quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Deus, o universo e os axiomas


Por Ricardo Mamedes

Afirmo que o universo existe porque o vejo, enxergo as estrelas à noite do meu quintal. Algumas galáxias são visíveis, os meus sentidos me informam que o que vejo realmente existe. Não estou em uma "matrix", sou um indivíduo. O meu coração pulsa, os dedos tocam a pele e sinto tanto os dedos como a própria pele. O ar frio eriça os pelos, os poros se contraem. Sim, eu existo. A filosofia ousa imaginar a não existência, como se nós fôssemos apenas uma miragem, considerando a possibilidade de não existirmos de fato. Quem sabe somos apenas a imagem de uma "não existência"? Mas ainda que assim fosse, quem criou essa imagem, e por que há o sentido de que ela (a imagem) existe, se não há um ser para senti-la?

Se partirmos porém dos sentidos - e aí podemos afirmar que existimos mesmo - de onde viemos, como viemos e como surgimos? Há controvérsias. Uns dizem que somos fruto do acaso, uma combinação aleatória de reações químicas dando origem a uma molécula e Buuuum! Eis que se criou uma pequena partícula que se expandiu dando origem ao universo. E do universo para nós foi mais uma série de combinações aleatórias, se iniciando com um insignificante ser unicelular, que deu origem a todas as espécies, grosso modo, jogando-se nesse caldeirão a seleção natural, de onde tudo surgiu. E desse encadeamento surgiu também o 'homo sapiens'.

Outros dizem que pura e simplesmente o homem e tudo que há foi criado por Deus, ser soberano e onipotente, início de tudo, vontade primeira, força criadora e definidora das espécies, bem ainda de todo o universo. Eu me coloco nessa segunda categoria.

Ora, de todos os pontos que olharmos, partindo da premissa de que tudo responde à lei de causa e efeito, o surgimento do universo também deverá ter uma causa: nada há sem uma causa antecedente. Não se pode criar algo do nada (nihil). De tal maneira que não se poderia conceber um universo inteiro, com todas as suas imensas complexidades surgido de reações aleatórias e sem causa.

A despeito de se imaginar uma partícula mínima a desencadear uma reação química, esta dando início ao big bang - o que se convencionou chamar de bóson de Higgs - ainda assim, essa partícula infinitesimal tem que ter tido uma origem, uma vontade que lhe tenhadado existência, uma força criadora: do nada nada se cria!

E por que tudo ao invés do nada? Se penso e existo, por que penso e porque existo? John Hick assevera que por trás dessa vontade há que ter " um ser necessário', que seja eterno, não causado, indestrutível e incorruptível " [1]. Os ateus logo foram céleres em afirmar que o "ser necessário" pode ser o próprio universo. Leibnitz, por seu turno, concebeu Deus como o Ser necessário, asseverando que "algo existe em vez de nada porque existe um ser necessário que carrega consigo sua razão para a existência e é a razão suficiente para a existência de todo ser contingente" [2].

Nós cristãos afirmamos que, se não podemos provar, à luz da lógica (humana) e da filosofia, através de absolutos, que Deus existe, também eles não podem provar a sua não existência, simplesmente por não poder ser demonstrado. Mas os que creem em Deus ainda levam a vantagem de explicar a origem de tudo, enquanto os que não creem, nada explicam e se atolam em uma encruzilhada lógica onde permanecem perenemente encravados.

Bem, então nós temos que considerar ser possível extrair de premissas bem formuladas a verdade, mesmo com a impossibilidade de ser demonstrada? Euclydes (330-270 a.c) disse que sim. Segundo esse célebre matemático o axioma fundamental de sua geometria é: "Por um ponto exterior a uma reta, somente podemos fazer passar uma só paralela a essa reta", só dando ao espírito humano três dimensões do espaço. Portanto, duas retas paralelas jamais se encontrarão, nem na terra e nem no universo infinito. E ainda assim elas existem e são paralelas. Porém, mesmo aí há controvérsias? Pois há aqueles que ousam afirmar que essas duas retas podem se encontrar no universo...

Se os axiomas devem ser evidentes, sob a condição de, não o sendo, ser demonstrados, este de Euclides não é evidente, tampouco pode ser demonstrado. No entanto, a geometria euclidiana foi comprovada, pela independência do seu axioma.

Assim, se a existência de Deus não pode ser comprovada logicamente, também a sua não existência é impossível de se comprovar. Mas ainda assim Ele existe. Por duas razões: a verdade que se extrai da Sua Palavra, e por que o Universo não existe por si mesmo ( esta uma impossibilidade lógico-científica), mas provém de uma força criadora pessoal, eterna e incorruptível: Deus. "Alia jacta est" : quem viver e morrer verá!

[1] John Hick, “God as Necessary Being,” Journal of Philosophy 57 (1960): 733-4.
[2] G.W. Leibniz, Theodicy: Essays on the Goodness of God, the Freedom of Man, and the Origin of Evil, trans. E.M. Huggard (London: Routledge & Kegan Paul, 1951), p. 127; cf. idem, “Principles,” p. 528.

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