Por Matheus Negri
Muitas críticas foram e ainda são levantadas contra o cristianismo. Elas estão em filmes, novelas, jornais, salas de aula e em no senso popular. Destas críticas muitas são direcionadas a denominações específicas e outras abertas a todos os cristãos. Principalmente no atual debate sobre gênero, homofobia, casamento gay e direito de minorias. A proposta deste texto é apresentar como o cristianismo é o responsável histórico dos direitos fundamentais do ocidente.
Na cultura popular podemos assistir desenhos animados como “Os Simpsons” ou “South Park”, onde vizinhos cristãos são motivos de riso e piadas. Temos também novelas e programas de entrevistas que colocam as posições cristãs como ultrapassadas, sem valor e deixando a entender que elas trazem de alguma maneira atraso para a sociedade: como os debates sobre a definição de família no estado brasileiro e a questão da homossexualidade na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal. Um bom exemplo é a matéria do dia 06.07.2013 no site da revista Veja intitulada, EVANGÉLICOS: Veja como ocorre a suposta ”CURA GAY” em templos de São Paulo. Nesta reportagem é demonstrada a forma como algumas igrejas evangélicas neopentecostais no contexto de São Pulo lidam com a questão da homoafetividade.
Outro ponto pertinente é apresentado por Dan Kimball (2011) em seu livro, Eles Amam a Jesus e Odeiam a Igreja, o qual fez uma pesquisa em universidades americanas e percebeu o grande descontentamento com a igreja cristã em seu país. Todos os pontos levantados por ele estão intimamente ligados com a moral cristã. Observa se o descontentamento nos seguintes pontos:
A organização da igreja como uma organização política com interesses próprios.
A igreja é intolerante e negativista.
A igreja oprime as mulheres e é machista.
A igreja é homofóbica.
A igreja é arrogante ao afirmar que só ela tem a salvação.
A igreja é fundamentalista e leva a Bíblia ao pé da letra.
Podemos afirmar sem medo que conduta cristã marca definitivamente a cultura ocidental até os dias de hoje. O próprio polêmico filósofo, Peter Singer (2002), reconhece que o advento do cristianismo foi o responsável pelos direitos fundamentais dados em nossa cultura, isso devido ao caráter teocêntrico das leis e a imortalidade da alma. Tornando essas doutrinas como os basilares incontestáveis da ortodoxia moral da civilização ocidental. Rodney Stark em seu livro, O Crescimento do Cristianismo, apresenta as grandes mudanças que houveram no Império Romano devido à propagação dos ideais cristãos. Irei ressaltar três grandes mudanças no agir romano: o problema das epidemias, o papel da mulher e os infanticídios.
As epidemias
Segundo Stark (2006) nos séculos II e III houve grandes número epidemias, chamadas “Peste de Galeno”, a taxa de mortalidade destas epidemias foram tão altas que havia caravanas de carroças e vagões para o transporte dos mortos. Das consequências produzidas pelas epidemias a que nos interessa é a da crise de fé, como se sabe sempre as grandes crises naturais, sejam doenças, terremotos, vulcões ou outras, são traduzidas em crises de fé. Esta crise de fé se dá principalmente pela ineficiência da religião dominante em responder e atender o problema. A ineficiência do paganismo romano se dá pela dificuldade dos sacerdotes e filósofos em responder o “por quê?” de tamanha mazela e ainda a fuga em massa dos sacerdotes e das mais altas autoridades civis dos locais onde ocorriam as epidemias. Temos como exemplo o relato de Tucídides, extraído de sua obra História da Guerra de Peloponeso:
“É que a catástrofe era tão devastadora que os homens, por desconhecer o que os esperava, se tornavam indiferentes a qualquer preceito legal ou religioso […]. Nenhum temor a deus ou a lei humana conseguia exercer influência restritiva. Quanto aos deuses, era indiferente adorá-los ou não adorá-los, quando se viam o bom e o mau morrendo indiscriminadamente”(p. 99).
Texto que ilustra de maneira significativa o sentimento que envolvia os pagãos quanto ao que estava acontecendo e a falta de respostas aos problemas seja pela religião ou filosofia.
A resposta cristã as epidemias, baseado em sua moralidade do amor e compaixão, deveria ser muito diferente do comportamento pagão. E realmente foi o que aconteceu. As epidemias eram vistas pelos cristãos como “lição e prova” que deveriam suportar e com elas aprender. Essa nova significação dada aos problemas reais enfrentados pela vida humana teve grande influência no crescimento do cristianismo e estima por parte do povo, pois diferentemente dos pagãos os cristão agiam com amor e compaixão.
Suas ações eram tão diferentes que o próprio imperador Juliano, em carta no ano de 362 d.C., pedira que o sumo sacerdote da Galácia que igualasse os pagãos as virtudes cristãs, pois segundo o imperador o crescimento cristão se dava pelo seu caráter moral. Lemos também na citação do próprio Juliano que diz: “Os ímpios galileus prestam apoio não apenas a seus pobres, mas também os nossos; todo mundo pode ver que nosso povo não conta com nossa ajuda” (p. 97).
O papel das mulheres
Quanto às mulheres houve grande adesão ao cristianismo, pois entre os cristãos as mulheres possuíam um status extraordinariamente maior do que no mundo greco-romano em geral. Esta diferença era fundamental e estava baseada em pensadores clássicos que muito influenciaram a cultura Greco-romana. Um bom exemplo é a biologia da natureza masculina e feminina de Aristóteles, que coloca a mulher em um patamar menor do que o homem, não só a mulher, mas todas as fêmeas dos seres vivos, excluindo o urso e o leopardo. Nas palavras do próprio filósofo:
Todas as fêmeas são menos vivazes que os machos, exceto a do urso e a do leopardo; nestas espécies a fêmea é considerada mais valente. Mas nos outros casos as fêmeas são mais delicadas, mais viciosas, menos simples, mais impetuosas, menos atentas à alimentação dos filhotes, enquanto os machos são, ao contrário, mais vivazes, selvagens, simples e menos astutos. Existem traços destas qualidades virtualmente em todos os animais, porém são mais evidentes naqueles que são mais possuidores de caráter e especialmente do homem. Pois a natureza do homem é mais completa, de modo que também essas disposições são mais evidentes nos seres humanos. Portanto, a esposa é mais compassiva do que o marido e mais dada às lágrimas, mas também mais invejosa e queixosa e mais apta para ralhar e lutar. A fêmea é mais desanimada e deprimida do que o macho, mais pudica e mentirosa, é mais disposta a enganar e tem uma memória mais vasta; além disso ela é mais vigilante, mais temerosa de agir, e em geral é menos inclinada a mover-se que o macho e toma menos alimento. O macho, por outro lado, é um animal mais disposto e é mais valente que a fêmea (livro IX, parte 1).
Ficando assim evidente como se dava o pensamento sobre as mulheres, colocadas de certa forma como negativas diante do homem, sugerindo assim que seu lugar na sociedade não deveria ser de muita importância, já que não era de confiança e nem possuía capacidade para tanto.
As meninas recebiam pouca ou nenhuma educação, casavam-se muitas vezes antes da puberdade. A mulher era considerada como criança, independentemente da idade, era assim propriedade legal de seu pai ou marido, dos bens que possuíam cabia ao marido gerenciar, e este poderia se divorciar quando quisesse. O chefe da casa poderia “usar” das mulheres da casa como bem lhe parecesse, da mesma forma que à suas posses. Fica evidente a diferença de trato com as mulheres no meio cristão, pois não toleravam de maneira nenhuma os infanticídios seja de meninas ou meninos, condenavam o sexo fora do casamento, o adultério e o divórcio.
Em caso de viúves as mulheres pagãs eram obrigadas a contrair novo matrimônio em dois anos e a sua herança estaria sob a responsabilidade de seu novo marido, em contrapartida quanto às viúvas cristãs eram tidas com grande estima por sua posição na comunidade, eram capazes de administrar a herança de seu finado marido e as que não possuíam bens, as pobres, eram amparadas pela comunidade. Lemos tanto no Antigo quanto no Novo Testamento vários apelos para o cuidado com as viúvas: “Não oprimam a viúva e o órfão, nem o estrangeiro e o necessitado. Nem tramem maldade uns com os outros” (Zacarias 7.10); “Naqueles dias, crescendo o número de discípulos, os judeus de fala grega entre eles queixaram-se dos judeus de fala hebraica, porque suas viúvas estavam sendo esquecidas na distribuição diária de alimento” (Atos 6.1); “Trate adequadamente as viúvas que são realmente necessitadas” (1 Timóteo 5.3); “A religião que Deus, o nosso Pai, aceita como pura e imaculada é esta: cuidar dos órfãos e das viúvas em suas dificuldades e não se deixar corromper pelo mundo” (Tiago 1.27).
Infanticídio e aborto
Na questão do infanticídio para uma melhor compreensão merece nossa atenção o caso do pater famílias, o chefe da casa, que constituía a suprema fonte de poder e de autoridade na casa. A casa ou família era constituída por todos os bens, posses e pessoas pertencentes à propriedade patrimonial diferente do conceito contemporâneo de pai, mãe e filhos. Este seu poder era absoluto, patriarcal e patrilinear, ele tinha o direito de vida, morte, disciplina e domínio sexual sobre todos inclusive crianças nascidas livres. Todos na casa eram virtualmente escravos do poder do pater até sua morte.
A prática do infanticídio era corroborada pelos os pensadores gregos, Aristóteles (1999) via o infanticídio como uma prática legítima de um estado, possibilitando não só o abandono de crianças como também o aborto. Em escavações na cidade de Ashkelon, cidade portuária localizada ao norte da faixa de Gaza, fora encontrado ossadas de mais de cem bebes atirados no esgoto em algum período do século VI a.C. Contrastando severamente com as práticas cristã de valorizar a vida em todas as situações, tendo os filhos como herança divina conforme é citado nas escrituras (Cf. Salmo 127.3).
Assim como vimos neste ensaio, fica evidente, pelo menos no cristianismo inicial, a grande mudança de projeto ético de vida que trouxe para o ocidente. Trazendo valor aos pobres e inferiores, as mulheres e crianças tornando a vida humana um dom divino que deve ser valorizado e respeitado. Verifica-se assim o porquê de seu grande crescimento e como fundamenta o pensamento ocidental até a contemporaneidade. Mesmo que o projeto ético contemporâneo não seja baseado na relação entre revelação e ser humano os princípios fundamentais ainda podem ser verificados.
Por isso o fundamento da crítica contemporânea não é válido, não vemos o enfraquecimento do homem ocidental em sua liberdade e direitos, mas a valorização do ser humano, tomado como fim e não meio.
Podemos concluir que a crítica popular ao cristianismo para a prática cristã, a sua demonstração visível e limitada. Existem sim grupos que vivem um cristianismo frio, sem vida, ou muitas vezes discriminatório, porém estas práticas não condizem com a moral cristã encontrada na Revelação, e carecem de uma adequação, ou seja, um arrependimento e retorno as Escrituras. Desta forma “os nomes devem ser dados aos bois”, e não a generalização.
REFERÊNCIAS
ARISTÓTELES. Política. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1999.
____________. The History of Animals. Australia: The University of Adelaide, 2013.
BALCH, David L. In: SAMPLEY, J. Paul. Paulo no mundo greco-romano: um compêndio. São Paulo: Paulus, 2008.
BÍBLIA SAGRADA. Nova Versão Internacional. Sociedade Bíblica Internacional. São Paulo: Editora Geográfica, 2000.
KINBALL, Dan. Eles gostam de Jesus, mas não da igreja. São Paulo: Editora Vida, 2011.
SINGER, Peter. Ética Prática. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
STARK, Rodney. O Crescimento do Cristianismo: Um sociólogo reconsidera a história. São Paulo: Paulinas, 2006.
WHITE, L. Michael. In: SAMPLEY, J. Paul. Paulo no mundo greco-romano: um compêndio. São Paulo: Paulus, 2008.
Fonte: NAPEC
parabens feliz natal a vc e todos os seus
ResponderExcluirObrigado minha irmã.
ExcluirQue você também tenha um Natal muito abeçoado e um ano novo cheio da graça do Senhor.