Por Samuel Bolton (1606-1654)
Aquilo que separa a alma do Bem maior, aquilo que separa a alma e Deus, o Bem maior, deve ser o maior mal. O pecado faz separação entre a alma e Deus: "mas as vossas iniquidades fazem divisão entre vós e o vosso Deus" (Is. 59:2), entre sua alma e a graça de Deus, entre sua alma e o conforto de Deus, sua alma e as bênçãos de Deus.
Diz-se que Naamã era um grande homem, um homem honrado, um poderoso homem de guerra, porém ele era um homem leproso. (II Reis 5:1). Quaisquer ornamentos que o homem tenha, quaisquer dons, beleza, bens, riquezas, etc, entretanto se ele for leproso, apesar de ser um homem letrado, um homem rico, ele é um homem repulsivo e isso estraga tudo.
Aquilo que é o fundamento e a causa de todos os outros males deve ser o mal sem par, pois o pecado é a causa de todos os outros males. O mundo antigo foi submerso em água? Isso foi por causa do pecado. Sodoma foi destruída com fogo, se transformando num lago de asfalto até o dia de hoje? Isso foi por causa do pecado. Jerusalém foi transformado em ruínas? O pecado fez isso. Se eu continuar citando nunca encontrarei um fim.
O pecado é a causa de todos os males nacionais. A seguir daremos nomes a alguns deles.
1. Guerras - "E se escolhia deuses novos, logo a guerra estava às portas". (Juízes 5:8).
"De onde vem as guerras e pelejas entre vós? Porventura não vem dos vossos deleites?". (Tiago 4:1).
2. Fome - "Ele converte a terra frutífera em terreno salgado, pela maldade dos que nela habitam. (Salmo 107:34). "Por isso também vos dei limpeza de dentes (por causa de seus pecados) em todas as vossas cidades, e falta de pão em todos os vossos lugares, etc." (Amós 4:6).
3. Pestilência - Observe o pecado de Davi em numerar o povo em Deuteronômio 28:21: "O Senhor te fará pegar a pestilência, até que te consuma da terra a que passas a possuir." Como o pecado é a causa dos males nacionais, assim ele é também a causa dos males pessoais, e eles são (1) temporais,(2) espirituais, e (3) eternos.
O pecado é a causa, a conseqüência, o responsável por tudo. Todos os males têm origem no pecado. O pecado é um mal protuberante e todos os outros males provêm dele. Alguns se manifestam sobre os seus corpos: doenças, dores, temores, enfraquecimentos. Outros sobre suas almas: medos, corações feridos, terrores, horrores. Se você pudesse rasgar o pecado, encontraria tudo isso habitando no interior do menor pecado.
Quer saber de uma coisa? O pecado foi o fundador do inferno, aquele que assentou a pedra angular da câmara mortuária das trevas, pois antes do pecado não existia inferno. E ainda, foi o pecado que edificou o inferno e o tem equipado com aqueles tesouros e riquezas da ira, fogo e enxofre. E não somente isso, entesoura ira para o dia da ira (Rom. 2:5).
Portanto, sendo um mal universal, um mal católico, o útero dos males e a causa de tudo, é o maior mal.
Aquilo que é pior do que o mais terrível dos males, há de ser o pior dos males, porém o pecado é o mal sem par. Aquilo que é maior do que o maior mal é excessivamente mau. O inferno é o mais terrível mal, todavia o pecado é pior do que o inferno em si. O inferno separado do pecado é somente miserável, não pecaminoso; um lugar punitivo, não um pecado em si.Separe o inferno do pecado (embora não possamos fazê-lo, ainda podemos fazer uma separação intelectual, abstrair o inferno do pecado só em nosso entendimento), digo então que o pecado é pior do que o inferno, porque o inferno é somente um lugar punitivo, o pecado é um mal excessivamente maligno. Existe o bem na punição, o bem na justiça, mas não existe bem nenhum no pecado, portanto, o pecado em si é o maior mal.
Agora vamos ao segundo ponto, que é o principal. O pecado em si, na compreensão do povo de Deus, é o mal sem par. Seus lamentos pelo pecado, e seus sofrimentos a fim de evitá-lo, mostra que ele reconhece ser o pecado o mal sem par.
1. Concernente a seus lamentos pelo pecado - pode ser visto nos salmos penitenciais de Davi quantas foram as lamentações e os gemidos dele por causa do pecado. Leiam o Salmo 51. Por que, qual foi a razão para eles? Todos os sofrimentos, todos os males no mundo não o teriam afetado tanto quanto o seu pecado. Paulo diz em Rom. 7:24: "Miserável homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte ? " A morte de seu corpo não era nada para ele em comparação com o corpo da morte!
Paulo passou por muitas tribulações, suportando grande sofrimen¬to, como vocês podem ler em II Cor. 11:23-25. No entanto, todos esses flagelos, essas prisões e perseguições não machucaram tanto o seu coração como o pecado, isto é, não o poder do pecado, e sim sua simples presença. Ainda que tenha sofrido muito, não lemos que ele tenha lamentado por tudo isso. Mas lamentou pelo pecado, "Oh miserável homem que sou! Quem me livrará deste corpo do pecado?" Assim fez Pedro, Manasses e outros.
2. Concernente ao sofrimento deles para evitar o pecado - Daniel estava contente ao ser atirado na cova dos leões, os três jovens no fogo, Paulo e Silas nos troncos. E muitos filhos de Deus escolheram prisões, estacas, fogo, e as mais ardentes perseguições em vez de pecar, o que claramente evidencia para nós que consideraram ser o pecado o maior mal.Eles consideraram-no pior que a pobreza, que é um grande mal. "Melhor mendigar do que pecar" disse alguém. "Moisés escolheu antes ser maltratado com o povo de Deus do que por um pouco de tempo ter o gozo do pecado ". (Heb. 11:24-28). Alguém semelhante a Moisés, Caleacius Caracciolus, foi um nobre príncipe e marquês que, para não pecar, deixou tudo o que tinha e foi morar em pobreza com o povo de Deus, meramente para se deleitar nas ordenanças.
Músculus, um homem de grande sabedoria e famoso teólogo, em vez de pecar preferiu se submeter a qualquer condição. A história conta-nos que sendo despojado de tudo quanto tinha, contentou-se, a fim de não pecar, em tornar-se um pobre comerciante, tecelão, para conseguir pão para sustentar sua esposa e filhos. Posteriormente, sendo marginalizado, o mundo considerando-se bom demais para ele, foi trabalhar com uma pá nas valas comuns da cidade para conseguir sua sobrevivência. Ele aceitaria qualquer condição, menos a que o levasse a pecar.
Eles não somente compreenderam que o pecado é um mal pior do que a pobreza, compreenderam que é algo pior do que a própria morte em si. Este foi o discurso de Ambrósio: "Você me lançará na prisão? Você tirará minha vida? Tudo isso é preferível para mim do que o pecado."
Quando Eudóxia, a Imperatriz, ameaçou Crisóstomo, aquele a quem posteriormente baniria, ele enviou-lhe esta mensagem: "Vá e diga-lhe", disse ele, "Eu não temo nada neste mundo a não ser o pecado".
3. Eles consideraram o pecado como sendo um mal maior do que a morte. Basil fala de uma jovem rica, à qual, sendo condenada ao fogo e sentenciada a perder todos os seus bens por não adorar ídolos, foi oferecida a promessa de vida e a restituição de seus bens se ela se retratasse. Ela respondeu, "Adeus vida, que pereça o dinheiro." Olhem para o caso das "Dez Sangrentas Perseguições" e os nossos recentes dias cruéis sob a rainha Maria, e encontrarão muitos exemplos dessa natureza.
4. Ademais, eles não somente compreenderam que o pecado é um mal maior do que a morte; mais do que isso, viram-no como um mal maior do que o inferno em si. Isto foi o que disse Crisóstomo: "Assim penso, e conseqüentemente sempre irei pregar, que é mais amargo pecar contra Cristo do que sofrer os tormentos do inferno."
Anselmo disse que se por um lado lhe fosse apresentado os males do pecado, e por outro lado os tormentos do inferno, ele preferiria escolher cair no inferno do que cair em pecado. Tal era a distância que estavam os corações deles do pecado. E nada é mais comum do que expressões como essas feitas pelos santos em tentações, em tribulações de espírito, ou num esclarecimento de seus próprios corações: "Prefiro que me matem, prefiro que me amaldiçoem, prefiro que me lancem no inferno, do que me permitir pecar contra Ti."
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