sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Predestinação em Êxodo


Por Gordon Haddon Clark

Após Gênesis, o livro de Êxodo enfatiza a doutrina da predestinação, no que os arminianos poderiam chamar de sua forma mais virulenta. Mas deixando de lado as objeções arminianas, Êxodo é tão claramente calvinista, ou os calvinistas são tão exodianos, que a continuada existência dos arminianos é um milagre da cegueira.

O princípio desse material está em Êxodo 4:21: "E disse o SENHOR a Moisés... mas eu lhe endurecerei o coração, para que não deixe ir o povo." Em face das predições em Êxodo 3 e 4, nas quais a rejeição de Faraó é predita (3:19), e por causa das palavras explícitas em 4:21, como pode um arminiano dizer que Faraó estava livre para deixar os escravos irem? Se Deus endureceu o seu coração, que possibilidade havia de que ele pudesse fazer de outro modo? Deus não é onipotente? Não pode a onipotência controlar a vontade do homem? Os arminianos são propensos a recuar e replicar que Deus, visto que ele é onipotente, pode controlar suas criaturas, mas por respeito à integridade delas, ele deseja não controlá-las. Mas os que os arminianos dizem que Deus não faria, o versículo diz que ele fez.

Ora, existe uma a regra padrão de teologia de que nenhuma doutrina deve ser baseada em um único versículo. Para evitar erros de interpretação, um cristão precisa comparar Escritura com Escritura e usar tantos versículos quanto possível. No caso da predestinação é fácil acumular versículos; a única dificuldade é encontrar todos eles. A assertiva particular do último versículo citado é repetida em Êxodo 7:3. Ele diz: "Eu endurecerei o coração de Faraó." Suponhamos agora que alguém em desespero tente replicar: "Bem, Deus disse: 'Eu irei [endurecer]'; isso está no tempo futuro. Então, ele depois mudou de idéia e não o fez. Isto é desespero de fato. A parte do fato que Deus nunca muda de idéia, pois ele é eternamente imutável, Êxodo 7:13 nos diz claramente que o que Deus predisse que faria, ele o fez: "Ele endureceu [tempo passado] o coração de Faraó."

Agora, há alguns versículos nos quais esse evento é mencionado sem indicação de quem fez o endurecimento. Êxodo 7:22 simplesmente diz: "O coração de Faraó estava endurecido." Então, com um suspiro de alívio o arminiano apressa-se para Êxodo 8:15 e 32. Veja, ele diz: "Faraó endureceu seu [próprio] coração." Alguns não-cristãos podem estar mais empolgados e dizer: "Veja, a Bíblia se contradiz." Contudo, a alegada contradição brevemente desaparecerá, à medida que a observação arminiana for considerada.

Um pouco de estatísticas irá melhorar a perspectiva. Êxodo menciona o endurecimento do coração de Faraó dezoito vezes, aos quais pode ser adicionado um outro versículo que se aplica aos egípcios em geral. Êxodo 4:21; 7:3, 7:13; 9:12; 10:1, 20, 27; 11:10; 14:4, 8, todos dizem que o SENHOR endureceu o coração de Faraó. O versículo extra diz que o SENHOR endureceu o coração dos egípcios (Êxodo 4:17). Isto é onze vezes de dezenove. Cinco ocasiões, 7:14,22; 8:19; 9:7, 35, não especificam quem endureceu o coração de Faraó. Os outros versículos, três em número, 8:15, 32 e 9:32, dizem que Faraó endureceu seu coração. Quem, então, em face de onze indicações de que o SENHOR endureceu o coração de Faraó pode negar que Deus seja a causa deste endurecimento? Não apenas essa indicação positiva é feita três vezes mais freqüente, mas é feita três vezes antes da outra declaração ser feita uma vez. Após tudo, quem dirige o Egito — Faraó ou Deus?

Bem, em dois sentidos diferentes, tanto Deus quanto Faraó dirigiam o Egito. E este fato, que muitos arminianos inconsistentes admitiriam, mostra como Deus e Faraó podem endurecer o coração de Faraó.

As dificuldades que os arminianos encontram brotam da idéia deles, usualmente não verbalizada, de que o relacionamento entre Deus e suas criaturas é similar àquele que se dá entre duas criaturas. Mas se isso não é verdadeiro de relacionamentos pessoais no plano mais baixo, o mesmo é excessiva e notoriamente falso nos mais elevados. O relacionamento entre um general quatro-estrelas do exército e um subordinado não é aquele que é obtido entre dois soldados raso. Muito menos é a relação de homem para com homem a mesma que a do homem para com Deus. Um homem pode persuadir um outro a escolher um curso de ação; ele pode por tortura forçar um homem a fazer algo; mas mesmo isto não é controle onipotente sobre a vontade do outro. Na situação comum a vontade de uma pessoa é obviamente livre de outros. Este não é o caso entre Deus e o homem. Quando Paulo pregou em Atenas, se alguma referência do Novo Testamento é permitida num capítulo sobre o Antigo Testamento, ele disse: "Porque nele nós vivemos, e movemos, e existimos." Esse "nós" não se refere apenas a Paulo e aos outros cristãos. Isto, particularmente, se referia a Paulo e à sua audiência paga. Os pagãos viviam e se moviam, pensavam e falavam, em Deus. A mente deles e a mente de Deus estavam interpenetradas. A doutrina da onipotência mostra que Deus controla a vontade dos homens; a passagem em Atos deixa de certo modo mais claro como Deus controla a vontade dos homens. Minha dor de dente não existe em sua mente; e muitos dos seus pensamentos não existem na minha. Mas cada pensamento seu e meu são encontrados de igual modo na mente de Deus. Essa interpretação no mínimo ilumina em certa medida a maneira pela qual a mente do Criador controla os pensamentos de suas criaturas.

Antes de deixarmos Êxodo e Faraó, podemos ver ali alguns dos propósitos de Deus em endurecer o coração de Faraó. Deus sempre age com um propósito. Êxodo 9:16 diz: "Para isto te mantive, para mostrar meu poder em ti, e para que o meu nome seja anunciado em toda a terra." Se Deus não tivesse endurecido o coração de Faraó, se a vontade de Faraó tivesse sido livre, ele poderia ter permitido que os israelitas partissem, no mínimo depois de duas ou três pragas. Mas nesse caso o poder de Deus nas outras pragas não teria sido manifestado, nem a grande libertação no Mar Vermelho. Para que afogasse o exército egípcio, após os israelitas terem atravessado seguramente, Deus endureceu o coração de Faraó.

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