Por Jesse Campos
Gilbert K. Chesterton apontou que o
problema do homem que não crê em Deus, não é que ele tenha parado de
crer, mas sim que esse homem crê em qualquer coisa. Moisés subiu ao
monte Sinai para receber a Lei de Deus. Mas, como Moisés demorou a
retornar, o povo israelita decidiu construir um bezerro de ouro. Ao
regressar, Moisés encontrou o povo cultuando tal bezerro (Êxodo 32). O
fato é que ou o ser humano cultua a Deus ou ele se devota a algum
bezerro que lhe pareça reluzir. Toda pessoa tem um lugar supremo, e
apenas um, no centro do seu ser e existência. Esse lugar é na verdade um
altar - um altar último. E ao ocupar esse altar o ser humano oferece
sua maior devoção - sua vida. A questão não é se alguém tem ou não tem
esse altar. A questão é o que está nesse altar - Deus ou um bezerro de
ouro?
O ser humano não consegue viver sem algo que dê significado
ao seu ser e existência. Ele precisa de algo que lhe provoque uma
antecipação de realização e satisfação. A vida se torna vazia e
insuportável sem esse valor. O altar não pode ficar vazio. Mas, nessa
necessidade inevitável, contida ou expressa, um erro é comumente
cometido. O ser humano concede uma dimensão última àquilo que é
contingente e fortuito, buscando em algo que é menor que a vida o
"atender" o anseio da alma ao invés de buscar no que é maior que a
vida... e morte. O ser humano transveste de Deus aquilo que não é Deus. É
um trágico equívoco. Da sua profunda experiência com esse drama, Blaise
Pascal alertou que o abismo do vazio interior "pode ser preenchido
apenas por um objeto infinito e imutável, em outras palavras, por Deus".
Jacques Ellul, professor
de Sociologia e História na Universidade de Bordeaux, falecido em 1994,
apontou corretamente que a idolatria "não tem desaparecido, mas longe
disso... há os deuses secretos que assediam e seduzem muito eficazmente,
porque eles não declaram abertamente serem deuses..." Sem Deus, essa
sedução sempre acontece. Nenhum ser humano deixa vazio o seu altar
supremo. O apóstolo Paulo disse que os seres humanos "dizendo-se sábios,
tornaram-se loucos, e trocaram a glória do Deus imortal por imagens
feitas segundo a semelhança do homem..." (Romanos 1:22-23)
No
abandonar Deus, a ocupação desse altar é concedida a uma variedade de
bezerros. Se para uns é um objeto religioso, para outros, atualmente,
são alternativas seculares. Para o adolescente, dominado pela mídia e
moda, o ocupante do altar é geralmente um artista ou esportista. Para o
adulto, pode ser o dinheiro. Para o devoto da ciência, o ocupante do
altar é ela própria. Outros endeusam uma causa, como a ecologia. As
opções de deuses se multiplicam em formas tais como poder, profissão, status, romance, família, esporte, sexo, drogas etc. Eis a questão - qual é o bezerro no altar supremo?
Na
esfera da religião, o erro do bezerro é um velho conhecido. Por isso, o
mandamento antigo proíbe categoricamente a construção de qualquer
imagem ligada ao culto - "não farás para ti... nenhuma imagem..." (Êxodo
20:4). É oportuno observar que Deus não deixou nenhum dado sobre a
aparência de Cristo. Se houvesse essa informação, absurdos idólatras
iconográficos aconteceriam. O coração humano é rápido e sutil na arte de
transferir a divindade para um objeto que possa manipular ou possuir, e
que se molde às suas expectativas e projeções.
É relevante notar
que a narrativa informa que "o povo, ao ver que Moisés demorava a
descer do monte, juntou-se ao redor de Arão e disse... faça para nós
deuses que nos conduzam, pois a esse Moisés... não sabemos o que lhe
aconteceu" (Êxodo 32:1). A demora foi crucial para o erro do bezerro.
Moisés foi o líder que Deus escolheu para conduzir o povo. Ainda que
Moisés fosse o homem de Deus para aquela tarefa, Moisés não era Deus,
mas um homem. No entanto, sem a presença visível de Moisés, o povo
desconsiderou Deus. Devido a visão equivocada que tinha de Deus, o povo
acabou na miséria de cultuar um bezerro. Eles queriam Deus numa
manifestação sob o controle de seus sentidos. Seria um deus condicionado
à percepção, manipulação, concepção ou expectativa deles. Na verdade,
os deuses no altar humano são consequências do domínio do ego em
contraposição ao domínio de Deus. Por isso, o ser humano transfere o seu
anseio pelo divino para algo da sua projeção e expectativa, e termina
nas mãos daquilo que é imanente e menor que a vida, seja algo religioso
ou secular.
O antídoto para esse erro é ter uma compreensão
nítida de quem Deus é - Deus que transcende o universo humano. Um Deus
acima e além da vida e da morte. É preciso uma visão de Deus que torne
irrelevante e desnecessário qualquer bezerro. E somente o conhecer do
Deus que transcende a finitude humana pode trazer a satisfação final.
O
fato é que os bezerros de ouro precisam ser abandonados ou não há
encontro com Deus, portanto, não há satisfação plena. Pela fé, em
arrependimento, o ego humano e suas idolatrias são crucificados com
Cristo e o encontro com Deus acontece - o Deus suficiente. E no poder do
Cristo ressurreto nasce uma nova vida com Deus. "...Deus estava em
Cristo reconciliando consigo o mundo..." (II Coríntios 5:19) E um novo
cântico e preenchimento chegam à vida.
Fonte: Editora Fiel
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