“Conheço as tuas obras,
que nem és frio nem quente. Quem dera fosses frio ou quente!” Ap 3.15
“Conheço
as tuas obras...”
Quando
o Senhor disse para a igreja de Laodicéia que conhecia as suas obras, Jesus queria dizer que tinha profundo
conhecimento do estado dessa igreja, e o que Ele viu em nada lhe agradou.
A carta aos
Laudicenses não contém nem um elogio, nem críticas por ensinos falsos ou
imoralidade. O problema dos Laodicenses era que eles não eram nem frio nem quente. Eles não tinham a
frieza da hospitalidade ao evangelho ou a rejeição da fé; mas também não tinham
o zelo e fervor (At 18.25; Rm 11.11) [1].
O problema da igreja de Laodicéia não era teológico nem moral. Não havia falsos
mestres, nem engano. Não há na carta menção de hereges, malfeitores ou
perseguidores. O que faltava à igreja era fervor espiritual. A vida espiritual
da igreja era morna, indefinível, apática. A vida espiritual da igreja era
acomodada. O problema da igreja não era heresia, mas apatia [2].
“... que
nem és frio nem quente...”
A
cidade de Laodicéia não possuía suprimento de água próprio, mas tinha que ser
servida por aqueduto, que vinha de Hierápolis e Colossos. A água de Colossos
era muito gelada e a de Hierápolis era muito quente, mas como percorriam uma
distância muito grande nem chegava fria e nem quente, mas chegava morna. As
águas termais de Hierápolis ajudavam no tratamento de alguns problemas de
saúde. As águas frias de Colossos eram boas para beber. Dessa forma, a igreja
de Laodicéia não estava oferecendo nem refrigério para o cansaço espiritual nem
cura para o doente espiritual. Era totalmente ineficaz e, assim, desagradável
ao Senhor. As águas mornas de Laodicéia basicamente não serviam para nada; só
davam ânsia de vômito!
Talvez
nenhuma das sete cartas seja mais apropriada à Igreja do final do século vinte
[e início do século vinte um] do que esta. Ela retrata nitidamente a
religiosidade respeitável, nominal, um tanto sentimental e superficial tão
difundida entre nós atualmente. Nosso cristianismo é frouxo e anêmico [3]. Desconfio que não seja pequeno o
número de pessoas em nosso país que acreditam que não fazer nada de mal é
suficiente para que Deus esteja satisfeito. Essa é uma das mais diabólicas
mentiras que afetam a vida dos cristãos. Para agradar o coração de Deus não
basta afastar-se do mal, é preciso aproximar-se do bem. Podemos passar um
verniz de crente em nossas vidas até convencer as pessoas de que somos
supercrentes, mas não vamos conseguir enganar a Deus, que tudo vê e tudo
conhece [4].
“...
Quem dera fosses frio ou quente!”
É
mais honroso ser um ateu declarado do que ser um membro incrédulo de uma igreja
evangélica [5]. A indiferença é
pior que a frieza. Jesus disse em Mateus 5.37: “Seja, porém, a tua palavra: Sim,
sim; não, não. O que disto passar vem do maligno.”
3.16 – “Assim, porque és morno e
nem és quente nem frio, estou a ponto de vomitar-te da minha boca;”
Por ser morna
a igreja de Laodicéia estava a ponto de ser vomitada pelo Senhor. O termo vomitar no grego é emeo, cuspir ou vomitar. Desse termo é que se deriva o vocábulo
moderno emético, um agente que causa
vômito [6]. Uma pessoa morna é
aquela em que há contraste entre o que diz e o que pensa ser, de um lado, e o
que ela realmente é, de outro. Ser morno é ser cego à sua verdadeira condição
de alguém [7]. Assim era a igreja
de Laodicéia, uma igreja indiferente ao seu estado espiritual. A enérgica
expressão de Cristo é de aversão. Ele repudiará totalmente aqueles cuja ligação
com Ele é puramente nominal e superficial [8].
3.17 – “pois dizes: Estou rico e
abastado e não preciso de coisa alguma, e nem sabes que tu és infeliz, sim,
miserável, pobre, cego e nu”.
“pois
dizes: Estou rico e abastado e não preciso de coisa alguma...”
O
autoengano é uma grande tragédia. Laodicéia considerava-se rica e era pobre.
Sardes se considerava viva e estava morta. Esmirna se considerava pobre, mas
era rica. Filadélfia tinha pouca força, mas Jesus colocara diante dela uma
porta aberta. O fariseu, equivocadamente, deu graças por não ser como os demais
homens. Muitos no dia do juízo vão estar enganados (Mt 7.21-23). A igreja era
morna devido à ilusão que alimentava a respeito de si mesma [9].
A
igreja de Laodicéia avaliava a si mesma segundo os padrões de riqueza material,
pois estava imersa na mentalidade do mundo. Essa igreja tanto estava no mundo
como fazia parte do mesmo. Por essa razão é que era totalmente ignorante a sua
verdadeira situação espiritual [10].
Por ser a cidade de Laodicéia uma cidade muito rica e orgulhosa, os cristãos
contraíram a mesma epidemia. Os membros dessa igreja tornaram-se convencidos e
vaidosos. Não há nenhuma diferença em relação a igreja atual. Quantas igrejas
se julgam melhores que as outras por terem melhores condições financeiras,
pensam que por estarem bem melhores localizadas são superiores as outras. Esse
mesmo espírito que agia na igreja de Laodicéia ainda age nos dias de hoje em
muitas igrejas e ministérios. As bênçãos do Senhor são medidas na vida de
muitos ministérios e de muitas pessoas pelo o que essas pessoas ou ministérios
possuem e não por terem uma vida na presença de Deus. O apóstolo Paulo
escrevendo à Timóteo diz:
“Exorta aos ricos do presente século que não
sejam orgulhosos, nem depositem a sua esperança na instabilidade da riqueza,
mas em Deus, que tudo nos proporciona ricamente para nosso aprazimento; que
pratiquem o bem, sejam ricos de boas obras, generosos em dar e prontos a
repartir; que acumulem para si mesmos tesouros, sólido fundamento para o
futuro, a fim de se apoderarem da verdadeira vida.” (1Tm 6.17-19).
“... e
nem sabes que tu és infeliz, sim, miserável, pobre, cego e nu”.
A
igreja de Laodicéia era morna em seu amor a Cristo, mas amava o dinheiro. O
amor ao dinheiro traz uma falsa segurança e uma falsa autossatisfação. A igreja
não tinha consciência de sua condição [11].
Na realidade ela é um mendigo cego, sem recursos, vestido de trapos. A palavra
“nu” pode significar insuficientemente trajado [12]. Esta é a visão de Cristo a nosso respeito se somos como
esses cristãos nominais, que não assumem um compromisso fervoroso com Ele.
Moral e espiritualmente, tais indivíduos, são nus, mendigos e cegos. São
mendigos porque não tem como comprar seu perdão ou passaporte para o Reino de
Deus. São nus porque não têm roupas adequadas para se apresentarem diante de
Deus. São cegos porque não conseguem enxergar sua pobreza espiritual nem o
perigo espiritual em que se encontram [13].
3.18 – “Aconselho-te que de mim
compres ouro refinado pelo fogo para te enriqueceres, vestiduras brancas para
te vestires, a fim de que não seja manifesta a vergonha da tua nudez, e colírio
para ungires os olhos, a fim de que vejas”.
“Aconselho-te...”
A
única coisa boa em Laodicéia é a opinião da igreja sobre si mesma e, ainda
assim, completamente falsa. Ela tem a pretensão de ter todas as coisas, mas ma
realidade não tem nada [14]. Devido
a essa falsa opinião que ela tem de si mesma, o Senhor se coloca diante dela
para aconselhá-la. Cristo prefere dar conselhos em vez de ordens. Sendo
soberano do céu e da terra, criador do universo, tendo incontáveis galáxias de
estrelas na ponta dos dedos, tendo o direito de emitir ordens para Lhe
obedecerem, prefere dar conselhos. Ele poderia ordenar, mas prefere aconselhar [15].
A igreja que
recebeu o julgamento mais severo de todas, recebe também os conselhos da maior
misericórdia. Por pior que seja uma comunidade, ela é sempre uma luz, não por
mérito próprio, mas por causa da misericórdia de Jesus, que está sempre pronto
para corrigir, perdoar e aconselhar.
“... que
de mim compres ouro refinado pelo fogo para te enriqueceres...”
Não
devemos perder a ênfase que está posta nas palavras “de mim”. Isto estava acima de tudo o que os laodicences tinham de
aprender. Eles consideravam-se autossuficientes; deveriam humildemente encontrar
sua suficiência em Cristo [16]. A
vida espiritual de Laodicéia era como bijuteria, cujo aspecto é de semelhança,
mas na realidade é falso, sem qualquer valor [17]. Jesus retratou o Reino do Céu como um tesouro enterrado em
um campo que um homem comprou, e como uma pérola de grande valor que um
comerciante comprou com dinheiro (Mt 13.44,45). Isto são comparações que
descrevem o valor inestimável das bênçãos do Reino dos Céus. Neste versículo
Cristo está exortando a igreja que procure as verdadeiras riquezas – ouro
refinado pelo fogo, que não perde o brilho [18].
Jesus está indubitavelmente usando a linguagem apropriada à mentalidade
comercial dos laodicenses. Cristo se compara a um mercador que visita a cidade
para vender as suas mercadorias e entra em concorrência com os outros
vendedores. “Aconselho-os a abandonar os seus antigos vendedores”, diz o
mercador divino, “e vir negociar comigo”. Talvez Ele esteja também pensando no
convite de Yahweh: “Todos vós os que tendes sede, vinde às águas; e vós os que não tendes
dinheiro, vinde, comprai, e comei. Sim, vinde e comprai, sem dinheiro e sem
preço, vinho e leite” (Is 55.1) [19].
“... vestiduras
brancas para te vestires, a fim de que não seja manifesta a vergonha da tua
nudez...”
Laodicéia
era um grande centro da indústria do vestiário, na antiguidade. Os crentes dali
se vestiam com elegância, mas espiritualmente estavam nus [20]. Estas vestes brancas representam referem-se à justiça dos
santos (Ap 19.8).
“... e
colírio para ungires os olhos, a fim de que vejas”.
Os
olhos dos crentes de Laodicéia estavam fechados devido à doença espiritual que
eles haviam adquirido. Jesus os exorta a lavar os olhos com o colírio que Ele
tinha a oferecer e não o colírio que a cidade fabricava, pois o colírio que
eles fabricavam era bom para as doenças físicas, mas para a doença espiritual
só o colírio de Cristo. Somente Jesus tem o colírio que pode curar a cegueira
espiritual tanto da igreja de Laodicéia quanto da igreja atual. Só assim eles
poderiam ver o estado deplorável que a igreja se encontrava. A igreja de
Laodicéia estava infeliz, miserável, pobre cega e nua, no entanto, não
conseguia ver isso. A cegueira espiritual nos impede de ver a verdade, pois
como nos fala o apóstolo Paulo em 2Co 4.4:
“o
deus deste século cegou o entendimento dos incrédulos, para que lhes não
resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, o qual é a imagem de Deus”.
Todo
o aparato e luxo de vestir o corpo não valem coisa alguma; o que vale é o
incorruptível traje espiritual (1Pe 3.4), que esconde a nudez espiritual.
3.19 – “Eu repreendo e disciplino
a quantos amo. Sê, pois, zeloso e arrepende-te.”
A
essa igreja morna, infeliz, miserável, pobre cega e nua o Senhor dirige uma
palavra de extremo amor. O Senhor a chama ao arrependimento.
Disciplina é
um ato de amor. Inegavelmente é porque anseia salvá-los do juízo final é que
repreende e disciplina. A base da disciplina é o amor. Porque Ele ama,
disciplina. Porque ama chama ao arrependimento. Porque ama nos dá oportunidade
de recomeçar. Porque ama está disposto a perdoar-nos [21].
A palavra amor usada aqui no texto é phileo. É o amor de sentimentos,
afeições e emoções. Neste contexto, esta é a palavra mais importante que Cristo
poderia usar [22]. Mas todo esse
amor sem que eles não tomassem duas atitudes básicas de nada adiantaria. Era
necessário em primeiro lugar que a igreja deixasse de ser morna e se tornasse
uma igreja quente, fervorosa e a segunda coisa que ela deveria fazer era
arrepender-se. Aliás, este é um dos elementos de quase todas as cartas, a
chamada ao arrependimento, exceto Esmirna e Filadélfia não foram chamadas a se
arrependerem. Arrependimento é o ponto chave para a vida cristã, sem
arrependimento não pode haver mudança na vida da igreja, tanto que Jesus inicia
o seu ministério chamando os povos ao arrependimento (Mt 4.17).
Arrepender-se
é dar as costas a esse cristianismo de aparências, de faz de contas, de
mornidão. A piedade superficial nunca salvou ninguém. Não haverá hipócritas no
céu [23]. Devemos vomitar essas
coisas da nossa boca, do contrário, Ele nos vomitará. Devemos trocar os anos de
mornidão pelos anos de zelo.
Notas:
1 - Ladd, George. Apocalipse,
introdução e comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP,
4º reimpressão, 1989: p. 51.
2 - Lopes, Hernandes Dias.
Apocalipse, o futuro chegou. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005: p. 140.
3 - Stott, John R. W. O que
Cristo pensa da Igreja. Ed.
United Press, Campinas, SP, 1999: p. 114.
4 - Oliva, Alfredo dos Santos. Uma Igreja Sem
Propósitos, Ed. Mundo Cristão, São Paulo, SP, 2004: p. 122.
5 - Bloomfield Arthur E. As
Profecias do Apocalipse, Ed. Betânia, Venda Nova, MG, 7º edição, 1996: p.
86.
6 - Champlin, Ph. D., R. N. O
Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo. Ed. Candeia, São Paulo,
SP, 10º reimpressão, 1998: p. 432.
7 - Stott, John R. W. O que Cristo pensa da
Igreja. Ed. United Press,
Campinas, SP, 1999: p. 116.
8 - Ibid, p. 119.
9 - Lopes, Hernandes Dias.
Apocalipse, o futuro chegou. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005: p. 141.
10 - Champlin, Ph. D., R. N. O Novo Testamento
Interpretado, versículo por versículo. Ed. Candeia, São Paulo, SP, 10º
reimpressão, 1998: p. 432.
11 - Lopes, Hernandes Dias.
Apocalipse, o futuro chegou. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005: p. 141.
12 Ladd, George. Apocalipse,
introdução e comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP,
4º reimpressão, 1989: p. 52.
13 - Stott, John R. W. O que
Cristo pensa da Igreja. Ed.
United Press, Campinas, SP, 1999: p. 118.
14 - Wilcock, Michael. A Mensagem do Apocalipse.
ABU Editora, São Paulo, SP, 1986: p. 35.
15 - Lopes, Hernandes Dias. Apocalipse, o futuro
chegou. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005: p. 143.
16 - Stott, John R. W. O que Cristo pensa da
Igreja. Ed. United Press,
Campinas, SP, 1999: p. 120.
17 - Szczerbacki, Rubens. Revelando os Mistérios
do Apocalipse, Ed. Betel, Rio de Janeiro, RJ, 1986: p. 77.
18 - Ladd, George. Apocalipse, introdução e
comentário, Ed. Mundo Cristão e Edições Vida Nova, São Paulo, SP, 4º
reimpressão, 1989: p. 52.
19 - Stott, John R. W. O que Cristo pensa da
Igreja. Ed. United Press,
Campinas, SP, 1999: p. 120.
20 - Champlin, Ph. D., R. N. O
Novo Testamento Interpretado, versículo por versículo. Ed. Candeia, São Paulo,
SP, 10º reimpressão, 1998: p. 433.
21 - Lopes, Hernandes Dias. Apocalipse, o futuro
chegou. Ed. Hagnos, São Paulo, SP, 2005: p. 144.
22 - Lawson, Steven J. As sete
igrejas do Apocalipse. Ed. CPAD, Rio de Janeiro, RJ, 4º edição, 2004: p. 184.
23 - Stott, John R. W. O que Cristo pensa da
Igreja. Ed. United Press,
Campinas, SP, 1999: p. 121.
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