segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Jesus X Igreja: tornei-me cristão quando saí da igreja


Por Maurício Zágari

Esta semana vi no twitter de alguém um link para a tabela que está aqui ao lado. Ela sintetiza um discurso que nos últimos anos se tornou moda entre grande parcela dos cristãos brasileiros: o grupo que passou a satanizar a igreja institucional. Segundo esse segmento, a igreja (com letra minúscula) é o grande mal do universo. Não mais as obras da carne, o pecado, o mundo, o diabo, nada disso. A maligna, satânica e perversa igreja organizada é o vilão da hora. O lema desse grupo poderia ser resumido a “tornei-me cristão quando saí da igreja”. Legiões têm abraçado esse discurso e passado adiante essa ideologia, em geral em redes de relacionamento, blogs e sites da internet. Analisei esse quadro e gostaria de tecer comentários a respeito (em breve abordarei em detalhes aqui no APENAS os pontos apresentados nesse quadro, mas por ora me atrevo a fazer uma consideração geral).

Antes de mais nada, é importante dizer que amo Jesus. Fui chamado pela graça, resgatado sem merecer e justificado exclusivamente pelo sangue do Cordeiro, sem mérito ou obra que me valesse. Por isso, busco Jesus de Nazaré. Sou grato a Ele. Preciso dele a cada passo, contando com sua misericórdia para me perdoar diariamente de minha multidão de pecados. Sei que só em sua pessoa, na seiva que corre na videira verdadeira, posso obter a vida – e por isso mesmo meu interesse é encontrá-lo onde Ele estiver. Ao mesmo tempo estou ciente dos absurdos que acontecem em muitas igrejas. Teologia da Prosperidade, igrejas onde se oprimem membros com usos e costumes humanos, congregações de fachada para o exercício de poder humano, legalismos vazios, cultos sem espiritualidade, politização e capitalização da fé… enfim, todos os descalabros que estamos acostumadíssimos a ver em diversos rincões por aí.

Por isso compreendo que, juntando-se o amor por Jesus à percepção desses absurdos no seio da chamada igreja evangélica, é natural que muitos decidam apedrejar o conceito de “igreja” para defender a causa de Cristo. Afinal, é a saída mais rápida e fácil. É a solução do médico que, para curar uma unha encravada, decide amputar a perna. Sim, isso é exatamente o que vem acontecendo: bons cristãos, ansiosos por uma vida profunda em Jesus, se revoltam contra o tanto de abuso e opressão que enxergam em determinadas igrejas e denominações que saem atacando o conceito – em vez de atacar os problemas.

O principal erro no discurso dos que demonizam a igreja institucional é o generalismo. A tabela acima estaria perfeita se viesse a se referir a determinadas congregações e denominações. Ela seria verídica se dissesse “igreja x” ou “igreja y”. Mas anatemizar o universo de todas as igrejas organizadas por causa dos maus exemplos é de uma irresponsabilidade, ignorância e superficialidade dignas de nota. Jesus é um, então Ele pode ser tomado como medida de comparação. Mas “igreja” (novamente: com minúsculas) é um substantivo comum que designa tantos modelos diferentes de reuniões de cristãos que construir uma comparação apenas a partir desse termo já é um equívoco em si. De qual igreja estamos falando? Neopentecostal? Tradicional? Presbiteriana? Batista? Católica romana? Ortodoxa? A dos puritanos? A dos morávios? A de John Wesley? A de Agostinho? A das catacumbas? A monástica? A de Tomás à Kempis? Luterana? Calvinista? Anglicana? Episcopal? Congregacional? Pentecostal? As comunidades alternativas dos desigrejados? A da minha esquina? A do leitor? Qual?

E não é só isso. Dentro desse universo de expressões institucionais que chamamos de “igreja”, há cristãos sérios e também falsos cristãos, simultaneamente. Peguemos uma igreja organizada qualquer. Dentro dela você encontrará pessoas espirituais e pessoas carnais, interesseiras ou devotadas, pastores canalhas e pastores piedosos, homens de Deus e joio do diabo. Então, dentro desse universo pluralista, cheio de nuances, cores e tons, criar uma tabela ou um discurso generalizando o conceito “igreja” é tentar embutir o oceano num copo d’água. Fazer isso é julgar inocentes, chamar de opressores muitos homens que pregam a liberdade e a piedade, acusar os que Jesus não acusa. Logo, é em sua essência bastante anticristão.

Lembremos sempre da pergunta de Abraão a Deus em Gênesis 18: “Exterminarás o justo com o ímpio?”. Ao que o Senhor responde que se houver dez justos ao menos em Sodoma Ele não destruirá a cidade.

Quem critica desse modo generalista e irresponsável a “igreja institucional”, a exemplo do autor da tabela acima, está usando o mesmo raciocínio de “homem não presta”. Isso geralmente é dito por alguma mulher que foi magoada por um, dois ou no máximo três homens. Mas há cerca de 3,5 bilhões de homens no mundo! Então afirmar que “homem não presta” é um generalismo brutal e bem injusto. Do mesmo modo, dizer que a “igreja” é isso tudo o que a tabela e que o discurso anti-igreja institucional dizem é no mínimo brutalizante.

Além disso, é de uma ignorância histórica patente. Lógico que a igreja errou muito ao longo de sua trajetória, com os exemplos clássicos da inquisição, omissão na Alemanha nazista, papado carnal, indulgências e outros desmandos mais. Ela é formada por homens, como alguém esperaria que ela não errasse? Errou do mesmo modo que errou a Igreja (com maiúscula) de Atos dos Apóstolos, que tinha em seu seio mentirosos e ladrões como Ananias e Safira, homens que se repreendiam na cara como Paulo e Pedro, discórdias como a de Paulo e Barnabé, entre muitas outras questões vistas nas epístolas e em Apocalipse (e não vejo ninguém demonizando a Igreja apostólica). Mas quem sataniza a igreja institucional ou ignora ou sofre de amnésia a respeito de tudo o que ela já fez e que ainda faz pelo Reino de Deus.

Pra começar, foi dentro de uma igreja institucional que Jesus me chamou à salvação. Só isso já me torna eternamente grato. E provavelmente você que me lê aqui também veio a conhecer Cristo numa igreja organizada. E possivelmente a maioria das pessoas que criticam a igreja! Esse tem sido ao longo de dois milênios o papel principal dessa igreja tão falha, tão pecadora e tão…humana. Humana assim como eu e você, que erramos todos os dias, pecamos sempre e ainda assim o Espírito Santo permanece habitando em nós e fazendo coisas boas por nosso intermédio – tesouro excelente em vasos de barro. Deus não nos fulmina por errarmos (senão eu, por exemplo, já seria cinza e pó há muito tempo), Ele nos chama ao arrependimento. Por que com a igreja organizada que comete deslizes seria diferente? Lembremos das palavras de Paulo em Rm 14.3: “Aquele que come de tudo não deve desprezar o que não come, e aquele que não come de tudo não deve condenar aquele que come, pois Deus o aceitou”. Condenaremos quem Deus aceitou? Como podemos ter a arrogância de pressupor que Deus rejeitou a igreja institucional como um todo?

Com todos os seus erros, a igreja conduziu milhões ao conhecimento de Cristo ao longo dos séculos, perpetuou as Escrituras, levou a mensagem da salvação aos cativos, empreendeu ações missionárias extremamente relevantes e ajudou a levar educação, saúde e apoio humanitário a multidões. Exatamente como faz hoje. Disso os críticos generalistas da igreja organizada aparentemente não se lembram (ou será que nunca estudaram História da Igreja? Ou será que não leem notícias da igreja pelo mundo?).

Conheço muitas igrejas institucionais, denominacionais, onde homens e mulheres de Deus buscam o Senhor de modo verdadeiro. Conheço muitos pastores piedosos e obedientes à Palavra. Conheço muitas, mas muitas pessoas que foram resgatadas do pecado, das drogas, do crime, da corrupção, do espancamento, da opressão familiar, de crises existenciais, da depressão e, principalmente, do inferno, por Cristo por intermédio das chamadas igrejas institucionais. Não posso, por isso, demonizá-las, pois estaria chamando de demoníaco aquilo que Deus torna sagrado ao utilizar como canal de bênção.

No capítulo 12 do evangelho segundo Mateus, os fariseus acusaram Jesus de expulsar demônios pelo poder de Belzebu (“Mas quando os fariseus ouviram isso, disseram: “É somente por Belzebu, o príncipe dos demônios, que ele expulsa demônios” – Mt 12.24). Ou seja: demonizaram o próprio Cristo. Hoje o mesmo está sendo feito com a igreja como um todo por tais críticos. Além disso, incorrem aqueles que acusam o conceito generalizado de “igreja” de agir contra Jesus o perigo de estar dividindo aquilo que Deus quer unir. Curioso é notar que no versículo seguinte, Mt 12.25, o texto bíblico nos diz: “Jesus, conhecendo os seus pensamentos [dos fariseus], disse-lhes: ‘Todo reino dividido contra si mesmo será arruinado, e toda cidade ou casa dividida contra si mesma não subsistirá”. Será que no afã de purificar a casa – cheios de boas intenções – os críticos da igreja institucional não estão dividindo a Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo? Será que ao generalizar que TODA igreja organizada é um câncer o Corpo não está ferindo a si mesmo?

Tenhamos responsabilidade. Precisamos lutar sempre pela purificação daquilo que está errado dentro da Igreja. Mas dizer que isso se faz pela aniquilação da igreja institucional é miopia espiritual e histórica, além de falta de amor. Combatamos o pecado. Oremos contra os falsos mestres. Preguemos contra as heresias. Desmascaremos as doutrinas de demônios. Denunciemos os líderes abusadores. Mas não generalizemos ao irrefletidamente acusar um organismo que ainda abriga milhares que não se curvaram a Baal de ser algo do mal. Pôr Jesus em oposição à igreja (com minúscula) é contrapor o Salvador à Igreja (com maiúscula) – que está presente aos milhões dentro dessas instituições imperfeitas. É jogar o Noivo contra a noiva. O Pastor contra as ovelhas. E não acredito que Deus fique muito feliz com isso.

Paz a todos vocês que estão em Cristo.

Fonte: Apenas

2 comentários:

  1. Pastor Silas Figueira, Deus continue lhe abençoando diante desse blog !!!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Graça e paz Habib.
      Obrigado pelo carinho e pelas palavras de incentivo.
      Fique na Paz!
      Pr. Silas Figueira

      Excluir