Por Rubens Muzio
O filósofo ateu Nietzsche foi um dos que mais influenciou o pensamento de Adolpho Hitler. Ele costuma repreender os cristãos dizendo: “Vocês me dão enjôo!” Por que, lhe perguntavam. “Porque vocês, redimidos, não parecem que são redimidos”. Esta crítica tem acompanhado a história da igreja por séculos: os relacionamentos cristãos exalam mau cheiro e seus conflitos fedem. Há crentes que não olham para outros crentes, famílias que não se dão com outras. As pessoas ficam ressentidas e magoadas quando seus pastores e líderes não aparecem na festa de aniversário ou no quarto do hospital; não perdoam umas as outras pelas palavras ásperas ou ríspidas e não se reconciliam por estarem repletas de orgulho. E todas freqüentam a mesma igreja!
Jesus não disse que seus discípulos seriam conhecidos pelo amor (João 14)? Jesus ordena que amemos uns aos outros como Ele nos amou. Reconciliados com Deus e uns com os outros em Cristo, a igreja recebe o ministério da reconciliação (2 Co 5). Qual seria o nível no seu amorômetro se pudéssemos medi-lo?
No Novo Testamento, a palavra grega para comunidade é koinonia, uma comunidade de homens e mulheres que crêem em Jesus Cristo como Salvador e Senhor de suas vidas. Esta comunidade cristã é a nova humanidade. Em união com o Cristo ressurreto, ela compartilha de Sua vida e sua energia interior flui para dentro dela. Na união com Ele, concretizada pelo arrependimento e fé, os pecadores salvos pela graça de Deus são indissoluvelmente incorporados nesta comunidade, unidos ao corpo de Cristo.
O seu futuro está unido ao Dele simplesmente porque a igreja é o Seu corpo, do qual Ele é “o cabeça” (Ef 1:22). Este corpo é único já que Cristo “destruiu a barreira, o muro de inimizade” (Ef 2:14) – não há mais judeus ou gentios, homens ou mulheres, escravos ou libertos. Todos em Cristo se tornaram um com Ele e com os outros. Os membros da igreja são espiritualmente um (Ef 4:1-6). De uma maneira bem simples, a igreja como corpo tem crentes em Cristo como seus membros. Isso é autenticado pela presença do Espírito Santo não apenas individualmente, mas na comunidade. A igreja dá prioridade a sua formação pelo Espírito como uma comunidade de discipulado mútuo e discernimento comunitário. Charles Van Engen escreve a respeito:
A nova presença de Jesus Cristo na comunhão de amor (koinonia) dos discípulos constitui a Igreja. Sem essa presença de Cristo, não há nenhuma Igreja. Como podemos esquecer com tanta facilidade que é somente no âmbito do amor do discípulo pelo Senhor e de um discípulo pelo outro que a Igreja tem alguma vida? O que Paulo afirmou em I Coríntios 13 vem a propósito: se a Igreja é una, santa, católica (universal) e apostólica, mas não tem amor, nada é. Servindo de base a tudo o mais, repousa o marco supremo do povo de Deus - o amor. Se a Igreja não for, em primeiro lugar, à comunidade de amor, a Palavra e o Sacramento são um esforço vão. Nessa “era entre as eras”, a Igreja deve mais uma vez ouvir a voz de seu Senhor (van Engen, ano, p.).
Esta idéia de koinonia é fundamental para a nossa compreensão da igreja. Este ministério, para que seja efetivo, requer uma demonstração da unidade antes que possa sequer falar de reconciliação ou participar de qualquer mediação significativa em conflitos. Como falar em resolução de conflitos se não sabemos lidar com nossas diferenças? O fracasso de muitas igrejas de alcançar igualdade entre seus membros e integração entre as classes sociais silencia a mensagem de paz social. Cada vez mais, as igrejas falam “da boca para fora” de sua unidade, mas se mostram como grupos etnocêntricos e ensimesmados, na realidade. Ajith Fernando, um respeitado líder e estudioso asiático, em sua exposição sobre Efésios 2:13-16 a respeito de como a cruz quebra as barreiras das diferenças e divisões, escreveu:
O preconceito tem sido um problema porque todos estamos embebidos dos preconceitos de nosso meio, onde se afirma ser um grupo superior a outro. Vindo de uma nação na qual a tensão étnica tem causado muito caos, posso dizer que, mesmo com respeito aos cristãos, os nossos preconceitos estão entre as últimas coisas que o processo de santificação toca. Os preconceitos podem dizer respeito à raça, classe, casta ou a outro destes fatores terrenos que não são significativos na visão de Deus. Aqueles que afirmam que não são preconceituosos são normalmente os mais preconceituosos. E algumas vezes, os que afirmam ser cristãos crentes na Bíblia são os mais anti-bíblicos com respeito a este assunto (Fernando, 1995, p. 198-199).
Como os crentes podem estar em unidade quando há uma série de razões para a diversidade? As igrejas, normalmente, estão divididas por causa de personalidade, cultura, denominacionalismo, doutrinas, etc. A imagem que Paulo tem da igreja reflete o mistério da “multiforme sabedoria de Deus”, e significa brilhante como as cores do arco-íris e variada como as múltiplas cores de um campo de flores (Ef 3:10). Ou seja, a unidade cristã deve ser baseada na diversidade. De outra maneira, se fosse sem diversidade, ela se tornaria uniformidade. A igreja tem muitas partes como um corpo, mas é um só corpo (1 Co 12). A unidade essencial dos crentes deve ser experimentada nos relacionamentos multi-classiais, multiculturais e interdenominacionais, como testemunho da Nova Criação em Cristo.
O lema de Agostinho foi adotado pela Assembléia da Aliança Evangélica Internacional em Nova Iorque, em 1783: In Necessariis Unitas; In Dubiis Libertas; In Omnibus Caritas. Isso pode ser traduzido como: nas questões essenciais, unidade; nas não-essenciais, liberdade; em todas as outras, caridade. Unidade nas experiências e cooperação funcional estão baseadas em um núcleo irredutível mínimo de crenças. Quais seriam essas doutrinas? Leith Anderson resumiu este núcleo: “a Bíblia como a Palavra de Deus, a Trindade, a deidade de Jesus Cristo, a reconciliação, salvação e vida eterna” (Fuller, 1998, p. 76). Nossa intenção deve ser experimentar esta comunhão na igreja local e praticá-la com todas as nossas forças nos relacionamentos pessoais.
Fonte: Sepal
Nenhum comentário:
Postar um comentário