Por Pr. Silas Figueira
INTRODUÇÃO
Para muitos eruditos
esse texto não faz parte do Evangelho de João, eles alegam que essa passagem
não faz parte dos manuscritos mais antigos, só vindo a aparecer nos manuscritos
mais novos, e nos casos em que aparece, nem sempre se encontra nessa parte do
Evangelho de João. No entanto, Papias, um discípulo de João, parece ter conhecido
e exposto essa história. A maioria dos estudiosos concorda que essa passagem
faz parte das Escrituras, e segundo F. F. Bruce, é “um fragmento de material
autêntico do Evangelho”, onde quer que seja colocado. Por isso que a versão
Almeida Revista e Atualizada trás esse texto entre colchete [Jo 7.53-8.11].
Eu não tenho nenhuma
dificuldade de crer nesse episódio, pois eu creio que o Senhor preservou a Sua
Palavra e ela é fiel e verdadeira. As aulas que tenho dado no seminário sobre
Crítica Textual só aumentam ainda mais as minhas convicções do quanto o Senhor
preservou a Sua Palavra. E outro detalhe importante, esse texto é uma ponte que
liga o discurso de Jesus no templo e as diversas reações a esse discurso,
principalmente a dos principais sacerdotes e fariseus, conf. Jo 7.1-53.
Hernandes Dias Lopes citando Hendriksen diz que essa passagem pode ser
entendida como preparação e elucidação do discurso do Senhor em João 8.12.
Lembrando-nos que essa mulher e seus acusadores estavam numa densa escuridão
moral. Assim não nos surpreendemos ao ler: Eu
sou a luz do mundo (Jo 8.12).
Voltemos
ao texto.
O texto nos diz que era
madrugada e Jesus volta do monte das Oliveiras para o templo e logo pela manhã já
estava ensinando. Lá estava Ele rodeado de pessoas, alguns são discípulos,
outros curiosos. Quer discípulos, quer curiosos, eles o ouvem atentamente.
Podemos dizer que aquelas pessoas abriram mão do sono para estarem com Jesus
bem cedo para ouvi-Lo. Acordaram cedo para comer de um pão espiritual que
somente Ele poderia oferecer. Somente o verdadeiro Pão da Vida pode saciar a
fome espiritual das pessoas.
Não sabemos o que o
Senhor estava ensinando, mas foi nesse instante da manhã que um bando
interrompe o ensino de Jesus. Invadem o pátio, eram líderes religiosos, homens
respeitados e importantes. A horda é constituída da mais alta nada da sociedade
judaica, eram os escribas e fariseus, eram os pastores e diáconos daquela
época.
Esses homens saem de
alguma rua estreita com uma mulher. Como diz o Pr. Eduardo Rosa Pedreira: “esses
homens são conhecidos como vigilantes morais, policiais do pecado alheio, gente
com olhos abertos para detectar como radares humanos a fraqueza do outro”.
Com eles está uma
mulher. Como diz Max Lucado: “e lutando
para manter o equilíbrio na crista dessa onda bravia encontrava-se uma mulher
semidespedida”. Apenas momento antes estava na cama com um homem que não era
o seu marido. Esses policiais do pecado alheio não estavam interessados na Lei,
nem muito menos na questão do adultério, pois se não teriam levado o homem
também. Queriam apenas usar de forma desonesta essa situação para apanhar Jesus
em algum erro, em uma armadilha (v. 6).
Se Jesus recomendasse a
clemência, Ele se colocaria em oposição à Lei de Moisés. Se Ele recomendasse o
apedrejamento, os judeus sabiam que tal julgamento entrava em choque com a
jurisdição romana, que reservava para si o direito de aplicar a morte. A
malignidade desses homens era notória em suas atitudes. Eles queriam pegar
Jesus em algum erro, era isso que lhes interessava. A pobre mulher era só um
chamarisco para tal coisa.
Esses homens põem esta
mulher na frente de Jesus e lhe dizem:
– Apanhamos esta mulher
em flagrante adultério! Brada o líder. A lei diz para apedrejá-la. O que o
Senhor diz?
A
lei dizia muitas coisas.
● A Lei referente ao
adultério era realmente muito severa, porquanto de acordo com as passagens de
Lv 20.10 e Dt 22.22 nesse caso, ambos os envolvidos, deveriam ser condenados à
morte.
● Em Dt 22.23,24
especifica a morte por apedrejamento para o caso especial de adultério em que a
mulher fosse virgem, comprometida com outro homem (noiva).
● Em Lv 21.9 diz que se
a filha de um sacerdote viesse a tornar-se prostituta deveria ser queimada.
Em outras palavras,
aquela mulher perante a Lei deveria morrer.
É, pois, neste
maravilhoso encontro, neste cenário atípico que podemos tirar algumas lições
importantes para nossa vida.
A
PRIMEIRA LIÇÃO QUE APRENDO É QUE PRECISAMOS MUDAR A NOSSA VISÃO – Uma pessoa é
maior que seus pecados.
Enquanto os fariseus
viram uma mulher adúltera, Jesus viu uma pessoa. Jesus viu gente. Para os seus
acusadores nada do que ela foi ou poderia ser era mais importante que o
adultério por ela cometido. Toda a sua vida estava resumida naquele ato. Um
momento apenas, e tudo mais foi ignorado.
O
seu pecado era passivo de morte, isso é um fato.
Ela havia traído o seu marido. A palavra grega para adultério é moikeia,
que descreve uma relação extraconjugal. Ela violou os votos de fidelidade
conjugal, quebrou a aliança, feriu a Lei de Deus e transgrediu o sétimo
mandamento.
Não estou querendo
justificar o pecado desta mulher, mas nós não sabemos o que aconteceu para que
esta mulher fizesse isso. Não sabemos se seu marido a maltratava, se ele havia
a traído também e por isso com ela estava se vingando dele. Quem sabe ela se aproveitou
do fim da festa dos tabernáculos, já que a cidade estava lotada de gente para
dar vazão aos seus desejos e pecar. Não sabemos se não foi nos braços de um
estranho que ela encontrou o carinho, o afeto que seu coração tanto desejava.
Não sabemos. De uma coisa sabemos:
1º Os fariseus usaram de
sua autoridade para condenar e não para restaurar (Jo 8.4,5).
Os líderes religiosos usaram da sua autoridade tanto para condenar a mulher,
quanto para condenar Jesus. Mais uma vez repito, o que havia ali era uma grande
malignidade no coração daqueles homens. Passava longe do coração deles a misericórdia.
O
Cristo Redentor é uma estátua com vinte e sete metros
de altura. Mil trezentas e vinte toneladas de concreto armado. Posicionada numa
montanha dois mil e quatrocentos metros acima do nível do mar. Essa estátua do
Cristo Redentor é impressionante, mas há uma grande ironia nesse Redentor: ele
é cego. A segunda ironia é que no peito da estátua há um coração. Só que é um
coração de pedra. A terceira ironia é que abaixo dele há uma cidade envolta no
pecado, mas que ele não redime, não tem poder de libertar as pessoas de seus
pecados.
A estátua do Cristo
Redentor é um símbolo desses fariseus. Homens cegos e com um grande coração de
pedra. Não havia nem ternura em seus olhos e nem amor em seus corações. Muitos
daqueles homens tinham a idade para ser seu pai, mas eles não a viram como uma
filha que precisava de colo, de carinho, de respeito, de disciplina, mas a viam
como digna de morte. Eles eram redentores sem vista e sem coração.
2º Vemos a hipocrisia
dos religiosos (Jo 8.5,6). Esses religiosos pareciam
estar preocupados com a Lei, com a moral e os bons costumes, mas na verdade
eram grandes hipócritas. Gente sem nenhum compromisso com Deus e muito menos
com a Sua Lei. Eram homens invejosos que não conseguiam conviver com a
popularidade de Jesus e nem queriam ouvir os seus ensinamentos. Diziam ser
filhos de Deus, mas eram filhos do diabo como bem disse Jesus. A vergonha e os
temores da mulher, ao ser exposta publicamente, não lhes significava nada,
conquanto alcançassem o objetivo que tinham proposto que era de matar Jesus. Com
essa atitude esses líderes se tornaram mais culpados que a acusada.
3º Corremos o risco de
nos tornarmos como esses homens (Jo 8.9,10a). Observe que
a multidão pega em pedras para apedrejar a mulher. As mesmas pessoas que estavam
ouvindo os ensinamentos de Jesus, de repente, passam a dar atenção aos líderes
religiosos. Isso serve de alerta para todos nós. Corremos o risco de sermos influenciados
a ver os pecados alheios e não repararmos nos nossos. Como disse Jesus em Mt
7.1-5 sobre o julgar o pecado alheio.
SEGUNDA
LIÇÃO QUE APRENDO É QUE SOMOS TODOS IGUAIS DIANTE DE JESUS (Jo 8.7-9).
O que vemos aqui é a
igualdade radical de todo ser humano diante de Jesus. Aos olhos de Deus todos
nós somos pecadores (Rm 3.23). Para Ele não existe tamanho de pecado, nós sim
fazemos distinção, nós sim comparamos tamanho de pecado. Aqui em baixo é que
somos diferentes. Aliás, é bom lembrar que há muitas pessoas em nossas igrejas
que se alegram, infelizmente, com o pecado dos irmãos, principalmente se seus
pecados forem “maiores” que os deles. Assim eles se sentem mais santos que os
outros.
1º - Jesus nivelou
todos eles ao pecado da adúltera (Jo 8.7). Hernandes Dias
Lopes citando William Barclay diz que é interessante notar que “a palavra grega
anamartetos, ‘sem pecado’, significa
não só sem pecado, mas também sem um desejo pecaminoso. Portanto, Jesus estava
dizendo: vocês só podem apedrejá-la se nunca desejaram no coração fazer o
mesmo”.
Veja o que o Senhor
disse em Mt 5.27,28: “Ouvistes o que foi
dito: Não adulterarás. Eu, porém, vos digo: qualquer que olhar uma mulher com
intenção impura, no coração, já adulterou com ela”.
O certo é que as pedras
abandonadas no chão provam que o adúltero e a adúltera são tão pecadores aos
olhos de Jesus quanto qualquer um que não haja cometido este pecado, mas esteja
envolvido em outros.
2º - Quando somos
confrontados com os nossos pecados há quebrantamento (Jo 8.9).
O que se ouviu depois da pergunta de Jesus foi o bater de pedras no chão.
Felizmente aqueles homens tinham um pouco de senso crítico e consciência
sensível, a ponto de perceberem seu próprio pecado e abandonarem a ideia de
tentar matar uma pessoa tão pecadora quanto eles.
Quando me considero tão
pecador quanto aquele que me feriu, entro num caminho de quebrantamento
maravilhoso. Minha ira pode ser quebrada, meu orgulho pode ser quebrado, meu eu
pode ser quebrado por esta atitude de não atirar pedras em quem me feriu –
conquanto tenha todas as razões do mundo para fazê-lo.
3º - Quando me
considero tão pecador quanto aquele que me feriu, então percebo que há perdão
para o outro. Isso não é fácil de se ouvir,
principalmente quando alguém já foi ferido por outra pessoa através de um
adultério. Talvez você diga que eu estou falando isso porque tal coisa não
aconteceu comigo, mas eu quero lhe dizer que se eu não pensar assim eu estou
dizendo que o sacrifício de Cristo na cruz foi só para perdoar alguns pecados,
e, principalmente, não perdoar os que me feriram.
Não estou dizendo com
isso que devemos voltar a conviver com quem nos feriu. Eu estou dizendo que
devemos perdoar aquelas pessoas que nos feriram, pois essa é uma necessidade da
nossa alma, se não liberamos perdão nós iremos morrer envenenados com o nosso
ódio.
TERCEIRA
LIÇÃO QUE APRENDO É QUE A GRAÇA DE DEUS NOS ISENTA DA MORTE (Jo 8.10,11).
O Pr. Eduardo Rosa
Pedreira diz que “o ver que todos haviam saído de cena sem condenar a mulher,
Jesus também não a condena. Aliás, naquele cenário Ele era o único com
condições de atirar a primeira pedra. Contudo não o fez. Ele nem se quer pegou
numa pedra. Ele a perdoa, livra-a do peso de seu adultério, liberta-a: ‘Vai,
segue teu caminho, constrói vida nova, caminha por jornadas novas, vai livre,
vai! No entanto, não peques mais’”.
1º - Jesus não esmagará
a cana quebrada, nem apagará a torcida que fumega (Jo 8.11b).
Cana ou caniço era um talo erguido à beira das águas de um rio ou lago ou
represa, uma espécie de bambu. Havia muito destas canas nos rios de Israel, as
crianças costumavam sentarem-se as margens destes rios, e ali faziam orifícios
nestas canas transformando elas em flautas. Era uma tarefa difícil, porque com
muita facilidade o bambu podia se danificar, se ficassem tortas ou estragadas
as crianças o esmagavam e jogava fora.
O
que é um pavio fumegante? É o pavio de uma lâmpada que ainda
fumega. Quem já morou na roça sabe muito bem o que é um pavio, isto era muito
usado no passado as lamparinas tinham um pavio que era aceso com gasolina. Um
pavio fumegante não está mais aceso, não existe mais fogo nele mais ainda esta
fumegando. Na antiguidade como não havia ainda luz elétrica e as casas em
Israel eram iluminadas por pequenas candeias de azeite. Um pavio feito de linho
flutuava no azeite, clareando a cassa, terminando o azeite o mau cheiro do
linho ardente se tornava desagradável e dona de casa o jogava fora.
Jesus tirou os olhos do
que estava escrevendo no chão somente quando todos os acusadores tinham
partido. Diante dele estava somente essa pobre mulher totalmente quebrada moralmente
e espiritualmente apagada. Ele a restaura. Não é porque não damos mais som e
nem temos mais luz que o Senhor nos descarta. Somos descartáveis para os
homens, mas não para Deus. Por isso o Senhor libertou aquela mulher para que
ela trilhasse um novo caminho e tivesse uma nova vida.
2º - O perdão tem suas
exigências (Jo 8.11c). Jesus despede a pecadora, mas sem
fechar os olhos ao seu pecado. Se Ele tivesse a despedido sem essa recomendação
Ele estaria dando aval ao seu pecado, mas não foi isso que Ele fez. Ele a
despede em paz, mas com essa ordem: “Vai
e não peques mais”.
Esta mulher volta-se e
caminha para o anonimato. Ninguém mais a vê ouve falar dela. Há uma antiga
lenda que diz que o nome dela era Susana e que se tornou discípula de Tiago,
irmão de Jesus. Se isso é verdade nós nunca poderemos descobrir, mas uma coisa
é certa: esta mulher nasceu de novo.
3º - Jesus restaura a
dignidade desta mulher. Ela vai para o anonimato
restaurada pelo Senhor. O Senhor a havia perdoado de seus pecados e lhe dado
uma nova oportunidade. Assim o Senhor está fazendo hoje também com cada um que se
achega a Ele quebrado e sem brilho. Ele restaura a honra dessa mulher e lhe dá
nova vida.
CONCLUSÃO
Muitas pessoas definem
o casamento como uma prisão, uma forca, mas eu quero dizer que há liberdade no casamento,
mas esta liberdade jamais estará livre de limites. Ela nunca é absoluta; ser
totalmente livre é viver uma vida sem amor. Se você é dirigido apenas pelos
seus próprios desejos e não tem consideração pelos outros, então logo estará
preso aos seus desejos. A ideia do “casamento aberto” – no qual se permite que
cada um dos parceiros tenha relações íntimas com outras pessoas – nunca se
mostrou ser uma forma funcional de casamento por uma simples razão: viola o amor verdadeiro. Alguém pode
alegar que o mundo está mudando, mas nesse ponto a família não pode mudar.
O Pr. Eduardo Rosa
Pedreira diz que “não há espaço para amizades coloridas ou as modernas
‘relações abertas’. Na era do ‘ficar junto’; no tempo em que antes de casar se
mora junto, como um prelúdio para ver se vai dar certo o casamento; nestes
tempos de tanta mudança, ainda é preciso erguer a voz e contestar aquilo que
fragmenta e mata uma relação sadia”.
Por isso que na Bíblia
o pecado sempre será pecado e será tratado como pecado independentemente de
haver uma concessão do parceiro para o pecado, no caso em questão – o
adultério.
Pense nisso!
muito bom que Deus continue lhe dando cada vez mais sabedoria.
ResponderExcluirObrigado pelas palavras.
ExcluirQue Deus o abençoe!
muito bom esse esboço gostei muito me ajudou bastante
ResponderExcluirFico feliz em saber que lhe abençoou.
ExcluirFique na Paz!
Pr. Silas Figueira
Parabéns pelas palavras Pr. Silas,
ResponderExcluirInfelizmente somos levados a sempre julgar o outro, antes de olharmos para nós mesmos. Todos somos pecadores, sendo assim, não somos melhores do que ninguém. Devemos amar o pecador e não o pecado.
Graça e paz Hélio.
ExcluirÉ mais fácil condenar o pecado alheio que admitirmos os nossos. É isso que o Senhor quer nos ensinar aqui, somos pecadores e precisamos de Sua graça. Somos julgados por Ele não pelo tamanho do nosso pecado, mas por sermos pecadores.
Esse texto tem uma grande lição para todos nós.
Fique na Paz!
Pr. Silas Figueira