Por Vincent Cheung
Chegando agora ao verso 16 da nossa passagem, Paulo introduz o escudo da fé: “Além disso, usem o escudo da fé, com o qual vocês poderão apagar todas as setas inflamadas do Maligno”. A palavra traduzida por “escudo” aqui é a palavra grega thyreon, e A. Skevington Wood escreve o seguinte:
Thyreon é derivado de thyra (uma porta) e refere-se ao grande quadrilongo ou ao escudo protetor oval do soldado romano, mantido na frente dele para proteção. Ele consistia de duas camadas de madeira coladas juntas, cobertas com linho e couro, e envolvidas com ferro. Os soldados freqüentemente lutavam lado a lado, com uma parede (testudo) sólida de escudos. Mas, mesmo um combatente sozinho encontrava-se a si mesmo suficientemente protegido. Após o cerco de Dyrachium, Sceva contou não menos do que 220 dardos cravados em seu escudo. Para o cristão, este escudo protetor é a fé (pistis).
A questão é se “fé” aqui, refere-se à crença subjetiva do cristão ou ao conteúdo objetivo do Cristianismo. Wood responde, “Mas o crer não pode ser divorciado daquilo que se é crido, e nenhuma linha rígida deveria ser traçada entre estes dois aspectos”. Mas a declaração de Wood não trata o assunto corretamente. Mesmo se o crer não possa ser divorciado do que é crido, o que é crido pode deveras ser distinguido do que deve ser crido. Isto é, a crença subjetiva do cristão não está sempre de acordo com o conteúdo objetivo do Cristianismo. Certamente, neste caso, o que é “usado” pela pessoa não é, no sentido exato, “o escudo da fé, mas alguma outra coisa, e o verdadeiro escudo permanece no chão, por assim dizer.
Já estabelecemos anteriormente que cada peça da armadura representa a doutrina bíblica que corresponde a ela. Mas então, isto significa que cada peça da armadura refere-se ao conteúdo objetivo do aspecto da fé cristã que ela representa, e não a crença subjetiva do indivíduo sobre o assunto. Isto é, o escudo da verdade refere-se à própria verdade, e não ao comprometimento do cristão à ela. Da mesma forma, a couraça da justiça representa a doutrina bíblica sobre o assunto, mas não implica por si mesma a percepção subjetiva do indivíduo dela. Paulo certamente não está dizendo aos seus leitores para “vestir suas crenças subjetivas”, visto que, antes de mais nada, as crenças subjetivas de alguém nunca são “tiradas”! Antes, seu ponto é que o cristão deve deliberadamente “vestir” algo que ele pode ou “vestir” ou “despir” –– isto é, algo que tenha existência e validade objetiva, independentemente das crenças subjetivas do indivíduo.
Ele está chamando seus leitores a tomarem posso e identidade com as doutrinas bíblicas representadas por estas peças da armadura. A verdade é verdade por si só, quer alguém concorde com ela ou não; contudo, ela não beneficiará alguém que não estrutura seus pensamentos e ações de acordo com ela. O conteúdo do evangelho permanece o mesmo se uma pessoa compreende somente uma pequena fração dele, mas quando ele se coloca em estudo e treinamento intensivo, e permite que o evangelho governe sua conduta diária, ele torna-se alguém que está preparado para avançar o reino de Deus. Da mesma forma, o escudo da fé pode representar muito pouco o conteúdo objetivo da fé cristã, mas ele só protegerá aquele que o toma e o coloca diante de si.
Sobre o ataque demoníaco contra a igreja, Wood escreve, “Mas, no contexto de Efésios, eles parecem ter deliberadamente tentado destruir a unidade do corpo de Cristo” (3:14-22; 4:1-16, 27) através da invasão de doutrinas falsas e fomentação de dissensão (4:2, 21, 31, 32; 5:6)”.[3] Paulo instrui os filipenses a serem “de mesma mente” (Filipenses 2:2, NASB), e que eles deveriam “com uma só mente” estar “lutando juntos pela fé do evangelho” (1:27, NASB). Uma igreja pode dificilmente ser “de mesma mente” se seus membros não concordarem sobre o conteúdo do evangelho, e quando as doutrinas falsas controlam as mentes de muitos cristãos professos. Divisão e heresia impregna a igreja hoje, pois ela negligencia o estudo da teologia e apologética bíblica.
As falsas doutrinas são como “setas inflamadas”, rapidamente espalhando destruição. Mas o escudo da fé pode “apagar todas as setas inflamadas do Maligno”. Se o escudo da fé refere-se ao conteúdo da fé cristã, então, usá-lo significa aprender e afirmar o conteúdo da Escritura. Aqueles que entendem completamente e afirmam fortemente as doutrinas bíblicas são capazes de resistir e sobrepujar as falsas idéias que são lançadas no seu caminho. Embora isto requeira força e disciplina, para tomar este escudo e mantê-lo diante de nós, seu uso é, algumas vezes, notadamente simples, especialmente quando o usamos para impedir ataques contra as nossas mentes:
Embora Paulo não dê exemplos individuais destas setas inflamadas, Hodge menciona pensamentos horríveis, blasfemos, cépticos e sugestões mais sutis de cobiça, descontentamento e vaidade. Estas, ou tudo o mais que a figura de linguagem possa representar, são extintas pela fé. Os pensamentos maus devem ser desalojados e expelidos por pensamentos bons. Se no meio de problemas duvidamos do poder ou da sabedoria de Deus, deveríamos dizer para nós mesmos, 'Eu creio em Deus, o Pai Todo-Poderoso', ou repetir alguns versos que falam da Sua amorosa bondade. Assim, as doutrinas da fé expelirão as falsas idéias.
Que o escudo da fé e as setas inflamadas são intelectuais e doutrinárias em natureza, produz certas implicações, a saber, “Já deveríamos ter estudado ou memorizado algumas porções da Escritura, para termos algo para lembrar. Este estudo é, antes de mais nada, como erguer o escudo”. Aquele que é fraco no entendimento bíblico e teológico não tem levantado o escudo da fé, e deveras não pode fazer até que ele tenha aprendido o básico da teologia e da apologética. Até então, ele tem pouca proteção contra as falsas idéias que vêm contra ele. Uma vez que um membro da igreja é prejudicado ou contaminado por falsas doutrinas, o dano pode se espalhar rapidamente, se não averiguado, pois “um pouco de fermento leveda toda a massa” (Gálatas 5:9). É importante para os líderes da igreja ensinar o seu povo, de forma que eles se tornem hábeis no uso do escudo da fé (Hebreus 5:13-14; Efésios 4:11-16).
Assim, levantar o escudo da fé não é somente uma questão de vontade, mas também de entendimento. Não é somente uma questão de volição, mas também de intelecto. De fato, o entendimento intelectual das doutrinas bíblicas necessariamente precede o assentimento volitivo às doutrinas bíblicas, visto que a vontade não pode se comprometer a algo que nem mesmo existe ali. Se o escudo da fé representa o conteúdo objetivo da Escritura, então, a compreensão de um comprometimento volitivo à Escritura representa o ato de levantar. O tamanho grande do escudo é significante. O conhecimento da verdade é uma área que não pode oferecer proteção contra a falsidade e confusão na outra área. Portanto, levantar o escudo da fé implica obter um conhecimento compreensivo da Escritura.
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