Por C. H. Spurgeon
A lei do Senhor é perfeita; (Salmos
19.7) - A referência não é somente à lei de Moisés mas à doutrina de Deus, a
todo o conjunto de instruções da Sagrada Escritura. A doutrina revelada por
Deus é declarada perfeita, e observe-se que Davi tinha apenas uma pequena parte
das Escrituras. Se um fragmento da porção mais obscura e histórica já é
perfeito, o que dizer do volume inteiro? Muito mais do que perfeito é o livro
que contém a demonstração mais evidente do amor divino, e nos abre a visão da
graça redentora. O evangelho é um plano completo ou lei da salvação pela graça;
ele apresenta ao pecador tudo o que este precisa para suprir suas terríveis
necessidades. Na Palavra de Deus e no plano da graça não há redundâncias nem
omissões; por que, então, pintar os lírios que já têm sua cor e dourar o ouro
que já foi refinado? O evangelho é perfeito em todas as suas partes, e perfeito
como um todo: é crime acrescentar, traição alterar e perfídia retirar algo
dele.
E
restaura a alma. Ela faz o homem retornar ou ser
recuperado para o lugar de onde o pecado o expulsara. O efeito prático da
Palavra de Deus é fazer o homem voltar-se para si mes¬mo, para Deus e para a
santidade, e a volta ou conversão não é apenas exterior; a alma é tocada e
renovada. O maior agente da conversão do pecador é a Palavra de Deus, e quanto
mais próximos nos conservamos dela em nosso ministério, tanto maior a
possibilidade de sucesso. E a palavra de Deus, e não a interpretação humana
dela, que exerce poder sobre as almas. A lei e o evangelho agem diferentemente,
mas o resultado é o mesmo, pois pela ação do Espírito de Deus a alma cede e
suplica: "Converte-me, e serei convertido." Tente convencer a
natureza corrupta do homem com filosofias e raciocínios; ele sorrirá dos seus
esforços, mas a Palavra de Deus logo opera uma transformação.
O
testemunho do Senhor é fiel. Deus dá testemunho
contra o pecado e em favor da retidão; ele testifica a nossa queda e
restauração; seu testemunho é claro, decidido e infalível, e deve ser aceito
como correto. O testemunho de Deus em sua Palavra é tão exato que nele
encontramos sólido conforto, tanto para o presente como para a eternidade, e nenhum
golpe contra ele desferido, por mais violento e sutil que seja, poderá diminuir
sua força. Que bênção saber que num mundo de incertezas temos algo tão seguro
onde nos apoiar! Libertamo-nos, assim, das areias movediças da especulação
humana para a terra firme da Revelação Divina.
E
dá sabedoria aos símplices. Mentes humildes, puras e
ensináveis recebem a Palavra e com ela a sabedoria para a salvação. Coisas
ocultas aos sábios e prudentes são reveladas a criancinhas. Os que se deixam persuadir
ficam sábios, mas os sofistas permanecem tolos. Como lei ou plano, a Palavra de
Deus converte e, a seguir, como testemunha, instrui. Todavia, a conversão é
insuficiente; precisamos dar continuidade sendo discípulos. E se temos sentido
o poder da verdade, havemos de provar sua autenticidade através da experiência.
A perfeição do evangelho converte, mas a certeza a respeito dele edifica; para
sermos edificados, não podemos vacilar incrédulos diante da promessa, pois um
evangelho de que duvidamos não poderia nos dar sabedoria. Somente uma verdade
da qual podemos ter certeza pode nos servir de esteio.
8.
Os preceitos do Senhor são retos. Os estatutos e os
decretos divinos estão fundamentados na justiça e são compreensíveis para a
razão humana. Como um médico prescreve o medicamente correto, e um conselheiro
o parecer adequado, assim é a Palavra de Deus. E alegram o coração. Observemos
o progresso: o convertido ganha primeiramente sabedoria, e a seguir felicidade;
a verdade que torna reto o coração, também lhe concede alegria. A graça traz
júbilo ao coração. A alegria que procede deste mundo reside nos lábios e excita
as forças do corpo; os prazeres celestiais, porém, satisfazem a natureza
interior e preenchem as faculdades mentais até transbordarem. Não há refresco
mais agradável do que este, derramado do cântaro das Escrituras. "Para ser
feliz, refugie-se e leia a Bíblia."
O mandamento do Senhor
é puro. Não há enganos infiltrados que o contaminam, nenhuma nódoa de pecado o
polui; ele é o leite não-adulterado, o vinho não-diluído. E ilumina os olhos,
ou seja, limpa com sua própria pureza a obtusidade humana que interfere no
discernimento intelectual: para os olhos obscurecidos por tristeza ou pecado, a
Escritura é um oculista habilidoso que os torna claros e radiantes. Olhe para
sol e ele lhe cegará os olhos; olhe para a luz maior da Revelação e ela os
abrirá. A pureza da neve provoca uma cegueira no viajante dos Alpes, mas a
pureza da verdade divina exerce o efeito contrário e cura a cegueira natural da
alma. Convém novamente observarmos a gradação: o convertido tornou-se um
discípulo e a seguir uma alma jubilosa; agora ele obtém olhos perspicazes e,
como pessoa espiritual, discerne todas as coisas, embora ele mesmo não seja
perscrutado pelos outros.
9.
O temor do Senhor é límpido. A doutrina da verdade é aqui
descrita pelo seu efeito espiritual, ou seja, a consagração interior ou temor
ao Senhor; ela é límpida em si mesma e limpa do amor ao pecado o coração onde
reina, santificando-o. O Sr. Temente a Deus não se satisfaz enquanto cada rua,
estrada e viela, sim, cada casa e cada esquina da cidade de Alma-Humana não
esteja varrida da sujeira diabólica que a infesta. E permanece para sempre. A
imundície gera decadência, mas a limpeza é o grande inimigo da corrupção. O
princípio puro da graça de Deus habitando no coração do homem é permanente e
incorruptível; pode ser suprimido por algum tempo, mas não pode ser destruido.
Tanto na Palavra como no coração, quando o Senhor escreve, ele repete as
palavras de Pilatos: "O que escrevi, escrevi." Deus não faz rasuras,
nem permitirá que outros façam. A vontade revelada de Deus é imutável, até
mesmo Jesus veio não para destruir mas para cumprir, e até a lei cerimonial foi
mudada somente na sua sombra, a substância que nela reside é eterna. Enquanto
os governos das nações são abalados por revoluções e antigas constituições são
rejeitadas, é confortador saber que o trono de Deus é Inabalável.
Os
juízos do Senhor são verdadeiros e todos igualmente justos.
Conjunta e separadamente as palavras do Senhor são verdadeiras; aquela que é
boa no detalhe é ótima no conjunto; não há nenhuma exceção para uma frase
isolada nem para o livro como um todo. Os juízos de Deus, em conjunto ou em
separado, são manifestamente justos, e não precisam de explanações trabalhosas
para se justificarem. As decisões judiciais de Jeová, reveladas na lei ou
ilustradas na história de sua providência, são a própria verdade e óbvias para
toda mente sincera; não apenas seu poder é invencível: sua justiça é
inquestionável.
10. São mais desejáveis do que ouro, mais do que
muito ouro depurado. A verdade bíblica enriquece a alma ao
mais elevado grau: a metáfora vai ganhando força: ouro - ouro depurado - muito
ouro depurado. Ela é boa, melhor, ótima, e merece ser desejada com voracidade
maior que a de um faminto. Uma vez que o tesouro espiritual é mais nobre do que
a mera riqueza material, ele deve ser desejado e procurado com um ardor cada
vez maior. Fala-se sobre a solidez do ouro, mas o que é mais sólido do que uma
verdade sólida? Por amor ao ouro as pessoas abrem mão do prazer, renunciam à
tranqüilidade e põe a vida em perigo; não devemos estar prontos para fazer o
mesmo por amor à verdade? E são mais doces do que o mel e o destilar dos favos.
Segundo Trapp: "Aos mais velhos
interessa o lucro, aos jovens o prazer; àqueles está reservado o ouro, sim, o
ouro depurado em grande quantidade e a estes, o mel, sim, o mel puro que
escorre dos favos." Os prazeres resultantes de uma compreensão correta
dos testemunhos divinos são da mais preciosa ordem. As alegrias terrenas são
totalmente desprezíveis se comparadas a eles. Os deleites mais doces, sim, o
mais doce de todos são a parte de quem tem a verdade de Deus por herança.
Fonte: C. H. SPURGEON
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