sábado, 23 de setembro de 2017

COMO SE DEVE ORAR


Por Pr. Silas Figueira

Texto base: Mateus 6.5-8

INTRODUÇÃO

Orar, jejuar e dar esmolas faziam parte do ritual de todo judeu na época de Jesus. Tanto que Ele fala a respeito dessas três coisas aqui no Sermão do Monte e, além disso, Ele ensina aos seus discípulos como eles deveriam fazer isso, não como os hipócritas que faziam para serem vistos pelos homens (Mt.6.2,5,16).

No texto de Mateus 6.5-8 o Senhor Jesus mostra aos seus discípulos algumas atitudes que eles não deveriam ter na oração e quais as atitudes corretas que eles deveriam ter. Orar é mais que falar com o Pai, é falar, mas de forma que sejamos ouvidos. Por isso que o Senhor nos alerta para termos cuidado como fazemos as nossas orações.

A oração é a bússola na vida na vida do crente, e os discípulos entenderam isso. Eles também observaram que a oração para Jesus era como o oxigênio da alma. Por isso Ele estava em constante oração. 
  
Como disse alguém: “a oração é um grito universal da alma”. Tanto e que até os ateus acham um jeito de orar. Durante os severos tempos do comunismo na Rússia, gente que acreditava no regime comunista mantinha num “cantinho vermelho” um retrato de Lênin, no lugar em que os cristãos costumavam colocar seus ícones. Tomado desse fervor, o que o Pravda (o principal jornal da União Soviética), publicou, em 1950, a seguinte orientação aos seus leitores:

Se você encontra dificuldade no trabalho ou de repente duvida da sua capacidade, pense nele – em Stalin – e encontrará a confiança de que precisa. Se você se encontra cansado numa hora em que não deveria se sentir assim, pense nele – em Stalin –, e seu trabalho correrá bem. Se você está querendo tomar uma decisão correta, pense nele – em Stalin – e chegará a essa decisão [1].

A oração é importante. Todos os que querem seguir o Senhor sabem que a oração é parte essencial da vida do discípulo. Entretanto, poucos oram e muitas vezes, quando oramos, parece que lutamos para nos expressarmos a Deus. Embora possa parecer que a oração deveria vir a nossa boca como uma expressão confortável de nossa fé e confiança em Deus, ela frequentemente parece difícil, talvez ineficaz.

Aliás, para muitos, orar é como um peso, uma luta que é travada e a pessoa se sente sempre derrotada, da mesma forma é ler a Bíblia. Por ser a oração primordial na vida do cristão ela sempre será uma luta diária. E o diabo fará de tudo para tentar nos impedir de orar. Mas nem por isso devemos deixar de orar.

Ao longo da história há relatos de muitas pessoas que tinham uma vida de oração. George Müller começava cada dia com várias horas de oração, implorando a Deus que cuidasse das necessidades práticas de seu orfanato. O bispo Lancelot Andrewes dedicava cinco horas por dia à oração e Charles Simeon levantava-se às quatro da manhã para começar o seu regime de oração [...]. Susannah Wesley, mãe ocupadíssima sem nenhuma privacidade, costumava sentar-se numa cadeira de balanço, cobrir a cabeça com um avental e orar por John e Charles e pelo resto da ninhada (ela deu à luz 19 filhos). Martinho Lutero, que dedicava duas a três horas diárias à oração, dizia que devemos orar com a mesma naturalidade com que o sapateiro faz sapatos e o alfaiate faz casacos. Jonathan Edwards escreveu sobre as “doces horas” às margens do rio Hudson, “arrebatado e perdido em Deus” [2]. No século dezenove Charles Haddon Spurgeon disse que em muitas igrejas a reunião de oração era apenas o esqueleto de uma reunião, onde as pessoas não mais compareciam. Ele concluiu que “se a igreja não ora, ela está morta” [3]. Você tem uma vida de oração?

No texto que lemos o Senhor nos dá algumas diretrizes de como deve ser a nossa oração. Ele nos dá algumas lições que são extremamente importantes para que as nossas orações possam chegar ao trono do Pai.  

PRIMEIRA LIÇÃO QUE O SENHOR NOS DÁ É QUE EXISTE UMA FORMA ERRADA DE ORAR (Mt 6.5,7).

A dificuldade com a maneira errada de orar é que sua própria abordagem é errada. Sua falha essencial é que ela se volta para dentro de si mesma. Trata-se da concentração da atenção naquele que está orando, ao invés de concentra-se nAquele para quem a oração está sendo dirigida [4].

Quando o Senhor começa a ensinar a respeito da oração Ele aponta três erros graves que estava ocorrendo com muitas pessoas de sua época, erros esses que, infelizmente, existem até hoje.

1º - O primeiro erro é a hipocrisia (Mt 6.5). A palavra hipócrita quer dizer ator. A palavra vem do grego hypokrinein, que designava, na antiga Grécia, os atores de teatro, pois durante as apresentações eles fingiam ser outras pessoas.
No caso aqui, são pessoas que fingem ser devotas e piedosas, mas na verdade são falsas. São verdadeiros atores que representam um papel no meio religioso. É aquela pessoa que não serve a Deus de coração, mas só da boca para fora. Veja como o Senhor chama tais pessoas que agem assim em Mateus 23.27,28:

“Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque sois semelhantes aos sepulcros caiados, que, por fora, se mostram belos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda imundícia! Assim também vós exteriormente pareceis justos aos homens, mas, por dentro, estais cheios de hipocrisia e de iniquidade”

O contexto dessa palavra nos diz que tais pessoas agem assim quando dão esmolas, oram e jejuam. Em todas essas ocasiões eles querem ser vistos pelos homens, em momento algum eles querem ser vistos por Deus. Em outras palavras, a motivação delas está nelas mesmas e receberem “aplausos” dos homens, mas estão longe de Deus.

D. Martyn Lloyd-Jones diz que o hipócrita descrito aqui é “um homem, a caminho do templo, onde ia orar, ansiava por dar a impressão que a sua alma era tão devota que não podia esperar até chegar no templo. Por esse motivo, começava a orar, postando-se de pé na esquina da rua. Pela mesma razão, ao chegar ao templo, esse homem colocava-se na posição mais destacada possível” [5].

O que tais pessoas recebem? A única recompensa que esses hipócritas recebem é serem vistos pelos homens. Tanto que a palavra traduzida por receber é apechousi, que era usada para descrever que o pagamento havia sido totalmente realizado, esta palavra era usada em recibos.

Para o hipócrita isso é o suficiente já que ele não tem compromisso com Deus! Aliás, ele não conhece a Deus.

2º - O segundo erro é a vã repetição (Mt 6.7). O que o Senhor Jesus está abordando aqui não é a repetição das orações cotidianas. Por exemplo: orar pela família, pela nossa Pátria, pela saúde. Tanto que Jesus quanto Paulo repetiam suas orações (Mt 26.36-46; 2Co 12.7,8). Uma oração é vã repetição quando as palavras não refletem um desejo sincero de buscar a vontade de Deus. É quando a pessoa ora por orar.

3º - O terceiro erro abordado por Jesus aqui que é o engano de acharem que estão sendo ouvidos por muito falarem. Fazem belas e longas orações, mas completamente vazias, falam, falam, mas não estão sendo ouvidas por Deus porque não é para Ele que tais orações estão sendo dirigidas.

Oram para que as pessoas os ouçam. Oram usando palavras e mais palavras, todas elas bem-postas para chamarem a atenção para si. E o que conseguem com isso é chamar dos homens, mas não de Deus. Tem os holofotes humanos, mas não a luz do Pai.

A SEGUNDA LIÇÃO QUE O SENHOR NOS DÁ É QUE EXISTE UMA FORMA CERTA DE ORAR (6.6,8).

C. S. Lewis disse: A oração que precede todas as orações é: “Que seja o meu verdadeiro eu quem fala. Que seja ao verdadeiro tu que me dirijo”.

Antes de nós falarmos a respeito de como se deve orar, eu só gostaria de lembrar que não é errado orar em público na igreja e muito menos de participar das reuniões de oração da igreja. Só falta agora alguém dizer que não frequenta as reuniões de oração da igreja porque ora em “secreto” em casa. O que é errado é orar para mostrar para as outras pessoas que você é uma pessoa de oração. O Senhor está condenando a atitude de espetáculo teatral que envolviam essas orações em público. E há um outro detalhe, muitas pessoas oram em público, mas não oram em particular. É gente que gosta dos holofotes, mas não da luz de Cristo.

Jesus fala a respeito do erro que os hipócritas estavam cometendo, no entanto, Ele agora se volta para os seus discípulos e os orienta de como eles deveriam orar. E Ele dá três orientações básicas em relação a oração.

1º - Devemos procurar um lugar privativo para orar – entra no teu quarto. A ideia que se tem é que a palavra quarto se refere ao aposento de dormir, mas não é. No grego a ideia que se tem é de um depósito, tanto que a palavra aqui é tameion designava uma sala-depósito ou um lugar que se guardava o tesouro. O “quarto” é um lugar onde ninguém vai nos incomodar nessa hora sublime. 

Jesus está dizendo que devemos procurar um lugar onde possamos ter privacidade para excluir certas coisas do meu campo de interesse. Entrar no quarto é acima de tudo entrar na presença de Deus e nos esquecermos das coisas ao redor. E isso pode acontecer na rua, junto de outras pessoas, na igreja... é você se fechar para tudo, inclusive para você mesmo, e orar ao Pai.

Por isso que o Senhor nos diz que devemos fechar a porta. Isto é, não estar num lugar onde as pessoas passem e possam nos ver orando. Não que não possam saber que estamos ali, mas que estamos em um lugar de oração; não é um lugar para sermos vistos orando para chamar a atenção das pessoas.

No filme “Quarto de Guerra” um dos lugares de oração era dentro de um closet.

2º - Entrar na presença de Deus. “Tu, porém... Fechada a porta, orarás a teu Pai, que está em secreto”. Se os hipócritas estavam orando na presença dos homens e para os homens verem, nós, discípulos de Jesus, devemos agir de forma contrária. Devemos entrar na presença do Pai que vê em secreto.

Observe que o Senhor falou “Tu, porém”, ou seja, a oração é pessoal. Podemos estar na presença de Deus de forma coletiva, mas a oração é pessoal. Porque o Senhor esquadrinha cada coração, cada necessidade de forma particular.

Orarás a teu Pai, que está em secreto. Devemos ter a percepção de quem Deus é, e do que Deus é. Antes de começarmos a proferir palavras, sempre deveríamos relembrar essa realidade. Deveríamos dizer para nós mesmos: “Agora estou entrando no salão do trono de Deus, o Todo-Poderoso, o absoluto, o grande e eterno Deus que brande todo poder, força e majestade, aquele Deus que é fogo consumidor, aquele Deus que é luz e em Quem não há trevas nenhuma, aquele Deus total e absolutamente santo”. E apesar de tudo isso, esse é um relacionamento entre Pai e filho [6].

Como disse o autor de Hebreus:

“De fato, sem fé é impossível agradar a Deus, porquanto é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e que se torna galardoador dos que o buscam” (Hb 11.6).

3º - Não sermos como os hipócritas (Mt 6.8). O Senhor nos diz para não sermos semelhantes a estas pessoas que não tinham intimidade com o Pai, pelo contrário, devemos estar longe de tal atitude e de tais pessoas.

A hipocrisia é prima-irmã do orgulho. Tem gente que começa bem em sua vida de oração, no entanto, por não vigiarem acabaram caindo no laço do orgulho e da hipocrisia. Tais pessoas começam a se ver melhores que as outras, ou, muitas vezes, por serem elogiadas como pessoas de oração, passam a querer demonstrar isso diante das pessoas. Aí caem no farisaísmo hipócrita que o Senhor tanto condenou em seu ministério. Por isso vigiemos!

A TERCEIRA LIÇÃO QUE O SENHOR NOS DÁ É QUE QUEM ORA CERTO É RECOMPENSADO (6.6b,8b).

Ao nos posicionarmos de forma correta na oração duas coisas tremendas ocorrerão: Em primeiro lugar seremos recompensados pelo Senhor, e em segundo lugar, podemos descansar em seus cuidados, pois Ele sabe do que necessitamos.

1º - A recompensa dos hipócritas é serem vistos pelos homens, a recompensa do cristão que ora em secreto é que ele é visto por Deus. O Senhor está contemplando o nosso coração. E mais, quando oramos o próprio Senhor nos auxilia na nossa oração. Veja o que o apóstolo Paulo nos fala em Romanos 8.26,27:

“Também o Espírito, semelhantemente, nos assiste em nossa fraqueza; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós sobremaneira, com gemidos inexprimíveis. E aquele que sonda os corações sabe qual é a mente do Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que ele intercede pelos santos”.

A palavra traduzida por “assistir” significa mais que “assistir”. O sentido é que o Espírito toma sobre si nossa carga não somente para nos ajudar e socorrer, mas sobretudo para nos aliviar, carregando todo o peso por nós. Nossa fraqueza nos levaria ao desfalecimento e ao desespero, não fosse a assistência do Espírito Santo [7].

Veja esse exemplo: Com a voz clara, embora trêmula, uma jovem começou sua oração com as seguintes palavras: “Deus, eu te odiei depois do estupro! Como pudeste deixar que aquilo acontecesse comigo?”. A congregação de súbito fez silêncio. Não mais se ouvia ruídos de folhas de papel ou gente se mexendo nos bancos. “Odiei as pessoas desta igreja que tentaram me confortar. Eu não queria conforto. Queria vingança. Queria retribuir a ferida. Eu te agradeço, ó Deus, por não teres desistido de mim, como também não desistiram algumas pessoas aqui. Tu continuaste a me procurar, e agora volto a ti e peço que me cures as cicatrizes da alma” [8].

Será que queremos melhor recompensa que esta? Creio que não!

 2º - “O vosso Pai, sabe o de que tendes necessidade, antes que lho peçais”. Quem tem vida de oração de forma correta tem todas as suas necessidades supridas. Necessidades não são os nossos caprichos. Há uma grande diferença aqui. Um pai antes de realizar o capricho de um filho, ele, em primeiro lugar, supre as suas necessidades. O nosso Pai celestial faz isso de uma forma plenamente perfeita. Por isso podemos descansar nEle.

A oração não é para fazer com que o Senhor faça a nossa vontade, mas para que a vontade do Pai seja entendida e aceita por nós. Veja o que Paulo falou em 2Co 12.7-10:

“E, para que não me ensoberbecesse com a grandeza das revelações, foi-me posto um espinho na carne, mensageiro de Satanás, para me esbofetear, a fim de que não me exalte. Por causa disto, três vezes pedi ao Senhor que o afastasse de mim. Então, ele me disse: A minha graça te basta, porque o poder se aperfeiçoa na fraqueza. De boa vontade, pois, mais me gloriarei nas fraquezas, para que sobre mim repouse o poder de Cristo. Pelo que sinto prazer nas fraquezas, nas injúrias, nas necessidades, nas perseguições, nas angústias, por amor de Cristo. Porque, quando sou fraco, então, é que sou forte”.

Paulo ora pedindo livramento do problema que ele estava passando, mas o Senhor o revela que o problema que ele estava enfrentando era para o seu próprio bem, “para que não me ensoberbecesse com a grandeza das revelações”. Mas ele só recebeu essa revelação através da oração. E tem mais, ele não só a recebeu como a aceitou.

Entenda uma coisa, oração não é um ópio, um calmante para a alma, um refrigério; mas o despertamento para uma nova ação. Jesus quando esteve no Jardim do Getsêmani lutou em oração, mas quando se levantou Ele encarou com ousadia e coragem a cruz que Ele iria enfrentar.

CONCLUSÃO

Há muitas pessoas que oram, mas oram errado. São arrogantes, presunçosas; oram, mas não com humildade e dependência de Deus.

Orar, é antes de mais nada, reconhecer a nossa total dependência do Senhor. É busca-lo para termos comunhão com Ele, antes de obtermos respostas para as nossas mazelas. Orar é entrar na sala do trono e buscar do Senhor forças para enfrentarmos os perigos que nos aguardam e enfrenta-los honrando o Seu Nome.

Orar é buscar a direção certa a seguir, é pedir intrepidez para enfrentar as lutas do dia a dia louvando o Seu Nome em todo o tempo. Mas tudo isso, sem hipocrisia.

Pense nisso!

Fonte:

1 – Yancey, Philip. Oração, ela faz alguma diferença? Rd. Vida, São Paulo, SP, 2007: p. 12.
2 – Ibid, p: 14.
3 – Lopes, Hernandes Dias. Piedade e Paixão. Arte Editorial e Ed. Candeia, São Paulo, SP, 2007: p. 36.
4 – Lloyd-Jones, D. Martyn. Estudos no Sermão do Monte. Editora Fiel, São Paulo, SP, 1984: p. 312.
5 – Ibid, p: 313.
6 – Ibid, p: 318.
7 – Lopes, Hernandes Dias. Romanos, o Evangelho segundo Paulo. Editora Hagnos, São Paulo, SP, 2010: p. 306.
8 – Yancey, Philip. Oração, ela faz alguma diferença? Editora Vida, São Paulo, SP, 2007: p. 107.

2 comentários:

  1. A oração no meu entender deve procurar a comunhão c Deus para podermos melhor entender a Vontade Divina...pois somos servos de Deus e não o contrário! Parabéns pela Palavra pela qual vc foi instrumentalizado

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    1. Graça e paz Ricardo.
      Concordo com você de que a oração é procurar ter comunhão com Deus para melhor entender a sua vontade.
      Devemos fazer o possível para não perdermos esta comunhão.
      Que Deus o abençoe!
      Fique na Paz.
      Pr. Silas Figueira.

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