sábado, 10 de dezembro de 2011

Amemos uns aos outros, seus imbecis


Por Maurício Zágari

Deus não faz absolutamente nada à toa. Tudo o que Ele faz tem um propósito e uma razão de ser. Com isso em mente, vem a pergunta: por que Deus decidiu escolher logo um cordeiro para prefigurar e simbolizar Cristo? Por que Jesus é o Agnus Dei, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo? Por que não o texugo de Deus, o avestruz de Deus, a jaguatirica de Deus ou o camelo de Deus? Afinal, quando o Senhor transmitiu ao povo de Israel a Lei e instituiu o sacrifício levítico como um tipo daquele que haveria de vir tinha à disposição uma vasta fauna. Uma opção seria até mesmo o leão, visto que o Messias é o Leão de Judá. Faria sentido. Imagine: cada pecador teria de sacrificar um leão, demonstrando seus méritos de caçador para aprisionar a fera e levá-la até o templo. Seria um preço e tanto para expiar os pecados. Mas não, o animal escolhido como símbolo maior de Jesus foi… o insosso cordeiro. Por quê?

Depois de alguma reflexão e de analisar diferentes passagens da Biblia, conclui-se que a escolha provavelmente foi feita pelo caráter manso, pacífico e obediente desse animalzinho. Isaias 53.7 infere isso: “Ele foi oprimido e humilhado, mas não abriu a boca; como cordeiro foi levado ao matadouro; e, como ovelha muda perante os seus tosquiadores, ele não abriu a boca”. Ou seja: o cordeiro é um animal calmo, que não revida, não ofende, não ataca, não agride. Em resumo: é um animal que não exprime raiva.

Ah, que percepção magnifica! A própria essência do Salvador é antirraivosa. É plácida. É uma essência de amor, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, domínio próprio e… mansidão – que é o fruto do Espirito. E todos nós sabemos que devemos ser imitadores do Mestre. Que devemos ter o caráter de Cristo. Se por um lado essa percepção é fantástica, pois nos leva a perceber o que Deus quer que sejamos, por outro lado é assustadora, pois nos faz ver o quanto a noiva do Cordeiro está distante do que Deus quer que sejamos. Isso porque temos vivido uma crise crônica de… raiva.

Sim, a Igreja de Jesus Cristo está com raiva. Muita raiva. Eu e você nos tornamos pessoas raivosas e valorizamos a raiva como uma suposta virtude cristã. “Imagina, Mauricio”, você poderia dizer, “eu não sinto raiva, a Igreja não sente raiva, que exagero”. Mas fato é que o cheiro de raiva paira no ar do templo.

Pense em quem são os líderes cristãos mais visíveis no Brasil atualmente. De um lado temos pastores na TV que gritam, esperneiam, cospem, agridem, ofendem, batem na mesa e transpiram toda sua testosterona. De outro lado temos aqueles que criticam esses mesmos pastores e se referem a ministros de Deus como “bundões”. Há ainda aqueles que para defender a liberdade religiosa vão a programas de auditório e organizam manifestações com agressões verbais e bate-bocas com pessoas não-cristãs que defendem o pecado. Vemos ainda conclamações enfurecidas do povo de Deus a lutar contra legislações que desaprovam (como se esse fosse o papel da Igreja). Vemos também guerras internas em denominações pela disputa de poder e cargos, em que sacerdotes são vistos em vídeos no youtube em discussões enraivecidas com outros sacerdotes, com ofensas rábicas pelo twitter. E por aí vai.

Por falar em youtube e twitter, basta gastar algum tempo nas redes sociais que você verá pastores que falam o tempo todo de amor, mas usando um discurso extremamente raivoso para defender o seu ponto de vista sobre Deus e a Igreja. Nunca vi tanta raiva sendo destilada em nome do amor. “Amemos uns aos outros, seus imbecis”, é só o que falta algum desses líderes postar no twitter. “Nós somos os da graça e os outros os da religião”, alfinetam outros. E assim segue a Igreja nas redes sociais, com litros e mais litros de raiva inundando nossos computadores.

E lógico que com líderes assim a membresia acaba se contaminando. Achando que é isso aí. Que esse é o caminho. Que botar pra quebrar e sair arrebentando é o papel do cristão. É só passar mais um tempinho surfando pelas redes sociais e alguns blogs de maior expressão no meio evangélico para ver que cada um defende aquilo em que crê não pela exposição de argumentos calmos, racionais e lógicos em favor daquilo em que acreditam, mas sim com ataques raivosos a pessoas, teologias e ideias de que discordam. A Igreja não está usando das ferramentas bíblicas para defender suas posturas e crenças, mas sim armas do mundo: a ofensa, a agressão, a ironia, o sarcasmo, os ataques. Raiva!

Com isso, nós desvirtuamos completamente a missão. Nos desviamos do que Cristo espera de nós. Não fazemos uso do exemplo de Jesus, pelo contrário: parecemos mais integrantes da juventude hitlerista ou da Ku Klux Klan em nosso comportamento público do que da Igreja do Cordeiro que se entregou em silêncio, que deu a outra face, andou a segunda milha. E com isso nos tornamos mundanos e pagãos.

Recentemente publiquei aqui no APENAS um post raivoso. Deixei-me contaminar pelo espírito que tem predominado nas discussões teológicas e nas redes sociais entre os cristãos. Mea culpa. Mas no dia seguinte reli o que tinha escrito e vi o quão distante da proposta de Deus para nós estava meu texto. Ao desabafar, me deixei contaminar por essa nuvem da raiva que paira sobre programas de TV evangélicos, blogs e redes sociais… e pequei. Cometi o pecado da raiva. Senti-me torpe. Diante disso, pedi perdão ao Cordeiro e deletei o post. Peço perdão também a você que me lê por ter somado minha raiva momentânea a esse tsunami de rancor e ira que tem varrido os rincões evangélicos. Pois não quero ser como esses cristãos raivosos. Não quero usar as armas do mundo. Quero ser manso e humilde de coração, servindo de exemplo para o mundo e não sendo visto como igual a ele. Não sou perfeito, mas quero caminhar para cada vez mais ser uma ovelha do Cordeiro e não um gladiador da fé.

Por isso decidi me afastar um pouco do twitter. Senti a necessidade de voltar à retaguarda, me recompor, lembrar do ponto onde caí e retomar a estrada da paz. Sair do burburinho, da multidão de vozes, para respirar fundo, ouvir o vento, o pulsar do coração e o cicio calmo do Senhor. O murmurejo do Cordeiro. Tenho falado menos e me contentado a levantar minha voz aqui no mosteiro do APENAS. E tem sido bom, pelo menos por enquanto.

A Igreja tem que repensar seu tom de voz. Tem de escolher melhor as palavras. Precisamos usar mais a gentileza. Desistir da ironia e do sarcasmo. Aí sim eu e você estaremos começando a ser menos parecidos com apresentadores de programas vulgares de auditório e mais parecidos com Cristo. Não me interessam telepastores agressivos. Não me interessam líderes que falam de graça mas chamam outros cristãos de “bundões”. Não me interessam líderes que acusam a igreja institucional de não ter amor e para isso exalam raiva para todos os lados do twitter. Não me interessa o bate-boca amargo e arrogante de cristãos nas redes sociais. Não me interessam leões. Me interessa o Cordeiro. Quero aprender com Ele e, cada dia mais, me tornar um bem-aventurado pacificador. Suave com o próximo. Carinhoso sem deixar de ser firme. Falar a verdade em amor. E argumentar com o próximo como gostaria que argumentassem comigo. Mesmo que isso me custe as duas faces doloridas e os pés feridos por andar uma milha a mais. Essa é minha meta.

Jesus saiu da Cruz cuspido, nu, ofendido, machucado, transpassado e humilhado por uma multidão de pessoas raivosas. Mas saiu plenamente vitorioso. Com raiva? Creio que não. Pois, senão, teria saído plenamente derrotado. E você, como tem se comportado? Como o Cordeiro diante de seus algozes ou como os algozes diante do Cordeiro?

Paz a todos vocês que estão em Cristo.

Fonte: Apenas

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