Por Jorge Fernandes Isah
Tornou-se comum entre os crentes frases do tipo: “Não olhe para mim, olhe para Jesus”. Mas seria ela e suas corruptelas uma verdade? Digamos que… parcialmente, pois contém apenas uma fração da verdade.
Devemos olhar sempre para o nosso Senhor, pois é Ele quem nos dirigirá, revelando-nos, segundo a Escritura, a Sua vontade [para nós e nossos semelhantes] como Aquele que é o autor e consumador da nossa fé [Hb 12.2]. Contudo, isso não quer dizer que não devamos olhar para os homens, nem aprender com seus exemplos, seja imitando o que fazem de bom, e rejeitando prontamente seus erros, não incorrendo neles, tudo segundo e sob a luz das Escrituras Sagradas.
Muitos se utilizam daquela frase com o nítido intuito de justificar seus erros; alguns até mesmo para encobri-los, quando devíamos seguir o exemplo de Paulo: “Admoesto-vos, portanto, a que sejais meus imitadores” [1Co 4.16].
Estaria o apóstolo tão cheio de si mesmo que proclamaria uma blasfêmia? Comparar-se a Cristo? Estaria envolvido pela vaidade e o orgulho a ponto de afirmar a necessidade dos coríntios serem como ele? Qual o fundamento de Paulo para tal afirmação? Não estaria o homem louco e dominado pela auto-exaltação?
Vejamos algumas características do apóstolo:
1) Paulo estava crucificado com Cristo [Rm 6.6, Gl 2.20a].
2) Paulo tinha a mente de Cristo [1Co 2.16].
3) Paulo tinha o Espírito de Cristo [Rm 8.9].
4) Paulo era imitador de Cristo [1Co 11.1].
No mundo atual, todos se querem originais, mas são exatamente os que se dizem originais que descambam para as esparrelas do diabo, os velhos ardis com que sempre os pegou; na pretensão de serem, digamos, únicos, singulares, acabam por repetir vulgarmente o que tornou satanás em pai da mentira e homicida desde o princípio, o qual “não se firmou na verdade, porque não há verdade nele” [Jo 8.44].
A mesma originalidade que fez Adão e Eva cairem; Caim matar seu irmão Abel; os homens contruírem a Torre de Babel; desprezarem os alertas de Nóe quanto ao julgamento divino; matar os profetas que proclamavam a Palavra de Deus; convencer Davi a assassinar covardemente um soldado a fim de adulterar com sua esposa; a crucificar Cristo; perseguir a igreja e matar os santos; implementar heresias, corrupções e formatar os antievangelhos com o nítido objetivo de dispersar o rebanho do Senhor, como se fosse possível espalhar aquilo que Cristo juntou pelo poder do Seu sangue na cruz [At 20.29].
Paulo não se envergonhava de ser como Cristo, pelo contrário, ele desejava ardentemente sê-lo, “esquecendo-me das coisas que atrás ficam, e avançando para as que estão diante de mim, prossigo para o alvo, pelo prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus”[Fl 3.13-14]. E o alvo era viver para e pelo Evangelho, o qual chamou apropriadamente de “meu evangelho” [Rm 2.16].
Novamente, parece que o apóstolo está envolto em soberba e arrogância, buscando uma autopromoção, porém, creio que para cada um de nós, os crucificados com Cristo, o Evangelho é nosso também, pois por ele fomos salvos, vivemos e seremos glorificados eternamente.
Antes de jactar-se em si mesmo, Paulo estava a glorificar Cristo, arraigado ao desejo de se parecer e ser semelhante ao seu Senhor. Ao invés de orgulho e vaidade, temos submissão e obediência, ao ponto de o termo “imitador”, algo tão desprezível em nossos dias, ser apontado por Paulo como uma virtude, uma qualidade dos que estão em Cristo, e são guiados por Ele.
Então, quando o apóstolo exorta a igreja a imitá-lo, o faz pelo privilégio de pertencer a Deus, mas não somente por isso, mas porque vivia não mais ele, mas Cristo nele; e a vida vivida na carne, vivia-a pela fé do Filho de Deus, o qual o amou, e se entregou a si mesmo por ele [Gl 2.20b]. O apóstolo tinha o legítimo direito de admoestar os crentes a serem seus imitadores, assim como ele era de Deus, pelo amor com que Cristo o amou em oferta e sacríficio a Deus [Ef 5.1-2].
E nós? Podemos pedir para que os irmãos nos imitem assim como imitamos Cristo? Ou nossa consciência nos diz para eles não fazerem isso? Por quê? Não será que nos esquecemos de seguir o exemplo de Paulo e imitar o Senhor? Ou estamos preocupados demais em imitarmos a nós mesmos, em nossas mentiras, orgulhos, vaidades, pretensões e objetivos nitidamente antibíblicos?
Se Paulo não vivesse a verdade seria facilmente confrontado. Não teria a autoridade apostólica reconhecida. Nem teria suas epístolas citadas por Pedro como parte das Escrituras. Se Paulo tivesse uma falsa vida cristã seria rejeitado pela igreja, a mesma igreja que o acolheu e reconheceu a regeneração operada pelo Espírito Santo naquele que antes a perseguia.
Na verdade, quando alguém afirma: “Não olhe para mim, olhe para Cristo”, está rejeitando em seu coração o próprio Evangelho; está se colocando vergonhosamente como alguém que não precisa seguir exemplos, e nem mesmo pode ser um; que se considera autosuficiente em si mesmo, e pode recusar qualquer conselho, exortação ou ensinamento, pois não se deve olhar para mais ninguém; e nisso, muitos acabam erroneamente por segui-lo… Contudo, Deus é um desconhecido para essa espécie de crente, o que nos levará inevitalmente à seguinte pergunta: como esse “super-homem” pode olhar exclusivamente para o Senhor, conhece-lO e a Sua vontade, se não se enquadra nas características de Paulo?
Ele:
1) Não está crucificado com Cristo.
2) Não tem a mente de Cristo.
3) Não tem o Espírito de Cristo.
4) Não é um imitador de Cristo.
É possível?
Como está escrito: “haverá homens amantes de si mesmos, avarentos, presunçosos, soberbos, blasfemos, desobedientes a pais e mães, ingratos, profanos… Tendo aparência de piedade, mas negando a eficácia dela. Destes afasta-te” [2Tm 3.1-2,5].
Assim se constrói uma mentira, a de que não devemos seguir os homens, nem ouvi-los, nem lê-los, nem espelharmos naquilo que de bíblico fazem. Ao contrário dos irmãos de Beréia que ouviam Paulo atentamente, mas confirmavam se tudo o que dizia estava nas Escrituras, a maioria está mais preocupada em viver uma vida à margem da Bíblia. Como bandoleiros e usurpadores da palavra; como se o testemunho cristão fosse algo irrelevante, descartável, inalcansável. E, nisso, tentam fazer de Deus mentiroso, para a própria condenação.
É uma via de mão-dupla:
1) Não se segue ninguém, porque assim pode-se viver a vida que quiser, à revelia da Escritura, sem que nada ou alguém o leve a imitar Cristo;
2) E não se corre o risco de ser imitado, e assim não é necessário aprimorar-se na palavra e no conhecimento de Deus. Pode-se ser o que sempre foi sem medo de ser importunado.
Sendo ainda possível:
1) Se considerarem em tão grande conta no seu orgulho que desprezam a igreja. Dizem: “Ela não é perfeita… ninguém é perfeito… então, por que devo olhar para os homens?“
Esquecem-se de que a igreja julgará o mundo juntamente com o Senhor, e de que, se não olharmos para ela, com seus erros e acertos, sendo capazes de apreender o bem e rejeitar o mal, não haverá purificação, porque Deus utilizará exatamente os meios humanos para torná-la santa e perfeita. De tal maneira que a multiforme sabedoria divina seja agora conhecida dos principados e potestades nos céus, através da igreja, “segundo o eterno propósito que fez em Cristo Jesus nosso Senhor” [Ef. 3.10-11].
A falácia do não seguir os homens está em acordo com o individualismo, o egoísmo e o humanismo que têm permeado a igreja nos últimos tempos. Já imaginou se os discípulos do Senhor tivessem esse pensamento, visto ser Jesus homem (sem se esquecer da sua deidade)? Já imaginou se os discípulos, pelo fato dEle ser também humano, desprezassem seus ensinamentos e mandamentos? E como a igreja se iniciaria, progrediria, sendo pastoreada por homens simples e incultos como Pedro, Tiago e João? Mas, que tinham a sabedoria que vinha do céu? Haveria uma Igreja de Cristo? Haveria proclamação do Evangelho? Haveria salvação? Santificação? E Cristo teria um corpo? E o Noivo, a Noiva?
O Evangelho foi pregado por homens divinamente inspirados e guiados. Hoje, o Evangelho progride por homens igualmente inspirados e guiados pelo Espírito Santo. Assim como devemos orar e clamar a Deus para que Ele nos capacite e aperfeiçoe ao ponto em que outros sentirão o desejo de nos imitar. Não para a nossa glória pessoal, mas para a glória de Deus, que a cada dia nos faz mais semelhantes ao Seu Filho Amado, Jesus Cristo. Se você não crê nisto, a sua fé está posta em outro deus, não no Deus Vivo e Todo-Poderoso.
Não seguir os homens naquilo em que são bíblicos, fará seguir os que não são bíblicos. E esta não é a vontade de Deus, mas somente outra forma do maligno aprisioná-lo.
Nota: Autofilia = estima exagerada por si próprio; egolatria (Do gr. autós, «próprio» +philía, «amor; amizade»)
Fonte: NAPEC
Nenhum comentário:
Postar um comentário