrependimento, fica cada vez mais distante o processo de restauração bíblica. A estrutura corporativa, por outro lado, não tem uma prática eficaz no pastoreio de pastores. Talvez seja também uma oportunidade de nós repensarmos nosso comportamento institucional diante do pastor caído.

Mas, o comportamento pastoral diante da vulgarização do casamento merece nossa total reprovação. É asqueroso demais o quadro desenhado em nosso território batista. Tenho a sensação que muitos já perderam a vergonha. A consciência sadia, conduzida pelo Espírito Santo, foi desprezada já há muito tempo. Nossos profetas se desviaram da Palavra de Deus, para viverem segundo os desejos do seu coração e o curso deste mundo. Eles acreditam que o ministério pastoral ainda é o melhor lugar do mundo para cometerem seus pecados e permanecerem impunes.

Esse impulso que muitos pastores têm de transgredir, de substituir, de acelerar, de divorciar, de adulterar, de manter relacionamentos amorosos enquanto ele trouxer satisfação e substituí-lo por outros que prometam ainda maior felicidade, precisa ser denunciado à Luz das Escrituras Sagradas. Se não batalharmos contra este pecado, nós estamos coniventes com esta transgressão. Concluo parafraseando Albert Camus: “Compreendi que não bastava denunciar o pecado. Era preciso dar a vida para combatê-lo”.

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