Por R.C. Sproul Jr.
O cristão está envolvido em uma guerra de três frentes. A Bíblia, repleta de linguagem marcial, confirma isso. A grande trindade maligna contra a qual lutamos é formada pelo mundo, a carne e o Diabo. Em nossos dias, fizemos as pazes com o mundo e reduzimos nossa carne a meros aspectos psicológicos. Perdemos de vista esses dois campos de batalha porque, precisamente, temos perdido de vista o terceiro. Em outras palavras, esquecemos que estamos em guerra contra o mundo e nossa carne porque o Diabo nos derrotou em uma batalha – esquecemos que ele existe.
CS Lewis, no prefácio de sua grande obra The Screwtape Letters ["As Cartas do Inferno" ou "Cartas de um Diabo a seu Aprendiz" nas edições brasileiras - N.T.], apresenta um conselho: “Há dois erros iguais e opostos em que nossa raça pode incorrer quando se trata de demônios. Uma é desacreditar em sua existência. A outra é acreditar e sentir um interesse doentio por eles. Eles ficam de igual modo satisfeitos com ambos os erros e aclamam um materialista ou um mago com a mesma satisfação”. Sábio como Lewis e essa citação em particular podem ser, levanto uma contestação. Sem dúvida, o Diabo é capaz de realizar em grande mal entre aqueles que o veem como uma espécie de deus do mal, aqueles com um interesse mórbido nele e seus asseclas. Dito isso, eu sugeriria que ele é capaz de causar danos muito maiores entre aqueles que não lhe dão crédito. Ou seja, tanto o materialista e o mago são ruins, mas o materialista é pior.
Temos o mesmo problema na subcultura cristã, e pelas mesmas razões. De um lado do espectro está a ala extremista do movimento carismático. Essas pessoas afirmam ver um demônio por trás de cada arbusto. Eles não pegam resfriados; estão sob ataque do demônio da fungada. Eles não têm olhos cobiçosos, mas estão em guerra com o demônio da luxúria. Muitas vezes, os que estão neste campo procuram demônios por trás de cada arbusto, porque eles podem se revelar bem úteis para servir de desculpa para os nossos pecados – como Flip Wilson costumava dizer: “O diabo me fez fazer isso”.
Este não é o perigo que enfrentamos nos círculos reformados. Estamos do outro lado do espectro. Ao contrário dos materialistas, nós sim acreditamos no reino demoníaco. A Bíblia, afinal de contas, fala sobre essas coisas. Mas tendemos a acreditar que os demônios saíram da arena humana ao mesmo tempo em que os milagres cessaram. Demônios existem, estamos dispostos a confessar, mas estão sentados nas arquibancadas celestes desde a era apostólica. Temo que o que impulsiona isso não é um estudo exegético cuidadoso do assunto e sim uma abrangente visão de mundo modernista. Olhamos com inferioridade nossos irmãos que prestam atenção no reino espiritual, não porque pensamos ser antibíblico, mas porque não achamos sofisticado. Achamos que o hábito de Martinho Lutero de gritar com o Diabo, de atacá-lo com seus textos, é um sinal de que Martinho estava em um limite psicológico, quando talvez devêssemos concluir que ele demonstrou aqui a mesma sabedoria que o levou a declarar “Esta é a minha posição!”. É possível que Lutero tenha absorvido a verdade de que Deus é um castelo forte da mesma fonte de onde ele discerniu que esse mundo está cheio de demônios: a Bíblia.
O fato de raramente darmos crédito ao diabo, muito menos à sua função, deveria nos confirmar essa importante realidade espiritual – que o Diabo está sentado no nosso ombro, sussurrando tolices em nossos ouvidos. Ele está presente não só nos cantos obscuros da África, mas nos cantos obscuros de nossos corações e mentes. Se quisermos buscar primeiro o reino de Deus, vamos ter que enfrentar a realidade de que ele está tentando nos parar.
O diabo está presente não só nos cantos obscuros da África, mas nos cantos obscuros de nossos corações e mentes.
As forças dele, também devemos lembrar, não estão apenas investidas nos campos de batalha político e cultural. Ele não tem a mão apenas no Partido Democrata, nem trabalha sua magia apenas em Hollywood. O negócio dele também é fazer crescer em nós o seu fruto diabólico. Ele está no comando quando estamos cheios de inveja, maldade, medo, egoísmo. Ele está em guerra quando nos encoraja a gastar as nossas energias não buscando o reino, mas perseguindo paz pessoal e prosperidade econômica. Ele está praticando sua magia negra quando ele nos encoraja a não defender a honra de Cristo, mas a nossa própria reputação e dignidade. Ele está no comando dos detalhes de nossas vidas, como falamos com nossos filhos, como ouvimos nosso cônjuge. E, infelizmente, ele está conquistando grandes vitórias.
A guerra entre a descendência da serpente e a semente da mulher não é exatamente a mesma coisa que a guerra cultural. Elas se cruzam, mas não são uma só. Em vez disso, a guerra entre a semente e a serpente é a mesma guerra que enfrentamos contra o mundo, a carne e o Diabo. Que Deus nos dê a graça de conquistar grandes vitórias nas batalhas que lutamos a cada dia. Que ele nos conceda visão para enxergar as batalhas épicas que ocorrem no decorrer de nossas vidas ordinárias.
Fonte: iPródigo
Nenhum comentário:
Postar um comentário